NULIDADES DE SENTENÇA
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
EXAME CRÍTICO
INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO PARA A DECISÃO
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
VALOR DA PROVA PERICIAL
IMPUTABILIDADE DIMINUIDA
Sumário

I - Nem todas as omissões ou inobservâncias dos pressupostos legais plasmados no art.º 374º do CPP determinam a nulidade da sentença.
II – A falta de indicação na sentença das conclusões da contestação nunca determinaria qualquer nulidade, seja porque escapa à previsão do art.º 379º do CPP, seja ainda porque não consta do elenco do regime geral consagrado no art. 119º do mesmo Diploma Legal.
III – O dever de fundamentação impõe ao dominus do processo que individualize as razões objectivas e a base racional que levou à convicção exprimida na factualidade provada e/ou não provada e bem assim os motivos que subjazem à valoração e credibilidade atribuída aos meios de prova disponíveis, de modo a convencer quem, posteriormente e com base nela, tente reconstruir o percurso mental decisório.
IV - O exame crítico só não será suficiente quando deixe de exteriorizar cabalmente o percurso lógico-dedutivo que presidiu à convicção firmada.
V - A insuficiência da matéria de facto para a decisão reporta-se a lacunas no elenco factual vertido na decisão pelo que tal vício ocorre quando da leitura desta se evidencia a omissão de factos que podiam e deviam ter sido averiguados - por se mostrarem necessários à formulação de juízo seguro de condenação ou absolvição - e não o foram, em prejuízo do dever de descoberta da verdade e boa decisão da causa que incumbe ao tribunal.
VI – O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo, partindo de um facto conhecido para um facto desconhecido pelo que as presunções simples ou naturais são simples meios de convicção, presentes na base desse juízo. Da prova indiciária induz-se, por meio de raciocínio alicerçado em regras de experiência comum ou da ciência ou da técnica, o facto probando. Do facto indiciante infere-se um facto conclusivo quanto ao facto probando, juridicamente relevante no processo.
VII - Nem todas as conclusões constantes de relatório elaborado por um perito se inscrevem no âmbito do juízo especializado - técnico, científico ou artístico.
VIII - Os pressupostos de facto que servem de base ao parecer continuam sujeitos à livre apreciação do juiz.
IX - A imputabilidade diminuída não se apresenta como uma consequência directa e necessária de determinada patologia diagnosticada. O seu estabelecimento é feito caso a caso, dependendo da análise das concretas circunstâncias dos factos ilícitos, modus operandi e personalidade de quem os pratica.

Texto Integral

RECURSO PENAL n.º 291/17.8JAAVR.P1
Secção Criminal
Conferência/Urgente

Relatora: Maria Deolinda Dionísio
Adjunto: Jorge Langweg

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:

I - RELATÓRIO
a) No âmbito do processo comum, com intervenção de Tribunal Colectivo, n.º 291/17.8JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro-J6, da Comarca de Aveiro, por acórdão proferido a 13 de Julho de 2018, foi o arguido B..., com os demais sinais dos autos, ABSOLVIDO da prática de 1 (um) crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punível pelos arts. 131º e 132º, n.ºs 1 e 2, al. b), do Cód. Penal, e CONDENADO na pena única de 21 (vinte e um) anos de prisão, em resultado das seguintes penas parcelares:
> 18 (dezoito) anos e 6 (seis) meses de prisão pela prática de um crime de homicídio qualificado, previsto e punível pelos arts. 131° e 132º, n.ºs 1 e 2, al. c), do Cód. Penal;
> 5 (cinco) anos de prisão pela prática de um crime de violação, previsto e punível pelo art. 264º, n.º 1, al. b), do Cód. Penal;
> 2 (dois) anos de prisão pela prática de um crime de roubo, previsto e punível pelo art. 210º, n.º 1, do Cód. Penal;
> 9 (nove) meses de prisão pela prática de um crime de profanação de cadáver, previsto e punível pelo art. 254º, n.º 1, al. a), do Cód. Penal.
Mais foi ainda CONDENADO a pagar ao assistente/demandante C..., com os demais sinais dos autos, a quantia de € 52.500,00 (cinquenta e dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora desde a notificação e até efectivo e integral pagamento, à taxa legal de 4% ou outra que venha a vigorar em cada momento, a título de indemnização de danos não patrimoniais.
b) Inconformado com o decidido, o arguido B... interpôs recurso rematando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem: (sem destaques/sublinhados)
.................................................
.................................................
.................................................
d) Neste Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer previsto no art. 416º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, acompanhando e reforçando a resposta do Ministério Público e pronunciando-se, por isso, pelo não provimento do recurso.
e) Cumprido o disposto no art. 417º n.º 2, do Cód. Proc. Penal, não houve resposta.
f) Realizado exame preliminar e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência que decorreu com observância do formalismo legal, nada obstando à decisão.

***
II- FUNDAMENTAÇÃO
1. Consoante decorre do disposto no art. 412º n.º 1, do Código de Processo Penal, e é jurisprudência pacífica [cf., entre outros, Acórdãos do STJ de 20/12/2006, Processo n.º 06P3661, in dgsi.pt, e de 3/2/1999 e 25/6/1998, in B.M.J. 484 e 478, págs. 271 e 242, respectivamente], as conclusões do recurso delimitam o respectivo objecto e âmbito do seu conhecimento, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso.
Assim, in casu, são suscitadas as seguintes questões:
1. Nulidade da decisão
-> Omissão de referência às conclusões da contestação
-> Insuficiência de fundamentação
2. Vícios do art. 410º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal
-> Insuficiência para a decisão da matéria de facto
-> Erro notório na apreciação da prova
3. Imputabilidade diminuída do arguido
-> Desqualificação e redução da pena do crime de homicídio
-> Redução da pena única
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2. A fundamentação de facto da decisão recorrida, no que ao caso interessa, é a seguinte: (transcrição)
A) Factos Provados
1. Entre data não posterior aos últimos meses do ano de 2012 e meados do mês de julho de 2017, o arguido B... manteve com a ofendida D... um relacionamento amoroso, chegando mesmo a viver juntos como se de marido e mulher se tratassem no período compreendido entre finais de 2012 e o dia 13 de maio de 2017, ainda que, de permeio, com períodos de afastamento e de reconciliação.
2. Entre data não posterior aos últimos meses do ano de 2012 e o ano de 2016, o casal residiu na habitação da ofendida, sita na Rua ..., n.º 1, R/C, em ..., ..., em Estarreja, mudando-se depois para Coimbra, novamente para ..., depois para ... e, por fim, para a atual residência da ofendida, sita na Rua ..., n.º .., em ..., Vagos.
3. Na sentença proferida no processo nº 9/16.2 GAAVR que corre termos no Juiz 3, do Juízo Local Criminal desta Comarca de Aveiro, resultou provado que desde o início da relação até 26 de setembro de 2016, enquanto viveram juntos, foi usual o arguido dirigir à ofendida D... expressões como “sua puta, sua vaca, andas-me a trair, andas com outros homens, és uma porca, meto-te num cepo com as pernas abertas, hás-de enfiar um cepo na cona”, e desferir-lhe murros, pontapés, bofetadas, puxões de cabelo, apertar-lhe o pescoço e chegou a espetar-lhe uma faca na barriga.
4. No âmbito do referido processo n.º 9/16.2GAAVR, que corre seus termos no Juiz 3, do Juízo Local Criminal desta Comarca de Aveiro, por sentença datada de 02 maio de 2017, o arguido foi condenado pelo crime de violência doméstica na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, fazendo depender essa suspensão do cumprimento da pena acessória de proibição de contactos pelo período de um ano com a ofendida D... e de o arguido se submeter ao tratamento do alcoolismo.
5. Para controlo do cumprimento da medida de proibição de contactos, o arguido e a D... ficaram sujeitos a meios de fiscalização eletrónica de controlo à distância pela Direção-Geral de Reinserção Social e Serviços Prisionais.
6. Na fase de inquérito do referido processo com o n.º 9/16.2GAAVR, em 26 de setembro de 2016, o arguido ficou sujeito às medidas de coação de proibição de contactar a vítima, cujo controlo era efetuado por recurso à proteção da vítima por equipamento de teleassistência, de obrigação de submeter-se a tratamento da dependência do álcool e a apresentações trissemanais no O.P.C. da sua área de residência, o que fez pela última vez no dia 03 de maio de 2017.
7. Não obstante o referido em 6., em data não concretamente apurada, mas situada na semana em que foi proferida a sentença no âmbito do processo n.º 9/16.2GAAVR, o arguido e a D... voltaram a viver juntos, residindo o casal na Rua ..., n.º .., em ..., ..., em Vagos.
8. Para iludir os meios técnicos de vigilância eletrónica e contornar o controlo da medida de proibição de contactos referida em 5., a ofendida D... e o arguido escondiam os respetivos dispositivos em locais distintos e afastados o suficiente entre si.
9. No dia 08 de maio de 2017, a ofendida D... recusou continuar a usar a unidade de proteção à vítima, tendo esta, nessa sequência, sido recolhida no dia seguinte.
10. Por sua vez, o arguido passou a não proceder ao carregamento da bateria da unidade de posicionamento móvel (UPM) que lhe estava distribuída, inviabilizando assim a possibilidade de, por essa via, ser localizável.
11. Enquanto viveram juntos, a D... tinha por hábito, diariamente preparar uma bebida de groselha e gasosa.
12. No dia 13 de maio de 2017, a hora não concretamente apurada mas certamente situada após o jantar e imediatamente antes de irem dormir, o arguido colocou num copo uma porção de groselha ao qual juntou um produto para desentupir canos e um fármaco de fluoxetina e colocou-o numa das mesinhas de cabeceira do quarto.
13. A D..., antes de ir deitar-se, pegou no copo colocado em cima da mesa-de-cabeceira, e deu um gole na bebida preparada, não tragando seguidamente o líquido todo porque sentiu, de imediato, um ardor na boca.
14. Perante tal ardor na boca e conhecedora do sabor da bebida que tomava todos os dias, a ofendida dirigiu-se imediatamente ao arguido e disse-lhe “Tu envenenaste-me, tu envenenaste-me”.
15. Nessa altura o arguido, de imediato, saiu apressadamente da casa da ofendida, não mais voltando.
16. Foi chamado o 112, tendo-se deslocado ao local uma patrulha da G.N.R. de Vagos e os bombeiros, que logo a transportaram ao Serviço de Urgência do Centro Hospitalar ... em Aveiro.
17. A D... foi observada no Centro Hospitalar ... em Aveiro e, prontamente, transferida para o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, onde realizou um exame de endoscopia digestiva alta. 18. A bebida acima referida e ingerida pela ofendida nas circunstâncias acima descritas, tinha fluoxetina, farmacologicamente um antidepressivo, e caraterísticas alcalinas com elevado valor de pH (>10), sendo que, uma vez ingerida, provoca vómitos e origina graves queimaduras a nível do tubo digestivo.
19. Como consequência direta e imediata da ingestão daquela bebida a D... sentiu dores na boca, garganta, peito e estômago.
II.
20. A partir do dia 13 de maio de 2017, sem casa, sem emprego, sem outros rendimentos e sem o apoio da sua ex-companheira, a referida D..., o arguido passou a levar uma vida de indigência, pernoitando na rua, sob uma ponte, na zona de ..., em Esgueira.
21. Como acima referido, pelo menos entre os anos de 2012 e 2016, o arguido residiu em ..., Estarreja.
22. Na mesma localidade, vive a irmã do arguido, E..., que, aproximadamente entre o ano de 2010 e o ano de 2012, residiu numa casa arrendada, sita na Rua ..., n.º .., pessoa que, na altura, o arguido por vezes visitava.
23. A vítima F..., nascida a 03 de novembro de 1936, residia na Rua ..., n.º .., precisamente na casa ao lado da referida residência da irmã do arguido E....
24. A vítima F... vivia sozinha, não obstante os seus 80 anos de idade, os seus problemas de saúde e as suas dificuldades de mobilidade, estas sentidas essencialmente a partir de 8 de abril de 2016 quando fraturou o fémur, sendo que apenas o seu irmão C..., G..., que prestava serviços domésticos, e o vizinho H..., que a auxiliava no quintal e na alimentação dos animais, frequentavam com regularidade a sua casa.
25. Em data não concretamente determinada, mas seguramente anterior ao final da manhã do dia 26 de maio de 2017, o arguido traçou um plano que tinha por finalidade a apropriação de quantias monetárias e/ou outros artigos de valor e como alvo a vítima F..., porquanto era sabedor da sua idade, dos seus problemas de saúde e da circunstância de aquela residir sozinha.
26. Dando corpo e execução ao plano delituoso previamente delineado, no dia 26 de maio de 2017, ao final da manhã, munido de fita adesiva, o arguido, utilizando uma bicicleta que lhe havia sido cedida pela D..., deslocou-se, pela E.N. ..., de Aveiro até à localidade de ....
27. Ali chegado, tratou de se alimentar, dirigindo-se à Rua ..., onde apanhou laranjas.
28. Depois, dirigiu-se à “I...”, sita na Rua ..., e daí para a “J...”, localizada no entroncamento da Av. ... com a rua ....
29. Cerca das 17h30m, o arguido dirigiu-se à residência da vítima F... e, vendo que a mesma anunciava num papel colado na porta principal de sua casa a venda de galinhas e ovos, por forma a ter um motivo para ali voltar ao cair da noite e assegurar-se que a vítima lhe abriria a porta de sua casa, abordou a mesma junto ao portão de acesso ao quintal de sua casa e perguntou se aquela lhe vendia uma galinha, combinando com ela voltar mais tarde para levar o referido animal.
30. Perante o interesse do arguido em comprar uma das suas galinhas, a vítima F..., cerca das 19 horas, encetou conversa com a sua vizinha K..., que por ali passou, procurando saber qual o preço a que estavam a ser vendidas as galinhas.
31. Cerca das 20h00, L..., comerciante e à data proprietário do “M...”, sito em ..., deslocou-se a casa da vítima F... e entregou-lhe a mercadoria que aquela antes tinha encomendado por telefone, tendo dela recebido o respetivo pagamento em numerário.
32. A hora não concretamente determinada, mas seguramente após as 20h00, depois de ter deambulado por ..., esperando que escurecesse, e de ter estacionado a sua bicicleta junto ao apeadeiro daquela localidade, o arguido deslocou-se a pé até à casa da vítima F..., tocou à campainha e, após confirmar através da janela de quem se tratava, aquela abriu-lhe a porta.
33. Após, o arguido entrou e seguiu a vítima F... até aos anexos onde se situavam os currais, ao mesmo tempo que, de forma discreta e sem que a vítima visse, retirou do bolso das calças o rolo de fita-cola que trazia consigo e cortou com a mão um pedaço do mesmo.
34. Chegados à zona dos currais, fazendo prevalecer a sua superioridade física e aproveitando o momento em que a vítima se baixou para apanhar uma galinha, o arguido abordou-a por detrás, introduziu-lhe na boca um lenço que a própria trazia consigo e amordaçou-a com a fita adesiva, enrolando-a à volta da face e tapando-lhe a boca.
35. Depois, usando para tal a pujança física que possuía, o arguido agarrou a vítima F... e introduziu-lhe uma parte indeterminada do seu corpo ou um objeto não concretamente identificado na vagina, efetuando movimentos de vai e vem.
36. De seguida, desferiu-lhe vários golpes, com um objeto contundente não concretamente apurado, com incidência na zona da cabeça, e asfixiou-a por compressão rápida, de tal forma que, como consequência direta e necessária de tal conduta, F... sofreu uma oclusão dos orifícios respiratórios, acabando por morrer devido a asfixia por sufocação.
37. De seguida, o arguido remexeu toda a casa à procura de valores, retirando uma carteira da vítima guardada num dos quartos, em cima de um guarda-fatos, contendo uma quantia monetária não inferior a € 145,00 (cento e quarenta e cinco euros) e um telemóvel da marca Samsung ..., com o IMEI ............... e um cartão SIM com o n.º ........., da operadora N....
38. Na posse do cartão com o n.º ........., o arguido introduziu-o no seu telemóvel da marca smartphone Mobiwire ..., com o IMEI ...............
39. Após, o arguido foi-se deitar numa das camas da vítima, onde pernoitou até à manhã do dia seguinte, ou seja, 27 de maio de 2017.
40. Na manhã do dia 27 de maio de 2017, após se levantar, o arguido colocou o cadáver da vítima no interior de uma arca frigorífica, existente na cozinha da casa, fechou-a à chave e pôs por cima do seu tampo uma toalha, sacos plásticos e uma bolsa.
41. Depois, o arguido aguardou pelo anoitecer, altura em que abandonou a casa da vítima, tendo regressado a esta cidade de Aveiro, onde então morava.
42. Em consequência dos comportamentos do arguido acima descritos, a vítima F... sofreu algumas lesões na face e múltiplas equimoses e feridas contusas dispersas pela superfície corporal, a maioria verificadas na cabeça bem como nos membros superiores, mais concretamente nas faces posterior dos antebraços e dorsal da mão direita, e no membro inferior esquerdo, bem assim como múltiplas escoriações nos membros direitos, esfoliação no membro superior direito, equimose no meato uretral e lesões na vulva e vagina.
43. Como consequência direta e necessária da conduta do arguido resultou a morte de F..., que ficou a dever-se a asfixia, mediante sufocação, por oclusão das vias respiratórias.
44. No dia 29 de maio de 2017, cerca das 19h20m, a vítima F... foi encontrada na sua residência no interior de uma arca frigorífica fechada à chave, sendo encontrada congelada e amordaçada com uma tira de fita adesiva e um lenço de senhora.
45. Após ter introduzido no seu telemóvel da marca smartphone Mobiwire ..., com o IMEI .............., o cartão com o n.º ........., titulado pela vítima, o arguido utilizou o mesmo entre as 23:26:50 do dia 26 de maio de 2017 e as 12:14:47 do dia 27 de maio de 2017.
46. Pelas 12:14:47 do dia 27 de maio de 2017, o arguido retirou o referido cartão com o n.º ......... do seu telemóvel e voltou a inseri-lo no telemóvel da vítima, que, depois, fez desaparecer, colocando-o no interior de um contentor do lixo.
47. Em 18 de julho de 2017, o arguido tinha na sua posse o telemóvel com o IMEI .............., da marca Mobiwire ..., no qual estava inserido o seu cartão a que corresponde o n.º ..........
48. No dia 26 de maio de 2017, pelas 15h20, a D... comunicou à GNR de Vagos que, quando se encontrava num pinhal localizado próximo nas proximidades da sua residência, sem que tivesse, contudo, contactado ou avistado o arguido, recebeu um aviso de aproximação no dispositivo de vigilância eletrónica distribuído a esta e a unidade de posicionamento móvel (UPM), distribuído ao arguido, nas circunstâncias referidas em 4 a 6.
49. No dia 16 de junho de 2017, a unidade de posicionamento móvel (UPM) distribuída ao arguido foi recuperada pela G.N.R. de Vagos, abandonada debaixo de uma ponte, em ..., Aveiro.
II.
50. Com o comportamento descrito em 20. a 45., na sequência de um plano previamente delineado e gizado por ele, agiu o arguido com o propósito concretizado de integrar a quantia em dinheiro e o telemóvel referidos em 37. no seu património, bem sabendo que não lhe pertenciam e que agia contra a vontade do seu legítimo proprietário, causando-lhe, consequentemente, um prejuízo patrimonial, o que logrou alcançar, recorrendo, para a concretização dos seus intentos criminosos, ao uso de força física e violência sobre a vida e o corpo da vítima F..., colocada na impossibilidade de lhe resistir.
51. Mais agiu o arguido com o propósito de introduzir na vagina da vítima uma parte indeterminada do seu corpo ou um objeto não concretamente identificado, efetuando movimentos de vai e vem, contra a vontade desta, usando da descrita força física contra ela, e pondo em causa a sua liberdade sexual, o que representou.
52. Mais sabia o arguido que ao agir da forma descrita, tapando a boca da idosa da forma como o fez, impedindo-a de respirar, asfixiando-a da forma descrita, atenta a sua vulnerabilidade física, porque se tratava de pessoa particularmente indefesa em razão da idade e dos seus graves problemas de saúde, lhe causava a morte, o que quis e que efetivamente sucedeu.
53. Ao esconder o cadáver da vítima F..., colocando-o no interior de uma arca frigorífica, que fechou à chave e onde pôs por cima do seu tampo uma toalha, sacos plásticos e uma bolsa, o arguido agiu com o propósito de ocultá-lo, objetivo que logrou alcançar, já que o cadáver só foi encontrado três dias depois pelos seus familiares e autoridades policiais.
54. O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo todas as suas condutas eram proibidas por lei e punidas criminalmente.
55. O demandante C... é irmão da infeliz vítima, e seu único herdeiro.
56. A supra referida F... faleceu com 80 anos de idade.
57. Depois de ter sofrido uma agressão física, em Abril de 2016, que lhe provocou fratura do fémur seguida de operação de urgência, ficou internada durante algum tempo no hospital de Aveiro, factos que deram origem ao processo nº 132/16.3GCETR, que corre ainda, termos no Ministério Público em Estarreja.
58. A partir dessa altura, a sua locomoção e mobilidade ficaram bastante reduzidas.
59. E praticamente apenas saía de casa para consultas médicas.
60. O demandante C... era único apoio da vítima em termos afetivos.
61. O demandante esteve vários anos emigrado nos Estados Unidos, mas vinha pelo menos de dois em dois anos a Portugal de férias, altura em que estava com a irmã.
62. O demandante era pessoa ligada à irmã por quem votava carinho e amor e visitava-a na casa onde esta residia, na Rua ..., tendo sido ali que nasceu.
63. Quando vinha de férias a Portugal, visitava a infeliz vítima ou então ia ter com esta às festas onde a mesma vendia regueifas, doces e tremoços.
64. Antes da agressão física que sofreu, a infeliz vítima era pessoa com uma vida completamente autónoma, bastava-se a si mesma em termos económicos.
65. Após a agressão que a vítima sofreu em Abril de 2016, as preocupações do demandante, relativamente à irmã, aumentaram, uma vez que a mesma vivia sozinha e, fisicamente estava mais limitada designadamente locomovendo-se com a ajuda de um andarilho ou de um pau.
66. O demandante acabou por regressar definitivamente a Portugal, em 16/05/2016.
67. Apesar de viver em ..., o demandante mantinha contactos pelo menos uma a duas vezes por semana com a sua irmã F....
68. Movimentava a conta da vítima para compra de géneros alimentícios de que a mesma necessitava, para as pessoas que ali prestavam serviços domésticos à vítima pudessem cozinhar.
69. A vítima gostava de criar animais.
70. O demandante chegou a contratar os serviços de apoio domiciliário da Misericórdia para apoiar a vítima, mas esta recusou tais serviços.
71. No dia 23 de maio de 2017 o demandante levantou a quantia de 275,00€, tendo entregue 200,00€ à irmã para as despesas da casa.
72. Durante o fim de semana de 27 e 28 de maio de 2017 tentou falar com a vítima mas esta não atendeu o telefone.
73. E então, no dia 29 de maio de 2017, já ao fim da tarde, preocupado, dirigiu-se a casa da vítima, sua irmã.
74. Estranhou as persianas estarem fechadas, mas entrou.
75. Chamou pela irmã, procurou por toda a casa e não encontrou a vítima.
76. Começou a ficar em pânico, angustiado e aflito.
77. Chamou a testemunha H... e juntos procuraram novamente a vítima pela casa, foram ao quintal pensando que estivesse caída no chão, mas nada encontraram.
78. Telefonou ainda à testemunha G... que ali se deslocou, tendo igualmente visto a casa e quintal.
79. O demandante ligou aos Bombeiros para saber se tinha havido alguma condução para o Hospital e não obteve qualquer resposta afirmativa.
80. O demandante chamou então a GNR.
81. E foram até ao poço para saber se estaria ali caída.
82. Quando a testemunha G... descobriu que a vítima estava dentro da arca congeladora, o demandante ficou em estado de choque.
83. Desde então, quando recorda o evento tem momentos de agitação.
84. Sobretudo mais próximo ao evento o demandante passou noites mal dormidas.
85. Este evento fez com que o demandante sentisse tristeza, dor e angústia e tornou-o mais irritável.
86. Lembra-se da vítima, dos bons momentos que passou com ela e que nunca mais a vai ver.
87. O demandante era uma pessoa alegre e bem disposta e saía muito de casa.
88. Aos fins de semana almoçava e jantava fora.
89. Atualmente, o demandante isola-se mais, passando mais horas sentado e pensativo.
90. O demandante sente dificuldades em ir à casa onde a irmã foi morta que agora lhe traz más recordações.
91. O demandante, sempre que revive o momento em que encontrou a irmã morta fica agitado.
92. A vítima perdeu a vida de uma forma abrupta, pensando apenas que ia vender uma galinha ao arguido, que manifestou esse interesse.
93. Vítima F... sofreu as lesões acima referidas, constantes do relatório de autópsia que aqui se dão por inteiramente reproduzidas e perpetradas pelo arguido demandado e que provocaram naquela fortes dores.
94. A morte ocorreu em consequência de asfixia mecânica por oclusão dos orifícios respiratórios/compressão rápida, num contexto de agressão física, pelo que a vítima sofreu aflição, desespero dor e sofrimento.
95. A vítima foi atacada pelo arguido, quando, momentos antes, lhe tinha aberto a porta de sua casa numa atitude de confiança e boa-fé.
96. Não tinha ninguém a quem pedir ajuda, estava sozinha com aquele, não pôde gritar e não teve forças para se defender.
97. No dia 14/05/2017 D... deu entrada no Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra, E.P.E, tendo sido assistida no Serviço de Urgência, com realização de exames e administração de injeção, tendo importado a assistência prestada àquela a quantia de €182,37 (cento e oitenta e dois euros e trinta e sete cêntimos).
98. O processo de desenvolvimento infanto-juvenil de B... decorreu com registo de constrangimentos significativos, pois a morte do seu pai antes do seu nascimento comprometeu o equilíbrio e a estabilidade familiares.
99. Coube à mãe a educação dos nove descendentes cujo desenvolvimento decorreu num contexto de sérias dificuldades materiais e de grandes limitações de supervisão parental.
100. O arguido é o mais novo dos irmãos nascidos na região de ..., em Abrantes.
101. Após a morte do pai do arguido, a mãe mudou-se com os filhos para a cidade de Aveiro onde tinha família.
102. Aqui trabalhou como operária e realizou limpezas, procurando assegurar as necessidades básicas da família.
103. Em termos gerais, o ambiente intrafamiliar era caraterizado por desinvestimento afetivo, sendo prioritário o trabalho e a subsistência do agregado.
104. O arguido recorda privações significativas e as dificuldades da sua mãe para garantir o sustento de todos.
105. O arguido B... retém da sua infância imagens marcadamente negativas, sobretudo de privações várias no seu processo de crescimento.
106. Em idade normal iniciou a escolaridade obrigatória, em Esgueira, tendo concluído apenas o 3.º ano de escolaridade e registando várias reprovações e elevado absentismo escolar, a que acresce o desinteresse pela aprendizagem.
107. Veio a abandonar a escola aos onze anos, altura em que, sem supervisão adequada, iniciou o consumo regular de bebidas alcoólicas junto de grupo de pares da mesma idade e igual condição socioeconómica.
108. Com 15 anos de idade, o arguido iniciou atividade laboral como servente da construção civil, ocupação que manteve durante toda a sua adolescência até à idade adulta, na região de Aveiro.
109. Durante este período, permaneceu no agregado familiar de origem com o qual mantinha um relacionamento próximo mas que, com o passar do tempo se foi desgastando.
110. Presentemente mantém relacionamento afetivo com um sobrinho e com duas das suas irmãs.
111. A dificuldade em se autonomizar aliada a um modo de vida pouco regrado e com frequentes períodos de ócio, promoveram os seus hábitos de consumo de álcool protagonizando episódios regulares de intoxicação alcoólica.
112. Aos 18 anos de idade encetou um relacionamento afetivo com O... que durou dois anos e do qual nasceriam 2 filhos: P... (23 anos) e Q... (21 anos), com os quais não mantém qualquer proximidade significativa.
113. O arguido atribui o fim desta relação marital à imaturidade do casal, explicando que se sentiu “desorientado” e acabou por regressar ao agregado da mãe.
114. No entanto, porque a sua mãe discordava dos seus comportamentos de alcoólico, com 21 anos de idade acabaria por ir viver sozinho para uma casa arrendada, em Estarreja.
115. Este período da sua vida é caracterizado por atitudes e comportamentos inadequados, associados ao alcoolismo, que acentuam as suas dificuldades em organizar um trajeto de vida pessoal coerente e condicionam, de forma significativa, as relações interpessoais, com episódios de instabilidade.
116. Com 30 anos de idade, B..., juntamente com um sobrinho e a companheira deste, decide emigrar para Espanha na tentativa de melhorar as suas condições de vida, referindo ter permanecido aí a trabalhar um ano e com maior controlo sobre a sua adição.
117. Ao regressar a Estarreja, iniciou uma relação afetiva com uma vizinha com a qual casou.
118. Este casamento durou 4 anos e B... justifica o seu fim com os problemas de alcoolismo e comportamentos agressivos que exibia quando se encontrava embriagado.
119. Findo o casamento, sem descendentes, o arguido começa a trabalhar em ... como aplicador de “pladur” e, mais tarde, na agricultura a troco de alojamento, comida e algum dinheiro.
120. É nesta fase da sua vida, quando o arguido tinha cerca de 36 anos, que faleceu a sua mãe, que apesar do afastamento que mantinham, era em quem encontrava algum suporte emocional.
121. O arguido B... inicia então uma terceira relação com D... e começam a viver como casal em casa desta, na zona de ....
122. O ciúme evidenciado por B... e os episódios de conflituosidade, a par da ausência de estruturação de objetivos comuns e a instabilidade emocional decorrente dos hábitos alcoólicos do arguido contribuíram para a rutura do relacionamento.
123. Neste contexto, o arguido foi condenado por crime de violência doméstica (Processo n.º 9/16.2GAAVR) na pena de prisão de 3 anos, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova de acordo com o plano da DGRSP.
124. O arguido, após a separação marital, residia como sem-abrigo acabando por ser acolhido pela S..., em 2017, onde se manteve a residir em regime de alojamento temporário, trabalhando como ajudante de montador de painéis de revestimento exterior, até vir a ser preso preventivamente à ordem do presente processo.
125. O arguido B... encontra-se no Estabelecimento Prisional de Aveiro desde 20 de julho de 2017.
126. Em meio prisional, o arguido apresenta relacionamento estável com os seus pares e com a autoridade, adotando uma postura compatível com as regras do saber ser e saber estar e desempenhando as funções de faxina de limpeza dos serviços administrativos com bom desempenho.
127. Desde o seu ingresso, o arguido é acompanhado nos serviços clínicos do Estabelecimento Prisional para o problema de alcoolismo, aderindo à terapêutica farmacológica até à presente data.
128. O arguido apresenta uma oligofrenia ligeira e alcoolismo atualmente em remissão.
129. Efetuado exame de avaliação psicológica ao arguido concluiu-se no respetivo relatório “ A eficiência intelectual avaliada através da WAISS-III situa-se no nível “ Muito inferior” (QI=66), o que, segundo o DSM-5 (APA 2013) e o ICD-10 (WHO,2016) revela uma incapacidade mental ligeira [317(f70)]. Apesar dos resultados dos vários subtestes se apresentarem de forma heterogénea (notas entre 2 e 33), não se verificam diferenças estatisticamente significativas entre QI verbal (69) e QI de realização (67)”.
130. O arguido já respondeu em Tribunal tendo sido condenado:
a) No processo Sumário n.º 616/07.4GCETR do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Estarreja, por sentença transitada em julgado a 11.02.2008, pela prática a 20.12.2007, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 70 dias de multa à taxa diária de 5,00€, já declarada extinta.
b) No processo comum singular n.º 944/09.4PBLRA do Tribunal Judicial de Leiria por sentença transitada em julgado a 30.09.2010,pela prática a 14.08.2009 de um crime de violência doméstica, na pena de dois anos e dois meses de prisão suspensos na sua execução, já declarada extinta.
c) No processo sumário n.º 395/14.9GCETR do Juízo de Competência Genérica, Juiz 2 de Estarreja, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, por sentença transitada em julgado a 30.09.2014, pela prática a 11.08.2014 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de oitenta dias de multa à taxa diária de cinco euros, substituída por 80 horas de trabalho a favor da comunidade, já declarada extinta.
d) No processo comum singular n.º 9/16.2GAAVR do Juízo Local Criminal – Juiz 3 do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, por sentença transitada em julgado a 02.06.2017, pela prática de um crime de violência doméstica, na pena de três anos de prisão suspensos na sua execução com regime de prova, na pena acessória de proibição de contactos com a vítima pelo prazo de um ano e na pena acessória de proibição de uso e porte de armas por três anos.
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B) Factos Não Provados
1. Enquanto viveram juntos, a D... preparava a bebida de groselha e gasosa, sempre antes de se deitar, fazendo-o num copo, por norma, colocado em cima da sua mesa-de-cabeceira.
2. A referida D... havia alertado o arguido dias antes para a existência de um produto de desentupir canos que se encontrava colocado numa garrafa guardada na cozinha.
3. A D... tenha adicionado gasosa ao conteúdo que já se encontrava no copo colocado na mesa de cabeceira pelo arguido,
4. Após ter dado um gole na bebida a D... se tenha dirigido ao arguido dizendo-lhe que a havia envenenado, e então este lhe tenha tirado o copo e dito: “isto está bom, não tem nada”, e que a D... lhe tenha retorquido: “foge que tu vais ser preso”.
5. Com o comportamento descrito em 12 dos factos provados, o arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o propósito, não concretizado, de matar a sua companheira, resultado que representou e que não conseguiu mas por motivos completamente alheios à sua vontade.
6. O arguido sabia que, ao colocar o fármaco de fluoxetina e o produto para desentupir canos na bebida, a D... ao bebê-lo teria dores imediatas no seu corpo, o que efetivamente queria.
7. Ao assim agir demonstrou ser insensível ao valor da vida e da integridade física da D....
8. As visitas do arguido B... à sua irmã E... quando esta foi vizinha da falecida F... tivessem um carácter regular.
9. A vítima F..., no dia 26 de maio de 2017 tivesse pedido à sua vizinha K... que se deslocasse a sua casa.
10. O arguido tenha projetado a cabeça da vítima F... contra uma superfície rígida.
11. O arguido agiu com o propósito de manter com a vítima cópula completa.
12. O demandante C... viesse todos os anos de férias a Portugal para estar com a irmã.
13. No período de férias o demandante C... visitava a sua irmã F... quase diariamente.
14. Antes do episódio descrito em 57 dos factos provados, a vítima F... fazia questão de estar com os sobrinhos nas férias, de cozinhar para todos e recebê-los em casa.
15. A infeliz vítima era muito crédula relativamente a pessoas que não conhecia.
16. O regresso do demandante a Portugal em 16.05.2016 tenha sido motivado pelo desejo de estar mais próximo da vítima F... e gozar os últimos anos de vida com ela.
17. Após o regresso dos Estados Unidos os contactos do demandante com a vítima F... eram praticamente diários.
18. Era o demandante que levava as rações para os animais que a F... criava.
19. Ainda hoje o demandante passe noites mal dormidas e se levante várias vezes durante a noite, por força da morte da sua irmã.
20. O demandante por força da morte da sua irmã esteja deprimido e depressivo.
21. O isolamento do demandante tenha sido causado pelas circunstâncias da morte da sua irmã F...
22. O demandante tenciona retornar aos Estados Unidos por causa da morte da sua irmã.
23. O demandante chore compulsivamente sempre que revive o momento em que encontrou a sua irmã morta.
24. Ao ler o despacho de acusação e o acompanhar da investigação, deixou-o completamente arrasado.
25. O demandante recorda incessantemente a morte horrorosa que a irmã sofreu e que o deixou completamente transtornado de desgosto, refletindo-se esta tristeza e revolta na sua vida familiar.
26. A vítima F... não teve morte imediata.
27. A vítima teve consciência de que ia morrer.
28. A assistência que foi prestada no Centro Hospitalar ... a D... a 14.05.2017 foi originada pelos ferimentos e lesões apresentados por esta em consequência da atuação do arguido no dia 13.05.2017, na sua casa sita na Rua ..., n.º .., em ..., ..., em Vagos, a hora não concretamente apurada mas certamente situada após o jantar e imediatamente antes de irem dormir.

Consigna-se que para além dos factos que resultam excluídos em face dos provados ou que se mostrem em oposição com estes e dos expressamente mencionados como provados, o Tribunal não se pronunciou sobre os demais constantes da acusação ou da contestação por serem conclusivos ou constituírem alegações de direito.
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3. Apreciando do mérito
3.1 Das nulidades da decisão
§1º Da economia da síntese recursória evola que o recorrente, sob a epígrafe que alude à violação do disposto nos arts. 379º, n.º 1 e 374º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, vem depois invocar indefinida nulidade por inobservância dos requisitos previstos no art. 374º, n.º 1, al. d), do mesmo diploma legal, por virtude de, em seu entender, não constarem do acórdão recorrido as conclusões da contestação.
E, a propósito de apreciação realizada sobre prova pericial, no tocante à divergência sobre o juízo relativo à verificação de imputabilidade diminuída, sustenta ainda, de forma absolutamente genérica, a existência de nulidade por falta de fundamentação.
Vejamos se alguma razão lhe assiste.
É consabido que o requisito prévio da apreciação do mérito de qualquer decisão é o da inexistência de patologias que inquinem de modo relevante a respectiva essência. E, entre elas figuram, precisamente, as nulidades da sentença[1], cuja declaração implica a invalidade do acto em que se verificar e bem assim daqueles que dele dependerem ou puder afectar [art. 122º n.º 1, do Cód. Proc. Penal].
In casu, esta questão tem que ser correlacionada com a matéria dos requisitos da sentença criminal previstos no art. 374º, do mesmo diploma legal que consagra o seguinte:
“1 - A sentença começa por um relatório, que contém:
a) As indicações tendentes à identificação do arguido;
b) As indicações tendentes à identificação do assistente e das partes civis;
c) A indicação do crime ou dos crimes imputados ao arguido, segundo a acusação, ou pronúncia, se a tiver havido;
d) A indicação sumária das conclusões contidas na contestação, se tiver sido apresentada.
2 - Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
3 - A sentença termina pelo dispositivo que contém:
a) As disposições legais aplicáveis;
b) A decisão condenatória ou absolutória;
c) A indicação do destino a dar a coisas ou objetos relacionados com o crime, com expressa menção das disposições legais aplicadas;
d) A ordem de remessa de boletins ao registo criminal;
e) A data e as assinaturas dos membros do tribunal.
4 - A sentença observa o disposto neste Código e no Regulamento das Custas Processuais em matéria de custas.”
Todavia, nem todas as omissões ou inobservâncias dos pressupostos legais plasmados neste normativo determinam a nulidade, pois que, de harmonia com a previsão do art. 379º, n.º 1, al. a), do Cód. Proc. Penal, tal apenas ocorre, nos processos que seguem a forma comum, relativamente à sentença “que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º”, ou seja que não enumere os factos provados e não provados, não indique as provas que fundamentam a convicção ou não realize o respectivo exame crítico e bem assim que não contenha a decisão absolutória ou condenatória.
Deste modo, é perfeitamente evidente que a falta de indicação das conclusões da contestação nunca determinaria qualquer nulidade, seja porque escapa à previsão do art. 379º, seja ainda porque não consta do elenco do regime geral consagrado no art. 119º e também não existe qualquer outra norma que, nesta sede, comine tal sanção pelo que, a verificar-se a situação invocada, estaríamos perante mera irregularidade, já sanada por falta de invocação atempada e em sede própria (perante o tribunal a quo), como decorre da previsão dos arts. 118º, n.º 1 e 123º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal.
No entanto, como patenteia a própria pretensão formulada pelo recorrente nem sequer existe a pretendida inobservância, pois que apresentou contestação tabelar, a invocar o merecimento dos autos, circunstância que o tribunal a quo exarou no relatório da decisão, não havendo outras “conclusões” a considerar.
O que acontece é que, por evidente lapsus calami, decorrente da utilização de meios informáticos, como se conclui, necessariamente, da simples leitura, minimamente atenta e leal, ficou a constar nesse segmento do relatório do acórdão recorrido excrescência que pode e deve ser eliminada, ao abrigo e nos termos do disposto no art. 380º, n.ºs 1, al. b) e 2, do Cód. Proc. Penal.
Com efeito, a propósito da contestação apresentada aí pode ler-se o seguinte:
“O arguido contestou a fls. 1019, oferecendo o mérito dos autos. Mais alegou que exercia a atividade de vendedor de sapatos retirando daí os proventos para a sua sobrevivência.
Alegou ainda ser uma pessoa dedicada à sua família, respeitada e respeitadora.
Juntou prova testemunhal.
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O arguido contestou oferecendo o merecimento dos autos e tudo o que em seu benefício resultar da audiência de julgamento.
Indicou prova testemunhal e requereu a realização e prova pericial.”
De tudo o exposto e da própria invocação do recorrente se extrai que é este último segmento que alude à sua contestação - junta a fls. 1168 e 1169 dos autos -, sendo a primeira referência extraída de suporte informático obviamente destinado a outros autos.
Em consequência e ao abrigo do normativo citado, pese embora a questão seja despicienda e sem qualquer real interesse ou efeito útil, determina-se que do relatório da decisão seja eliminado o segmento seguinte:
“O arguido contestou a fls. 1019, oferecendo o mérito dos autos. Mais alegou que exercia a atividade de vendedor de sapatos retirando daí os proventos para a sua sobrevivência.
Alegou ainda ser uma pessoa dedicada à sua família, respeitada e respeitadora.
Juntou prova testemunhal.”
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§2º Ainda nesta sede das nulidades decisórias sufraga o recorrente que existe falta de fundamentação no tocante ao afastamento da imputabilidade diminuída pela qual concluiu o relatório pericial.
Vejamos, então.
Já sabemos que as sentenças judiciais, constituindo actos decisórios necessariamente fundamentados – arts. 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e 97º n.ºs 1 a) e 5, do Cód. Proc. Penal -, devem especificar os motivos de facto e de direito que lhes servem de sustentação e observar os demais requisitos fixados no art. 374º, do citado Código.
A enumeração da matéria de facto provada e não provada visa garantir, para além de qualquer dúvida, que o julgador contemplou todos os factos submetidos à sua apreciação.
Por seu turno, a indicação e exame crítico das provas decorre da necessidade de potenciar a adesão dos destinatários e comunidade em geral ao teor da decisão criminal e de garantir a observância e respeito pelos princípios da legalidade, imparcialidade e independência, postergando a mera arbitrariedade em benefício do legítimo e fundado exercício da livre convicção, servindo de garante a um processo equitativo.
Em consequência, o dever de fundamentação das decisões judiciais constitui um elemento indispensável para assegurar o efectivo exercício do direito ao recurso, constitucionalmente garantido pelo art. 32º n.º 1, da nossa Lei Fundamental (Constituição da República Portuguesa) e tornar funcional a relação entre o primeiro e o segundo graus de jurisdição. Ou seja, é a motivação que, por um lado, permite às partes não só ponderar melhor a necessidade e oportunidade da impugnação mas também individualizar e exprimir os seus motivos específicos e, por outro lado, que vai dotar o juiz de recurso de mecanismos – argumentação de facto e de direito - que hão-de fortalecer o juízo que terá que formular sobre a sentença impugnada.
Como é bom de ver e facilmente se conclui do anteriormente exposto não é o facto dos sujeitos processuais discordarem da valoração probatória realizada pelo tribunal a quo, ou considerarem mesmo que esta se mostra inquinada por erro ou ilegalidade, que determina a ocorrência de nulidade por falta ou insuficiência de fundamentação.
Tal invalidade relaciona-se antes com a incapacidade do julgador em exprimir, em moldes claros e adequados, a convicção adquirida, qual o caminho percorrido para a atingir e os elementos probatórios considerados para o efeito.
Na verdade, o dever de fundamentação impõe ao dominus do processo que individualize as razões objectivas e a base racional que levou à convicção exprimida na factualidade provada e/ou não provada e bem assim os motivos que subjazem à valoração e credibilidade atribuída aos meios de prova disponíveis, de modo a convencer quem, posteriormente e com base nela, tente reconstruir o percurso mental decisório[2].
Assim sendo, como é bom de ver, o exame crítico só não será suficiente quando deixe de exteriorizar cabalmente o percurso lógico-dedutivo que presidiu à convicção firmada, não se confundindo com o erro de julgamento ou os vícios decisórios, prevenidos no n.º 2, do já citado art. 410º, cujo âmbito, finalidades e consequências são muito distintos.
Ora, na presente hipótese, o tribunal a quo explicitou exaustivamente não só as razões da sua divergência relativamente à referenciada “imputabilidade diminuída”, mas também os motivos porque entendia que o seu distinto entendimento não incidia sobre um juízo técnico qua tale mas antes sobre os pressupostos fácticos em que tal conclusão do perito assentava.
Deste modo, não tendo o recorrente identificado - nem se vislumbrando - qualquer falha na indicação e exame crítico das provas que fundamentam a convicção do julgador que o impossibilitasse de compreender as razões da opção firmada relativamente à factualidade descrita como provada ou não provada, é óbvio que a sede própria da questão suscitada será, logo que observados os requisitos do art. 412º, do Cód. Proc. Penal, em termos que permitam a reapreciação da prova disponível, a do erro de julgamento ou, no caso de se destacar do texto do próprio acórdão recorrido, a dos vícios decisórios.
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3.2 Do recurso em matéria de facto
É consabido que os Tribunais da Relação conhecem não só de direito mas também de facto [art. 428º, do Cód. Proc. Penal].
Todavia, não o fazem no âmbito de um qualquer poder discricionário, sem limites ou âmbito previamente estabelecidos, numa espécie de “julgamento do julgamento”, porquanto o recurso tem em vista o estrito controlo da observância da legalidade na concretização do acto de julgar e decidir de outro órgão judiciário, não visando o cotejo de diferentes sensibilidades sobre a questão controvertida, funcionando antes como remédio quanto a questões concretamente suscitadas e, eventualmente, carecidas de reparação por enfermarem de uma qualquer desconformidade relevante.
Assim, a matéria de facto pode ser sindicada por duas vias distintas:
§1ª Vícios documentados no texto da própria decisão, de harmonia com o preceituado no art. 410º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal [erros da decisão cognoscíveis a requerimento do interessado ou oficiosamente];
§2ª Reapreciação probatória, nos precisos termos do n.º 3 do art. 412º [erros de julgamento dependentes de requerimento prévio do interessado], ou seja quando o recorrente especifique os concretos pontos de facto da discórdia, as provas que impõem decisão diversa da recorrida e as provas que devem ser renovadas, acrescendo ainda o ónus, tendo havido gravação, das duas primeiras especificações deverem ser feitas por referência à acta e com indicação concreta [ou transcrição se a acta for omissa – v. Acórdão do STJ n.º 3/2012, de 8/3/2012, DR, I Série, n.º 77, de 18/4/2012] das passagens em que se funda a impugnação, consoante decorre do n.º 4, do mesmo normativo legal.
-> A primeira hipótese integra o chamado recurso de «revista ampliada», permitindo que o tribunal superior possa conhecer os vícios documentados no texto da decisão proferida pelo tribunal a quo que contendam com a apreciação do facto, ainda que não tenham sido directamente invocados pelo recorrente, ou o tenham sido de forma parcial e deficitária, ou mesmo quando o recurso verse unicamente matéria de direito [daí que não possa recorrer-se para o STJ com fundamento em tais vícios mas esse Tribunal possa, oficiosamente, suscitá-los no âmbito de recurso de direito ante si apresentado].
Todavia, é uma intervenção restrita, já que apenas admissível no tocante às patologias catalogadas nas alíneas do n.º 2, do art. 410º e evidenciadas no texto decisório, por si ou em conjugação com as regras de experiência, sem recurso a quaisquer outros elementos que o extravasem.
O elenco legal destes vícios, como decorre das alíneas a), b) e c), do citado normativo legal, abrange a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada [lacunas factuais que podiam e deviam ter sido averiguados e se mostram necessários à formulação de juízo seguro de condenação ou absolvição], a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão [incompatibilidade entre factos provados ou entre estes e os não provados e entre a matéria fáctica e a conclusão jurídica] e o erro notório na apreciação da prova [erro patente que não escapa ao homem comum].
-> No segundo caso o âmbito da intervenção é bem mais extenso visto ser admissível a reapreciação da prova produzida em audiência, embora balizada pelos pontos questionados pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de impugnação especificada legalmente imposto e já supra aludido.
In casu, pese embora a audiência de julgamento decorresse com documentação da prova, o recorrente conformou a sindicância à matéria de facto provada unicamente por referência aos vícios decisórios, questionando a suficiência, valoração e interpretação de determinadas provas por parte dos julgadores na exacta perspectiva que ficou explanada no texto do acórdão.
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3.2.1 Da insuficiência para a decisão da matéria de facto [art. 410º, n.º 2, al. a)]
Resulta do já exposto que existem patologias que, tendo ainda a sua fonte na decisão recorrida, podem extravasá-la e inquinar, total ou parcialmente, o próprio julgamento, se não puderem ser colmatados no tribunal de recurso, como decorre do estatuído nos arts. 410º, n.º 2, 426º, n.º 1, 430º, n.º 1, e 431º, alíneas a) e c), do Cód. Proc. Penal.
O recorrente invoca a insuficiência da matéria de facto relativamente ao imputado crime de violação, afirmando que as provas produzidas em audiência de julgamento não eram suficientes para se considerar provada a matéria vertida nos pontos 35, 42 e 51.
Acrescenta que a sua confissão não abrangeu tal factualidade, tendo negado a existência de contacto sexual, e que o relatório de autópsia referindo lesões na região vulvar e vaginal não permite estabelecer a autoria de quem as provocou, concluindo que o tribunal a quo se baseou em juízo opinativo e de probabilidade do perito, sendo ainda certo que a expressão “lesões recentes” comporta período temporal que pode ir de várias horas a vários dias.
Tendo presente o já anteriormente explicitado é evidente que a pretensão do recorrente é manifestamente infundada, pelo menos no recorte em que se apresenta.
É que a insuficiência da matéria de facto reporta-se a lacunas no elenco factual vertido na decisão. Isto é, tal vício ocorre quando da leitura da decisão se evidencia a omissão de factos que podiam e deviam ter sido averiguados - por se mostrarem necessários à formulação de juízo seguro de condenação ou absolvição - e não o foram, em prejuízo do dever de descoberta da verdade e boa decisão da causa que incumbe ao tribunal e decorre, entre outros, do estatuído no art. 340º, do Cód. Proc. Penal.
Ora, in casu, o recorrente alude, antes e tão só, à insuficiência de prova que sustente a factualidade necessária à condenação, sendo patente que não sustenta a existência de qualquer hiato factual que impossibilitasse a emissão da decisão recorrida.
Afirma, pois, a insuficiência dos meios probatórios produzidos para fundamentar a matéria dada como assente pelo tribunal a quo onde, ao contrário do afirmado, são concretizadas todas as circunstâncias de facto necessárias e suficientes à subsunção jurídica realizada. E, como é óbvio, o facto do recorrente entender que determinada matéria não devia ter sido considerada provada por insuficiência da prova produzida não é susceptível de fundamentar o aludido vício que deve ser analisado por referência ao real e concreto teor da decisão impugnada e não a qualquer outro que o recorrente tenha por mais adequado.
Ou seja, o recorrente questiona a convicção adquirida pelo tribunal a quo com base na prova produzida que, em seu entender, é insuficiente e justificaria a sua absolvição relativamente ao crime de violação. Não invoca qualquer omissão fáctica susceptível de afectar o thema decidendum submetido à apreciação do tribunal a quo, aludindo antes à insuficiência ou ausência probatória que possa sustentar parte dos factos dados como provados.
Consequentemente, o meio próprio de suscitar a questão seria a impugnação prevista no art. 412º, n.ºs 3 e 4, do Cód. Proc. Penal, com vista à reapreciação da prova disponível, o que, vimos já, não aconteceu.
Deste modo, a única hipótese do recorrente ter vencimento na questão reconduz-se à verificação de erro notório na apreciação da prova, na eventualidade da fundamentação de facto constante da decisão recorrida evidenciar que o tribunal a quo julgou e condenou, como diz, por “palpite” e sem dispor de quaisquer provas para o efeito, violando assim a presunção de inocência e correlativo princípio in dubio pro reo que beneficia o arguido.
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3.2.2 Do erro notório na apreciação da prova [art. 410º, n.º 2, al. c)]
a) Da autoria do crime de violação
Consoante anteriormente se explicitou os erros da decisão, para poderem ser apreciados ou mesmo conhecidos oficiosamente, devem detectar-se, sem esforço de análise, do teor da própria sentença, sem recurso a elementos externos como seja o cotejo das provas disponíveis nos autos e/ou produzidas em audiência de julgamento.
Por seu turno, o erro notório na apreciação da matéria de facto, consagrado no art. 410º, n.º 2, al. c), do Cód. Proc. Penal, refere-se às situações de falha grosseira e ostensiva na análise da prova que podem consubstanciar-se em:
> Factos provados e/ou não provados inconciliáveis entre si;
> Conclusões ilógicas ou inaceitáveis;
> Retirar de facto provado uma conclusão logicamente inaceitável.
Ou seja, há um tal erro quando o homem médio suposto pela ordem jurídica, perante o que consta do texto da decisão, facilmente se dá conta que o tribunal violou as regras de experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis[3], traduzindo o vício em questão “um erro supino, crasso, e inquestionável a partir da simples leitura do texto da decisão recorrida, que escapa à lógica das coisas, ou seja quando sendo usado um processo lógico racional se extrai de um facto uma conclusão ilógica, irracional, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum”[4].
In casu, o arguido mostra-se inconformado com a circunstância do tribunal a quo lhe ter atribuído a autoria de crime de violação da vítima F..., pese embora a sua negação de tais factos e a inexistência de testemunhas presenciais ou outros meios de prova directa.
Sendo certo que lhe assiste razão quando afirma que o relatório de autópsia médico-legal, demonstrando a existência de lesões nos órgãos genitais da vítima, não permite imputar-lhe a autoria de práticas de natureza sexual na pessoa desta, é também manifesto que é erróneo assumir que a falta de prova testemunhal ou de outros meios de prova directa nessa matéria imponha a absolvição do arguido e que, consequentemente, a sua condenação constitua uma violação do princípio in dubio pro reo, corolário da presunção de inocência, tutelada no art. 32º, n.º 2, da Const. Rep. Portuguesa, que o beneficia até ao trânsito em julgado de decisão condenatória.
Com efeito, importa recordar que o ordenamento jurídico processual penal não impõe a existência de prova plena para a responsabilização criminal, sendo admissíveis as provas que não forem proibidas por lei, nos termos do disposto no art. 125º, do Cód. Proc. Penal, pelo que a convicção do julgador não tem que limitar-se à prova directa dos factos submetidos à sua apreciação, sendo legítimo o recurso a presunções simples ou naturais, que o art. 349º, do Cód. Civil, densifica como “as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” e são admitidas nos casos e termos em que é possível a prova testemunhal (v. art. 351º), desde que na decisão constem os factos-base resultantes da prova instrumental necessários à dedução ou inferência respectiva e seja explicado o raciocínio através do qual se chegou àquela solução, não podendo o juízo de inferência ser arbitrário, absurdo ou infundado.
É que, o sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo partindo de um facto conhecido para um facto desconhecido, pelo que as presunções simples ou naturais são simples meios de convicção, presentes na base desse juízo.
Da prova indiciária induz-se, por meio de raciocínio alicerçado em regras de experiência comum ou da ciência ou da técnica, o facto probando.
E, é do facto indiciante que se infere um facto conclusivo quanto ao facto probando, juridicamente relevante no processo.
Por seu turno, o princípio in dubio pro reo, procurando responder ao problema da dúvida na apreciação do caso criminal e, partindo da premissa de que o juiz não pode terminar o julgamento com um non liquet, determina que na dúvida quanto ao sentido em que aponta a prova feita, esta seja resolvida em benefício do arguido. Quer isto dizer que o princípio in dubio pro reo, é por definição uma imposição dirigida ao juiz, segundo o qual, a dúvida sobre os factos implica uma decisão de absolvição[5].
Porém, a dúvida que fundamenta o accionamento do princípio in dubio pro reo terá de ser insanável, razoável e objectivável, não bastando a constatação de versões divergentes, a existência de declarações negatórias do arguido ou a falta de testemunhas presenciais ou outra prova directa.
A dúvida apenas será insanável se, esgotadas as todas as diligências necessárias ao cabal esclarecimento dos factos e descoberta da verdade material, no âmbito dos deveres legalmente impostos ao dominus do processo [v. art. 340º, do Cód. Proc. Penal], não tiver sido possível ultrapassar o estado de incerteza.
Acresce ainda que não poderá ser qualquer dúvida a ditar a absolvição. Há-de ser uma dúvida intrinsecamente séria, argumentada e racional.
E, finalmente, terá que ser extrinsecamente compreensível e justificada, o que exclui dúvidas arbitrárias ou fundadas em meras conjecturas ou hipotéticas suposições sem respaldo nos elementos probatórios disponíveis.
No caso sub judice, considerando o teor da fundamentação de facto e da própria motivação da convicção exarada pelo tribunal a quo é patente que o julgador chegou a conclusão lógica e devidamente sustentada no tocante à autoria dos referidos actos, não estando em causa qualquer juízo de probabilidade ou simples palpite, arbitrariamente desenhado à revelia das provas produzidas e regras e princípios que regem em sede probatória.
A existência de lesões de natureza sexual não está questionada e foi estabelecida por meio de prova pericial cujo juízo técnico não foi impugnado.
Por outro lado, como patenteia a enumeração dos factos provados e a abundante motivação da convicção foi possível estabelecer uma linha temporal relativamente às actividades e contactos da vítima F... no dia da ocorrência sem que a mesma denunciasse qualquer sinal de incómodo ou de que algo de anormal lhe tivesse acontecido [v., entre o mais, os pontos 30 e 31 da matéria de facto provada e as circunstâncias que rodearam o desenrolar desses acontecimentos que constam do exame crítico da prova, onde se destaca que a última pessoa a vê-la com vida (que não o homicida obviamente), L..., a conhecia há mais de 20 anos e, nos últimos tempos, lhe levava as compras a casa, a notou, cerca das 20 horas, do dia 26/5/2017, bem disposta e sem qualquer sinal que lhe suscitasse estranheza].
A conjugação desse circunstancialismo com a estabelecida natureza e características das lesões e ferimentos detectados nos órgãos genitais da vítima, a demandar a conclusão de que teria sofrido violência sexual recente, bem como as condições pessoais da mesma [pessoa de cerca de 80 anos, fisicamente fragilizada, a viver sozinha e sem visitas regulares que não as do seu irmão, uma vizinha que lhe prestava serviços domésticos e um vizinho que a auxiliava no quintal e alimentação dos animais – v. pontos 23 e 24 dos factos provados] permitem justificar o nexo de imputação desses factos ao aqui arguido. É que a caracterização de “lesões recentes” não admite o lapso temporal que o mesmo reivindica, pelas razões de natureza técnica – e não “palpites” ou juízos de mera probabilidade – que a perita médica (Dr.ª T...) que realizou a autópsia delimitou cabalmente nos esclarecimentos que prestou na audiência de julgamento e que são referidos na motivação da convicção supra transcrita, no que ao caso importa, nos moldes seguintes: «No que concerne às lesões na região vulvar e vaginal, explicou de forma clara a razão porque afirmou tratarem-se de lesões recentes, o que fez por referência às características das lesões encontradas (por existir edema e hemorragia, pois que são lesões cuja evolução é muito rápida para a cura e não havia, na situação em apreço sinais de absorção da hemorragia, concluindo, por isso que não eram de há vários dias antes da morte).
Confirmou apenas poder concluir – face aos exames realizados e lesões verificadas na vítima – pela existência de “práticas sexuais” não podendo afirmar ter ocorrido cópula.
A clareza destes esclarecimentos em conjugação com o teor do relatório de autópsia permitiram concluir que as lesões verificadas na vítima não são compagináveis com o seu transporte após a morte, como o arguido pretendeu afirmar, nem são compatíveis com meras quedas e tombos».
Por conseguinte, o que ressalta do exposto é que não existe qualquer elemento probatório, mesmo que indiciário ou instrumental, que permita questionar, validamente, a autoria criminosa assim estabelecida, em perfeita harmonia com o acervo probatório disponível, atendido e explicitado pelo tribunal a quo em perfeita consonância com as regras de experiência e normalidade de acontecer.
Depois e salvo o devido respeito, no contexto evidenciado, não vislumbramos qual poderia ser o fundamento da dúvida, precisamente porque todas as premissas disponíveis convergem num único e mesmo sentido e não há qualquer elemento que as contradiga.
Neste conspecto e da conjugação de todas as circunstâncias supra referidas, únicas que ressumam da fundamentação de facto, nada inculca, pois, que possa estar em causa pessoa diversa do arguido, no tocante à execução das práticas sexuais que determinaram as lesões evidenciadas no cadáver da vítima e não é pelo facto do arguido negar os factos e considerar a prova insuficiente que pode afirmar-se a existência de dúvida susceptível de accionar o princípio in dubio pro reo, pois que aos julgadores não se colocou, nessa matéria, qualquer hipótese de non liquet inultrapassável após a produção da prova, como demonstra a detalhada motivação da convicção obtida, inexistindo, por consequência, fundamento para decidir em sentido favorável ao arguido e considerar o facto incriminador como não provado, ao abrigo do princípio in dubio pro reo[6].
Improcede, pois, a pretensão de alteração da matéria de facto com vista a ser contemplada a absolvição do arguido relativamente ao crime de violação.
b) Da imputabilidade diminuída
Sufragou o recorrente que o tribunal a quo teria incorrido em erro notório na apreciação de prova pericial que estabeleceu que é portador de patologia determinante de imputabilidade diminuída, porquanto tendo considerado provada a existência de oligofrenia ligeira e alcoolismo em remissão considerou-o inteiramente imputável, sem para o efeito dispor de argumentos técnicos ou científicos equiparados aos dos peritos.
De harmonia com a previsão do art. 151º, do Cód. Proc. Penal, “a prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos”.
Assim, a perícia é a actividade de percepção ou apreciação dos factos probandos efectuada por pessoas dotadas de especiais conhecimentos nessa matéria controvertida[7].
Sabendo-se que, em regra, “a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador”, por força do disposto no art. 127º, do Cód. Proc. Penal, é consensual o entendimento de que a prova pericial constitui uma limitação a tal princípio.
Na verdade, estatui o art. 163º, n.º 1, do citado diploma legal, que “o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador”, estabelecendo ainda no seu n.º 2 que “sempre que a convicção do julgador divergir do juízo contido no parecer dos peritos, deve aquele fundamentar a divergência”.
Todavia, tal não significa que todas as conclusões constantes de relatório elaborado por um perito se inscrevam no âmbito do juízo especializado – técnico, científico ou artístico – porquanto a prestação técnica parte da consideração de determinada materialidade fáctica cuja irrepreensibilidade será condição sine qua non do acerto do juízo técnico, científico ou artístico emitido e, por conseguinte, do acatamento judicial legalmente estipulado no normativo em causa, pois que os pressupostos de facto que servem de base ao parecer continuam sujeitos à livre apreciação do juiz.
Recordando que este tribunal ad quem se mostra limitado à apreciação do teor decisório, não podendo reapreciar a prova produzida em audiência de julgamento, por não ter havido impugnação nos precisos moldes contemplados no art. 412º, n.ºs 3 e 4, do Cód. Proc. Penal, é inegável que a fundamentação de facto denuncia metodologia e juízo científico de natureza médica no tocante ao estabelecimento da patologia de que o arguido é portador e que se reconduz a uma oligofrenia (atraso/deficiência mental) ligeira, presente desde o nascimento, juízo esse que permanece intocado e a propósito do qual existe sintonia.
A questão controvertida centra-se na conclusão da Ex.ma Perita, Dr.ª U..., de que associada à denunciada doença está uma imputabilidade diminuída.
Todavia, como decorre do texto decisório, no segmento da indicação e exame crítico das provas, ao contrário do que inculca a mera leitura da conclusão do relatório pericial, a presença de uma oligofrenia não determina, por si só, sempre e necessariamente, tal condição.
Quer dizer: a imputabilidade diminuída não se apresenta como uma consequência directa e necessária da patologia diagnosticada. Poderá ocorrer mas o seu estabelecimento é feito caso a caso, dependendo da análise das concretas circunstâncias dos factos ilícitos, modus operandi e personalidade de quem os pratica.
Remetendo para o contexto e circunstâncias extrínsecas e intrínsecas que rodeiam e caracterizam a prática do delito e a personalidade do agente, não estamos já no domínio da metodologia e princípios científicos ou técnicos mas antes na apreciação de suportes fácticos que compete ao julgador estabelecer, observado que seja o princípio do contraditório e demais direitos de defesa que assistem ao arguido, de acordo com a sua liberdade de apreciação probatória.
Ora, a Ex.ma Perita apontou no sentido da imputabilidade diminuída porque, das declarações ouvidas ao arguido, analisadas de forma linear, acrítica e sem sujeição a contraditório, concluiu que estava em presença de um crime praticado de forma “pouco inteligente”, designadamente porque: “…ele foi a casa da senhora penso que terá dito a alguém, faz aquilo barbaramente e diz que não se apercebeu, não imaginando que uma senhora daquela idade não suportaria ter a boca tapada; a maneira como dorme, descreveu-me que dormiu na casa da senhora e que só a foi ver de manhã e não esperava que estava morta”.
Questionada ainda quanto à compatibilidade da conclusão pela imputabilidade diminuída com a circunstância de o arguido ter ocultado o corpo na arca congeladora referiu a Sr.ª perita que o arguido tinha perfeita noção do que fazia, poderia era não alcançar a sua totalidade e por isso surge percetível que tenha tentado esconder o cadáver, “mas escondê-lo na arca da própria pessoa não lhe pareceu inteligente” (cfr. motivação da convicção).
Salvo o devido respeito, cumpre anotar que, nesta perspectiva e independentemente da categoria intelectual dos respectivos autores, a maior parte dos crimes de homicídio cometidos, são-no de forma pouco inteligente, como demonstra o elevado grau de sucesso na sua resolução por parte dos órgãos de polícia criminal.
Depois, o suporte fáctico em que a Ex.ma Perita se baseia é claramente insuficiente e mesmo contraditório com a realidade que veio a apurar-se no julgamento: O arguido aborda a vítima (pessoa idosa, frágil e só) logrando convencê-la a franquear-lhe o acesso à sua casa, mais tarde, ao cair da noite, sob falso pretexto, para melhor poder levar a cabo os seus intentos e diminuir o risco de ser visto ou interrompido por terceiros, aproveitando, entretanto, o tempo disponível para se munir de objectos que lhe permitiriam concretizar mais facilmente o intento criminoso delineado e obviar a qualquer esboço de resistência que a vítima tentasse.
E, se dormiu em casa desta é porque sabia perfeitamente que nenhum risco existia pois que a mesma já estava morta, vivia sozinha e quase não recebia visitas[8].
Neste contexto destaca-se apenas a inverosimilhança das declarações do arguido e já não qualquer falta de inteligência que justifique a atribuição de imputabilidade diminuída.
Quer isto dizer que, neste preciso segmento, a conclusão da Ex.ma Perita não constitui um juízo técnico/científico que a densificação normativa pressupõe, pois embora revestida de cientificidade subjectiva em razão da qualidade profissional do seu autor (perito médico) não apresenta cientificidade objectiva, já que não se baseia em qualquer metodologia ou princípios de natureza técnico-científica antes constituindo um pré-juizo extrajudicial sobre matéria fáctica que integra o thema decidendum dos presentes autos, realizado por entidade sem competência para o emitir e que, ao fazê-lo, invade mesmo a esfera de atribuições que ao juiz são cometidas a título exclusivo.
Com efeito, não se mostram verificados os quatro vectores que a jurisprudência actual vem considerando serem essenciais para a aceitação de um juízo científico e que se reconduzem ao seguinte:
i) Saber se existe perícia reconhecida e se estão cumpridos os requisitos formais atinentes às notificações e exercício possível do contraditório (possibilidade de indicação de consultores técnicos);
ii) Saber se o parecer assenta em factos e dados suficientes e judicialmente aceites;
iii) Saber se foram utilizados princípios e métodos (científicos ou técnicos) de confiança;
iv) Saber se esses princípios e métodos foram devidamente aplicados aos factos do caso a ser julgado[9].
Assim, a conclusão firmada sobre a imputabilidade diminuída do arguido, porque não assenta nos factos e explicitação cabal de todas as circunstâncias atendíveis e desenrolar dos acontecimentos que estão definitivamente assentes, constitui mera opinião da Ex.ma Perita e, como tal, não é um juízo científico, encontrando-se submetida ao princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127º, do Cód. Proc. Penal.
Por isso mesmo, a divergência, devidamente explicitada e sustentada nas demais provas disponíveis nos autos, assumida pelo Tribunal a quo, não belisca minimamente a disciplina do art. 163º, do mesmo diploma legal, inexistindo o invocado erro notório na apreciação de prova pericial.
Resta concluir com duas breves notas:
1 - A análise da relacionação do consumo excessivo de bebidas alcoólicas com o acentuar da imputabilidade diminuída é despicienda não só porque a ingestão de álcool por parte do arguido, na ocasião, não ficou provada mas também porque a própria perita admite no relatório que desconhece se os factos foram praticados sob o efeito de álcool, tudo de harmonia com a motivação da convicção exarada na decisão recorrida.
2 – Não há evidência de que a detectada oligofrenia ligeira de que o arguido é portador o “impede de organizar e conduzir a sua vida em conformidade com os padrões comportamentais socialmente aceites, em virtude da patologia de que padece”, como sustenta na conclusão XLV, pois está provado que frequentou a escola, concluindo mesmo a 3ª classe (agora 3º ano), tem filhos, casou, exerceu actividade profissional na agricultura e construção civil, não só em Portugal, como também no estrangeiro e, estando o ligeiro atraso mental presente desde o nascimento, nunca foi obstáculo nos anteriores contactos com o sistema judicial e às anteriores condenações sofridas.
Depois, a forma expedita como o arguido utilizou o cartão de telemóvel da vítima e depois se desfez dele e do equipamento respectivo e bem assim logrou iludir os meios técnicos de vigilância electrónica e contornar as proibições de contacto com a ofendida D..., como melhor se pode ver dos factos provados sob os pontos 6 e segs., 38, 45 e 46, contrariam frontalmente as alegadas incapacidades de condução da sua vida, sendo ainda certo que a indigência na vida adulta e as dificuldades de infância não justificam a opção por percurso delinquente nem sustentam uma qualquer imputabilidade diminuída e consequente atenuação especial da pena.
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3.3 Do recurso em matéria de direito
O recorrente pretendia ver desqualificado o crime de homicídio, com a consequente redução da pena parcelar fixada e bem assim da pena única, com base no reconhecimento da existência de imputabilidade diminuída.
Todavia, tendo soçobrado tal pretensão fica prejudicado este segmento recursório por inexistência de fundamento que justifique a modificação da subsunção jurídica ou a medida de qualquer das penas.
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III – DISPOSITIVO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto negar provimento ao recurso do arguido B... e manter nos precisos termos a decisão recorrida, sem prejuízo da rectificação do lapso material detectado no relatório nos moldes supra explicitados em 3.1, parte final do §1º.
Comunique de imediato à 1ª instância para os efeitos previstos no art. 215º n.º 6, do Cód. Proc. Penal.
Custas pelo recorrente B... com 4 (quatro) UC de taxa de justiça - art. 513º n.º 1, do Cód. Proc. Penal, e Tabela III anexa ao Regulamento das Custas Judiciais.
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[Elaborado e revisto pela relatora – art. 94º n.º 2, do CPP[10]]
Porto, 15 de Novembro de 2018
Maria Deolinda Dionísio
Jorge Langweg
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[1] Ou acórdão se o acto decisório provém de tribunal colegial – art. 97º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal – como é o caso.
[2] Neste sentido, entre muitos outros, Ac. desta RP, de 11/6/2008, Proc. 0745662, in dgsi.pt.
[3] Cfr. Simas Santos/Leal Henriques, “Recursos em Processo Penal”, 7ª ed., 2008, pág. 77.
[4] V., entre outros, Ac. do STJ de 18/5/2011, Proc. 420/06.7GAPVZ.S1, in dgsi. pt.
[5] Cfr. Rui Patrício, in “O princípio da presunção de inocência do arguido na fase do julgamento no actual processo penal português”, Associação Académica da FDL, 2004, pág. 94.
[6] V., a propósito, Figueiredo Dias, Direito processual Penal, pág. 215.
[7] Cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 3ª ed., pág. 197.
[8] Aliás, a permanência no local do crime para comer, beber e/ou dormir não é inédita, havendo até delinquentes que são detidos em flagrante precisamente porque adormecem no local onde levaram a cabo os actos desviantes.
[9] V., Ac. acórdão do STJ, de 11/07/2007, Proc. 07P1416, in dgsi.pt.
[10] O texto do presente acórdão não observa as regras do acordo ortográfico – excepto nas transcrições que mantêm a grafia do original – por opção pessoal da relatora.