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CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
CASSAÇÃO DA LICENÇA DE CONDUÇÃO
PRISÃO
REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA
Sumário
A medida de segurança de cassação do título de condução, no âmbito da prática de crime de condução sob o efeito do álcool, deve ser perspetivada em termos de proporcionalidade com o regime de cassação pela prática de contraordenações, especialmente previsto no Código da Estrada. Se nos termos do disposto no artigo referido artigo 148º do CE, há lugar à cassação da licença de condução sempre que se encontrem subtraídos todos os pontos ao condutor, o que implica que o seja à terceira condenação por contraordenação muito grave que, no caso da condução sob efeito de álcool, ocorre sempre que o grau de alcoolemia seja superior a 0,80 g/l e inferior a 1,2 g/l, entende-se que estando em causa a reiteração da conduta por sete vezes, três das quais nos últimos três anos, tal não pode deixar se ser considerado inaptidão para a condução de veículo com motor, para os efeitos do disposto no artº 101º/1 e 2, do CP Tendo em conta que, por outro lado, é indivíduo trabalhador, familiar e socialmente inserido, confessou os factos e não lhe são conhecidos outros antecedentes criminais, a aplicação da medida de segurança de cassação conjugada com a pena de seis meses de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, autorizando-se as saídas necessárias para trabalhar cojugando com a medida de segurança de cassação do título de condução mostram-se adequadas no caso concreto de condenação por condução com álcool já pela 7ª vez.
Texto Integral
Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal:
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I – Relatório:
Em processo sumário, o arguido N..., casado, soldador, filho de JG... e de MC..., natural da freguesia e concelho da Ribeira Brava, onde nasceu em 17/01/1977, e residente na ..., no ..., naquela freguesia e concelho, foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292°/1, do Código Penal, na pena de nove meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, autorizando-se as saídas necessárias para trabalhar.
Mais foi decretada a medida de segurança de cassação do título de condução do arguido, pelo período de quatro anos, período durante o qual não lhe pode ser concedido novo título de condução de veículos com motor de qualquer categoria.
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O arguido recorreu, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem: «1 - O presente recurso versa matéria de direito. 2- O recorrente não se conforma com o douto acórdão que o condenou na pena de 9 meses de prisão, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez , p.p. pelo artigo 292, n° 1 do C.P. e na medida de segurança de cassação do título de condução do arguido pelo período de 4 anos . 3- Dá-se por reproduzidos as condições pessoais do recorrente. 4- Defende-se que a pena aplicada não é proporcional à culpa e gravidade dos factos praticados, sendo que atendendo a integração social e profissional do arguido bem como as suas fracas condições económicas e do mesmo ser o suporte familiar do seu agregado familiar e ter demostrado arrependimento através da confissão dos factos. 8- A pena de 9 meses de prisão aplicada ao recorrente é deveras exagerada e desproporcional violando os princípios consagrados no artigo 70 e 71 do C.P. 9- Não decorre do acórdão que exista ineptidão do recorrente para a condução de veículos automóveis ou até que tenha ocorrido gravidade dos factos até porque da atuação do arguido não resultaram danos físicos ou materiais para terceiros ou para ele próprio, apesar da existência de antecedentes criminais pela prática do mesmo tipo de ilícito. 10- Não se verificando aqueles indícios deve ser aplicada a medida de proibição de conduzir do artigo 69 n° 1 al. a) do C.P. . 11- Atento a idade do arguido e o período aplicado de 4 anos de cassação de titulo de condução aplicada ao recorrente é previsível que o mesmo fique impossibilitado no futuro de obter um novo titulo de condução de veículos automóveis, o que iria causar-lhe graves prejuízos e danos na sua integração profissional dado que necessita da carta de condução para exercer em pleno a sua atividade profissional. 12- A determinação da medida concreta da pena de ser feita em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção geral e especial das penas. 13- A medida da pena não pode ultrapassar a medida da culpa. 14- A atuação do recorrente parece-nos adequada uma pena de prisão que não ultrapasse os 6 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos e controlo à distância, com autorização das saídas necessárias para trabalhar. 15- Devendo ser substituída a medida de segurança de cassação do título de condução do arguido pela inibição de conduzir veículos motorizados nos termos previstos no artigo 69 n° 1 al. a) do C.P. ou se assim não se entender que a medida segurança de cassação do título de condução do arguido não ultrapasse um ano, por se revelar adequado e proporcional a atuação do recorrente.».
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Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações nos termos que se transcrevem: «1- O douto Tribunal condenou o Arguido N..., pela prática, em autoria material, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.°, n.°l, do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos à distância, autorizando-se as saídas necessárias para trabalhar. 2- Decretou a medida de segurança de cassação do título de condução do arguido pelo período de 4 anos, período durante o qual não lhe pode ser concedido novo título de condução de veículos com motor de qualquer categoria; 3- O Arguido não se conformando recorreu, pugnando, pela redução da pena de prisão para seis meses; 4 - Pela aplicação de pena acessória de proibição de conduzir ou, em caso de confirmação de condenação em medida de segurança, pela redução pelo período de um ano. 5- O arguido praticou seis crimes contra a segurança rodoviária, 6 crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, e um de condução perigosa de veículo rodoviário, respectivamente, em 3 de Outubro de 2003, 8 de Agosto de 2006, 6 de Novembro de 2012, 20 de Julho de 2013, 5 de Maio de 2016, 23 de Dezembro de 2017 e, o dos presentes autos, em 24 de Junho de 2018. 6- O arguido foi condenado por sentença de 3 de Abril de 2014, pela prática, em 20 de Julho de 2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 2 meses de prisão, substituída por 80 dias de multa, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 1 ano; 7 - Foi condenado, por sentença de 19 de Maio de 2016, pela prática, em 5 de Maio de 2016, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 16 meses; 8 - Foi condenado, por sentença de 8 de Janeiro de 2018, pela prática, em 23 de Dezembro de 2017, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 7 meses. 9- A pena de prisão aplicada ao arguido, foi por uma vez substituída por pena de multa, e por duas vezes suspensa na sua execução, não demoveram o arguido da prática de novos crimes e de demonstrara que o prognóstico favorável deveria ter-se por infirmado. 10- O arguido foi já condenado em penas de seis e sete meses de prisão pelo que, a pena de nove meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, salvo todo o devido respeito, não nos merece reparo. 11- O arguido foi já condenado em penas acessórias de proibição de conduzir, respectivamente, em 6 meses, 6 meses, 8 meses, 1 ano, 16 meses, 7 meses. 12- O douto Tribunal fundamentou a aplicação da medida de segurança nos termos do artigo 101° do CP, considerando que a sexta condenação por crime de condução de veículo em estado de embriaguez, sustentavam um facto susceptível de configurar a inaptidão para o exercício da condução. 13 - Para tal, ponderou, ainda, e conjugadamente, a personalidade do arguido, a falta de consciência crítica para a sua conduta, no fundado receio de cometimento de novos crimes rodoviários e todos os factos ilícitos já averbados ao seu registo criminal. 14 - A ser concedido provimento ao recurso do arguido condenado, pugnar-se-ia, pela aplicação de pena acessória por período superior a 16 meses — 20 meses, aplicada na última condenação, e não conforme o mesmo, uma redução sem fundamento, para o período de um ano. 15 - A douta sentença aplicou devida e criteriosamente os critérios de escolha e determinação concreta da medida da pena, considerando ainda a prevenção geral e especial, bem como a perigosidade, porquanto está em causa a aplicação da medida concreta da pena, o cumprimento das regras de circulação rodoviária com a tutela da protecção da vida, da integridade física e de bens patrimoniais dos utentes das estradas nacionais e regionais. 16 - Contrariamente ao pretendido pelo Arguido, parece-nos, que o douto Tribunal não violou o disposto nos artigos 70.°, 71.°, 40.°, 69.°, n.° 1, alínea a), e 101.°, n°s 1 e 2, do Código Penal. 17 - Pelo exposto, com a devida vénia, parece-nos, que a douta sentença recorrida deverá ser mantida nos seus termos, não se aderindo às considerações tecidas pelo arguido, devendo o presente recurso ser julgado improcedente».
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Nesta instância, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer em concordância com a contra-motivação.
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II- Questões a decidir:
Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]).
As questões colocadas pelo recorrente, arguido, são:
- Excesso da medida concreta da pena de prisão;
- Desajustamento da medida de segurança de cassação do título de conduzir.
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III- Fundamentação de facto: Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos:
1. No dia 24 de Junho de 2018, pelas 05.29 horas, o arguido conduzia o veículo automóvel da marca "Toyota”, modelo "Dyna 160”, com a matrícula ..-..-.., pela Via Expresso 3, na zona da Murteira, na freguesia e concelho da Ribeira Brava, quando foi submetido ao exame de detecção de álcool no sangue através do teste de pesquisa no ar expirado, por aparelho analisador qualitativo, que resultou positivo.
2. Seguidamente, o arguido foi submetido ao exame de quantificação da taxa de álcool no sangue, através do teste de pesquisa no ar expirado por aparelho analisador quantitativo, do qual resultou que o arguido conduziu com uma taxa de álcool no sangue de 1,63 g/l, correspondente à taxa de álcool no sangue registada de 1,72 g/l, deduzido o valor do erro máximo admissível.
3. Por o ter requerido, o arguido foi submetido à contraprova do exame de quantificação da taxa de álcool no sangue, através de teste no ar expirado, do qual resultou que conduziu com uma taxa de álcool no sangue de 1,78 g/l, correspondente à taxa de álcool no sangue registada de 1,88 g/l, deduzido o valor do erro máximo admissível.
4. A taxa de álcool no sangue apresentada resultou da ingestão voluntária de bebidas alcoólicas pelo arguido em momento anterior ao do início da condução.
5. O arguido sabia que a condução de veículo com ou sem motor na via pública por pessoa que seja portadora de uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l era e é proibida por lei e criminalmente punida.
6. O arguido representou como possível que, em resultado da ingestão de bebidas alcoólicas em momento anterior ao do início da condução, era portador de uma taxa de álcool no sangue não inferior a 1,2 g/l.
7. Não obstante, o arguido quis conduzir o mencionado veículo automóvel, nas circunstâncias acima descritas.
8. O arguido actuou sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei e criminalmente punida, e, ainda assim, não se coibiu de a adoptar.
9. O arguido foi condenado:
- Por sentença de 4 de Outubro de 2003, pela prática, em 3 de Outubro de 2003, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 100 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir por 6 meses;
- Por sentença de 5 de Fevereiro de 2009, pela prática, em 8 de Agosto de 2006, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, na pena de 150 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir por 6 meses;
- Por sentença de 6 de Novembro de 2012, pela prática, em 6 de Novembro de 2012, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 100 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir por 8 meses;
- Por sentença de 3 de Abril de 2014, pela prática, em 20 de Julho de 2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 2 meses de prisão, substituída por 80 dias de multa, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 1 ano.
- Por sentença de 19 de Maio de 2016, pela prática, em 5 de Maio de 2016, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 16 meses.
- Por sentença de 8 de Janeiro de 2018, pela prática, em 23 de Dezembro de 2017, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 7 meses.
10. O arguido vive em moradia unifamiliar, adquirida com recurso a empréstimo bancário, que vem pagando, com a esposa, doméstica, e dois filhos, com 17 e 15 anos de idade; trabalha por conta própria, auferindo rendimentos variáveis com essa actividade; frequentou o ensino básico e secundário.
*** Não há factos não provados.
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IV- Fundamentação probatória: O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos: «A convicção do tribunal quanto aos factos provados baseou-se na análise crítica e global da prova produzida, considerando-se as declarações do arguido e os documentos juntos aos autos. O arguido confessou, de modo livre, integral e sem reservas, os factos que lhe eram imputados. Depôs, com aparente sinceridade, sobre as suas condições pessoais e económicas. A convicção do tribunal funda-se, ainda, na análise dos talões expedidos pelos alcoolímetros de fls 4, dos certificados de verificação dos alcoolímetros, de fls 5 e 6, e do certificado de registo criminal do arguido, de fls ....»
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V- Fundamentos de direito:
A discordância que motiva este recurso é relativa à medida da pena de prisão em que o arguido foi condenado e à cassação da licença de condução.
Entende o recorrente que a pena de prisão deve ser menor, de 6 e não 9 meses, e que em vez da cassação deve ser condenado em proibição de conduzir, ao abrigo do disposto no artigo 69º/CP ou, quanto muito, numa cassação por período não superior a um ano.
A fundamentação exarada na sentença recorrida contem-se nos seguintes termos: «A protecção das expectativas sociais relativamente ao bem jurídico tutelado pela norma incriminadora foi posta em causa de forma que se reputa intolerável, pelo arguido. Na verdade, por um lado, estamos perante crime de comissão muito frequente nesta comarca. Por outro lado, trata-se de crime a que está associada uma elevada taxa de sinistralidade rodoviária, também na comarca (e em todo o país). Esperando, assim, a comunidade, postura severa do tribunal perante este tipo de ilícitos. Por outro lado, não é esperada a reintegração social do arguido, que já foi condenado pela prática de cinco crimes de condução de veículo em estado de embriaguez e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário. Tendo-lhe sido aplicadas penas de multa, de prisão substituída por multa, e de prisão suspensa na sua execução, com e sem obrigações, a última das quais cumpria ainda. Nenhuma delas servindo para afastar o arguido da sua conduta criminosa. Pelo que se opta pela pena de prisão. A determinação das medidas das penas, dentro dos limites abstractos acima referidos, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (art. 71°, n° 1 do Código Penal). São globalmente altas, como se viu supra, as exigências de prevenção geral e especial cabíveis ao caso concreto. É moderadamente elevado o grau de ilicitude dos factos que integram o crime, pois que o arguido conduz de madrugada, em hora de menos trânsito, ao volante de um automóvel e com uma taxa de álcool no sangue que se tem de considerar alta. É medianamente elevada a culpa do arguido pois que age com dolo eventual. A sua conduta anterior ao facto não é boa. Manifestou, nos factos, falta de preparação para manter conduta lícita, designadamente para conduzir sem estar intoxicado. A seu favor recenseia-se a confissão, embora sem relevo para a prova dos factos, e a circunstância de estar profissional e familiarmente inserido. Tendo em conta o circunstancialismo supra referido julga-se adequado fixar a pena de prisão aplicável ao crime em 9 meses. Não se vê como é que a substituição desta pena por outra possa prevenir, de modo adequado e suficiente, as finalidades da punição. Numa perspectiva de prevenção geral, dificilmente poderia a comunidade entender a concessão de mais uma oportunidade ao arguido. O qual, numa perspectiva de prevenção especial, se mostra incorrigível. Pelo que não se irá determinar a suspensão da execução da pena de prisão nem substituí-la por outra. Contudo, repete-se, o arguido é homem trabalhador, inserido na comunidade e com uma família que de si depende. Entendendo-se que a pena de prisão em que é condenado poderá ser, com vantagens evidentes para a sua ressocialização, executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, previsto no artigo 43° do Código Penal, na sua actual redacção. Regime de execução que permitirá a manutenção da actividade profissional do condenado (n° 3 do citado artigo). Assim se realizando, de modo adequado e suficiente, as finalidades da punição. O crime de condução em estado de embriaguez é um crime cometido com grave violação das regras da circulação rodoviária (vide, a propósito, o art. 146°, al. j) do Código da Estrada). Razão pela qual, por força do disposto no art. 69°, n° 1, al. a) do Código Penal haveria que aplicar ao arguido a pena acessória da proibição de conduzir veículos motorizados. Porém, a verdade é que o arguido já vai na sua sexta condenação pelo mesmo tipo de crime. Não demonstra juízo crítico adequado pela sua conduta. Pelo que, no caso vertente, a simples aplicação da pena acessória não realiza, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Dispõe o art. 101°, n° 1 do Código Penal que “em caso de condenação por crime praticado na condução de veículo a motor ou com ela relacionado, ou com grosseira violação dos deveres que a um condutor incumbem (...), o tribunal decreta a cassação do título de condução quando, em face do facto praticado e da personalidade do agente: a) Houver fundado receio de que possa vir a praticar outros factos da mesma espécie; ou b) Dever ser considerado inapto para a condução de veículo com motor." Sendo certo que o n° 2 do mesmo preceito, considera, na sua alínea c) a “condução de veículo em estado de embriaguez" como facto susceptível de revelar a inaptidão referida na alínea b) do número anterior. Ora, face ao que já foi dito quanto à personalidade do agente e a falta de consciência crítica da sua conduta, existe fundado receio que ele venha, novamente, a conduzir sob o efeito do álcool. Devendo, ademais, face ao seu percurso criminoso, ser considerado inapto para a condução de veículos com motor. Razões pelas quais se irá determinar a medida de segurança de cassação do seu título de condução e a interdição da concessão de novo título pelo período, que se reputa adequado, de 4 anos.».
Na verdade, o arguido, que conta com 42 anos de idade, vem sofrendo condenações penais por crimes de condução sob o efeito do álcool desde 2003, ou seja, desde os 27 anos de idade, tendo cometido seis crimes dessa natureza, em Outubro de 2003, Agosto de 2006, de Novembro de 2012, Julho de 2013, Maio de 2016 e Dezembro de 2017. Foi sucessivamente sancionado com penas de 100 dias de multa e proibição de conduzir por 6 meses, 150 dias de multa e proibição de conduzir por 6 meses, 100 dias de multa e proibição de conduzir por 8 meses, 2 meses de prisão, substituída por 80 dias de multa, e proibição de conduzir por 1 ano, 6 meses de prisão, suspensa na sua execução e de proibição de conduzir por 16 meses e 7 meses de prisão, suspensa na sua execução e proibição de conduzir por 7 meses.
Significa isto que esta é a sétima vez que é encontrado a conduzir sem habilitação legal e a terceira nos últimos três anos, sendo que as duas anteriores foram sancionadas com penas de prisão, suspensas na sua execução, que não foram suficientes para evitar a prática de novo crime.
Se as penas de prisão suspensas não servem para a prevenção da prática de novos crimes da mesma natureza, impõe-se, por necessidades prementes de prevenção especial, a aplicação de uma pena de prisão efectiva, facto que aliás o arguido não discute. Entende é que 9 meses é uma medida excessiva. E, neste ponto, concordamos.
É que, sendo a pena máxima aplicável a de um ano de prisão, e estendendo-se os seis crimes pelo período de 15 anos, afigura-se-nos excessiva uma condenação tão perto da pena máxima, quando se trata de um indivíduo trabalhador, familiar e socialmente inserido, que confessou os factos - o que tem implícito alguma forma de reconhecimento do mal do crime – e a quem não são conhecidos outros antecedentes criminais. Aliás, esta é a primeira pena efectiva de prisão imposta ao arguido e o bom senso impõe uma gradação sucessiva da gravidade da sanção, adequada à culpa demonstrada, cuja medida não pode ser excedida.
Além disso, e infelizmente, não se pode afirmar que esta é uma situação inusitadamente grave, que apenas se satisfaça com uma pena efectiva perto do máximo, quando é sabido que há graus de alcoolemia muito superiores e inveterados do crime que coleccionam condenações.
Cremos, pelo exposto, que a pena de seis meses de prisão, correspondente à pena média dentro da moldura legal, se afigura satisfatória para fins de prevenção especial, atenta a quantidade de álcool, a personalidade revelada pelo arguido, e as necessidades de prevenção geral e especial que se impõem.
No que concerne à questão da cassação do título de condução do arguido, pelo período de 4 anos, não podemos sufragar o entendimento do arguido de que essa cassação não se justifica, desde logo por uma questão de paralelismo com a cassação imposta pelo Código da Estrada, quando em causa está a prática de meras contra-ordenações.
Nos termos do artigo 121º/CE a cada condutor são atribuídos 12 pontos na sua carta de condução. Tais pontos são retirados ou acrescentados conforme haja, ou não, a prática de contra-ordenações e da respectiva natureza (artigo 148º/CE). Ora, nos termos do disposto no artigo referido artigo 148º, há lugar à cassação da licença de condução sempre que se encontrem subtraídos todos os pontos ao condutor, o que implica que o seja à terceira condenação por contra-ordenação muito grave que, no caso da condução sob efeito de álcool, ocorre sempre que o grau de alcoolemia seja superior a 0,80 g/l e inferior a 1,2 g/l.
Tal normativo entrou em vigor a 1/06/2016. Significa isto, aplicado ao caso dos autos, que esta é a segunda condenação por crime praticado no âmbito da vigência da cassação automática por prática de contra-ordenações, sendo que o arguido vem sendo advertido pelas diversas condenações penais para a necessidade de modificar a sua conduta estradal desde 2003.
Justifica-se, quanto a nós, a aplicação da medida de segurança de cassação, se bem que pelo período de ano e meio, atenta a moldura penal que o fixa entre um e cinco anos (artigos 101º/5 e 100º/2, do CP) e o facto de ser a primeira vez que a medida é aplicada ao recorrente.
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VI- Decisão:
Acorda-se, pois, concedendo parcial provimento ao recurso, em revogar a decisão recorrida e em condenar o arguido pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292°/1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, autorizando-se as saídas necessárias para trabalhar e em decretar a medida de segurança de cassação do título de condução do arguido, pelo período de dezoito meses, período durante o qual não lhe pode ser concedido novo título de condução de veículos com motor de qualquer categoria.
Sem custas
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Lisboa, 13/ 02/2019
Texto processado e integralmente revisto pela relatora.
Maria da Graça M. P. dos Santos Silva
A.Augusto Lourenço
[1] Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271. [2] Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995.