Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ACUSAÇÃO
NULIDADE PROCESSUAL
Sumário
I. A omissão de notificação da acusação constitui irregularidade cuja reparação pode ser conhecida oficiosamente, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, afectando tal omissão o acto em si, de conhecimento da acusação, nos termos previstos no artº 123º, nº 2 do CPP. II. Dispõe o nº 5 do artº 283º do CPP, por remissão para o nº 3 do artº 277º do mesmo diploma, a obrigatoriedade de o Ministério Público notificar a acusação ao arguido e ao seu defensor, tendo a obrigação legal de tudo fazer para notificar o arguido. III. O legislador só admitiu a possibilidade de o processo transitar para a fase de julgamento sem o arguido ser notificado da acusação na situação prevista no nº 5 do artº 283º do CPP, ou seja, “quando os procedimentos de notificação se tenham revelado ineficazes”. IV. A devolução dos autos ao Ministério Público para reparação da irregularidade por omissão de notificação da acusação, na situação em que se não mostram preenchidos os pressupostos do nº 5 do artº 283º do CPP, em nada contende com a estrutura acusatória do processo.
Texto Integral
Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.
I. RELATÓRIO.
1. No Processo comum com intervenção de Tribunal Colectivo, com o número supra identificado, a correr termos no Tribunal judicial da Comarca de Lisboa Oeste -Juízo Central Criminal de Cascais -Juiz 3, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido C...., com os sinais dos autos, imputando-lhe a prática de um crime de furto qualificado, e remetidos os autos à distribuição, veio o Mmº Juiz de julgamento a proferir o despacho que consta de fls. 349, julgando verificada a irregularidade de falta de notificação da acusação ao arguido, nos termos dos artigos 283º, nº 5 e 123º, nº 1 do CPP, determinando a devolução dos autos ao Ministério Público.
2. O Ministério Público, inconformada com esta decisão veio interpor recurso, cuja motivação termina com a formulação das seguintes conclusões (transcrição):
“1. O despacho de saneamento do processo, previsto no artº 311º do CPP, no caso de não ter havido instrução, tem como conteúdo o conhecimento dos pressupostos processuais e de nulidades, incluindo os vícios da acusação, e de questões prévias ou incidentais, incluindo os vícios da acusação e de questões prévias incidentais de que o tribunal possa conhecer oficiosamente e que obstem à apreciação do mérito da causa.
2. A falta de notificação de acusação do Ministério Público ao arguido, constitui uma irregularidade que tem de ser arguida pelos interessados no prazo de 3 dias, não sendo de conhecimento oficioso, já que não afecta as garantias de defesa daquele.
3. Tal irregularidade encontra, assim, a sua previsão no nº 1 do artº 123º do CPP, como aliás, e bem, refere a Mmª Juiz a quo, e não no nº 2.
4. Pelo que, a Mmª Juiz a quo não podia determinar, como fez, a reparação oficiosa da referida irregularidade.
5. E ao fazê-lo, violou o artº 123º, nº 1 do CPP.
6. Mas ainda que seja entendimento do Juiz que é de reparar oficiosamente a mencionada irregularidade, tal não significa que possa ordenar ao Ministério Público essa reparação e, consequentemente, devolver-lhe os autos para esse efeito.
7. Do artº 123º, nº 2 do CPP, resulta que se pode ordenar oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que dela se tomar conhecimento e quando ela afectar o valor do acto praticado.
8. Esta última referida norma não pode, porém, ser repartida em dois segmentos distintos: reconhecer a existência de uma irregularidade; e remeter para momento ulterior a operador diverso o seu suprimento.
9. Constatando que o despacho final de inquérito que deu origem aos autos foi irregularmente notificado ao arguido, a Mmª Juiz a quo no âmbito do artº 311º aprecia a acusação deduzida pelo MºPº, não, pode decidir reconhecer uma irregularidade consistente na falta de notificação e mandar remeter os autos ao Ministério Público para que proceda à sua reparação.
10. De duas, uma, ou a Mmª Juiz a quo não toma posição sobre a irregularidade que não lhe constrange o poder que lhe é conferido pelos arts. 311º e 312º do CPP; ou, diversamente, entendendo reparar a irregularidade, deve fazê-lo a instâncias suas, isto é, deve ser suprida judicialmente.
11. O que não pode é declarar uma irregularidade e ordenar a devolução dos autos ao Ministério Público para a sua reparação, pois a matriz constitucional do processo penal, com a sua estrutura acusatória e com a atribuição ao Ministério Público do exercício da acção penal orientado pelo princípio da legalidade e com a autonomia dessa Magistratura (arts. 32º, nº 5 e 219º, nº 2 da CRP), sempre impediria tal entendimento, sufragado na decisão recorrida.
12. A decisão recorrida violou, pois, o disposto nos artigos 32º, nº 5 e 219º, nº 2 da CRP e 123º, nº 2 e 311º do CPP.
13. Nestes termos, deve ser revogada a decisão ora recorrida a ser substituída por outra que receba a acusação pública deduzida a fls. 299 e ss e, consequentemente, designe data para a realização da audiência de discussão e julgamento ou, pelo menos, por outra que ordene aos próprios serviços judicias a reparação da aludida irregularidade”.
3. O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo (cfr. despacho de fls. 352).
4. Não foi oferecida qualquer resposta ao recurso.
5. Neste Tribunal, a Exmª Procuradora Geral Adjunta na oportunidade do artº 416º, nº 1 do CPP apôs visto.
8. Colhidos os Vistos legais, procedeu-se à Conferência.
*
II-FUNDAMENTAÇÃO.
1. Constitui entendimento pacífico que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, assim se definindo as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso[1].
Atentando nas conclusões da motivação, o recurso coloca a seguinte questão:
Poderá o Juiz de julgamento, no âmbito do despacho de saneamento do artº 311º do CPP, conhecer oficiosamente do vício de falta de notificação da acusação do Ministério Público ao arguido e determinar a reparação oficiosa do referido vício, remetendo os autos ao Ministério Público parta tal efeito?
2. Apreciando.
2.1. Os factos.
Verificam-se com relevância as seguintes ocorrências processuais:
a. Nos presentes autos de Inquérito, o arguido C..., nacional e natural do Chile, em 5/05/2017 prestou Termo de Identidade e Residência, de onde consta como residência o Estabelecimento Prisional de Monsanto, tendo o mesmo sido advertido das suas obrigações, designadamente, a obrigação “de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde se possa encontrar (cfr. fls. 184).
b. O arguido encontrava-se desde 29/11/2016 na situação de prisão preventiva, à ordem do P. nº 162/16.5PGOER, Juízo Instrução Criminal -Lisboa Oeste -Cascais.
c. Nos presentes autos, em 26.10.2017 foi deduzida acusação contra o arguido, imputando-lhe a prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 204º, nº 1, als. als, a) e f) e nº 2, al. e), 203º, nº 1 e 202º, als. a) e e), todos do Código Penal, ficando a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito às obrigações decorrentes do TIR já prestado.
d. Por ofício datada de 7/11/2017, o Ministério Público solicitou ao Estabelecimento Prisional de Monsanto a notificação ao arguido da acusação que contra ele foi deduzida nos presentes autos (cfr. fls. 312).
e. Na mesma data procedeu-se à notificação do despacho de acusação à Ilustre defensora do arguido através de notificação por via postal registada (cfr. fls. 313).
f. O Estabelecimento Prisional de Monsanto em resposta informou não ter sido possível a notificação do arguido, por ter sido colocado em liberdade, em 20.10.2017 (cfr. ofício de fls. 34)
g. Em 23.11.2017 o Ministério Público solicitou informação ao SEF- Serviço de Estrangeiros e Fronteiras- a saber do actual paradeiro do arguido (cfr. fls. 211).
h) Em resposta, informou o SEF que o cidadão C..., com morada declarada a 19/04/2017 no EP de Monsanto, tendo sido expulso de Território Nacional a 20/10/2017 e tem medida cautelar de interdição de Entrada em Território Nacional criada em 23/10/2017 válida até 20/10/2022 (cfr. ofício de fls. 324).
i) Por despacho do Ministério Público de fls. 325 e 330 foi solicitada informação ao Gabinete Nacional da Interpol a saber se têm conhecimento da actual morada/ paradeiro do arguido, a fim de ser notificado da acusação.
j. Não se mostra junta aos autos qualquer resposta desta entidade, nem foram feitas outras diligências, tendo o Ministério Público remetido os autos à distribuição -artigos 272º, nº 1 e 283º, nº 5 do CPP (cfr. despacho de fls. 334).
k. Distribuídos os autos ao Juízo Central Criminal de Cascais -Juiz 3, a Mmª Juíza proferiu a seguinte decisão, datada de 22.03.2018, cujo teor aqui se transcreve:
“Vieram os presentes autos à distribuição sem qualquer tentativa de notificação do arguido, o que, em nosso entender, consubstancia uma irregularidade de conhecimento oficioso.
Dispõe o artº 283º, nº 5 do CPP, por remissão para o nº 3 do artº 277º, a obrigatoriedade de o Ministério Publico notificar a acusação ao arguido e ao seu Defensor/Mandatário.
A omissão de tal formalidade legal constitui a irregularidade prevista no artº 123º, nº 1 do CPP.
De acordo com o nº 5 do artº 283º do CPP, é permitida a continuação do processo quando os procedimentos de notificação os tenham revelado ineficazes.
Note-se que a lei não refere que o processo prossegue quando os procedimentos se revelem morosos, mas ineficazes.
Daqui se conclui que existe a obrigação legal de tudo fazer para notificar o arguido mesmo que daí decorra alguma demora.
Ora foi tentada apenas a notificação do arguido no estabelecimento prisional, sendo informado que o mesmo foi expulso para o Chile.
Pedida informação ao Gabinete da Interpol sobre o paradeiro do arguido, a Exmª Procuradora remeteu os autos para julgamento.
Destarte, não se pode dizer que os procedimentos conducentes à notificação se revelaram ineficazes, uma vez que não se aguardou pela resposta nem se tentou a notificação, o que se impunha.
Pelo exposto julgo verificada irregularidade de falta de notificação da acusação ao arguido, nos termos dos artigos 283º, nº 5 e 123º, nº 1 do CPP.
Notifique e devolva aos autos ao Ministério Público”.
3. O Direito.
3.1. Da invocada irregularidade por falta de notificação da acusação ao arguido.
Como vimos, a Mmª Juíza de julgamento logo após a distribuição dos autos, verificando que o arguido não tinha sido notificado da acusação e considerando que não se mostravam esgotados os procedimentos de notificação nos termos previstos no nº 5 do artº 283º do CPP, declarou oficiosamente verificada a irregularidade por falta de notificação da acusação, nos termos do artº 123º, nº 1 do CPP, devolvendo os autos ao Ministério Público.
Na tese do Digno recorrente que se opõe a este procedimento adoptado pelo Tribunal, aduz a seguinte argumentação:
- a irregularidade por falta de notificação da acusação não é de conhecimento oficioso, visto que não ofende os direitos de defesa do arguido, tratando-se de irregularidade prevista no nº 1 do artº 123º do CPP, que tem de ser invocada pelo arguido, no prazo de 3 dias, após o conhecimento da omissão.
- E mesmo a entender-se que a falta de notificação da acusação pudesse ser de conhecimento oficioso pelo juiz, a reparação da irregularidade tem de ser no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afectar o valor do acto praticado, conforme dispõe o nº 2 do artº 123º, do CPP.
-E acrescenta que ainda que se considere a irregularidade em causa de conhecimento oficioso, tal não significa que o Juiz possa ordenar ao Ministério Público essa reparação e, consequentemente, devolver-lhe os autos para esse efeito.
-Porquanto, o Tribunal não tem que tomar posição sobre esta irregularidade pois nada interfere com o poder que lhe é conferido pelos arts. 311º e 312º, e caso venha a entender reparar a irregularidade terá de o fazer a instâncias suas, suprindo judicialmente a irregularidade.
-Firmemente entende o recorrente que o Juiz não pode declarar a irregularidade por falta de notificação da acusação e ordenar a devolução dos autos ao Ministério Público para a sua reparação, invocando a matriz constitucional do processo penal, com a sua estrutura acusatória e com a atribuição ao Ministério Público do exercício da acção penal orientado pelo princípio da legalidade e com a autonomia dessa Magistratura.
Vejamos:
Decorre do artº 113º, nº 10, do CPP, que a acusação deve ser notificada ao arguido, não se bastando com a mera notificação do seu defensor, sendo a notificação da acusação um direito pessoal do arguido.
Conforme se refere no acórdão do STJ de 10.10.2007 (relator, Cons. Henriques Gaspar, P.07P2301, in www.dgsi.pt) “A notificação da acusação deve ser feita pessoalmente ao arguido, além do defensor (...). Esta exigência constitui um pressuposto do exercício efectivo do direito de defesa, dada a função processual do acto de acusação e da posição eminentemente pessoal do arguido perante os factos da acusação...”
Esta notificação não tem, contudo, de ser feita mediante contacto pessoal com o arguido, podendo sê-lo por via postal registada, por meio de carta ou aviso registados e por via postal simples, com prova de depósito, quando tiver prestado TIR (cfr. artigos 113º, nº 1, als. a), b) e c) e 196º, nº 1, al. c), ambos do CPP).
No caso em apreço, proferida a acusação o processo veio a transitar para a fase de julgamento sem que o arguido tivesse sido notificado da acusação, invocando o Ministério Público o disposto no nº 5 do artº 283º, do CPP.
Face à posição do Digno recorrente, a questão fundamental que importa apurar é a de saber se o conhecimento dessa omissão de notificação é oficioso e quem a deve suprir?
Podemos dizer que a omissão de notificação da acusação tem sido entendida maioritariamente pela jurisprudência, não como uma nulidade, mas como uma irregularidade, podendo ser conhecida oficiosamente nos termos previstos no nº 2 do artº 123º, do CPP.
Posição com a qual se concorda.
Como é consabido, em matéria de nulidades vigora, entre nós, o princípio da legalidade, segundo o qual a violação ou inobservância das disposições da lei do processo só determina a nulidade do acto quando for expressamente cominada na lei. -cfr. artº 118º do CPP.
A figura da irregularidade tem carácter residual na medida em que engloba a generalidade das situações em que haja violação, por acção ou omissão, da legalidade na prática de um acto processual. Assim, esta categoria engloba quaisquer vícios de que enfermem os actos processuais e que a lei não apelida de nulidade. E o acto irregular, tal como o acto nulo, produz os efeitos típicos do acto perfeito enquanto a irregularidade não for declarada.
Para que a irregularidade determine a invalidade do acto a que se refere, e dos termos subsequentes que possa afectar, deve ser arguida pelos interessados no próprio acto se a este tiverem assistido, ou nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado.
Não encontramos na lei processual sobre matéria de ilegalidade que puna como nulidade a omissão de notificação da acusação, donde teremos de qualificar tal omissão como irregularidade, preenchendo a estatuição do artº 123º, do CPP.
E esta irregularidade pode ser conhecida oficiosamente, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afectar o valor do acto praticado -cfr. nº 2 do artº 123º, do CPP.
Não nos merece dúvida que a falta de notificação da acusação afecta naturalmente o acto em si, de conhecimento da acusação que se perfila como um direito pessoal do arguido, que tem de ficar a conhecer o teor da acusação e o exercício dos direitos que lhe são conferidos com a notificação da acusação, desde logo a possibilidade de requerer a abertura de instrução.
Resulta assim deste preceito legal que: i) se pode ordenar oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade; ii) no momento em que da mesma se tomar conhecimento; iii) quando ela puder afectar o valor do acto praticado. In casu, a Mmª Juíza declarou oficiosamente verificada a irregularidade por falta de notificação da acusação, considerando que o Ministério Público remeteu os autos à distribuição sem levar a cabo outros procedimentos na tentativa de notificação do arguido, concluindo não estarem reunidos os pressupostos que permitem a aplicação do nº 5 do artº 283º do CPP.
O Digno recorrente opõe-se a que tal irregularidade deva ser suprida pelo MP com a remessa dos autos à fase de Inquérito para tal efeito.
Invoca que o Tribunal não tem que tomar posição sobre a irregularidade a qual em nada interfere com o despacho a proferir nos termos dos arts. 311º e 312º do CPP, e por outro lado, sempre a remessa dos autos ao MP para a sanação da irregularidade estaria vedada face à estrutura acusatória do processo penal e a autonomia do Ministério Público.
Acontece que o legislador só admitiu esta possibilidade (atropelo) de o processo transitar para a fase de julgamento sem ser notificado da acusação na situação prevista no nº 5 do artº 283º, do CPP, ou seja, “prosseguindo o processo quando os procedimentos de notificação se tenham revelado ineficazes”.
E como muito bem decidiu o despacho recorrido, “...a lei não refere que o processo prossegue quando os procedimentos se revelem morosos, mas ineficazes. Daqui se conclui que existe a obrigação legal de tudo fazer para notificar o arguido mesmo que daí decorra alguma demora”.
Compulsados os autos, verifica-se que o Ministério Público apenas tentou a notificação do arguido no estabelecimento prisional, sendo informado que o mesmo foi expulso para o Chile, o que não deixa de ser revelador de falta de comunicação entre estas entidades. O SEF informou não saber do paradeiro do arguido, e tendo solicitado informação ao Gabinete da Interpol sobre o paradeiro do arguido, e sem que tenha obtido resposta deste organismo o Ministério Público logo remeteu os autos à distribuição para julgamento.
Desde logo impunham-se outras diligências óbvias no sentido de apurar o paradeiro do arguido como seja colher informações através da respectiva Embaixada, ou através do processo de expulsão do arguido.
Neste quadro, tem razão a Mmª Juíza a quo ao considerar que “não se pode dizer que os procedimentos conducentes à notificação se revelaram ineficazes, uma vez que não se aguardou pela resposta solicitada nem se tentou a notificação, o que se impunha”, sendo que só nesta situação em que os procedimentos se tenham revelado ineficazes, o processo pode prosseguir para julgamento.
Esta é uma situação excepcional que só se aplica quando se mostram esgotadas as possibilidades de notificação da acusação ao arguido, mas que não pode conduzir, como seria este o caso, a uma situação de substituição de competência, de quem tem o dever legal de proceder a tal notificação: a obrigação de notificação da acusação é naturalmente do Ministério Público e não do tribunal.
Dito de outro modo, a referida norma do nº 5 do artº 283º do CPP não se destina a ser uma norma geral que permita transferir para a fase de julgamento as dificuldades de notificação do arguido, sem que antes se tenha concluído que os procedimentos de notificação se revelaram ineficazes.
Evidentemente que decorre do princípio do acusatório que o tribunal não pode interferir no conteúdo da acusação, que o Ministério Público é o dominus do Inquérito e que as magistraturas são autónomas.
Mas do que aqui se trata nada tem que ver com o princípio do acusatório ou qualquer interferência na autonomia do Ministério Público. O que está em causa é que cabe ao Ministério Público proceder à notificação da acusação, acto da sua competência que não se verificou, vindo o Ministério Público a remeter os autos para julgamento sem que a situação no caso possa ser enquadrada no nº 5 do artº 283º do CPP, o que consubstancia irregularidade de conhecimento oficioso nos termos do atrtº 123º, nº 2 do mesmo diploma.
Termos em que se tem o recuso como não provido, mantendo-se o despacho recorrido, que decidiu com acerto, não merecendo qualquer censura.
*
III-Decisão.
Nestes termos, e com os fundamentos acima expostos, acordam os Juízes da 3ª secção deste Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida .
Sem custas por não serem devidas.
Notifique.
*
Elaborado, revisto e assinado pela relatora Conceição Gonçalves e assinado pela Desembargadora Ana Paula Grandvaux.
Lisboa, 25/07/2018.
[1] Cfr. Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª ed. 2007, pág.103; entre outros, mais recentemente, o ac.do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt, e ainda, o acórdão do Pelenário das Secções Criminais do STJ nº 7/95, de 19.10.95, DR, I-A, de 28.12.1995.