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RECURSO
ALEGAÇÕES
PRAZO
MATÉRIA DE FACTO
Sumário
Para que o prazo de alegações de recurso beneficie do aumento de 10 dias [n.º6 do art. 698 do CPC], apenas é necessário que aquele tenha por objecto “a reapreciação da matéria de facto”, que apenas tem de constar das próprias alegações, não sendo necessário a sua menção no requerimento de interposição.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
B………., inconformado com o despacho que julgou deserto o recurso de apelação (que apresentou da sentença proferida nos autos nº …/05.7TBMTS, que lhe move C………., S.A., no .º Juízo Cível de Matosinhos), por ter considerado que as respectivas alegações foram apresentadas intempestivamente, do mesmo interpôs recurso de agravo, em cuja minuta formulou as seguintes conclusões:
I) O recurso da sentença do processo apresentado pelo Agravante tem por objecto a reapreciação da prova gravada, constituindo, aliás, a sua essência;
II) As alegações do referido recurso foram apresentadas dentro do prazo previsto nos n.ºs 2 e 6, do art.º 698.º;
III) A lei prevê um prazo regra para a apresentação das alegações, que é de 30 dias;
IV) Mas acrescenta que tal prazo será de mais 10 dias, desde que se verifique determinada situação – o recurso ter por objecto a reapreciação da prova gravada;
V) Dispondo que, em tal caso, o prazo regra é acrescido de mais 10 dias;
VI) Sendo certo que não faz depender o funcionamento deste regime especial de qualquer outro requisito para além daquele que consta da sua previsão - o recurso ter por objecto a reapreciação da prova gravada;
VII) Se, porventura, o uso de tal prazo adicional estivesse dependente de qualquer ónus ou dever imposto ao recorrente, afigura-se que o mesmo não poderia deixar de estar expressamente previsto na lei;
VIII) Não faz sentido anunciar ou antecipar os contornos de um objecto que apenas fica definido com a junção aos autos das alegações do recurso;
IX) Por outro lado, ainda que o recorrente manifeste, expressa ou tacitamente, no processo o seu propósito de impugnar a decisão de facto, com a reapreciação das provas gravadas, daí não resulta, desde logo, que o seu prazo para alegar é de 40 dias;
X) Efectivamente, se das alegações e respectivas conclusões apresentadas se concluir que, afinal, o recurso não tem por objecto a reapreciação das provas gravadas, então o prazo para as juntar aos autos é de 30 dias;
XI) Mais, o requerimento de interposição de recurso, salvo restrição nele expressa (que não se verifica no caso em apreço) abrange toda a decisão que for desfavorável ao recorrente, incluindo, pois, a decisão sobre a matéria de facto – 2.ª parte do mesmo n.º 2, do art.º 684.º;
XII) Diga-se, ainda, que o entendimento da douta decisão recorrida – o de que o recorrente, para poder beneficiar do prazo adicional de 10 dias, deve manifestar no processo que pretende a reapreciação da prova gravada – daria lugar a situações de desigualdade entre as partes;
XIII) Na verdade, a seguir-se tal tese, nos casos em que o recurso tivesse por objecto a reapreciação da prova gravada e o recorrente não tenha manifestado nem expressa nem tacitamente o propósito de ver incluído no recurso a reapreciação da prova gravada, o prazo para ele alegar seria de 30 dias, ao passo que o prazo do Recorrido, para o mesmo efeito, sem necessidade de nada dizer no processo, seria de 40 dias;
XIV) Afigura-se inútil o requerimento apresentado no processo dizendo que o objecto do seu recurso compreende a reapreciação das provas gravadas, uma vez que tal objecto já se encontra traçado pelo requerimento de interposição de recurso e apenas ficará com os contornos definidos nas conclusões das alegações, que constituem a última tarefa ou remate do trabalho que cabe ao Recorrente e que importará sempre analisar para efeito de confirmar se, de facto, a alegação apresentada dentro do referido prazo adicional previsto na lei foi tempestiva;
XV) Acresce que a interpretação das normas processuais aplicáveis ao caso em apreço, aqui defendida pelo Agravante, deve prevalecer à interpretação do douto despacho recorrido, por consideração aos valores em jogo e às consequências que derivam da sua adopção;
XVI) A interpretação propugnada pelo Agravante é a mais conforme com a letra da lei, e não fere nenhuma outra regra ou princípio processual, bem como dela não resulta nenhum prejuízo para os interesses da outra parte;
XVII) Na decisão fez-se, assim, inadequada aplicação do direito, mormente do disposto nos artigos 698.º, n.ºs 2 e 6, 684.º, n.º 3, 690.º, n.º 1, 684.º, n.º 2 e 687.º, n.º 1, a contrario, do Cód. de Proc. Civil;
XVIII) Sem prescindir, ainda que se entenda que a posição que mais se adequa às citadas normas processuais é a que vem no douto despacho recorrido, sempre se deveria concluir, pelo que consta do processo, que o recorrente manifestou que pretendia recorrer da decisão da matéria de facto e, por conseguinte que fossem reapreciadas as provas gravadas em que a mesma se sustentou.
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O Mmº Juiz “a quo” sustentou a sua decisão.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – CPC= 684º, nº 3 e 690º, nº.s 1 e 3, Diploma a que pertencem as normas a seguir mencionadas sem indicação de origem.
Com tal delimitação, emerge, para conhecer, a questão de saber se as supra referidas alegações foram, ou não, tempestivas.
Os factos pertinentes, para além do supra referido, são os seguintes:
O Recorrente interpôs o recurso de apelação, sem qualquer menção de que pretendia recorrer da matéria de facto.
O recurso foi admitido por despacho notificado ao Recorrente por carta enviada em 17/10/06.
Por fax remetido em 29/11/06, o Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, das quais consta impugnação da matéria de facto
O Recorrente no requerimento de indicação de provas requereu a gravação das provas produzidas na audiência final.
O IL.Mandatário requereu, em 10/10/06, que lhe fosse facultada cópia das gravações dos depoimentos prestados em audiência.
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O Mmº Juiz a quo, considerou que o Recorrente, para beneficiar do acréscimo de 10 dias – previsto no nº 6, do artº. 698º - teria de ter dado conta nos autos da sua pretensão de impugnar a matéria de facto (praticando algum acto, expresso ou tácito, mas inequívoco, dessa intenção, no decurso do prazo geral de 30 dias de que dispõe para alegar), e como não o fez, julgou o recurso deserto
O Agravante, por sua vez, argumenta, em primeira linha, que o prazo adicional de 10 dias não depende de manifestação do recorrente, dentro do prazo regra de 30 dias, de que pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto e depois, sem prescindir, alega que da sua actuação processual e do seu Mandatário, resulta que no recurso interposto se pretendia impugnar a decisão da matéria de facto.
Pensamos que assiste razão ao Agravante.
Vejamos.
De acordo com o nº 2, do artº. 698º «O recorrente alega por escrito no prazo de 30 dias…» e segundo o seu nº 6 «Se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, são acrescidos de 10 dias os prazos referidos nos números anteriores».
Como é sabido, este nº 6 destina-se a facilitar o cumprimento do ónus estabelecido no artº. 690º-A.
Da simples leitura daquele nº 6, constata-se que nele não se prevê qualquer requisito (nomeadamente o de dar conta nos autos da sua pretensão de reapreciação da prova gravada) a cumprir pelo recorrente, para beneficiar do acréscimo de 10 dias, que não seja o do recurso ter por objecto a “reapreciação da prova gravada” – e como este objecto é delimitado pelas conclusões das alegações, será pelas conclusões que se aferirá se as alegações são ou não tempestivas, o que nos leva a perfilhar a tese do Recorrente, ou seja, a de que tendo havido gravação da prova e não tendo o Recorrente, no requerimento de interposição do recurso, excluído do âmbito do recurso o decidido quanto à questão de facto, então o processo não deverá ser concluso ao Mmº Juiz antes do decurso do prazo de 40 dias, contados da notificação ao recorrente do despacho que o admitiu e, apresentadas as alegações, para além dos 30 dias, das duas uma: ou o recorrente, nas conclusões, pede a reapreciação da prova gravada, como aconteceu in casu – situação em que as alegações são tempestivas – ou não pede – hipótese em que as alegações serão tidas por intempestivas e o recurso julgado deserto.
Aliás, mesmo na tese perfilhada no douto despacho recorrido, sempre as alegações teriam de ser consideradas tempestivas, e o recurso não encontrado deserto, na medida em que o ora Agravante praticou actos inequívocos da sua intenção de requerer a reapreciação da prova gravada, nomeadamente quando requereu a gravação da audiência final e quando o Il. Mandatário requereu que lhe fosse facultada cópia dos registos dos depoimentos prestados em audiência de julgamento.
Termos em que procedem as conclusões da minuta.
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Decisão.
Pelo exposto concede-se provimento ao agravo, revoga-se a decisão recorrida e considera-se que o recurso de apelação interposto pelo ora Agravante se não encontra deserto por não se ter ainda esgotado o prazo para apresentação das alegações.
Sem custas.
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Porto, 10 de Setembro de 2007
José Rafael dos Santos Arranja
Anabela Figueiredo Luna de Carvalho
Abílio Sá Gonçalves Costa