TOMADOR DO SEGURO
APRECIAÇÃO DO RISCO
PREENCHIMENTO DE QUESTIONÁRIO
OBRIGAÇÃO DE EXATIDÃO DOS FACTOS
ANULABILIDADE DO CONTRATO
Sumário

5.1. - O tomador do seguro está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para apreciação do risco pelo segurador, ainda que as mesmas não sejam solicitadas em questionário fornecido pelo segurador ;
5.2.- A anulabilidade do contrato de seguro prevista no art. 26º, nºs  1 e 4, do RJCS , e ao contrário do que ocorre em sede de Omissões ou inexactidões dolosas, exige a verificação de um nexo de causalidade entre as omissões ou inexactidões negligentes e o sinistro verificado ou consequências do mesmo.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL do Tribunal da Relação de LISBOA

1.- Relatório

A, intentou AÇÃO DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO, SOB A FORMA DE PROCESSO COMUM, CONTRA B [ SEGUROS...,SA ], pedindo a condenação da Ré a :
a) pagar ao Autor a quantia de 15.562,00€ ( Quinze mil e quinhentos e sessenta e dois euros), relativo ao capital seguro ;
b) pagar os Juros à taxa legal em vigor, desde a data em que a Ré incorreu em mora, até efectivo pagamento, a calcular sobre o montante indemnizatório, os quais entre o fim do processo (04-11-2015) e a data da presente acção se cifram em 760,626 (Setecentos e sessenta euros e sessenta e dois cêntimos);
c)  pagar ao Autor, a título de privação de uso do veículo o montante de 11.175,00€ (onze mil cento e setenta e cinco euros (447 dias x25€), bem como dos juros vincendos desde a data de citação da Ré, até integral pagamento;
d) pagar ao Autor a quantia de 5.036,30€ a título de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidos de juros vincendos, contabilizados desde a data da citação da Ré, até integral e efectivo pagamento.
1.1. -Para tanto , alegou o autor,  em síntese, que :
- Desde 2015, e apesar de adquirido pelo seu filho, que passou  o autor a utilizar o veículo 00-00-XD, razão porque celebrou com a Ré um contrato de seguro com cobertura obrigatória (perante terceiros) e, outrossim, com cobertura facultativa referente a acidentes do condutor e de choque, colisão e capotamento ;
- Ocorre que, no dia 18-09-2015, e quando circulava na Estrada Nacional, n.° 10, ao Km 6, sentiu-se mal,tendo perdido o controlo do veículo ,  e acabando por embater com a frente do veículo numa árvore existente na berma, sendo que, em resultado do embate, sofreu o veículo diversos danos , tendo que ser rebocado para a oficina reparadora;
- Participando o Autor o acidente à Ré, veio a Seguradora em 08-10-2015, a entender que se estava perante um caso de perda total do veículo seguro e, já em 04-11-2015, comunicou a mesma seguradora ao autor que, "de acordo com os elementos carreados no processo pelos nossos serviços técnicos, constatamos que os danos apresentados no veículo seguro não são compatíveis com a dinâmica do acidente", acabando por declinar a regularização do sinistro;
- Porque efectivamente o acidente ocorreu tal como foi pelo autor participado, deve a Ré ser condenada a pagar-lhe a quantia de 15.562,00€  relativa ao capital seguro, acrescida dos juros de mora à taxa legal em vigor, e que na presente data se cifram em 760,62€;
- Acresce que, não possuindo o Autor outro veículo para fazer face às suas necessidades diárias, pessoais e profissionais, o que tudo lhe provocou aborrecimentos, ansiedade, e aumento de tensão nervosa e outras patologias associadas, e além do ressarcimento dos danos morais sofridos, deve ainda a Ré ser condenada a pagar-lhe o montante de 25,00€ diários referente ao valor do aluguer usado no mercado para um veículo com características idênticas ou iguais ao veículo segurado, entre o dia 4-11-2015 e a data da presente acção, no valor total de 11.175,00€;
- Por último, e ainda em consequência do acidente, sofreu o autor diversos ferimentos , tendo sido encaminhado para o Hospital de Vila Franca de Xira, tendo padecido de dores e vindo a sofrer uma fractura da base dos ossos do metacarpo da mão direita, suportando ainda todos os custos inerentes a taxas moderadoras e realização de exames, assim como tratamentos e despesas medicamentosas no valor de 36,30€;
- Logo, e a título de ressarcimento de todos os danos morais sofridos ,deve a ré indemnizá-lo em quantia não inferir a 5.000€.
1.1.- Após citação, contestou a Ré Companhia Seguradora, por impugnação [ aduzindo que ,embora desconheça se os danos na viatura foram provenientes do hipotético acidente , certo é que dos elementos recolhidos é sua convicção que o acidente não ocorreu conforme participado ]  e por excepção [ invocando por um lado a nulidade do contrato de seguro celebrado, e , por outro, a excepção dilatória decorrente da preterição de litisconsórcio necessário e que consubstancia ilegitimidade do Autor para a presente acção ], concluindo a final para que a acção seja julgada improcedente com a consequente absolvição da Ré do pedido.
1.2.- Após RESPOSTA do autor às excepções pela Ré deduzidas, foi proferido despacho pré saneador - que julgou improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade e se considerou as partes legítimas -  e, realizada  uma audiência prévia, no respectivo âmbito proferiu-se então o competente despacho saneador, tabelar , e , bem assim, fixou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova .
1.3.- Por fim, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento [ iniciada a 15/1/2018 e concluída a 5/3/2018 ] e, conclusos os autos para o efeito, proferiu o tribunal a quo a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor:
(…)
IV- Dispositivo
Tendo em conta tudo o acima exposto, factos provados, disposições legais citadas e considerações expendidas julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada a presente acção e em consequência;
a) Condeno a Ré a pagar ao Autor a quantia de 15.562,00€ ( Quinze mil e quinhentos e sessenta e dois euros);
 b) Condeno a Ré a pagar ao Autor juros vencidos e vincendos sobre a quantia referida em a) contados à taxa legal em vigor actualmente de 4% desde 04-11-2015 sendo que os vencidos até à data de entrada da acção se cifram em 760,626 (Setecentos e sessenta euros e sessenta e dois cêntimos) até integral pagamento;
 c) Condeno a Ré a pagar ao Autor a titulo de danos patrimoniais a quantia de 36,30€ (trinta e seis euros e trinta cêntimos) - relativa a despesas com custos médicos,
d) Condeno a Ré a pagar ao Autor juros vencidos e vincendos à taxa legal em vigor actualmente de 4% sobre a quantia referida em c) desde a data da citação até integral pagamento;
e) Absolvo a Ré dos restantes pedidos formulados.
Condeno o Autor e a Ré nas custas do processo na proporção de ½ ( metade) cada um
Registe e notifique.
Lisboa 03 de Abril de 2018”.
1.4. - Inconformada com a referida sentença, da mesma apelou então a Ré B Companhia Seguradora, apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
I. - O âmago da divergência face à decisão recorrida reside na improcedência da excepção de nulidade do contrato de seguro e atentos os factos provados n°s 40, 43, 44, 46 e 47, por um lado, e por outro, na matéria assente sob os n.°s 21, 22 e 23, na medida em que, segundo a prova carreada para os autos e o depoimento das testemunhas José …., perito avaliador e Belmiro ….., perito avaliador do departamento de reconstituição científica de acidentes, o alegado acidente não se podia ter dado, segundo a física conforme descrito pelo Autor.
II. - Ao decidir pela procedência da acção o tribunal a quo, fez uma incorrecta análise crítica da prova e interpretação e aplicação da matéria de Direito, violando o disposto no art.° 607° n.° 4 do CPC, 342° n.° 1 e 346° do C.C, 24° e 25° do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (DL n.° 72/2008 de 16 de abril).
III. - A aplicação do Direito, designadamente dos art.°s 24° e 25° do Regime Jurídico do Contrato de Seguro conduziria à procedência da excepção da invalidade do contrato de seguro e a correta análise crítica da prova, conduziria a não se darem como provados os factos constantes na matéria assente sob os n°s 21, 22 e 23 e consequentemente da aplicação do art.° 342° n.° 1 e 346° do C.C levaria à improcedência da acção declarativa intentada pelo Autor por não ter demonstrado o alegado acidente!
IV. O tribunal a quo deu como provado que a apólice de seguro foi emitida de acordo com as declarações do Autor e este omitiu que teve um acidente nos últimos 5 anos.
V. O tribunal a quo deu como provado que a R. tendo conhecimento de sinistralidade não celebraria o contrato com danos próprios.
VI. O tribunal a quo dá como provado que é do conhecimento geral das pessoas que a factualidade inerente à existência de sinistros é motivo de influência no contrato de seguro.
VII. Assim, dos próprios factos provados n.°s 40, 43, 44, 46 e 47, bem como, da Prova Documental constantes de fis 152 a 154, e aplicação dos artigos 24° e 25° n.°s 1 e 3 do DL n.° 72/2008 de 16 de Abril, importa a invalidade do contrato de seguro dos autos com a consequência de tornar inexigíveis as obrigações inerentes.
VIII. - Não obstante, os factos provados n.°s 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46 e 47 estão em contradição com os factos não provados a) a e). Dos factos provados 40 a 47 justifica-se dar como provado que, "com a referida declaração de inexistência de sinistros o Autor através do seu mediador dolosamente deu a entender à R. que era um bom condutor. Que a R. apenas aceitou o seguro proposto nos referidos pressupostos, que por isso o A. não teve qualquer agravamento, que a R. foi induzida em erro e que aceitou celebrar um seguro que se tivesse conhecimento da declaração falsa não celebraria.
IX. - O tribunal a quo desvalorizou o depoimento das testemunhas José ….. e do Engenheiro Belmiro …. com factos que não correspondem à verdade.
X. Contrariamente ao referido pelo tribunal a quo, o Engenheiro Belmiro ….não só disse que foi ao local do acidente, como disse expressamente que foi várias vezes e pasme-se, até mediu a árvore (veja-se o seu depoimento).
XI. Contrariamente ao invocado pelo tribunal a quo, o depoimento da testemunha Belmiro ….. não foi imparcial, não tendo sequer o tribunal invocado a razão de ser dessa alegada parcialidade.
XII. Ao contrário da fundamentação do tribunal a quo, a testemunha Belmiro …. não se limitou a tentar perceber a dinâmica do acidente pelo croqui do auto policial. Muito pelo contrario (veja-se depoimento),esta testemunha foi várias vezes ao local do alegado acidente, analisou vestígios e mediu a referida árvore, viu o carro acidentado na oficina, analisou os danos, e pasme-se, até fez uma reconstituição cientifica do acidente, mediu velocidades de deformação, apurou a velocidade a que a viatura tinha de circular para apresentar aqueles danos, mas o tribunal quo refere que apenas tento perceber o acidente pelo croqui!
XIII. Mais, refere o tribunal a quo que a testemunha Belmiro …. apenas se limitou a levantar hipóteses, quando contrariamente, ouvindo o seu depoimento, o mesmo referiu expressamente que é impossível o acidente se ter dado conforme descrito. E conforme se invoca, a R. não tem de demonstrar o que terá realmente acontecido, a R. demonstrou factos, impossibilidade de acidente conforme participado, que tornem impossíveis e por isso duvidosos os factos alegados pelo Autor, art.° 346° CC
XIV - Do confronto das declarações de parte com o depoimento da Testemunha Engenheiro Belmiro …., temos que, o A. é que não conseguiu demonstrar efectivamente que o alegado acidente se dá conforme por si descrito, não conseguindo explicar, aliás como o não consegue a testemunha Belmiro …. e por meios físicos e científicos, como é que a viatura apresenta danos de embate numa superfície plana e ele diz que embateu numa árvore, superfície naturalmente circular!.
Como é que o choque por si alegado é frontal na árvore e o espelho retrovisor direito sem ali ter embatido estava partido.
Como é que o veículo apresentava danos no radiador, ar condicionado e refrigeração e não existiam vestígios de fluídos
Como é que a viatura apresenta danos à velocidade de 20 km/h (explicado pela testemunha Belmiro ….) e o Autor diz que circulava a 60 km/h .
Como é que o airbag do ocupante dispara sem o seu ocupante e tendo o carro um circuito de controlo com neutralizador sob peso ou carga.
Como é que, atenta a curva e imediata alegada distracção, o carro vai para a direita e não para a esquerda atenta a inclinação e posição final de embate no auto policial.
XV. Termos em que, do depoimento das testemunhas Belmiro …, José …, prestados em 15-01-2018 11:42:31 a 15-01-2018 12:24:39 e 05-03-2018 12:14:27 a 05-03-2018 12:47:28, bem como, do auto policial, e do confronto destes com as declarações de parte do A. e restante prova documental, a R. demonstrou que o alegado acidente não se deu conforme alegado na P.I, porque fisicamente não era possível e como tal, nos termos do art.° 346° do C.C, devem passar para a matéria de facto não provada os factos n.°s 21, 22 e 23 da Matéria Assente.
XVI. Por outro lado, não obstante deverem-se dar como não provados os factos n.°s 21, 22, e 23, pela mesma ordem de razões, designadamente, do depoimento das testemunhas Belmiro …, José …, bem como, do auto policial, e do confronto destes com as declarações de parte do A. e restante prova documental, a R. demonstrou os factos constantes das alíneas h), i), j), k), I) da matéria não assente, que por isso devem passar para a matéria de facto provada.
XVII. Não obstante a invalidade do contrato de seguro e consequentemente a inexistência da obrigação a que estava contratualmente adstrita, n.° 3 do art.° 25° do RJCS, o Autor não demonstrou como lhe competia a existência do acidente conforme descrito na Petição Inicial e por conseguinte a ocorrência de um evento aleatório, art.° 1 RJCS o que obsta ao pagamento da prestação, conforme art.° 342° C.C e 102° n.° 1 RJCS à contrario.
XVIII. A este propósito e tratando-se exactamente da mesma matéria e nos mesmos termos, decidiram os Venerandos Desembargadores no Acórdão da Relação de Lisboa de 20 de Marco de 2018, pela nulidade do contrato de seguro celebrado com base nas declarações do tomador e ainda, mesmo quanto à matéria de facto, fundamentou-se o dolo precisamente com o benefício no prémio, que é do conhecimento geral das pessoas.
Escreveu-se ali que:
"Ora, perante o que acima se deixa expresso não pode o comportamento assumido pelo aqui Apelante deixar de ser considerado como doloso, tanto mais que, enquanto condutor e tomador do seguro anteriormente celebrado na Companhia de Seguros Allianz, relativamente a uma outra sua viatura 92-HP-75, não podia deixar de saber da existência do sinistro ali participado, tanto mais que era o respectivo condutor à data daquele acidente, tendo recebido a indemnização pela perda total do veículo ali seguro com esse acidente - Ponto 43 dos Factos Provados.
Trata-se de um facto pessoal, de relevo para que uma qualquer Companhia de Seguros possa decidir se contrata ou não a cobertura que lhe é pedida - que, volta-se a frisar, é de carácter facultativo - bem como para fixar o valor do prémio respectivo, elemento que está directamente ligado ao perfil do tomador e seguro, enquanto condutor. E a situação é tanto ou mais gravosa quanto é certo que, como é do conhecimento comum, estando a fixação do prémio do seguro intimamente ligada com o tipo/perfil de condutor - como já acima deixamos frisado - não podia o aqui Apelante deixar de saber que a sua falta à verdade iria determinar uma alteração do valor do prémio de seguro, traduzida numa vantagem patrimonial a seu favor - um prémio mais baixo e que no caso obteve uma bonificação de 35 - comportamento que integra uma violação dolosa do seu dever de declaração de risco.
Nestes termos e nos melhores de Direito que os Venerandos Desembargadores mui sabiamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência deve ser revogada a decisão proferida e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente por não provada, só assim se fazendo a tão desejada JUSTIÇA!,
1.5.- Dos autos não decorre que tenha autor apresentado contra-alegações.
                                                     *
Thema decidendum
Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir  resumem-se em aferir  :
Primo - Da pertinência da impetrada alteração da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto;
Secundo - Se em razão da alteração da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto, importa revogar a sentença, sendo a acção julgada improcedente ;
 Tertio - Se , não obstante improceder a impugnação da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto, importa ainda assim revogar a sentença, sendo a acção julgada improcedente em razão da procedência da excepção de invalidade do contrato de seguro dos autos com a consequência de tornar inexigíveis as obrigações inerentes.
                                                ***
2. - Motivação de Facto.
Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade :
A) PROVADA
2.1.- Em 2015, o filho do Autor C, adquiriu, por compra, o veículo automóvel ligeiro de passageiros da marca Audi, modelo A4, modelo Cabriolei 2.5. TDI S-Line com a matrícula 00-00-XD;
2.2.- A Ré é uma sociedade seguradora que exerce a actividade de seguros e resseguros, explorando diversos ramos de seguro, vida e não vida;
2.3.- No exercício dessa sua actividade, o Autor e a Ré celebraram, através de mediador, o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, com cobertura obrigatória (perante terceiros) do veículo da marca Audi, modelo A4, modelo Cabriolet 2.5. TDI S-Line com a matrícula 00-00-XD, sob a apólice número …;
2.4.- Tendo ainda contratado a cobertura responsabilidade civil facultativa, acidentes do condutor/segurado, protecção jurídica, assistência em viagem, quebra de vidros, sem franquia;
2.5.-  Foram ainda contratadas as coberturas de furto, roubo ou furto de uso, incêndio, raio ou explosão, choque, riscos catastróficos, todos sem franquia e pelo valor seguro de € 16.900,00;
2.6. - Foi contratada a cobertura de choque, colisão e capotamento, com franquia de 2% sobre o capital seguro e mínimo de €250,00, pelo valor seguro de € 16.900,00;
2.7. - E ainda de protecção de compras com franquia fixa de € 20,00 e de actos maliciosos, com franquia de € 125,00, pelo valor seguro de € 16.900,00, tudo conforme contrato titulado através da apólice número … ;
2.8. - O Autor participou o acidente à Ré, tendo dando origem ao processo de sinistro n.° …;
2.9. - Em 8/10/2015, a Ré entendeu que se estava perante um caso de perda total do veiculo seguro, dado que: "após peritagem efectuada à sua viatura pelos serviços técnicos da B, foi a mesma considerada perda total ao abrigo do artigo 13.°do Decreto-Lei n.° 44/2005, de 23 de Fevereiro, por, o valor da reparação ser superior a 70% do valor venal do veículo à data do acidente.", conforme missiva datada de 08-10-2015;
2.10. - Em 04-11-2015, a Ré remeteu comunicação ao Autor A a informar que terminou a instrução do processo de sinistro e que "de acordo com os elementos carreados no processo pelos nossos serviços técnicos, constatamos que os danos apresentados no veículo seguro não são compatíveis com a dinâmica do acidente";
2.11. - Mais concluiu que "o acidente não ocorreu conforme nos foi participado", pelo que não procedeu à regularização do sinistro;
2.12. - O Autor apresentou reclamação junto do Centro de Informação, Mediação e Provedoria e Arbitragem de Seguros;
2.13. - Em 20-01-2016, o processo foi concluído porque a Ré  B recusou a resolução do sinistro por via daquele Centro;
2.14. - A Ré, até ao momento, não pagou o valor indemnizatório devido, apesar das tentativas realizadas;
2.15. - Desde a aquisição que o Autor é que passou a usar e a usufruir do aludido veiculo, à vista de toda a gente, dele retirando utilidade e proveito.
2.16. - O Autor é que suportava todos encargos decorrentes dessa utilização, pagando o imposto automóvel, as inspecções periódicas, fazendo as reparações necessárias e providenciando pela conservação do veículo, incluindo fazendo o correspondente seguro e pagando o prémio;
2.17. - No dia 18-09-2015, pelas 23:20 minutos, na Estrada Nacional, n.° 10, ao Km 6, o Autor circulava naquela estrada, no sentido Calhandriz - Alverca, na zona de A-dos-Melros, da união de freguesias de Alverca do Ribatejo e Sobralinho, do Concelho de Vila Franca de Xira.
2.18. - A estrada nacional em causa é composta por dois sentidos de marcha (Calhandriz - Alverca e Alverca - Calhandriz), tendo cada via uma largura de 2,80 metros cada;
2.19.- A via naquele local, atento o sentido de marcha do veículo seguro é uma recta, com boa visibilidade.
2.20. No acidente foi único interveniente o veiculo seguro - o Audi A4 cabriolet, conduzido pelo Autor.
2.21. - No dia e hora em causa, o Autor A vinha de um velório, sem ter jantado e deslocava-se para casa, no sentido Calhandriz - Alverca e ao km 5, na zona de A-dos-Melros, sentiu-se mal e tendo perdido o controlo do veículo seguro foi embater na árvore existente na berma;
2.22. -   O embate ocorreu com a frente do veículo na árvore;
2.23. - O veículo, em resultado dos danos que sofreu, nomeadamente, ao nível de capot, guarda-lamas, pára-choques, para brisas, órgão de iluminação, airbags e ainda de motor,  sistema de ar condicionado e outros órgãos internos, não se locomovia pelos seus próprios meios.
2.24. - Tendo sido rebocado para as instalações de oficina reparadora.
2.25. - No chão ficaram diversos vestígios óleo, gasóleo e ainda vidros e plásticos.
2.26. - Os quais foram removidos por acção de bombeiros que foram chamados ao local, e procederam à limpeza do local.
2. 27. O salvado foi adquirido pelo Autor.
2.28.- Deduzido o valor da franquia e do salvado o valor em causa do veículo considerado como perda total é na quantia de 15.562,00€ (Quinze mil e quinhentos e sessenta e dois euros), relativamente ao capital seguro;
2.29. - Como consequência directa e necessária do acidente de viação, resultaram ferimentos para o Autor tendo sido encaminhado para o Hospital de Vila Franca de Xira, onde deu entrada pelas 00H08 do dia 19-09-2015, sob o episódio clínico sob o número ….
2.30. - Na data da sua entrada hospitalar, o Autor queixava-se de dor sacrococcígea e da mão direita.
2.31.- As queixas motivaram a realização de diversas RX, especificamente à mão direita, dedos da mão direito, tórax e ao sacro-cóccix, o que permitiu verificar que o Autor teve uma factura da base dos ossos do metacarpo da mão direita;
2.32. - O Autor teve alta hospitalar no próprio dia, passando a ser orientado na ortopedia e, em simultâneo pela médica de família;
2.33. - Em 28-09-2015 voltou a realizar consulta de ortopedia;
2.34.- A lesão na mão direita do Autor, provocou àquelas dores físicas intensas e atrozes, tanto no momento do acidente, como no decurso dos tratamentos,
2.35. - O Autor passou por diversas consultas de ortopedia, realizou novos exames e raios RX nomeadamente à mão direita;
2.36. -Tendo o Autor suportado todos os custos inerentes a taxas moderadoras e realização de exames, assim como tratamentos e despesas medicamentosas no valor de 36,30€;
2.37. - O Autor não possui veículo para fazer face às suas necessidades diárias, pessoais e profissionais;
2.38.- A impossibilidade de se deslocar por veículo provoca aborrecimentos, ansiedade, e aumento de tensão nervosa e outras patologias associadas;
2.39. - Entre a data do acidente (18-09-2015) e a data de entrada da presente acção o Autor está, em certa medida, impossibilitado de dar os seus passeios com a família, de visitar os seus amigos e familiares, quando quiser e bem entender;
2.40. - A apólice …, foi emitida com base nas declarações prestadas pelo Autor, designado de tomador do seguro, condutor habitual e segurado, na proposta de seguro que foi apresentada o que fez perante o mediador João ……;
2.41.- Foi com base nas declarações do mediador de seguro que a Ré, aceitou o seguro titulado pela aludida apólice;
2.42. - Foi com base nas mesmas declarações, que a Ré procedeu ao cálculo do prémio do seguro;
2.43. - O medidor de seguros indicou à Ré que o Autor não teve qualquer sinistro nos últimos 5 anos;
2.44.- É do conhecimento da generalidade das pessoas, que as seguradoras ou não aceitam os seguros, ou, quando aceitam, têm por regra aplicar agravamentos sobre os prémios dos seguros do ramo automóvel, quando são propostos seguros em que os segurados e/ou os condutores habituais têm antecedentes de sinistralidade  ;
2.45.- Algumas seguradoras reservam às respectivas direcções técnicas, a aceitação de seguros com a chamada cobertura de danos próprios, quando os segurados e/ou condutores habituais têm sinistralidade;
2.46. - É o caso da Ré, que, de acordo com as suas "Normas e Limites de Aceitação" de seguros do ramo automóvel não aceita a cobertura de danos próprios nas situações de sinistralidade do proponente, agravando as restantes coberturas, no caso de as aceitar;
2.47. - A Ré, quando recebeu a participação do sinistro dos autos desencadeou os procedimentos para a regularização do mesmo no desenvolvimento do processo de averiguações, e veio a tomar conhecimento de que o Autor, tomador do seguro, teve um sinistro grave com o veículo 00-00-ZC, BMW 730D, em 2014.11.22, seguro na Liberty, de que resultou perda total;
2.48.- O Autor, nas declarações que prestou às autoridades escreveu o seguinte: "Deslocava-me de um velório, quando me lembro de desfazer a curva e entrar na recta, avistei umas luzes ao longe e não me lembro de mais nada só depois do acidente";
2.49.- Na participação efectuada, o Autor fez constar uma descrição idêntica, referindo que seguia a uma velocidade de 60 km/h; 50. Posteriormente, em declarações verbais prestadas durante a averiguação o Autor referiu que circulava na EN 10-6, via sinuosa, no sentido Calhandriz/Alverca, a uma velocidade de 40/60 km/h, quando após ter efectuado uma curva à esquerda e já depois de ter percorrido cerca de 100 m e sem explicação plausível, perdeu o controle da direcção do veículo, vindo a embater violentamente e frontalmente numa árvore existente na berma do lado direito atento o meu sentido de marcha e que após o violento embate, saiu do veículo e ligou para os Bombeiros via 112;
2.51.- Conforme consta do Relatório de Alta junto pelo Autor consta: "...embate frontal contra árvore a 70 km/h, sem capotamento, usava cinto de segurança e saiu do carro pelos próprios pés";
2.52.- Decorre do Relatório de peritagem que os danos no veículo eram avultados;
2.53. - Com todo o cenário e perante os danos do veículo, bem como do airbag do passageiro estar accionado sem que tenha sido indicado que no veículo houvesse qualquer ocupante, a Ré efectuou as diligências que considerou pertinentes, e procedeu a uma reconstituição do acidente; 54. Apurou que não houve qualquer testemunha do acidente;
2.55. - No dia 2015.10.02, ao mesmo tempo que era efectuada a peritagem ao veículo, a Ré fez deslocar ao local indicado como tendo sido o do acidente, um perito;
2.56. - Perito que analisou o local e, posteriormente, fotografou o veículo;
2.57. - A via por onde o Autor circulava tem uma largura de 5,60 metros;
2.58. - A berma de terra não apresenta qualquer desnível;
2.59. - No veículo algumas peças da frente do mesmo têm de origem uma cor diferente (azul escura) e estão mal pintadas;
2.60. - O mediador João …. - da " os seguros Lda", teve intervenção directa, quer no ato de celebração do seguro em causa quer no acto de desvinculação do anterior seguro do Autor junto da seguradora Liberty;
2.61. - O mediador da Ré - João …. - da "Os seguros Lda" teve intervenção na celebração, execução, e tentativa de resolução do sinistro no âmbito do contrato de seguro sob a apólice ….;
2.62. - A Ré, através do seu mediador, preencheu a referida apólice com toda a informação que assim foi prestada;
B) NÃO PROVADA
2.63. - Com a referida declaração de inexistência de sinistros o Autor através do mediador dolosamente deu a entender à Ré que era um bom condutor e até por isso veio a beneficiar de uma redução no respectivo prémio;
2.64. - A Ré apenas aceitou o seguro proposto nos referidos pressupostos (inexistência de sinistros);
2.65. - A Ré aceitou celebrar o contrato de seguro nos termos e condições negociadas, tendo decidido não imputar qualquer agravamento ao A ;
2.66. - A Ré foi induzida em erro pelo tomador do seguro através do mediador;
2.67. - Tendo acabado por celebrar um contrato seguro que não aceitaria em circunstância alguma ;
2.68. - À data da celebração da apólice, a Ré detinha conhecimento do histórico de sinistralidade do Autor, bem como de todos os elementos que levaram a contratar a apólice de seguro incluindo a impossibilidade do Autor deter bens em seu nome.
2.69. - A Ré só não procedeu à anulação da apólice porque o próprio A. solicitou a anulação da mesma;
2.70. - Os danos que o veículo apresenta não se coadunam com a descrição do acidente elaborada pelo A;
2.71. - O veículo apresenta alguns danos na lateral direita que não têm qualquer justificação perante a descrição do hipotético acidente;
2.72. - Circulando a uma velocidade de 60 Km/h (ou 70 km/h) não se entende a perda de domínio do veículo (quando dispõe de sistemas de controle de tracção);
2.73. - Não sendo transportado qualquer passageiro no lugar do passageiro da frente, nunca o airbag podia ter sido accionado, pois o mesmo só funciona quando o respectivo sensor detecta que alguém se encontra sentado no referido lugar;
2.74. - Quando os airbags são activados, os pré-tensores dos cintos de segurança são, obrigatoriamente, accionados;
2.75. - Os pré-tensores pirotécnicos que equipam o modelo do veículo, funcionam por indicação de um sensor que mede a desaceleração/travagem sofrida pelo veículo durante a colisão e estão incorporados na unidade de comando que é responsável pela gestão do sistema de airbag;
2.76.- O funcionamento dos pré-tensores está intimamente ligado ao funcionamento dos airbags, por isso numa colisão forte em primeiro lugar verifica-se a activação dos pré-tensores e logo de seguida dos airbags;
2.77. - Após o pré-tensor ter sido activado, os cintos de segurança perdem a sua capacidade de retenção, ficando desenrolados;
2.78. - Os pré-tensores dos cintos de segurança do condutor e do passageiro não se encontram activados encontrando-se na sua posição de recolha sem estarem desenrolados;
2.79. - Na árvore onde o veículo terá embatido deviam existir vestígios de tinta;
2.80. -  A árvore devia ter marcas de ter sido embatida;
2.81. - Tendo detectado tantas incoerências, a Ré, após consulta na Base de dados Segurnet, verificou a existência de vários sinistros em que o A. foi interveniente e do qual resultaram perdas totais;
2.82. - Em consequência do acidente, o Autor teve um período de incapacidade para o trabalho de 30 dias.
2.83. - Nos 30 dias que se seguiram ao acidente o Autora não podia alimentar-se sozinho, ou fazer as tarefas diárias necessitando de acompanhamento,
2.84. - As sequelas decorrentes do acidente continuam a provocar ao Autor dores físicas, incómodo e mal-estar.
2.85. - Basta um simples comprimento de mão, para que o Autor sinta dores,
2.86. - As dores e sofrimento vão acompanhar o Autor para toda a vida, existindo uma diminuição dos movimentos da mão direita, nomeadamente, na condução de veículos pesados, já que o Autor é motorista de profissão.;
                                                 *
3.- Da pretendida modificação/alteração da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo.
Analisadas as alegações e conclusões da apelante ré Seguradora, temos para nós que, em rigor, observou e cumpriu a mesma todas as regras/ónus processuais a que alude o artº 640º, do CPC, quer indicando os concretos pontos de facto que considera como tendo sido incorrectamente julgados [ os vertidos nos itens 2.21, 2.22, 2.23, 263 a 267 , e 2.70 a 2.74 ] quer precisando quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa da recorrida, quer , finalmente , indicando quais as diferentes respostas que deveria o tribunal a quo ter proferido, e , ademais, porque gravados os depoimentos das testemunhas pela impugnante indicadas, procedeu a mesma , outrossim , à indicação do inicio e termo da respectiva gravação.
Destarte, na sequência do exposto, nada obsta, portanto, a que proceda este Tribunal da Relação à análise do “mérito” da solicitada/impetrada alteração das  respostas aos pontos de facto indicados e impugnados.
3.1.- Se devem ser alteradas as respostas dadas ( como integrando factualidade provada ) pelo tribunal a quo à matéria de facto vertida nos itens  2.21, 2.22 e 2.23, todos da motivação de facto do presente Acórdão.
Tendo o tribunal a quo, em sede de sentença, considerado provada toda a matéria de facto que se mostra vertida nos itens 2.21, 2.22 e 2.23, todos da motivação de facto do presente Acórdão, considera todavia a apelante que a todos os referidos pontos de facto antes deveria a primeira instância ter respondido negativamente, ou seja, Não Provado.
No essencial, considera assim a apelante que o Tribunal “a quo” não ajuizou bem a prova produzida, designadamente não se mostra de todo justificada a convicção sufragada pela primeira instância no sentido de considerar plausível a versão do acidente relatada pelo autor,  maxime por apenas se basear nas declarações de parte do autor e, concomitantemente, desvalorizar os depoimentos das testemunhas da Ré e sem que para o efeito dispusesse de razão atendível
Ora bem.
Antes ainda de tecer considerações direccionadas para a adequação e pertinência da convicção formada pelo tribunal a quo, importa  recordar quais os exactos fundamentos que conduziram a Exmª Julgadora da primeira instância a enveredar pelo julgamento de facto que a recorrente  censura,  e que foram , em síntese, os seguintes :
“ (…)
No caso concreto dos autos, a prova por declarações de parte do Autor foi ponderada, e serviu também para fundamentar a convicção positiva do tribunal no que reporta aos factos provados constantes dos pontos 15) a 39) em concreto quanto à dinâmica do acidente que descreveu com detalhe, bem como as suas consequências em termos de danos no veiculo, e danos próprios, a nível físico e sendo que tais declarações de parte, as quais foram prestadas de forma clara e concreta especialmente no que se reporta à dinâmica do evento são consentâneas como teor dos documentos juntos aos autos de fls. 19 a 23 ( em concreto documento policial de participação do acidente e croqui a este junto a fls. 22 que foi desenhado pelo agente policial que se deslocou ao local como por este descrito na sequência do acidente), bem ainda como documentos de fls 24( relatório de urgência para a policia) fls. 27 ( descrição do sinistro feita pelo Autor), de fls 39 a 41 relatório de alta clínica, de fls. 42 recibo emitido no hospital onde o autor foi assistido na sequência do acidente, de fls 43 e 44 - (marcação de consultas), de fls. 45 a 48 e 50 ( pedido de exames e respectiva marcação ) e de fls. 49 (comprovativo de pagamento de exames).
Na verdade o Autor ouvido confirmou tais factos descrevendo o acidente, referindo que seguia na estrada no local indicado vindo de um velório não se recordando como se deu o acidente porque pensa que terá adormecido ou que se terá sentido mal porque ainda não teria jantado.
De facto considerando embora que o Autor sofreu tal acidente sozinho as declarações que prestou quanto à dinâmica do acidente são absolutamente consentâneas com os documentos dos autos, bem assim como com o depoimento da testemunha Dário …. agente policial que chamado ao local na sequência do acidente elaborou a participação do acidente resultando assim tais aludidas declarações como clarificação desse depoimento, tendo em conta que analisadas tais declarações ( as quais se revelaram claras, concretas e credíveis) com o depoimento desta testemunha inexiste qualquer fundamento para crer que o acidente não se deu tal como consta dos factos provados.
(…)
Por sua vez a testemunha Dário …. no seu depoimento também serviu para fundamentar a convicção positiva do tribunal tendo o seu depoimento sido concreto, isento e revelando conhecimento dos factos.
Referiu em síntese ter elaborado o auto de participação do acidente, documento com o qual foi confrontado confirmando o mesmo, e referindo a tal respeito que embora o auto tenha sido realizado com base nas declarações do Autor, já para efectuar o croqui anexo ao mesmo tirou medidas para que o veiculo do Autor fosse posicionado no croqui na mesma posição em que estava após o embate quando chegou ao local.
(…)
Referiu também que o veículo do Autor logo que o viu estava junto à árvore onde teria embatido na árvore tal como consta dos documentos que elaborou e que este veículo ficou totalmente inutilizado o que ocorreu em consequência do provável embate na árvore.
Disse ainda que efectivamente o Autor após o acidente aparentava estar dorido e por isso nem mesmo conseguiu assinar os documentos que precisava, sendo que por causa das dores apenas foi possível ao Autor assinar tais documentos mais tarde no hospital, tendo confirmado ainda que o Autor teve que se deslocar com os bombeiros para assistência hospitalar após o embate.
 Por sua vez a testemunha Deolinda …. amiga do Autor também do mesmo modo confirma a versão deste embora não tendo como já dito assistido ao embate. Referiu nomeadamente que no dia e hora descrito nos factos recebeu um telefonema do Autor referindo que tinha tido um acidente e precisava que fosse ter ao local. Assim na sequência de tal telefonema foi ter ao local que descreveu como sendo o que consta dos factos provados tendo visto ai o veículo do Autor, o qual estava todo desfeito tendo que ser rebocado .
(…)
Também a testemunha Paulo …., ouvida em depoimento referiu ser amigo e colega à data do Autor pois ambos trabalhavam como motoristas na mesma empresa e que no dia que refere que consta dos factos provados foi acordado de noite por causa de um telefonema onde lhe foi dito que o Autor teria tido um acidente. Assim na sequência de tal telefonema foi ter com o Autor que estava no hospital sendo que também posteriormente viu o local do acidente.
(…)
Analisada a prova resulta da conjugação das declarações de parte do Autor com os depoimento das testemunhas indicadas tendo ainda em conta o teor do documentos que consubstanciam auto de participação policial ( documento que foi totalmente confirmado pela testemunha acima referida que o elaborou) e dos documentos hospitalares resulta de acordo com regras de experiência comum aplicáveis à analise dos elementos de prova, de acordo com a livre convicção que o evento em apreciação nos autos terá ocorrido exactamente conforme referido na petição inicial … “
Aqui chegados, analisada a decisão [ rectius os fundamentos decisivos em sede de formação da convicção ]  proferida pelo tribunal a quo e acabada de reproduzir parcialmente, uma primeira observação se impõe desde logo efectuar, qual seja a de que procedeu o tribunal a quo, em termos  minuciosos e bem explicados [ para além do minimamente exigível e ao contrário do que costuma ser norma/prática recorrente ] à explicitação da ratio da convicção formada e que conduziu à fixação da matéria de facto ora impugnada.
Depois, uma segunda nota se justifica, de seguida, ainda aduzir, e estando a mesma relacionada com a adesão/preferência pela Exmª Julgadora da tese e/ou versão da ocorrência do acidente indicada pelo Autor, pois que, consagrando o artº 607º, nº5, do CPC, o princípio da prova livre ( que não arbitrária ou caprichosa), julgando o tribunal segundo a sua convicção formada sobre a livre apreciação das provas, de modo a chegar à decisão que lhe parecer justa (1), e porque não raro ( é aliás o “pão nosso de cada dia “ nos tribunais, designadamente em matéria de acidentes de viação  ) se depara o julgador com depoimentos testemunhais de sinal contrário, não é de estranhar que seja o mesmo “forçado” a efectuar escolhas,  e isto porque, como é consabido, não é um qualquer estado ( mas apenas a fundada, insuperável e insanável - cfr. artº 8º, nº1, do Cód. Civil ) de dúvida que justifica a imediata e cómoda - porque não responsabiliza e até desculpabiliza - aplicação do princípio a que alude o artº 414º, do CPC.
Pelo contrário (2), quando confrontado com meios de prova diversificados, cabe ao tribunal, no exercício da sua função, tomar posição.
Postas estas breves considerações e notas pertinentes direccionadas para o julgamento do mérito da impugnação da recorrente dirigida para a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, temos assim que, in casu,  a referida decisão de facto se estribou fundadamente, na análise e ponderação crítica e conjugada dos depoimentos prestados por algumas das testemunhas arroladas, que o mesmo é dizer, teve em consideração a apreciação de parte da prova produzida, tendo a Exmª Juiz a quo explicado – com pertinência e adequada ponderação – a ratio de ter enveredado pela aceitação da tese da efectiva verificação do acidente de viação relatado pelo autor, designadamente considerando não ter sido produzida contraprova ( cfr. artº 346º, do CC ) idónea susceptível de tornar duvidosa a efectiva ocorrência do sinistro.
Será que, e tal como o entende a apelante/Seguradora, a prova que indica em sede de instância recursória - e produzida em julgamento - justificava e impunha, quando em confronto pela prova produzida pelo autor, que o tribunal a quo tivesse enveredado por um diferente/diverso julgamento de facto ?
Vejamos.                                                                                        
Começando pelo depoimento de parte prestado por A, reiterou o autor a versão carreada para os autos na sua petição inicial, confirmando a ocorrência do acidente e a existência de danos físicos e materiais, e esclarecendo que do pouco que se recordava das circunstâncias do aludido acidente apenas podia afirmar que embateu numa árvore quando circulava na estrada após ter vindo de um velório.
Mais esclareceu que imediatamente após o acidente terá sido abordado por um condutor que circularia no momento na mesma via mas em sentido contrário.
Por aquilo que foi dado aperceber por este tribunal de recurso, e não obstante “despojados” das vantagens decorrentes do princípio da imediação, a verdade é que não logrou este tribunal da Relação aperceber-se de quaisquer elementos revelantes susceptíveis de abalar e pôr em causa a coerência, a razoabilidade e a verosimilhança da versão/relato apresentado pelo depoente/autor no que à ocorrência do acidente concerne.
Precisando melhor, e sendo verdade que não raro são as declarações de parte desvalorizadas e prematuramente arredadas e consideradas como desprovidas de qualquer utilidade em termos de valor probatório -  com base em raciocínio de que “ não acredito na parte porque é parte “ -  , temos para nós que, importando porém e em primeiro lugar, valorar a declaração da parte e, só depois, a pessoa da parte, sob pena de estar a prejulgar as declarações e a incorrer no viés confirmatório (3), o certo é que, in casu, analisadas todas as declarações do autor, nada se constatou/detectou [ em razão v.g. da insegurança revelada pelo declarante, da falta de coerência do relato ou até da total falta de razoabilidade da versão apresentada ]  que justificasse “suspeitar” da versão trazida ao tribunal.
Analisado de seguida o depoimento prestado por Dário …. ( agente policial da PSP, identificado na participação junta a fls. 19 e segs, que fazia parte da brigada de acidentes ), constata-se que confirma a testemunha a elaboração do documento – que assinou - junto a fls. 19 a 23 ,  esclarecendo que se deslocou ao local do acidenteprima facie logo após a sua ocorrência e logo que chamado - , tendo efectuado o croqui/esboço que dos autos consta , o que fez, segundo esclareceu, com base nos elementos que no momento observou – posição do veículo e medições efectuadas - no local do acidente.
Da referida participação consta, designadamente, a informação da existência de vestígios de acidente no local ( plásticos e vidros partidos ) , e, bem assim, que para a descrição do acidente ( alegado despiste seguido de embate em árvore – ponto de conflito - existente na berma da via ) por si efectuada baseou-se a testemunha na visualização das características da via e em declarações prestadas no local pelo condutor interveniente.
A testemunha Dário ….. no depoimento que prestou, informou ainda que efectuou todas as medições no local, sendo à data coadjuvado por um colega.
Por sua vez, ouvido que foi o depoimento prestado por Deolinda …. [ amiga do autor e respectiva esposa ], apurou-se a confirmação da ocorrência do acidente, explicando a testemunha que se deslocou ao local da sua ocorrência juntamente com o seu marido [ porque momentos antes estava junto da esposa do autor, tendo esta última recebido uma chamada a informar da ocorrência do sinistro ] e apenas se tendo retirado/ausentado quando o autor foi conduzido ao Hospital.
A testemunha Deolinda, não obstante o relacionamento/amizade com o autor, e pela forma/modo como prestou o seu depoimento, não denotou falta de imparcialidade, não se tendo descortinado qualquer elemento e/ou afirmação que, segundo as regras da experiência comum, justifique questionar da credibilidade, consistência e razoabilidade do relato apresentado.
Já a testemunha Paulo …., amigo do autor e seu colega de trabalho há pelo menos 4/5 anos, e corroborando o depoimento prestado por Deolinda …., esclareceu que também se deslocou ao local do acidente ( na sequência de telefonema ) logo após a sua ocorrência, tendo relatado de forma detalhada quais os danos existentes no veículo e que no  momento visualizou .
Analisando-se de seguida o/s depoimento/s prestado/s por testemunha/s que a apelante Seguradora considera serem os reveladores/demonstrativos do erro de apreciação da prova pelo tribunal a quo, a ponto de a versão da ocorrência do acidente não se justificar de todo, temos desde logo o prestado por José …. ( perito avaliador de sinistros e que presta serviços para a Ré/apelante e outras Companhias Seguradoras ), tendo o mesmo esclarecido que das averiguações efectuadas ( análise do local do sinistro e dos danos existentes e visualizados na viatura interveniente ), concluía que o acidente não poderia ter ocorrido tal como foi ele pelo autor participado.
Precisando a testemunha José ….. que foi ao local do acidente ( cerca de uma semana após ter ele alegadamente ocorrido ) e que verificou na oficina quais os danos no veículo, e tendo também ouvido o autor, esclareceu a testemunha que, no seu entender, muito dificilmente os danos que a viatura apresentava podem ter resultado de um embate na árvore identificada no croqui da participação da PSP, além de que alguns dos danos visualizados são também de alguma forma incompreensíveis em face de um mero embate frontal em árvore ( vg. a existência de um vidro lateral da viatura partido ).
Por tudo o que apurou, concluía assim a testemunha José ….  que a versão do acidente pelo autor apresentada era de alguma forma inverosímil, sendo infirmada pelas regras da experiência e também em face dos danos ( ou falta deles ) que a árvore apresentava.
Ouvido que foi também o depoimento prestado por Belmiro …. ( perito avaliador na Ré B ), esclareceu a testemunha quais os trâmites/démarches que levou a cabo em sede de instrução e averiguação das condições em que terá ocorrido o acidente participado, afirmando que foi ao local do acidente e à oficina onde a viatura sinistrada se encontrava.
No essencial, e por tudo aquilo que apurou e visualizou, concluía a testemunha que os danos que a viatura apresentava não são compatíveis com um embate do mesmo na árvore dos “autos” ( a indicada na participação do acidente ), não sendo também compreensível que o mesmo embate pudesse ter desencadeado o accionamento do airbag do lado direito da viatura  e a quebra do vidro da porta do lado direito, isto por um lado e, por outro, que não tivessem os danos existentes na viatura “libertado” líquidos e fluídos deixados e localizáveis no local do pretenso acidente .
Em suma, e atendendo aos vectores/variáveis da dinâmica, estática e cinemática,  e falta de relação entre todos eles, não aceitava a testemunha Belmiro …. que o acidente dos autos pudesse ter ocorrido da forma como o autor sustenta/apresenta
Aqui chegados, e descendo agora e finalmente, ao concreto, analisada que foi a globalidade da prova produzida e dirigida para a ocorrência do sinistro ( correspondendo a mesma praticamente a toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento ), a primeira nota que importa realçar, é a de que a versão do acidente julgada provada pelo tribunal a quo mostra-se em princípio amparada em diversos depoimentos testemunhais prestados em audiência, além de também corroborada [ que não apenas ] nas declarações de parte do próprio autor.
Não menosprezável é também o depoimento prestado pela testemunha da PSP, estando o mesmo alicerçado  em documento autêntico ( a participação do acidente  ), sendo que, este último , faz prova plena da verdade dos factos relatados e passados na presença do documentador ( v.g. a existência de vestígios de acidente no local, a imobilização da viatura fora da via pública e a existência de uma árvore na sua frente, apresentando ainda a mesma viatura danos externos visíveis e prima facie compatíveis com uma colisão na árvore  ).
É certo que, qual contraprova susceptível de abalar a veracidade da ocorrência de um acidente, e a suscitar a dúvida sobre se não terá antes o sinistro vg. sido encenado ( sendo antes falso, porque pretensamente “montado” ), foram carreados para os autos pelo menos dois testemunhos prestados por peritos/averiguadores, os quais, e em face das averiguações por ambos efectuadas ( dias após a pretensa ocorrência do sinistro ), concluíram pela reduzida e/ou elevada improbabilidade de os danos existentes no veículo dos autos terem resultado de um sinistro ocorrido nos moldes como foi ele pelo autor participado.
Sucede que, não obstante os referidos 2 testemunhos, ambos essencialmente de “natureza pericial”, que não presencial, temos para nós que pertinente e seguro – muito longe disso – não é considerar ( apenas com base neles ) que existiu um qualquer erro de julgamento que determine a alteração da decisão de facto proferida pelo a quo, maxime no tocante aos 3 concretos pontos de facto impugnados pela apelante e ora em apreciação, e isto porque, em rigor, não se mostram tais depoimentos coadjuvados de outra prova e/ou indícios típicos que por regra se mostram presentes quando na presença de uma simulação/encenação da ocorrência de um acidente de viação.
Depois, recorda-se que quaisquer dos depoimentos prestados pelas testemunhas que compareceram no local do acidente imediatamente após pretensamente ter ele ocorrido, e em face dos pormenores, contextualização e  espontaneidade com que foram prestados, não são de todo merecedores de  qualquer reparo e, ademais, não apresentaram também vulnerabilidades que tivessem afectado/minado a respectiva credibilidade, confiança e consistência, isto é, não devem ser apenas credores de uma fé reduzida..
Para além do referido, recorda-se outrossim que o exercício de poderes jurisdicionais não se move por princípios de certeza absoluta ou inabalável, bastando que o convencimento do julgador se mostre fundado numa certeza relativa, histórico-empírica, dotada de um grau de probabilidade adequado às exigências práticas da vida, e , ademais, pertinente e razoável não é que, à mínima contrariedade ( v.g. em face da verificação, em sede de contraprova, de circunstâncias que tornem duvidosa a versão de um acidente apresentada por uma das partes ] , deva o julgador desencadear a imediata e cómoda aplicação do princípio plasmado no artº 414º, do CPC.
É que, como bem se chama à atenção em Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães (4), não é toda a dúvida que legitima o funcionamento do princípio plasmado no artº 516º do pretérito CPC , mas apenas a dúvida argumentada que, em concreto - após a produção e análise crítica de todos os meios de prova relevantes e sua valoração de acordo com os critérios legais – deixa o julgador ( objectivo e distanciado do objecto do processo ) num estado em que permanece como razoavelmente possível mais do que uma versão do mesmo facto.
Ou seja, a própria dúvida ( a se ) está também sujeita a controlo, devendo revelar-se conforme à razão ou racionalmente sindicável, pelo que, não se mostrando racional, tal dúvida não legitima a aplicação do citado princípio razoável. (5)
Postas estas breves considerações, recorda-se por último que em sede de julgamento do mérito de impugnação dirigida para decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo, não cabe de todo ao tribunal de segunda instância realizar um segundo ou um novo julgamento, sendo antes a sua competência residual [ porque os respectivos poderes circunscrevem-se à reapreciação de concretos meios probatórios relativamente a determinados pontos de facto impugnados (6) ], ou seja, tal impugnação, “ não pode transformar o tribunal de segunda instância em tribunal de substituição total e pleno, anulando, de forma plena e absoluta, o julgamento que foi realizado por um tribunal a quem cabe, em primeira e decisiva linha, fazer uma aproximação, imediata e próxima, das provas que lhe são presentes “,  antes incumbe tão só ao ad quem proceder ao julgamento da decisão de facto por forma a corrigir erros de julgamento patentes nos tribunais de 1.ª instância, mas dentro de limites que não podem exacerbar ou expandir-se para além do que a lei comina.” (7)
Daí que, e em consonância com o acabado de aduzir, aquando da formação da convicção pelo ad quem, importante é não esquecer que, se é certo que o princípio da imediação não pode constituir obstáculo à efectivação do recurso da matéria de facto, a pretexto de, na respectiva decisão, intervirem elementos não racionalmente explicáveis (8), a verdade é que [ o que ninguém ousa questionar ] muito do apreendido pelo Julgador da primeira instância nunca chega - porque não é gravado ou registado - ao ad quem, sempre existindo inúmeros factores difíceis de concretizar ou verbalizar e que são importantes e decisivos em sede de formação da convicção, e , consequentemente,  no âmbito do julgamento da impugnação da decisão de facto, há-de - compreensivelmente – o Tribunal da Relação evitar a introdução de alterações quando não lhe seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de um efectivo erro de apreciação da prova relativamente aos concretos pontos de facto impugnados. (9)
Ora, porque para nós, e não obstante a conjugação/valoração de toda a prova produzida, a verdade é que não se nos “assalta” um qualquer estado de dúvida susceptível de lançar mão do artº 414º, do CPC,  e  ,porque não nos permite também a prova escalpelizada e pela apelante invocada, concluir, com a necessária segurança, pela existência de um efectivo erro de apreciação da prova relativamente aos 3 concretos pontos de facto impugnados e ora em aferição, inevitável se mostra a improcedência da apelação no tocante à impugnação da decisão de facto dirigida pela apelante/seguradora para os itens 2.21, 2.22 e 2.23, todos da motivação de facto do presente Acórdão.
Ou seja, a matéria de facto provada é, no tocante à verificação do sinistro, aquela que o tribunal de primeira instância fixou.
                                                 *
3.2.- Se devem ser alteradas as respostas dadas ( como integrando factualidade não provada ) pelo tribunal a quo à matéria de facto vertida nos itens  2.70  a  2.74.
Todos os itens de facto ora em apreciação [ pontos de facto correspondentes aos itens  2.70  a  2.74. ]  , quer pelas razões já expostas no item 3.1 do presente Ac. a propósito da improcedência da impugnação da apelante dirigida para os factos 2.21 a 2.23, mas , sobretudo por integrarem meros juízos conclusivos , uns [ os itens 270 a 2.72 ], e simples impugnação motivada e meros factos instrumentais, outros [ os itens 2.73 e 2.74 ], não são de todo merecedores de julgamento da parte deste tribunal.
É que, além de as “conclusões” se mostrarem infirmadas pelas respostas aos itens de facto 2.21 a 2.23, também os factos instrumentais dos itens 2.73 e 2.74, mostram-se em rigor destituídos de qualquer utilidade em face das respostas positivas conferidas aos factos principais relacionados com a  verificação do sinistro.
Logo, também a impugnação dirigida para os pontos de facto dos itens  2.70  a  2.74.,improcede.
                                                    *
3.3.- Se devem ser alteradas as respostas dadas ( como integrando factualidade não provada ) pelo tribunal a quo à matéria de facto vertida nos itens  2.63 a 2.67.
Tendo todos os itens de facto ora em aferição [ 2.63 a 2.67 ]sido objecto de respostas negativas [ de Não Provado ], defende a Seguradora apelante que todos eles mereciam terem sido julgados de forma diversa [ como PROVADOS ], sendo que, ademais, e tendo o tribunal a quo julgado PROVADA toda a factualidade inserida nos itens de facto nºs 2.40 a 2.47, não se compreende que tenha enveredado por respostas negativas, todas elas de resto em manifesta contradição com as conferidas aos aludidos itens 2.40 a 2.47.
A ancorar a impugnação da decisão de facto, nesta parte, invoca assim e fundamentadamente a apelante uma contradição existente entre julgamentos.
Ocorre que, a invocada contradição, não existe de todo, sendo apenas aparente e decorrente de uma leitura menos atenta da sentença apelada na parte em que integra a mesma a fundamentação a que alude o nº 4, do artº 607º, do CPC.
Vejamos.
Explica a Exmª Juiz a quo, na sentença apelada, que ouvida a testemunha apresentada pelo Autor, o João …., consultor de seguros e que trabalha para a Ré, reconheceu que foi ele que tratou da negociação do seguro da viatura sinistrada para o Autor, tendo preenchido por si a proposta de seguro que serviu de base ao seguro.
Ainda segundo a Exmª Juiz a quo, reconheceu a testemunha João ….. que aquando da celebração do seguro do veículo XD, tinha perfeito conhecimento que o Autor havia tido um outro acidente com um diferente veículo, sendo que o Autor nunca lhe omitiu tal informação, antes a facultou.
Porém, porque o acidente referido ocorrera com um veículo diferente do que iria ser objecto do contrato de seguro dos autos, disse a testemunha João …. que considerou então que não se justificava informar a seguradora da existência do mencionado acidente, tendo assim preenchido ( a própria testemunha, que não o autor ) o documento que consubstancia a proposta de seguro sem nele apor uma tal menção relacionada com a existência de um acidente anterior.
Ou seja, porque no entender do tribunal a quo, foi a testemunha João …. absolutamente clara no sentido de que o Autor não teve qualquer intervenção directa na elaboração da proposta de seguro, e relativamente aos pontos de facto nºs 2.63 a 2.67., nenhuma prova consistente foi produzida, daí a ratio das respostas negativas conferidas aos referidos itens de facto, isto é, existindo é verdade uma informação errada e não verdadeira reportada à inexistência de um sinistro/acidente anterior ( cfr. conjugação dos itens 243 e  2.47 ), não podia porém a mesma ser imputada – dolosamente – ao autor ( cfr. conjugação dos itens 2.63 e 2.66 ), não se justificando assim considerar PROVADO que “ A Ré foi induzida em erro pelo tomador do seguro através do mediador “.
Aqui chegados, em face do acabado de expor, e analisando com atenção e detalhe o conteúdo das respostas conferidas aos pontos de facto nºs 2.40 a 2.47,  e nºs 2.63 a 2.67, difícil não é assim reconhecer que não existe entre as mesmas uma qualquer e efectiva contradição, antes têm as mesmas por objecto realidades diversas, perfeitamente compatíveis, ou seja, existindo é verdade a ocultação de concreta realidade à Ré Seguradora em sede de aferição e  apreciação do risco , não era a mesma  ( a ocultação ) “ imputável” ao tomador do seguro [ e daí a ratio das respostas negativas ao perguntado nos pontos de fato nºs 2.63 e 2.66 ].
Em suma, impondo-se concluir, e em razão de tudo o supra exposto, temos assim como inevitável a improcedência in totum da impugnação da decisão proferida pelo a quo e relativa à matéria de facto, ou seja, a factualidade a atender, em sede de julgamento do mérito da apelação interposta, é forçosamente a fixada pelo tribunal a quo em sede de sentença.
                                                       *
4.- Motivação de Direito
4.1. - Se deve a sentença apelada ser revogada, sendo substituída por decisão diversa e que absolva a Ré  do pedido do Autor/apelado , sendo assim a acção julgada improcedente.
A justificar a impetrada alteração do julgado, e numa primeira fase, serve-se a apelante Seguradora da faculdade da impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, máxime em relação aos pontos de facto que integram a factualidade que “ comprova”  a verificação do acidente de viação.
Na verdade, no essencial, invocando a recorrente que a improcedência da acção se justificava desde logo em face de a factualidade alegada e alusiva à ocorrência do acidente não se ter provado,  forçoso era, para a alteração do julgado, que os factos impugnados [ os correspondentes aos itens 2.21, 2.22 e 2.23 ] e julgados “provados” , fossem todos eles reconduzidos ao rol dos factos não provados .
Ora, porque em razão dos fundamentos que constam do item 3.1 do presente Ac., decidiu-se pela total impertinência de se introduzirem quaisquer modificações/alterações na decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo e no tocante aos itens 2.21, 2.22 e 2.23 , como que inevitável se mostra, assim, a improcedência da apelação com fundamento na ausência de prova – a cargo do apelado - dos factos constitutivos do direito .
Já num segundo momento, e outrossim para impetrar a não  confirmação do julgado, vem a apelante seguradora invocar que, em face da factualidade provada e com base nas alterações a introduzir – pelo ad quem - na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, importava considerar como provado o facto extintivo do direito invocado pelo autor, a saber, a  excepção atinente à invalidade do contrato de seguro.
Porém, porque também na referida parte nenhumas alterações  introduziu este tribunal de recurso na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, resta de seguida aferir se, ainda assim [ ou seja, com base na factualidade que o próprio tribunal a quo fixou ], não deveria o tribunal a quo ter decidido de forma diversa a questão relacionada com a invalidade do contrato de seguro.
Ora, a fundamentar a improcedência da referida excepção peremptória, recorda-se,  discreteriou o tribunal a quo , em parte, do seguinte modo :
“(…)
A Ré veio invocar a título de excepção peremptória a nulidade do contrato de seguro celebrado com o Autor como facto impeditivo do direito invocado pelo mesmo, vício de que cumpre previamente aferir uma vez que no caso de existência de vício de vontade ficaria prejudicaria a decisão sobre a restantes questões.
(…)
Neste aspecto, e para o que ora importa dispõe desde logo o artigo 24.° da Lei acima citada reguladora do contrato de seguro, norma com a epígrafe; " Declaração inicial do risco" que;
"1 - O tomador do seguro ou o segurado está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pelo segurador.
2 - O disposto no número anterior é igualmente aplicável a circunstâncias cuja menção não seja solicitada em questionário eventualmente fornecido pelo segurador para o efeito.”
(…)
Do artigo 25.° seguinte com a epígrafe: "Omissões ou inexactidões dolosas" decorre que ;
 "1 - Em caso de incumprimento doloso do dever referido no n.° 1 do artigo anterior, o contrato é anulável mediante declaração enviada pelo segurador ao tomador do seguro.
2 - Não tendo ocorrido sinistro, a declaração referida no número anterior deve ser enviada no prazo de três meses a contar do conhecimento daquele incumprimento.
3 - O segurador não está obrigado a cobrir o sinistro que ocorra antes de ter tido conhecimento do incumprimento doloso referido no n.° 1 ou no decurso do prazo previsto no número anterior, seguindo-se o regime geral da anulabilidade.
(…)
Por sua vez decorre do artigo 26.° do mesmo diploma legal norma com a epígrafe" Omissões ou inexactidões negligentes;
"1 - Em caso de incumprimento com negligência do dever referido no n.° 1 do artigo 24.°, o segurador pode, mediante declaração a enviar ao tomador do seguro, no prazo de três meses a contar do seu conhecimento:
a) Propor uma alteração do contrato, fixando um prazo, não inferior a 14 dias, para o envio da aceitação ou, caso a admita, da contraproposta;
b) Fazer cessar o contrato, demonstrando que, em caso algum, celebra contratos para a cobertura de riscos relacionados com o facto omitido ou declarado inexactamente.
2 - O contrato cessa os seus efeitos 30 dias após o envio da declaração de cessação ou 20 dias após a recepção pelo tomador do seguro da proposta de alteração, caso este nada responda ou a rejeite.
3 - No caso referido no número anterior, o prémio é devolvido pro rata temporis atendendo à cobertura havida.
4 - Se, antes da cessação ou da alteração do contrato, ocorrer um sinistro cuja verificação ou consequências tenham sido influenciadas por facto relativamente ao qual tenha havido omissões ou inexactidões negligentes:
a) O segurador cobre o sinistro na proporção da diferença entre o prémio pago e o prémio que seria devido, caso, aquando da celebração do contrato, tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente;
b) O segurador, demonstrando que, em caso algum, teria celebrado o contrato se tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente, não cobre o sinistro e fica apenas vinculado à devolução do prémio.
Reportam-se os mencionado normativos, por um lado, à declaração inexacta de factos ou circunstâncias conhecidas pelo segurado ou pelo próprio tomador do seguro, ou seja, a informação inexacta sobre esses factos ou circunstâncias e por outro lado, à reticência consubstanciada na omissão ou ocultação de uns ou de outras sendo ainda que tais factos ou omissões podem ser praticadas por dolo ou negligencia sendo diferentes as consequências como acima vimos.
(…)
No caso que ora nos importa cumpre ainda atentar que decorre ainda do disposto do artigo 28° da LCS , norma com a epígrafe: "regime comum" que: "Sem prejuízo da aplicação das regras contidas no presente regime, ao contrato de seguro celebrado com a intervenção de um mediador de seguros é aplicável o regime jurídico de acesso e de exercício da actividade de mediação de seguros.
Do artigo 29.° do mesmo diploma legal decorre ainda que: " Quando o contrato de seguro seja celebrado com intervenção de um mediador de seguros, aos deveres de informação constantes da secção ii do presente capítulo acrescem os deveres de informação específicos estabelecidos no regime jurídico de acesso e de exercício da actividade de mediação de seguros ".
Por sua vez do artigo 31º da mesmo diploma legal com a epigrafe" Comunicações através de mediador de seguros" resulta que:
"1 - Quando o mediador de seguros actue em nome e com poderes de representação do tomador do seguro, as comunicações, a prestação de informações e a entrega de documentos ao segurador, ou pelo segurador ao mediador, produzem efeitos como se fossem realizadas pelo tomador do segurado ou perante este, salvo indicação sua em contrário.
2 - Quando o mediador de seguros actue em nome e com poderes de representação do segurador, os mesmos actos realizados pelo tomador do seguro, ou a ele dirigidos pelo mediador, produzem efeitos relativamente ao segurador como se fossem por si ou perante si directamente realizados."
Face à factualidade acima dada como provada e que acima consta, não há dúvidas que o Autor através do mediador que teve intervenção no contrato celebrado com a Ré em causa, foram omitidas circunstâncias que conhecia e razoavelmente devia ter por significativas para a apreciação do risco por parte da seguradora.
Ora no caso o mediador de seguros aquando da elaboração do documento que consubstancia a proposta do contrato de seguro do Autor com a Ré omitiu efectivamente a informação na proposta de seguro de existência de diferente sinistro por parte do Autor em 2014, sinistro do qual resultou perda total.
Todavia tendo em conta a factualidade que resultou provada e a que não se provou não se nos afigura que tal omissão por parte do mediador que preencheu a proposta de seguro da qual como acima vimos não consta qualquer assinatura do Autor ( fls 80) se possa considerar como sendo imputável ao mesmo Autor a titulo de omissão dolosa por parte do mesmo Autor, não obstante tal facto ( existência de sinistro anterior do qual resultou perda total) ser susceptível de influenciar a Ré na decisão de contratar a nível da definição das condições contratuais, e influenciar a decisão tomada pela Ré quanto à avaliação de risco ao contratar com o Autor.
E porque não se mostra possível nos termos da factualidade imputar tal omissão ao Autor a título de omissão dolosa há que considerar que no caso não se mostram assim reunidos os pressupostos de que o artigo 25° do DL n° 72/2008, de 16 de Abril, faz depender a anulabilidade do contrato de seguro.
E estarão no caso em concreto preenchidos os pressupostos previstos no artigo 26° do mesmo diploma legal ?
Do mesmo modo afigura-se-nos que a resposta terá que ser negativa.
Na verdade decorre do disposto no artigo 26°, n° 3 da LCS norma que já atrás citada aplicável no caso previsto no artigo 24° mas para omissões ou declarações inexactas negligentes que se mesmo antes da cessação ou da alteração do contrato, ocorrer um sinistro cuja verificação ou consequências tenham sido influenciadas por facto relativamente ao qual tenha havido omissões ou inexactidões negligentes:
a) O segurador cobre o sinistro na proporção da diferença entre o prémio pago e o prémio que seria devido, caso, aquando da celebração do contrato, tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente;
b) O segurador, demonstrando que, em caso algum, teria celebrado o contrato se tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente, não cobre o sinistro e fica apenas vinculado à devolução do prémio.
No caso dos autos a Ré ( pois a esta cabe o ónus de prova dos factos, neste aspecto de acordo com o disposto no artigo 342°, n° 2 do Código Civil) não alegou sequer qual a diferença entre o prémio pago e o prémio que seria devido pelo Autor, caso, aquando da celebração do contrato de seguro tivesse tido conhecimento da existência de acidente anterior como facto que foi omitido pelo mediador na proposta de seguro, sendo que não resultou provado ao invés do que alegou que em caso algum teria celebrado o contrato dos autos se tivesse conhecido o facto que lhe foi omitido.
Por exposto nesta parte não assiste razão à Ré havendo que considerar o contrato de seguro em causa nestes autos celebrado com o Autor válido e eficaz.
Assim sendo julga-se improcedente a questão da excepção peremptória de nulidade do suscitada pela Ré.
Aqui chegados, e percebida com “detalhe” quais os fundamentos que conduziram ao julgamento negativo da procedência da excepção peremptória da invalidade do contrato de seguro outorgado entre apelante e apelada,  e com os quais não concorda a recorrente Seguradora, temos para nós que pelo menos no tocante à decidida impertinência – em face da factualidade provada, claro está – de se verificar a previsão do nº1, do artº 25º, do REGIME JURÍDICO DO CONTRATO DE SEGURO [ aprovado pelo DL n.º 72/2008, de 16 de Abril ] , não é a sentença apelada susceptível de qualquer reparo.
Na verdade, sendo pacífico que existindo uma omissão dolosa determinante da celebração do contrato de seguro, assiste à seguradora o direito de opor ao segurado a  anulabilidade do contrato, nos termos do nº 1 do artigo 25º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, certo é que, porque em causa está uma situação de particularização do regime da anulabilidade do erro causado por dolo, previsto em geral no artigo 254º do Código Civil (10), importa atentar que nos termos do nº 1, do artº 253º, do mesmo diploma legal, « [e]ntende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante» .
Ou seja, tal como ensina o Prof. Menezes Cordeiro (11), consubstancia o dolo uma espécie agravada de erro,  ou melhor , um erro provocado.
Dito de uma outra forma e no que à modalidade de culpa mais gravosa concerne ( o dolo ), e tal como o vem considerando alguma doutrina (12) , necessário é que para efeitos de preenchimento do tatbstand do artº 25º,nº1, não se fique pelo mero dolo-modalidade de culpa, antes exigível é a prova do “dolus malus”, vício da vontade previsto no artº 253º, do CCivil.
Em rigor, portanto, regula o artº 25º, do RJCS, a violação dolosa do dever pré-contratual de informação a cargo do segurado ou tomador do seguro e no que ao risco a segurar concerne,  e tendo a mesma desencadeado uma declaração negocial do segurador alicerçada em erro causado pelo dolo . (13)
Ora, respeitando-se o entendimento contrário da Ré apelante, a verdade é que, por si só, não “chega” a factualidade provada nos itens  nºs 2.40 a 2.47,  para se considerar como verificada a previsão do nº1, do artº 25º, do RJCS , e , sobretudo, quando os itens de facto correspondentes aos nºs  2.63  e 2.66 acabaram por merecer  respostas NEGATIVAS.
É que, no essencial e em rigor, não decorre da apontada factualidade que o tomador do seguro agiu dolosamente,  querendo conscientemente a violação do dever de declaração inicial do risco e a indução em erro da seguradora.
Já relativamente à viabilidade/pertinência  de a factualidade provada poder/dever integrar a previsão do nº 4 , alínea b),  do artº 26º, do RJCS [ Omissões ou inexactidões negligentes , ou situações  em que o Tomador do seguro/Segurado deve ser censurado, pois não agiu com o cuidado e a diligência que devia, mas ainda assim não agiu dolosamente, com o intuito de induzir o Segurador em erro, querendo ou não, obter com isso uma vantagem (14) ], importa antes de mais deixar claro que, para o referido efeito,  e quando antes ainda da cessação do contrato vem a ocorrer um sinistro, importa a alegação e a prova, a cargo da Seguradora [ cfr. Artº 342º,nº 2, do CC ], que :
a) o sinistro se verificou e/ou as suas consequências foram influenciadas por facto relativamente ao qual tenha havido omissão ou inexactidão negligentes;
b) O segurador demonstre que, em caso algum, teria celebrado o contrato se tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente.
Ou seja, claro é agora o nº 4, do artº 26º do RJCS, em exigir , para efeitos de reconhecimento do direito potestativo de invocar a anulabilidade do contrato por parte do Segurador, e com fundamento em Omissões ou inexactidões negligentes [ ao contrário do que sucede com as Omissões ou inexactidões dolosas ] do segurado aquando da Declaração inicial do risco, a necessidade de alegar e provar/demonstrar a Seguradora que existe um nexo de causalidade entre o facto omitido e o sinistro para se aferir da  relevância  da inexactidão ou reticência  negligentes .
Ora, relativamente ao pressuposto supra referido sob a alínea b) [ a demonstração pela seguradora de que, em caso algum, teria celebrado o contrato se tivesse conhecido o facto omitido ou declarado inexactamente ], e ao contrário do entendimento do tribunal a quo, temos para nós que o mesmo se mostra comprovado.
Na verdade,  estando provado que :
2.45.- Algumas seguradoras reservam às respectivas direcções técnicas, a aceitação de seguros com a chamada cobertura de danos próprios, quando os segurados e/ou condutores habituais têm sinistralidade;
2.46. - É o caso da Ré, que, de acordo com as suas "Normas e Limites de Aceitação" de seguros do ramo automóvel, não aceita a cobertura de danos próprios nas situações de sinistralidade do proponente, agravando as restantes coberturas, no caso de as aceitar,
Não se vê como não considerar provado que, caso a Ré seguradora tivesse tido conhecimento de que o Autor, tomador do seguro, teve um sinistro grave com o veículo 00-00-ZC, BMW 730D, em 2014.11.22, seguro na Liberty, e de que resultou perda total, não teria celebrado o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel identificado nos itens de facto nºs 2.3 a 2.7.
Porém, já o pressuposto supra referido sob a alínea a) , a saber, a existência de  um nexo de causalidade entre o facto omitido [ a existência de um sinistro grave com um veículo e em 2014.11.22 ] e o sinistro  dos autos e ocorrido a 18-09-2015, não se mostra de todo comprovado e alicerçado em factualidade subjacente pertinente.
Logo, ainda que com fundamento diverso do invocado pelo tribunal a quo, bem andou a primeira instância em julgar improcedente a excepção peremptória de nulidade do contrato de seguro suscitada pela Ré.
Em conclusão, a apelação da Ré seguradora improcede in totum, impondo-se a confirmação da sentença recorrida .
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5.- Sumariando  ( cfr. nº 7, do artº 663º, do CPC).
5.1. - O tomador do seguro está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para apreciação do risco pelo segurador, ainda que as mesmas não sejam solicitadas em questionário fornecido pelo segurador ;
5.2.- A anulabilidade do contrato de seguro prevista no art. 26º, nºs  1 e 4, do RJCS , e ao contrário do que ocorre em sede de Omissões ou inexactidões dolosas, exige a verificação de um nexo de causalidade entre as omissões ou inexactidões negligentes e o sinistro verificado ou consequências do mesmo.
                                                 *
6. -  Decisão
Termos em que,
acordam os Juízes na 6 tª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, em , julgando a apelação de B, totalmente improcedente:
6.1.-   Não alterar  a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo; 6.2.-  Manter a sentença apelada no tocante ao respectivo comando decisório.
Custas da apelação pela apelante.
                                                    ***
(1) Cfr. Alberto dos Reis, in CPC anotado, IV Volume, pág.s 566 e segs.
(2) Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime”, Almedina, 2010 ,pág. 571.
(3) Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, in Prova Testemunhal, 2013, Almedina, págs. 363 e segs..
(4) Ac. de 18/9/2012, Proc. nº 7477/10.4TBBRG.G1, in www.dgsi.pt..
(5) Cfr. Ac. STJ de 04.11.1998, in BMJ nº 481º, pág. 265
(6) Cfr. António Santos Abrantes Geraldes , in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2010, 3ª Edição, pág. 309.
(7) Cfr. Ac. do STJ de 1/7/2014, Proc. nº 1825/09.7TBSTS.P1.S1, in www.dgsi.pt.
(8) Cfr. Ac. do STJ de 8/6/2011, Proc. nº 350/98.4TAOLH.S1, in www.dgsi.pt.
(9)    Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, ibidem, pág. 318.
(10) Cfr. Ac. do STJ de 29-06-2017, proferido no Proc. nº 225/14.1TBTND.C1.S1, e in www.dgsi.pt
(11) in Tratado de Direito Civil Português I, Parte Geral, Tomo I, pág. 550.
(12) Cfr. Joana Galvão Teles, in Deveres de informação das partes, Temas de Direito Dos Seguros, Almedina, pág. 382 e PEDRO ROMANO MARTINEZ, in Lei do Contrato de Seguro Anotada, Almedina, 2ª Edição, pág. 161.
(13) Cfr. Joana Galvão Teles, ibidem, pág. 382.
(14) Cfr. Vanessa Louro,in Declaração Inicial do Risco no contrato de seguro: Análise do regime jurídico e breve comentário à jurisprudência recente dos Tribunais Superiores, in Dissertação de mestrado - versão revista e adaptada - apresentada à Faculdade de Direito da Universidade do Porto, 2015, disponível em https://www.cije.up.pt/download-file/1463
                                                   ***
LISBOA, 11 /10/2018
                                                                                                        António Manuel Fernandes dos Santos  ( O Relator)

Eduardo Petersen Silva ( 1º Adjunto)

Cristina Isabel Ferreira Neves ( 2ª Adjunta)