CONSÓRCIO
CESSAÇÃO DO CONTRATO
INDEMNIZAÇÃO
Sumário

· Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou coletivas, que exercem uma atividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição com um (ou mais) dos seguintes fins: a) realização de atos preparatórios de um determinado empreendimento ou de uma atividade contínua; b) execução de determinado empreendimento; c) fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; d) pesquisa ou exploração de recursos naturais; e/ou e) produção de bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio.
· O objeto imediato do contrato de consórcio não se reduz à realização de uma atividade ou à efetivação de uma contribuição, nem sequer à realização concertada de uma atividade ou à efetivação concertada de uma dada contribuição; o objeto imediato do consórcio é complexo e exige a realização concertada de uma atividade ou a efetivação concertada de contribuições para um dos mencionados fins.
· As atividades que o contrato de consórcio tem por objeto podem ser: i) contínuas ou reiteradas (fornecimento de bens a terceiros, pesquisa ou exploração de recursos naturais, produção de bens que possam ser repartidos em espécie entre os membros do consórcio); ou ii) atividades delimitadas pela consecução de um dado resultado (realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios, quer de uma atividade contínua quer de um determinado empreendimento, e execução de determinado empreendimento).
· No primeiro caso, por força do disposto no art. 11, n.º 2, da LCC, o consórcio extinguir-se-á decorridos dez anos sobre a data da sua celebração, sem prejuízo de eventuais prorrogações expressas, a menos que as partes tenham fixado ab initio prazo mais longo.
· No segundo caso, o consórcio extingue-se pela realização do seu objeto ou por este se tornar impossível, o que eventualmente sucederá num período de tempo superior a dez anos (são normas distintas, dirigidas a situações distintas).
· No contrato dos autos, as partes constituíram-se em consórcio para a promoção e realização concertada do conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento de certo prédio, tendo estipulado que o acordo duraria até ao final da execução desse conjunto de ações, que designaram por «empreendimento», pelo que o contrato não caducou pelo decurso do prazo de dez anos sobre a sua celebração.
· O contrato dos autos findou por declaração unilateral (a conformação ulterior da contraparte com a cessação decorreu da falta de confiança gerada pela posição da declarante, e não de uma vontade que, somada à declaração de cessação, possa constituir um acordo revogatório), e discricionária (sem justa causa), mas eficaz (pela impossibilidade de forçar a colaboração objeto do contrato).
· Perante a regra máxima de que pacta sunt servanda, cabia à parte que pôs fim à relação contratual alegar e provar factos suficientes à conclusão da licitude da cessação.
· À data da cessação do contrato, tinham decorrido mais de 12 anos sem um projeto aprovado ou sequer formalmente submetido; não se sabia quantos anos mais decorreriam até que fossem aprovados os projetos necessários à venda de lotes; nem quantos até à conclusão das ações necessárias à efetivação dos estudos projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio; tão pouco se previa quanto mais a demandada teria de despender, sabendo-se, porém, o muito que já tinha despendido e que pode não ter qualquer tipo de aproveitamento, face à nova posição da Câmara; o lucro, que era à partida incerto (o que as partes logo admitiram, conformando-se a demandante expressamente com a possibilidade de nada receber), passou a ser improvável.
O direito a uma indemnização não nasce da eventual ilicitude da cessação do contrato, mas da existência de danos (prejuízo causado ou benefício que se deixa de obter em consequência da lesão) e, no caso, os dados de facto não contemplam danos emergentes nem nos permitem concluir que, se a relação contratual não tivesse cessado, e se as partes tivessem continuado a executar os termos do contrato, haveria a final «lucro do consórcio» para distribuir pelas partes.

Texto Parcial

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
C. – Compra e Venda de Imóveis, Lda. e Ct. – Promoção Imobiliária, S.A., respetivamente demandante e demandada em processo arbitral que correu termos em Lisboa, notificadas da sentença proferida em 4 de janeiro de 2018, que julgou a ação parcialmente procedente, e com ela não se conformando, dela vieram ambas interpor recursos para a Relação de Lisboa.

A compreensão do litígio e do objeto dos recursos impõe que nos detenhamos sobre o historial dos autos.
Convenção de arbitragem, Tribunal Arbitral e seu regulamento
Em 8 de janeiro de 2003, as partes celebraram entre si um denominado contrato de consórcio no qual incluíram uma cláusula 12.ª que passamos a transcrever enfatizando, desde já, os aspetos relevantes para a apreciação dos recursos:
12.ª
1. Os diferendos que surjam entre a CT. e a C. na execução do contrato do consórcio serão discutidos no órgão de coordenação do Consórcio.
2. Se se mostrar impossível o acordo entre as partes, quer a CT. quer a C. poderão recorrer a arbitragem nos termos dos números seguintes.
3. O Tribunal será composto por três árbitros, competindo a cada uma das partes designar um árbitro e aos árbitros escolhidos pelas partes designar o terceiro, que presidirá.
4. O prazo para a decisão arbitral será de nove meses a contar da designação do terceiro árbitro.
5. O Tribunal julgará de acordo com o Direito constituído.
6. Competirá ao Tribunal fixar as regras de processo.
7. Os honorários dos árbitros e os custos administrativos da arbitragem serão os que resultarem da tabela do Centro de Arbitragem Comercial das Associações Comerciais de Lisboa e Porto, em vigor à data da arbitragem.

Em 2015, a C. impulsionou a constituição de tribunal arbitral que veio a ser constituído com sede em Lisboa, presidido pelo Prof. Doutor António Menezes Cordeiro e integrado também pelo Prof. Doutor Miguel Catela, indicado pela demandante, e pelo Bastonário Dr. José Miguel Júdice, indicado pela demandada.

Com data de 21 de dezembro de 2015, as partes e os três árbitros designados complementaram a convenção de arbitragem através de um Regulamento de Arbitragem, com o seguinte conteúdo:
Proémio
A — A parte Demandante e a parte Demandada assinaram, no dia 8 de janeiro de 2003, um denominado Contrato de Consórcio.
B — No âmbito deste contrato, surgiu um diferendo que não foi possível ultrapassar.
C — A parte Demandante dirigiu à parte Demandada, uma comunicação destinada a iniciar um procedimento arbitral, indicando um árbitro.
D — A parte Demandada indicou, também, um árbitro, tendo os dois árbitros designado um terceiro, que aceitou.
E — A convenção de arbitragem deve ser complementada, de modo a assegurar um processo arbitral justo, previsível e eficiente.
F — Todos os signatários consideram vantajoso proceder a essa complementação através do presente regulamento.
Cláusulas
1.ª
(Partes)
(…)
2.ª
(Árbitros)
(…)
3.ª
(Sede)
(…)
4.ª
(Secretariado)
(…)
5.ª
(Convenção de arbitragem)
6.ª
(Objeto do litígio)
O objeto do litígio é delimitado pela Petição Inicial, pela eventual Reconvenção da Demandada, pelas restantes peças processuais das partes e pelos seus desenvolvimentos.
7.ª
(Remissão)
1. No tocante aos princípios cogentes das arbitragens, à aceitação do encargo de árbitro, às suas independência e imparcialidade, a escusas, a recusas e a substituições, aos meios de prova admitidos e à contagem de prazos aplicam-se as regras deste Regulamento de Arbitragem e, subsidiariamente, a Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro.
2. Os casos omissos no presente Termo de Arbitragem e na Lei n.º 63/2011 deverão ser solucionados pelo Tribunal Arbitral de acordo com os princípios gerais de Direito processual estabelecidos no Código de Processo Civil.
8.ª
(Contagem dos prazos)
1. Todos os prazos fixados no Regulamento são contínuos.
2. Vale como data da prática do ato a da sua expedição pelos meios previstos no Regulamento.
3. A contagem do prazo inicia-se no dia útil seguinte àquele em que se considere praticado o ato de citação, notificações e comunicações, por qualquer dos meios previstos no Regulamento.
4. O prazo que termine em sábado, domingo ou feriado transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
9.ª
(Articulados)
(…)
9.ª
(Despacho preliminar)
(…)
10.ª
(Instrução)
(…)
11.ª
(Meios de prova e diligências complementares de prova)
1. São admitidos todos os meios de prova em Direito permitidos, sendo os representantes das Partes considerados para todos os efeitos como testemunha, tendo o Tribunal em relação a eles – como em relação a quaisquer outras testemunhas incluindo peritos – o direito pleno de livre apreciação da prova.
2. Os depoimentos são feitos por escrito.
3. Fixada, em definitivo, a instrução do processo, o Tribunal decide se há lugar a diligências probatórias complementares, requeridas ou não, pelas partes, definindo o seu âmbito e aponta os prazos úteis para as mesmas.
4. No prazo de 20 dias antes do início da audiência, cada parte indicará: (i) quais das testemunhas, partes ou peritos que tenham apresentado depoimento ou relatório pretende ouvir em audiência do Tribunal; e (ii) quais das testemunhas, partes ou peritos cujo depoimento ou relatório escrito a contraparte tenha apresentado pretende ouvir em audiência do Tribunal.
5. Se uma testemunha, parte ou perito não comparecer em audiência, tendo para isso sido solicitado por qualquer das partes, o seu depoimento ou parecer será livremente valorado pelo Tribunal, ponderando a impossibilidade de exercício do contraditório.
6. O facto de uma parte não requerer a comparência em audiência de uma testemunha, parte ou perito cujo depoimento tenha sido oferecido pela contraparte não significa que aceite o depoimento ou relatório apresentado.
7. O Tribunal poderá designar um ou mais assessores técnicos e/ou um ou mais peritos, se o entender necessário à boa solução do litígio, devendo estes últimos e os respetivos relatórios ser submetidos ao princípio do contraditório, fixando o tribunal o prazo para o exercício do mesmo.
12.ª
(Audiência)
1. Concluídas as diligências complementares de prova, se as houver, o Tribunal adota, ouvidas as Partes, o calendário para a audiência de julgamento.
2. O Tribunal pode, por iniciativa própria, ouvir os representantes das Partes e quaisquer terceiros.
3. A prova a produzir em audiência será limitada, incluindo as instâncias das testemunhas, parte e peritos apresentadas pela contraparte, terá uma duração a fixar pelo Tribunal, ouvidas as Partes.
4. Todos os depoimentos são gravados.
5. O Presidente dirige a audiência, assegurando sempre o contraditório, a igualdade entre as partes e a dignidade de todos os intervenientes.
13.ª
(Documentos)
(…)
14.ª
(Alegações)
(…)
15.ª
(Acórdão final)
O acórdão final é prolatado no prazo de 2 meses a contar do termo do prazo para as alegações, prorrogável por uma vez pelo prazo de mais 2 meses, observando-se o disposto na convenção de arbitragem, quanto ao Direito aplicável.
16.ª
(Honorários, encargos administrativos e despesas)
(…)
17.ª
(Pagamento)
(…)
18.ª
(Audiências, expediente e decisões interlocutórias)
(…)
19.ª
(Férias judiciais)
(…)
20.ª
(Notificações e requerimentos)
1. As notificações são feitas por correio eletrónico, dirigido aos Ilustres Mandatários das partes, com conhecimento aos árbitros, e aviso de leitura.
2. Os requerimentos, articulados, alegações e outros escritos apresentados pelas partes, bem como documentos que os acompanham, serão oferecidos por via eletrónica, dirigido ao Presidente, com conhecimento aos coárbitros e aos Ilustres Mandatários das partes e aviso de leitura, só remetendo a versão em papel quando o Tribunal assim o entender necessário e notificar, para o efeito, a parte respetiva.
3. O Presidente indica, por despacho, os endereços eletrónicos oficiais de todos os intervenientes, a observar na presente arbitragem.
4. Os documentos que as partes pretendam juntar que, por si só, excedam a capacidade de envio através de correio eletrónico, devem ser apresentados em suporte de CD-Rom, em cinco exemplares, destinando-se um a cada um dos árbitros, um ao mandatário da parte contrária e um outro para integração do original do processo:
a) Na sede do Tribunal Arbitral, valendo como data da prática do ato, a respetiva entrega;
b) Remessa pelo correio, sob registo, valendo como data da prática do ato processual a da efetivação do respetivo registo postal.
21.ª
(Dúvidas)
As dúvidas que surjam em execução deste Regulamento, bem como as adaptações que se mostrem necessárias, são decididas pelo Tribunal, ouvidas as partes.
22.ª
(Assinatura)
1. O presente regulamento é assinado pelas partes, pelos coárbitros e, em último lugar, pelo Presidente, que nele aporá a data da sua assinatura, com notificação imediata aos Ilustres Mandatários das partes.
2. Nessa mesma data, considera-se assinado o presente regulamento e instalado o Tribunal, iniciando-se a contagem dos prazos nele previstos.

Alegações e pretensões das partes – objeto do litígio na instância arbitral
Em março de 2016 foi apresentada a petição inicial na qual a demandante alega, muito resumidamente, que: em 3/01/2003, as sociedades S. e Ct. celebraram com as sociedades B.T. e C. um contrato de consórcio, relativo a um empreendimento imobiliário na Amadora, figurando a Ct. como promotora investidora e a C. como promotora imobiliária; a Ct., detida pela S., pertencente ao setor público, era a dona dos terrenos; a C., do grupo B.T., dispondo de larga experiência no campo da urbanização, forneceria o know how, a capacidade humana, a consultoria; a Ct. suportaria as despesas, repartindo-se os lucros nos termos da cláusula 9.ª do contrato. O contrato foi sendo executado até que, em 1 de junho de 2015, a Ct. invocou a cessação do contrato pelo decurso do prazo. Entende a demandante que não ocorreu a invocada caducidade, pelo que a declaração da demandada deve ser havida como uma resolução sem justa causa, o que a obriga a indemnizar os prejuízos havidos.
Termina pedindo que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência:
a) Declarada ilícita a declaração de caducidade do contrato de consórcio efetuada pela demandante por carta datada de 8 de abril de 2015;
b) Declarada a cessação do contrato de consórcio celebrado entre as partes em 8 de janeiro de 2003, por efeito de resolução sem justa causa operada por via da declaração efetuada pela Ct. por cartas datadas de 8 de abril e 24 de junho de 2015;
c) Declarado o incumprimento do contrato de consórcio decorrente da fusão por incorporação da S., SA na sociedade Pr., SA e pela projetada fusão da Ct., SA na Est., SA;
d) Caso o tribunal não considere ter o contrato cessado por resolução da demandada, a demandante requer, subsidiariamente, que seja apreciado o direito que lhe assiste à resolução do contrato fundado na quebra de confiança decorrente do incumprimento do contrato pela demandada e, caso conclua pela verificação de tal direito, declare resolvido o contrato, com justa causa;
e) Em qualquer caso, seja condenada a demandada a pagar à demandante a quantia de € 148.181.841 (cento e quarenta e oito milhões, cento e oitenta e um mil, oitocentos e quarenta e um euros), acrescida de juros à taxa supletiva legal aplicável às operações comerciais, a contar desde a data de entrada em juízo da ação até integral e efetivo pagamento.
Juntou 208 documentos, pediu depoimentos de parte, arrolou 19 testemunhas, requereu a notificação da demandada para juntar documentos aos autos, e juntou três relatórios periciais e um parecer do Prof. Doutor António Pinto Monteiro.

A demandada contestou, impugnando parte dos factos que sustentam os pedidos, nomeadamente os que se prendem com incumprimentos da sua parte, e invocando, ainda, que a demandante, em 13 anos, não concluiu a fase de implementação dos estudos urbanísticos (a primeira fase) e nada foi aprovado, nem há expectativas de vir a sê-lo, não obstante o apoio que a demandada sempre deu à demandante. Contesta as avaliações da demandante, contrapondo-lhe as suas. Segundo entende, o prazo de 10 anos fixado no artigo 11, n.º 2, do DL 231/81, de 28 de julho, não foi afastado pelas partes, pelo que o contrato teria caducado em 2013. Mais entende que, na falta de caducidade, a apresentação da T., SGPS, S.A. (anteriormente denominada B.T.), indiretamente detentora da demandante e parte no contrato de consórcio, a processo especial de revitalização (PER), seria fundamento de resolução com justa causa. Configura, ainda, um direito a denunciar o contrato.
Termina concluindo que a demandante não só não tem direito à indemnização por não estarem preenchidos os pressupostos da ilicitude e da culpa, de que depende a mesma, como não demonstrou a existência de quaisquer danos, presentes ou futuros, causados pela demandada.
Termina pedindo que se reconheça que o contrato se extinguiu por caducidade devido ao decurso do prazo legal em 8/1/2013; caso assim não se entenda, que se qualifiquem as comunicações de 8/5/2015 e 24/6/2015 como uma resolução lícita do contrato; ou, ainda subsidiariamente, que se qualifiquem as comunicações de 8/5/2015 e 24/6/2015 como uma denúncia válida e eficaz do contrato, julgando-se, em qualquer caso, a ação totalmente improcedente e condenando a demandante no pagamento dos honorários e despesas despendidos pela demandada com esta ação.
Juntou 6 documentos, pediu depoimentos de parte, arrolou 10 testemunhas, e juntou três relatórios de avaliação e um parecer do Prof. Doutor José Engrácia Antunes.

O processo seguiu os seus termos, houve réplica, outros requerimentos, despachos e diligências preliminares.
Após julgamento foi proferida sentença que assim terminou:
I. Pelo exposto, acordam os árbitros:
a) Em julgar improcedente a invocação da caducidade do contrato de 8 de janeiro de 2003 ou, em qualquer caso, em considerar que o mesmo se prorrogou por condutas concludentes de ambas as partes;
b) Em julgar irrelevantes as alterações subjetivas verificadas na Demandada;
c) Em subscrever o entendimento de que um PER não equivale a uma concordata, para efeitos de aplicação do artigo 10.º/2, a), do Decreto-Lei n.º 231/81;
d) Em considerar subsistente o contrato de consórcio de 8 de janeiro de 2003;
e) Em julgar que o mesmo não foi cumprido pela Demandada, tendo sido corretamente resolvido pela Demandante.
II. Mais decidem os árbitros:
f) Que o não-cumprimento do contrato não ocasionou danos emergentes pedidos (e provados) mas antes
g) Que desse não-cumprimento resultaram lucros cessantes provados de aproximadamente € 79.767.000,00.
h) Que essa cifra, descontados os custos contratualmente assumidos pela Demandada e feita a distribuição clausulada, dá lugar a uma indemnização de € 2.025.000,00.
III. Termos em que julgam a presente ação parcialmente provada e procedente, condenando-se a Demandada numa indemnização de € 2.025.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, contados a partir da notificação do presente acórdão.
IV. Mais decidem os árbitros, uma vez que ambas as partes agiram com total correção, não sendo individualmente responsabilizáveis pela presente ação, repartir igualmente as custas do processo por ambas. As correspondentes quantias foram já pagas, pelo que nada mais é devido.
V. Pela mesma ordem de razões, cada parte pagará ao seu ilustre e respetivo Mandatário.

Com o decidido não se conforma nenhuma das partes.
A demandante C. apresenta 84 páginas de alegações de recurso, das quais 33 são «conclusões», iniciadas no número 195 (sem numeração autónoma relativamente às alegações). Apresentamos em seguida essas conclusões expurgadas de parágrafos supérfluos, tendo em consideração o que já consta do relatório deste acórdão e dos factos provados adiante consignados.

Conclusões do recurso da demandante C.:
«(…)
214. A Demandante, pelo presente recurso vem manifestar o seu desacordo com a parte da decisão que condenou a Demandada a pagar-lhe uma indemnização de apenas € 2.025.000,00 e ainda com a parte da decisão que não determina a natureza da taxa de juro aplicável e condena no seu pagamento somente a partir da notificação do acórdão, limitando o seu recurso à parte da decisão constante das alíneas g) e h) da decisão e à parte referente aos juros;
215. O seu desacordo assenta em quatro ordens de razão, ordenadas de acordo com a seguinte precedência lógica, a saber:
e) Ao não ter explicitado todas as variáveis que utilizou no seu raciocínio para determinação dos danos correspondentes aos lucros cessantes nem ter explicitado os cálculos em que fundou a sua decisão, o Tribunal não especificou devidamente os factos e o raciocínio que efetuou para justificar a decisão tomada quanto à determinação do valor dos danos, tornando a decisão impercetível, o que gera nulidade da mesma, nesta parte (por autonomizável), por falta de fundamentação, nos termos do disposto no Art.º 615.º, n.º 1 alínea b) do CPC;
f) Ao não determinar a natureza (comercial ou civil) da taxa de juros legais aplicável sobre o valor da indemnização, o Tribunal deixou de apreciar uma questão que se lhe impunha, sendo a decisão nula, nesta parte, por omissão de pronúncia nos termos do disposto no Art.º 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC);
g) A decisão padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto, por erro notório na apreciação da prova, ao ter considerado provados os factos constantes dos pontos 145, 160, 164, 168, 176 e 181 que não o poderiam ter sido e não ter considerado provados os factos constantes dos Art.ºs 182.º, 183.º, 197.º, e 339.º da p.i., que o deveriam ter sido, tudo em face da prova produzida, no que respeita aos parâmetros de edificabilidade, custos invocados pela Demandante na execução do projeto e outras variáveis para determinação do valor dos lucros cessantes;
h) A decisão padece de erro de julgamento de direito, consubstanciado na errada interpretação e aplicação do disposto nos Art.ºs 562.º, 564, n.º 2, primeira parte, 566.º, n.º 2 e 3 e 805.º, n.º 2 alínea b) e n.º 3, todos do CC, por não ter efetuado uma correta interpretação e aplicação destas normas quanto à responsabilidade civil contratual por facto ilícito decorrente da atuação da Demandada, no que respeita à determinação do valor da indemnização e ainda quanto à data a partir da qual são devidos juros que incidem sobre a indemnização a pagar.
(…) [Quanto à impugnação da decisão de facto, v. infra III.C.b)]
236. Considerando que os factos provados não lhe permitiam a determinação de um valor exato do prejuízo, o Tribunal socorreu-se de juízos de equidade nos termos do disposto no Art.º 566, n.º 3 do CC, isto é, decidindo segundo juízos de equidade dentro dos limites por si considerados como provados.
237. Contudo, em face dos factos dados como provados, não poderia o Tribunal ter recorrido à equidade conforme previsto no Art.º 566, n.º 3 devendo ter tomado em consideração o Plano Foster e aceite as avaliações apresentadas pela Demandante;
238. Não aceitando nenhuma das avaliações juntas pela Demandante (hipótese que só se coloca, por mero dever de patrocínio, para o caso de ser considerado legítimo o recurso a juízos de equidade para determinação do valor da indemnização), o Tribunal decidiu mal, ao considerar um índice de 0,55 que não tem sustentação legal ou documental e sendo indicado por uma testemunha que tem interesse profissional no assunto, bem como considerando outros critérios que não respeitaram os factos por si considerados como provados, desrespeitando as regras do bom senso, da boa prudência, da justa medida das coisas e de uma criteriosa ponderação da realidade da vida.
239. Tendo em consideração os factos dados como provados sob os n.ºs 68, 80, 81, 93, 95, 124, 125 e 126, a Câmara Municipal da Amadora não pode livremente optar por um plano diferente do Plano Foster porquanto o Acordo Quadripartido celebrado em 16 de março de 2017 por esta entidade com a Demandada e os ateliers de arquitetura Foster and Partners e Gonçalo Byrne Arquitetos pode ser reconduzido a uma figura contratual admissível legalmente (“Contrato para Planeamento”), celebrada em momento anterior aos da elaboração de instrumentos planificadores, funcionando como forma legal de desencadeamento e desenvolvimento do seu procedimento, o qual  gera obrigações para todas as partes, incluindo a Câmara (Cfr. Parecer Fernanda Paula Oliveira);
240. Tal Contrato, não obstante “não afete (não possa afetar) o poder de planeamento municipal (o qual, não obstante o contrato, permanece nas mãos da Administração), não há como negar que a sua celebração limita esta discricionariedade, uma vez que, tendo sido celebrado aquele contrato, o não desencadeamento ou a não conclusão do procedimento de planeamento contratualizado, bem como um desvio do conteúdo do plano em relação ao concertado com os interessados, apenas será legítimo se entretanto tiverem surgido outros interesses mais relevantes que fundamentadamente devam prevalecer em relação aos que estiveram subjacentes àquela celebração (e que foram devidamente ponderados para esse efeito). Interesses supervenientes esses que devem ser devidamente explicitados.” ( Parecer Cit.)
241. “Deste modo terá de se concluir, a não ser que a evolução das circunstâncias de facto e de direito existentes à data da assunção do compromisso se tenham modificado ― o que terá de ser alegado e provado pela Câmara ― que a celebração deste tipo de contratos confere aos privados uma posição jurídica que lhes permite exigir (nem que seja por via judicial) a aprovação de um plano nos termos contratados ou lhes possibilita impugnar (também por via judicial) um plano que não dê cumprimento aquela contratualização.” (Parecer Cit.);
242. “Daqui decorre um claro compromisso do Município da Amadora no desencadeamento de um procedimento de planeamento para a área em causa, compromisso esse em perfeita consonância com o previsto no Plano Diretor Municipal da Amadora que expressamente determina a conveniência/necessidade de a área em causa (integrada na UOP 3) ser desenvolvida/concretizada por plano de urbanização ou plano de pormenor.” (Parecer Cit.)
243. Neste caso, a Câmara Municipal não assumiu apenas o compromisso (a obrigação) de desencadear um procedimento desenvolvimento de um plano mais concreto para aquela área, tendo ido mais longe ao definir os pressupostos urbanísticos em que os trabalhos deveriam assentar. (idem)
244. Em face do referido teremos de concluir, atendendo ao acordo quadripartido celebrado e aos seus efeitos, que uma “desvinculação” por parte dos órgãos municipais, dos compromissos nele assumidos apenas seria legítima se estes mesmos órgãos viessem invocar razões injuntivas de interesse público não existentes e/ou não ponderadas à data da celebração do contrato, ou seja, se tal “desvinculação” se fundamentasse na evolução das circunstâncias de facto e de direito existentes à data da assunção do compromisso, que para além de alegado teria de ser provado terem ocorrido em momento posterior.
O que, manifestamente não ocorreu na situação concreta, sendo até, “ridículo” que a atual Presidente da Câmara Municipal da Amadora (Vice Presidente desta mesma Câmara à data da celebração do contrato) venha agora afirmar desconhecer o PLANO FOSTER, como se fosse legítimo, anos depois (e milhões de euros depois) deixar, pura e simplesmente cair (ou, mais grave ainda, ignorar) os compromissos assumidos.” (idem)
245. “Não vemos, assim, atentas as circunstâncias de facto e de direito que enquadram a presente situação e que foram dadas como provadas no Acórdão, como pode a Câmara Municipal da Amadora não aprovar o PLANO FOSTER. (idem)
246. Daqui decorre que se tem razão o Tribunal ao afirmar, “não há negócio sem construção legalizada e esta depende sempre da CMA” já não é verdade que a Câmara possa pura e simplesmente decidir invalidar este procedimento. Mais do que uma “grave censura politica, moral e, quiçá, jurídica” à atuação da Câmara Municipal da Amadora a que o Tribunal se refere, consideramos, com os dados que constam do processo e nele se dão como provados, que existe um dever jurídico de este Plano ser aprovado pelo Município.” (idem)
247. Do que se acabou de expor, resulta claramente que o Tribunal não podia ter afastado a concretização do Plano Foster como uma realidade previsível (ou pelo menos, francamente expectável), devendo ter considerado nos cálculos da indemnização a arbitrar e como parâmetro de edificabilidade seguro e determinado nos autos o índice 1,00 (0,8 + 0,2 de majoração), ou, pelo menos, o índice de 0,8.
248. Devendo ser considerado para efeitos de avaliação um projeto urbanístico com as características de qualidade e capacidade de alteração da zona de implantação, como aquele que foi desenvolvido por NF e GB. Isto é, um projeto de elevada dimensão e qualidade, que pretende criar um novo centro no concelho da Amadora - novas áreas cívicas, comerciais e de retalho; pretende igualmente criar um grande parque verde público – estabelecendo corredores verdes para outros parques nos bairros circundantes; prevê a criação de cinco blocos residenciais, cada um dos quais com os seus espaços verdes privados – o que potencia a criação de comunidades individuais com boas condições de vida;
249. Para apuramento da margem de lucros cessantes de um Empreendimento como o previsto nos autos é adequada a utilização do método comparativo, de critérios de homogeneização e apuramento do valor da margem bruta com utilização do método residual estático, conforme melhor se encontra explicado no ponto 155;
250. Tendo em consideração que o valor das infraestruturas a considerar vai ser deduzido ao valor apurado de venda dos lotes, quanto maior for o valor considerado, menor será o resultado da margem bruta a considerar.
251. Sendo os valores apresentados por todas as empresas portuguesas para infraestruturas na mesma ordem de grandeza, são estes que traduzem efetivamente os valores que devem ser considerados adequados à metodologia a aplicar no caso.
252. O valor dos custos a considerar no caso dos autos é o do valor de aquisição do terreno, que é conhecido - € 52.500.000,00 acrescido do valor de impostos pagos, o que perfaz a quantia de € 57.120.000,00, sendo este o valor a considerar acrescido de soft-costs (custos com os projetos de infraestruturas e de comercialização).
253. Todas as avaliações apresentadas pela Demandada, que se encontram analisadas em detalhe no ponto 59 das motivações, apresentam graves incorreções, quer ao nível dos pressupostos, quer ao nível da metodologia aplicada, quer ainda quanto aos seguintes critérios considerados, pelo que não deverão ser aceites e validadas no âmbito da determinação do montante da indemnização pelo Tribunal:
a) Avaliam o valor de mercado do terreno e não o valor da margem bruta do negócio.
b) Apresentam metodologia e critérios não adequados e não fundamentados, tais como  um índice de construção muito abaixo do permitido pelo PDM da Amadora no caso de realização de um PU ou PP;
c) Incorreta estimativa do tempo de aprovação do Master Plan elaborado por Norman Foster;
d) Incorreto levantamento e análise de comparáveis de mercado e, consequentemente, utilização do método comparativo.
254. Ao invés, as avaliações apresentadas pela Demandante elaboradas pela Cushman & Wakfield, Jones Lang Lasalle e Aguirre Newman, apresentam-se:
a) Bem fundamentadas;
b) Assentes em pressupostos corretos em função do que é necessário a uma correta determinação do valor do negócio cuja chance a Demandante perdeu ao ser impedida de concretizar o negócio;
c) Utilizam metodologia correta;
d) Efetuam uma seleção de comparáveis adequada em função do tipo de empreendimento em causa, considerando a capacidade de transformação da zona que o mesmo apresenta;
e) Utilizam índices de edificabilidade adequados;
f) Utilizam corretos valores de infraestruturas, corretos custos relativos à aquisição do terreno e corretos custos de comercialização.
255. Os valores a que chegam as três avaliações apresentadas pela Demandante são muito próximos entre si (o que não acontece com as avaliações apresentadas pela Demandada, que apresentam valores entre si muito dispares) – o que resulta, não apenas da utilização de critérios e de metodologia adequada, mas sobretudo de uma correta prospeção de mercado, com uma seleção de comparáveis que são adequados à determinação da margem do negócio, tendo em consideração o concreto projeto urbanístico em causa.
(…)
258. O Tribunal deveria pois julgar corretos os valores da margem apurada nas avaliações apresentadas para um índice de edificabilidade de 1,00 (0,8 + 0,2):
- Cushman & Wakefield : € 209.966.260,00 – Cfr. Relatório de Avaliação Cushman.
- JLL: €221.050.000,00 - Cfr. Relatório de Avaliação JLL
- Aguirre Newman : € 213.590.671,00 – Cfr. Relatório de Avaliação Aguirre.
259. Tais entidades indicaram também, nos seus depoimentos escritos juntos aos autos os valores que resultam das suas avaliações efetuadas (com exatamente os mesmos comparáveis, método e restantes critérios, mas com um índice de edificabilidade 0,8, nos seguintes termos (Cfr. Depoimentos escritos dos peritos Nuno T., Paula S. e Hugo S. juntos aos autos):
- Cushman & Wakefield : € 151.875.710,00
- JLL: €186.080.000,00 
- Aguirre Newman : € 133.912.388,00
260. Os valores apresentados já foram subtraídos do valor da aquisição do prédio pela Ct., impostos e remuneração do capital, bem como do valor a realizar em infraestruturas, sendo que o valor apresentado em tais relatórios é já o valor do lucro tal como está previsto no n.º 2 da cláusula 9ª, restando pois aplicar a fórmula de distribuição de lucro.
261. Previamente, porém, tendo em consideração que se dispõe de três avaliações, importa apurar o valor médio dos montantes das avaliações efetuadas, que é de € 207.037.318 (duzentos e sete milhões trinta e sete mil trezentos e dezoito euros). (190 095 697 €+221 050 000 €+209 966 258 €/3=               207 037 318 €)
262. Nos termos constantes do contrato – Cl. 9.ª, e Anexo B – a distribuição do lucro do consórcio será efetuada em função do Empreendimento tal como resulta definido no Plano de Pormenor, ou, à falta dele, no alvará de loteamento, ou ainda, na falta dele, no instrumento administrativo que o substitua, a área total do terreno, ou seja, 593.062 m2.
263. Assim, se a Demandante tivesse tido a possibilidade de prosseguir com o contrato teria um ganho de € 148.181.841 (cento e quarenta e oito milhões cento e oitenta e um mil oitocentos e quarenta e um euros);
264. Assim, considera-se que as avaliações apresentadas pela Demandante deveriam ter sido consideradas como valores credíveis e provados, contendo pois os autos elementos de facto que não permitiam o recurso pelo Tribunal à equidade;
265. Se o índice a considerar for o de 0,8, tendo em consideração os valores já calculados nos seus depoimentos escritos pelos peritos Hugo S., Nuno T. e Paula S., juntos aos autos, o valor da indemnização será de € 123.307.865,00 (cento e vinte e três milhões trezentos e sete mil, oitocentos e sessenta e cinco), por aplicação da fórmula prevista no Contrato.
(…)
267. Desde logo o índice de edificação adotado – 0,55 – não tem qualquer suporte legal ou documental, fundando-se o Tribunal num mero depoimento de uma testemunha, que afirma apenas ter realizado um exercício teórico de ocupação desenhada para estimar superfícies de construção – parece tratar-se da projeção da capacidade construtiva efetuada de uma forma empírica.
268. Importa saber, caso não fosse viabilizado o Plano Foster pela CMA, que outro plano pode ser viabilizado atento o enquadramento legal e regulamentar aplicável. (Cfr Parecer)
269. Recorrendo a juízos de equidade para determinação do valor da indemnização, o Tribunal deveria ter considerado um índice de 0,8, não podendo em circunstância nenhuma considerar um índice inferior (Cfr Parecer Prof. Doutora Fernanda Paula Oliveira):
“Em suma, e quanto a esta segunda questão, teremos de concluir que:
f) Os índices de 0,55 e 0,40 não decorrem de qualquer instrumento de planeamento em vigor, nem se encontram previstos em qualquer outro documento jurídico (designadamente contratual, que conste do processo;
g) Antes da aprovação de instrumentos de regulação do território (planos de pormenor ou de urbanização) deve considerar-se, para toda a zona da UOP 3, onde se insere o prédio em questão nos autos, o índice de edificabilidade é de 0,80.
h) Não é admissível a edificação em qualquer zona do prédio em questão antes da aprovação de um plano de pormenor ou de urbanização;
i) Na elaboração de um plano de urbanização ou de um plano de urbanização, é admissível definir índice de edificabilidade de 0,80 para toda a área do terreno – e mesmo que não fosse possível, teria que ser aplicado o mecanismo da perequação;
j) Num raciocínio de determinação de danos por “perca de chance” têm que ser considerada, quer as características do projeto em questão, quer a possibilidade de edificação que resultaria da sua aprovação e nunca um qualquer índice que não resulta de qualquer plano em vigor nem sequer do um projeto em elaboração.”
(…)
272. Considerando um CENÁRIO A, em que:
 - Índice 0,8
 - Preço /m2 – 400 € - (preço /m2 considerado pelo Tribunal Arbitral) tendo em atenção a média  de valores indicados pelos peritos da ambas as partes.
 - Custo das Infraestruturas considerado – valor médio das seis avaliações de ambas as partes, retiradas as relativas ao valor mais alto e mais baixo apresentado, agravado de 89% por forma a cingir-se à área afeta ao Consórcio
- Prazo considerado para o desenvolvimento total do projeto – 18 anos
 - Taxa de atualização aplicada aos lucros futuros esperados - conforme critério definido e calculado pelo Tribunal Arbitral.
 - Totalidade das despesas efetuadas até ao momento pela Ct. – compra do terreno + totalidade das despesas efetivas + encargos financeiros escriturados - € 61.455.658.
Encontrada desta forma a margem do consórcio e aplicando-se a fórmula contratualmente estabelecida apura-se um valor de atribuição à C. no montante de € 69.501.493.
273. Considerando um CENÁRIO B, em que:
- Se atualizou o índice de 0,55 para 0,8
- Prazo considerado para o desenvolvimento total do projeto – 18 anos Mantendo todas as demais premissas consideradas pelo Tribunal Arbitral
 Obtém-se dessa forma a margem do consórcio de e aplicando-se a fórmula contratualmente estabelecida apura-se um valor de atribuição à C. no montante de € 53.855.968,00.
274. Do que se acaba de expor resulta que o valor da indemnização a que a Demandante terá direito é muito superior ao que lhe foi arbitrado pelo Tribunal recorrido, devendo, em consequência o Acórdão proferido ser revogado e substituído por outro que considere as diferentes premissas supra enunciadas, a saber:
e) € 148.161.841,00, considerando os valores constantes das avaliações das avaliações apresentadas pela Demandante, o índice de 1, 0 (0,8 + 02) e o Plano Foster; se assim não se entender:
f) €123.307.865,00, considerando os valores constantes das avaliações apresentadas pela Demandante, um índice de 0,8 e o plano Foster; se assim não se entender:
g) € 69.501.493,00, considerando um projeto a ser executado com o índice de 0,8, aceitando o valor de venda dos lotes considerado pelo Tribunal, custos devidamente escriturados e provados nos autos, prazo de 18 anos para o desenvolvimento do projeto e taxa de atualização aplicada aos lucros futuros esperados e aos custos, conforme determinação do Tribunal; se assim não se entender:
h) € 53.855.968,00, considerando todos os parâmetros do Tribunal, efetuando uma correção de valores decorrente da atualização do índice de 0,55 para 0,8 e considerando o prazo de 18 anos para o desenvolvimento do projeto.
275. Tendo a Demandante peticionado a condenação da Demandada no pagamento de juros à taxa supletiva legal aplicável às operações comerciais, a contar desde a data de entrada em juízo da presente ação até integral e efetivo pagamento, são devidos juros nos termos peticionados, pelo que, ao ter decidido que os juros são devidos desde a notificação do Acórdão, o Tribunal violou diretamente o Art.º 805.º n.º3 do CC, o que constitui erro de julgamento, devendo o Acórdão ser revogado e substituído por outro que considere devidos os juros desde a citação.
Nestes termos e nos mais de direito, requer-se a V.Ex.ª se dignem admitir e julgar procedente o presente recurso e, em consequência:
A) Declarar parcialmente nulo o Acórdão recorrido por falta de fundamentação e omissão de pronúncia;
B) Alterar a matéria de facto nos termos supra indicados e revogar o Acórdão por erro de julgamento e de aplicação do direito, substituindo-o por outro que dê a ação como integralmente procedente e provada, condenando a Demandada a pagar à Demandante uma indemnização no montante de:
b.1) € 148.161.841,00, considerando os valores constantes das avaliações apresentadas pela Demandante, o índice de 1, 0 (0,8 + 02) e o Plano Foster; se assim não se entender,
b.2) €123.307.865,00, considerando os valores constantes das avaliações apresentadas pela Demandante, um índice de 0,8 e o plano Foster; se assim não se entender,
b.3) € 69.501.493,00, considerando um projeto a ser executado com o índice de 0,8, aceitando o valor de venda dos lotes considerado pelo Tribunal, custos devidamente escriturados e provados nos autos, prazo de 18 anos para o desenvolvimento do projeto e taxa de atualização aplicada aos lucros futuros esperados e aos custos, conforme determinação do Tribunal; se assim não se entender:
b.4) € 53.855.968,00, considerando todos os parâmetros assumidos pelo Tribunal e efetuando apenas uma correção de valores decorrente da atualização do índice de edificabilidade de 0,55 para 0,8.
C) Condenar a Demandada no pagamento de juros sobre o montante total da indemnização arbitrada, à taxa legal para as operações comerciais, contados desde a data da citação a presente ação e até efetivo e integral pagamento, bem como nas custas do processo,
Só assim se fazendo a costumeira e sã JUSTIÇA!»

Também a demandada Ct. não se conforma com o acórdão e dele recorre em extensas alegações e conclusões que em seguida se condensam.
A Ct. conclui as suas alegações de recurso da seguinte forma:
«(…) C)    Os factos que o Tribunal deveria ter considerado provados e não o fez são os seguintes:
(…) [v. infra III.C.c) – A) a AA)]
D) No capítulo 4.1.1. das alegações (“Dos factos que deveriam ter sido considerados provados e não foram”), que aqui se dá por reproduzido, a Recorrente indica, de forma descriminada, os motivos e concretos meios de prova que justificavam que os factos supra referidos tivessem sido considerados provados.
E) Por outro lado, há factos que o Tribunal Arbitral considerou provados, e que deveriam tê-lo sido noutros termos. Assim:
(…) [v. infra III.C.c) – Das alterações aos factos provados]
F) No capítulo 4.1.2. das alegações (“Das alterações aos factos considerados provados”) que aqui se dá por reproduzido, a Recorrente indica, de forma discriminada, os motivos e concretos meios de prova pelos quais cada um dos factos supra referidos deveria ter sido considerado provado em termos diferentes dos consignados no Acórdão Arbitral.
G) Além do mais, O Tribunal não deveria ter considerado provado o “facto” provado 174., na medida em que se trata de uma conclusão, requerendo-se a sua eliminação.
H) O Tribunal errou também na aplicação do Direito aos factos considerados provados.
I) Considerou o Tribunal Arbitral, concordando com a Recorrida, que o Contrato de Consórcio celebrado em 8/1/2003 não caducou em 8/1/2013.
J) Não tem razão o Tribunal Arbitral, já que o Contrato caducou por decurso do prazo de 10 anos previsto no artigo 11.º, n.º 2, da LCC.
K) Em primeiro lugar, o prazo de 10 anos previsto no artigo 11.º, n.º 2, da Lei do Contrato de Consórcio (“LCC”) é um prazo supletivo, aplicável caso as partes não fixem um outro prazo, mas é também um prazo máximo imperativo, não podendo as partes inicialmente estabelecer um prazo de duração do consórcio superior a 10 anos.
L) Subsidiariamente, e ainda que as partes pudessem validamente fixar no Contrato um prazo superior ao prazo de 10 anos previsto no artigo 11.º, n.º 2, da LCC, o que não se concede, não o fizeram no caso vertente.
M) Além disso, as partes não prorrogaram o prazo de 10 anos previsto no artigo 11.º, n.º 2, da LCC, já que:
a. A caducidade é de verificação automática, pelo que, findos os 10 anos, o Contrato caducou ope legis.
b. O artigo 11.º, n.º 2, da LCC exige a existência de prorrogação expressa, para que o Contrato não se extinga ao fim de 10 anos. No presente caso, não houve qualquer declaração negocial de prorrogação (expressa ou tácita).
c. O artigo 6.º da LCC exige a forma escrita para as modificações do contrato de consórcio. No presente caso, não houve qualquer prorrogação escrita.
d. Caso tivesse existido alguma declaração negocial de prorrogação do Contrato, que não houve, a mesma seria nula, nos termos do artigo 294.º, do Código Civil, por não ter satisfeito os referidos requisitos previstos na LCC.
N) A conduta da Recorrente, ao invocar a caducidade dois anos depois de a mesma ter ocorrido, não foi abusiva, ao invés do que sustentou a ora Recorrente na P.I..
O) Mesmo que se concluísse que o Contrato não tinha caducado por decurso do prazo legal, haveria que reconhecer a existência de fundamento de resolução deste por parte da Recorrente, uma vez que em maio de 2014, a T., anteriormente denominada B.T., sociedade que detém indiretamente a Recorrida e que é parte do Contrato, se apresentou a Processo Especial de Revitalização (“PER”) no qual foi aprovado e homologado um plano de recuperação.
P) A LCC prevê no artigo 10.º que o contrato de consórcio pode ser resolvido, quanto a alguns dos contraentes, por declarações escritas emanadas de todos os outros, ocorrendo justa causa, considerando ser justa causa para resolução do contrato de consórcio quanto a algum dos contraentes a homologação de concordata.
Q) O regime da concordata, vigente no CPC, foi revogado pelo CPEREF e este, posteriormente, foi revogado pelo CIRE; todavia, tais diplomas salvaguardaram expressamente a existência e consequente vigência das remissões para os regimes revogados, pelo que a revogação da “falência” e da “concordata”, enquanto institutos previstos e regulados nos aludidos diplomas não teve como consequência a revogação do artigo 10.º, n.º 2, alínea a), da LCC.
R) A entrada em vigor do CIRE – lei geral aplicável à insolvência e recuperação de empresas –, não correspondeu a uma “revogação tácita” do artigo 10.º, n.º2 – lei especial que regula o consórcio.
S) Mantendo-se em vigor o artigo 10.º, n.º 2, alínea a), da LCC, e havendo figura na lei em vigor em tudo semelhante ao instituto da concordata - o PER, equivalente normativo da concordata - pode e deve fazer-se uma interpretação atualista da norma, devendo a locução “homologação de concordata”, contida no indicado preceito constituir uma referência à homologação judicial do PER que, assim, configura justa causa de resolução do contrato de consórcio.
T) O argumento formalista de que apenas a T. (e não a Recorrida) se apresentou a PER não pode proceder, pois, neste consórcio não existiam quatro membros independentes. Existiam sim dois “blocos” de consorciados: de um lado as empresas detidas pelo Estado; do outro as empresas do Grupo T..
U) Assim, caso se entendesse qualificar as comunicações de 8/4/2015 e 24/6/2015 da Recorrente como declarações resolutivas do Contrato, como sempre afirmou a Recorrida, haveria que considerar que tal resolução tinha fundamento legal nos termos do artigo 10.º da LCC.
V) A T. apresentou-se a PER sem ter comunicado esse facto à Recorrente ou à S., que souberam da sua existência já o plano de recuperação tinha sido celebrado com os credores, o que consubstancia uma violação grave dos deveres de lealdade e transparência que se impõem com especial acuidade num contrato de cooperação, como o Contrato de Consórcio, e decorrem do princípio da Boa Fé (artigo 762.º do Código Civil).
W) Não fora o Contrato de Consórcio ter caducado, a Recorrente tinha justa causa para o resolver ao abrigo do artigo 10.º, n.º 2, da LCC, que considera justa causa para resolução do contrato de consórcio quanto a algum dos contraentes, “A falta grave, em si mesma ou pela sua repetição, culposa ou não, a deveres de membro do consórcio”.
X) Independentemente da invocada caducidade do Contrato, a Recorrente teria sempre um comportamento lícito alternativo (resolução do Contrato nos termos do artigo 10.º, n.º2, da LCC) que conduziria à legítima extinção do Contrato.
Y) Além de não existir qualquer conduta ilícita por parte da Recorrente, a mesma afastou a presunção de culpa prevista no artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil (“CC”). A Recorrente tudo fez e tudo disponibilizou à Recorrida para que o Plano Foster fosse executado. As alterações de estratégia da CMA para o Prédio, por razões económicas, sociais e políticas, não são imputáveis à Recorrente que, além do mais, constantemente alertou a Recorrida para a necessidade de coordenação com as entidades públicas, nomeadamente com a CMA.
Z) No que respeita aos supostos danos sofridos pela Recorrida, a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral é nula por violação do disposto nos artigos 30.º, 46.º, n.º3, al. a), ii) e v), da LAV e dos artigos 3.º, 5.º e 615.º do CPC, porquanto o Tribunal delineou uma outra causa de pedir distinta daquela articulada pela Recorrida, com base na qual veio a julgar parcialmente procedente o pedido indemnizatório desta. Requer-se que o Tribunal ad quem aprecie esta nulidade subsidiariamente (substituindo o Acórdão por outro que absolva a Recorrente) e apenas se entender que a matéria de facto provada não conduz à absolvição total do pedido.
AA) Por outro lado, a Recorrida não alegou nem provou a existência de qualquer dano, como lhe competia nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CC.
BB) Conforme resulta do disposto na cláusula 9ª, n.º 6 do Contrato (e também do seu Anexo B), a Recorrida só teria direito a ser remunerada caso existissem lucros. Contudo, a Recorrida não alegou nem demonstrou a existência desses lucros, pelo que também por este motivo deve a decisão do Tribunal Arbitral ser revogada por outra que absolva integralmente a Recorrente.
CC) A atribuição de indemnização pelos lucros cessantes depende da alegação e prova de factos que permitam a construção de um curso normal da evolução dos acontecimentos. Ora, o que se demonstrou foi que foram realizadas enormes despesas, que não foram geradas quaisquer receitas e que a CMA não pretende viabilizar o projeto. A Recorrida falhou na demonstração da ínfima probabilidade de o projeto vir a gerar lucros, pelo que não podia o Tribunal vir a suprir essa deficiência com recurso à equidade, nos termos do artigo 566.º, n.º 3, do CC (que apenas pode ser utilizado para quantificar danos cuja existência já foi demonstrada, não para determinar a existência de danos).
DD) A Recorrida aludiu na P.I. à figura da perda de chance, na qual o Tribunal parece de algum modo ter sustentado a condenação da Recorrente. Esta figura é, em abstrato, de aplicação muito questionável no ordenamento jurídico português, sendo de afastar totalmente no caso concreto, por manifesta falta de verificação dos respetivos pressupostos.
EE) A Recorrida não sofreu nem irá sofrer quaisquer prejuízos decorrentes do suposto incumprimento do Contrato pela Recorrente.
FF) Ainda que estivéssemos perante um incumprimento contratual ilícito e que desse incumprimento tivessem resultado danos, o Tribunal Arbitral não poderia ter atribuído uma indemnização pelo interesse contratual positivo, como fez.
GG) O Tribunal Arbitral aceita e defende a tese de que a Recorrida tem direito a cumular irrestritamente a resolução do Contrato com uma indemnização pelo interesse contratual positivo, o que, além de contrariar a posição dominante da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, conduz, no caso vertente, a um resultado desequilibrado e injusto, colocando a Recorrida numa posição muito melhor do que a que existiria caso o Contrato subsistisse.
HH) Por outro lado, o cálculo dos danos efetuados pelo Tribunal é, salvo o devido respeito, errado.
II) O Tribunal não apresentou de forma completa os cálculos concretos que efetuou, incorrendo num vício de falta de fundamentação. Requer-se que o Tribunal aprecie esta nulidade subsidiariamente (substituindo o Acórdão por outro que absolva a Recorrente) e apenas se entender que a matéria de facto provada não conduz à absolvição total do pedido.
JJ) O Tribunal compara valores dos vários Relatórios Periciais que não são passíveis de comparação, por tratarem de realidades distintas.
KK) No que respeita às Avaliações da Recorrente, os Peritos visitaram o Prédio em causa, analisaram os instrumentos jurídico-urbanísticos vigentes e contactaram a CMA e/ou outras entidades competentes, ao contrário do que foi feito pelos Peritos que elaboraram relatório a pedido da Recorrida.
LL) As Avaliações da Recorrente foram feitas com base na realidade atual e na evolução plausível do Prédio e permitiram demonstrar que o negócio foi claramente deficitário.
MM) Não obstante a dificuldade em ter em conta o Masterplan, por se tratar de um exercício puramente teórico e especulativo, as avaliações realizadas a pedido da Recorrente com base no Masterplan permitiram demonstrar a total irrazoabilidade das “avaliações” da Recorrida.
NN) As “avaliações” realizadas pelos peritos indicados pela Recorrida apresentam inúmeras deficiências metodológicas e partem de pressupostos errados, incompletos ou especulativos, em especial a certeza na aprovação e execução do Masterplan, sendo propositadamente desligadas da realidade.
OO) Estando demonstrada a inviabilidade do Masterplan, as avaliações realizadas pelos peritos da Recorrida não têm qualquer valor. 
PP) Nos termos da cláusula 17ª, n.º 4 e 5, do Regulamento de Arbitragem, a repartição das despesas com o tribunal e despesas próprias é feita em função do decaimento. Assim, atendendo ao decaimento de 98,634% da Recorrida, o Tribunal Arbitral violou o disposto no artigo 46.º, n.º 3, al. a), sub-al. iv) da LAV e o princípio da igualdade (artigo 30.º da LAV) ao repartir tais despesas em partes iguais e considerar que cada parte é responsável pelas despesas em que incorreu. Ainda que assim não se entendesse, essa decisão consubstanciaria um erro de julgamento, que haveria também que corrigir.
Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, requer-se a V. Excelências, Venerandos Desembargadores, concedam provimento ao presente Recurso nos termos supra alegados e, em consequência, revoguem o Acórdão Arbitral, substituindo-o por outro que:
a) Absolva a Recorrente de todos os pedidos formulados pela Recorrida na ação arbitral:
b) Condene a Recorrida no pagamento da totalidade das despesas com o Tribunal Arbitral e despesas próprias despendidas pela Recorrente, pagando-lhe € 467.370,89, acrescido de juros à taxa legal e das custas e despesas com o presente recurso;
Subsidiariamente
c) Caso decidam manter a decisão recorrida, no que não se concede, revogue os pontos IV e V do Acórdão Arbitral e condene as partes no pagamento de despesas com o Tribunal Arbitral e despesas próprias em função do decaimento, conforme estabelecido no Regulamento de Arbitragem, e, em consequência, condene a Recorrida a pagar à Recorrente € 456.088,79, acrescido de juros à taxa legal, aplicando o mesmo critério com as custas e despesas com o presente recurso;
Tudo com as legais consequências.»

Ambas as partes responderam, pugnando pela improcedência do recurso da contraparte.

Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.

Objeto do recurso
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.º 2, e 639, n.ºs 1 e 2, do CPC).
As questões a decidir são as que a seguir se indicam, começando pelas suscitadas pelo recurso da demandante e depois pelas originadas no recurso da demandada. No entanto, na parte III do presente acórdão serão apreciadas e decididas pela ordem imposta pela lógica e pelas normas processuais.

Do recurso da demandante C.
Conclusões 216 a 219 – O acórdão arbitral padece de nulidade parcial por falta de fundamentação, consubstanciada na falta de explicação de todas as variáveis que utilizou para determinação dos danos correspondentes aos lucros cessantes e dos cálculos em que fundou a sua decisão?
Conclusão 220 – O acórdão arbitral é nulo por omissão de pronúncia, uma vez que não determina a natureza (comercial ou civil) dos juros em que condenou a demandada?
Conclusões 221 a 234 – Houve erro de julgamento na apreciação da prova e consequente decisão da matéria de facto, devendo passar a não provados os pontos 145, 160, 164, 168, 176 e 181, e considerarem-se provados os factos constantes dos Art.ºs 182.º, 183.º, 197.º, e 339.º da p.i.?
Conclusões 235 a 274 – A decisão padece de erro de julgamento no cálculo da indemnização?

Do recurso da demandada Ct.
Conclusões A) a G) – A prova deve ser reapreciada e a matéria de facto alterada nos termos pretendidos pela recorrente?
Conclusões I) a N) – O contrato de consórcio terminou por caducidade?
Conclusões O) a Y) – A apresentação da T. (dona da C.) a PER, em maio de 2014, constituía fundamento para a Ct. resolver o contrato de consórcio?
Subsidiariamente
Conclusão Z) – O acórdão arbitral concedeu indemnização com base numa causa de pedir distinta da invocada pela demandante, sendo, por isso, nulo?
Conclusões AA) a GG) – A demandante não invocou nem provou qualquer dano?
Conclusões HH) a PP) – Os prejuízos foram erradamente calculados?

II. Fundamentação de facto
Estão provados os seguintes factos (que correspondem aos adquiridos na 1.ª instância, com as alterações pontuais determinadas em III.C.):
(...)
III. Apreciação do mérito do recurso
A. Nota prévia: objeto do recurso e sucessão de leis da arbitragem voluntária no tempo
A convenção de arbitragem que legitimou o julgamento do caso sub judice por um tribunal arbitral foi estipulada em 8 de janeiro de 2003, integrada na cláusula 12.ª do contrato de consórcio então celebrado entre as partes.
Vigorava à data a Lei 31/86, de 29 de agosto (LAV-1986), lendo-se no seu artigo 29: se as partes não tiverem renunciado aos recursos, da decisão arbitral cabem para o tribunal da relação os mesmos recursos que caberiam da sentença proferida pelo tribunal de comarca (n.º 1); a autorização dada aos árbitros para julgarem segundo a equidade envolve a renúncia aos recursos (n.º 2).
Na convenção de arbitragem (acima transcrita no relatório) as partes, não só não renunciaram aos recursos, como expressaram que o tribunal arbitral julgaria de acordo com o direito constituído.
Em janeiro de 2003, aquando da estipulação da convenção de arbitragem, vigorava o velho Código de Processo Civil na redação do DL 329-A/95, de 12 de dezembro, já com várias alterações, mas na versão imediatamente anterior à introduzida pelo DL 38/2003, de 8 de março. Já então se admitia a modificação da decisão de facto pela Relação nos termos definidos pelo então art. 712 e desde que o recorrente cumprisse as regras impostas pelo art. 690-A. Apresentavam estes artigos a seguinte redação:
Artigo 712
1 - A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690.º-A, a decisão com base neles proferida;
(…)
2 - No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
(…)
Artigo 690.º-A
Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão de facto
1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na ata, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.
3 - Na hipótese prevista no número anterior, incumbe à parte contrária proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, também por referência ao assinalado na ata, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.
4 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A.
5 - Nos casos referidos nos n.ºs 2 a 4, o tribunal de recurso procederá à audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes, exceto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição, a qual será realizada por entidades externas para tanto contratadas pelo tribunal.
Os recorrentes cumpriram os ónus impostos pela norma e constam dos autos todos os elementos necessários à reapreciação da prova, nomeadamente, depoimentos que foram prestados por escrito (em conformidade com o art. 11, n.º 2, do Regulamento do Tribunal Arbitral, transcrito no relatório); os poucos prestados em audiência, foram gravados (cfr. art. 12, n.ºs 3 e 4, do mesmo Regulamento).
Este tribunal da Relação tem, portanto, ao seu dispor todos os elementos de que o tribunal a quo dispôs para formar a sua convicção.

Quando o processo arbitral foi iniciado corria o ano 2015 e estava em vigor a Lei da Arbitragem Voluntária aprovada pela Lei 63/2011, de 14 de dezembro (LAV). À luz desta, em arbitragem nacional, a sentença que se pronuncie sobre o fundo da causa ou que, sem conhecer deste, ponha termo ao processo arbitral, só é suscetível de recurso para o tribunal estadual competente no caso de as partes terem expressamente previsto tal possibilidade na convenção de arbitragem e desde que a causa não haja sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável (art. 39, n.º 4, da LAV hoje vigente). A regra que passou a vigorar foi a de a sentença arbitral ser apenas suscetível de impugnação na forma de pedido de anulação, perante alguma das causas enunciadas no n.º 3 do art. 46 da atual LAV, suscetíveis de afetar a validade da decisão.
A nova lei, como é próprio da lei processual, aplica-se aos processos arbitrais iniciados após a sua entrada em vigor. No entanto, também como expectável, foram ressalvados os recursos permitidos à data da celebração de convenções arbitrais anteriores – o n.º 3 do art. 4.º da Lei 63/2011, epigrafado «Disposição transitória», estabelece que as partes que tenham celebrado convenções de arbitragem antes da entrada em vigor do novo regime mantêm o direito aos recursos que caberiam da sentença arbitral, nos termos do artigo 29.º da velha LAV, caso o processo arbitral houvesse decorrido ao abrigo deste diploma.

Porquanto dito, assiste às recorrentes o direito de recorrerem da sentença arbitral, incluindo da decisão sobre a matéria de facto.

De dizer que a possibilidade ampla de recurso que a velha LAV-1986 conferia foi criticada e caso minoritário, no tempo e no espaço.
Com efeito, até ao DL 243/84, de 17 de julho (LAV-1984), que fixou o enquadramento legal da arbitragem, o velho CPC-1961 estabelecia, no seu art. 1522, que à decisão dos árbitros era aplicável o disposto no art. 716, que dispunha sobre vícios e reforma do acórdão em sede de apelação, o qual, por seu turno, remetia para o disposto nos arts. 666 a 670 referentes aos vícios e reforma das sentença.
A LAV-1984 estabeleceu expressamente que, salvo estipulação em contrário, o tribunal arbitral decidirá definitivamente todas as questões compreendidas na convenção de arbitragem (art. 25 da LAV-1984); sem prejuízo de a decisão arbitral poder ser anulada caso estivesse afetada de algum dos vícios enumerados no art. 31 do mesmo diploma.
A LAV-1986 veio permitir o recurso dos acórdãos dos árbitros nos mesmos termos em que era permitido recurso das sentenças dos tribunais judiciais, a menos que as partes renunciassem ao recurso. Esta solução foi fortemente criticada por contrariar a razão de ser do instituto da arbitragem voluntária e aniquilar os benefícios que as partes visam obter com a instituição do julgamento arbitral (neste sentido, Francisco Cortez, «A arbitragem voluntária em Portugal: dos ‘ricos homens’ aos tribunais privados», O Direito, 124, IV (1992) pp. 541-91 (581); Paula Costa e Silva, «Os meios de impugnação de decisões proferidas em arbitragem voluntária no direito interno português», ROA, 56, I (1996) pp. 180 e 188-9; Pedro Miguel Pina de Jesus, A intervenção dos tribunais judiciais na arbitragem voluntária, Coimbra, 2001, dissertação de mestrado, policopiada, pp. 196-8; Luís de Lima Pinheiro, «Apontamento sobre a impugnação da decisão arbitral», ROA, 67, III (2007), consultada https://portal.oa.pt/comunicacao/publicacoes/revista/, último § do ponto II).

As críticas da doutrina foram ouvidas e a atual LAV (2011) estabelece que, por defeito, não haverá recurso do acórdão arbitral; só poderá havê-lo se as partes tiverem expressamente ressalvado essa possibilidade na convenção de arbitragem e desde que a causa não tenha sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável.

Aqui chegados, sublinhamos que a solução da LAV-1986 que nos leva à apreciação dos presentes recursos em toda a sua abrangência foi uma exceção no tempo e no espaço (leiam-se as soluções de outros países na bibliografia citada), exceção que contraria a lógica de uma convenção de arbitragem, permitindo aquilo que, à partida, as partes terão querido afastar: a apreciação da causa por um órgão jurisdicional, com os seus processos, tempos e vocação generalista.

B. Nulidades imputadas ao acórdão
a) Da concessão de indemnização pelo tribunal a quo com base numa causa de pedir distinta da invocada pela demandante
Esta questão foi suscitada pela demandada Ct. a título subsidiário (conclusão Z) do recurso da Ct.), pelo que, apesar da sua anterioridade lógica na economia do acórdão, apenas a apreciaremos a final, se necessário.

b) Nulidade parcial por falta de explicação de todas as variáveis utilizadas para determinação dos danos correspondentes aos lucros cessantes e dos cálculos que alicerçaram a decisão
Nas suas conclusões 216 a 219, a demandante C. imputa ao acórdão arbitral o vício da nulidade parcial por falta de fundamentação no que respeita à explicação de todas as variáveis que utilizou para determinação dos danos correspondentes aos lucros cessantes e dos cálculos em que fundou a sua decisão.

Tem sido jurisprudência recorrente e unânime que a deficiente ou insuficiente fundamentação da sentença não gera nulidade da mesma. Apenas uma falta absoluta de fundamentação pode reconduzir-se à causa de nulidade prevista no art. 615, n.º 1, al. b) do CPC.
No caso, o Tribunal Arbitral justificou, no decurso de seis páginas, o valor da indemnização (v. n.ºs 51 a 54 do acórdão). Indicou as avaliações de que partia, fundamentou a sua opção por dado índice de construção e por certo valor de venda, chegou a dado valor a que abateu os gastos, encontrou o lucro e indicou a cláusula contratual que estipula a fórmula pela qual chegou ao valor da indemnização concedida.
Independentemente da bondade do valor indemnizatório – questão que se prende com eventual erro de julgamento –, o acórdão não padece da imputada nulidade por falta de fundamentação.

c) Omissão de pronúncia quanto à natureza (comercial ou civil) dos juros em que a demandada foi condenada
Pretende ainda a demandante C. (conclusão 220 das suas alegações de recurso) que o acórdão arbitral enferma de nulidade por ser omisso quanto à natureza (comercial ou civil) dos juros em que condenou a demandada.
Nos termos do disposto no art. 615, n.º 1, al. d), do CPC, a sentença é nula quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
No caso dos autos, em que a titular do crédito é uma empresa comercial (aliás, ambas as partes o são) e em que estão em causa juros moratórios legais, diz a lei (art. 102, § 3.º do CCom) que tais juros serão os fixados por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça para o efeito.
A natureza comercial dos juros deriva direta e claramente da lei, como o tribunal a quo expressou no despacho n.º 25, de 11 de abril, não determinando a omissão de indicação expressa no acórdão a esse respeito a nulidade do mesmo.

C. Impugnação da decisão de facto
a) Dever de reapreciação da decisão de facto
Como demos conta em III.A., à data da celebração da convenção de arbitragem dos autos (janeiro de 2003) vigorava a LAV-1986, que permitia que da decisão arbitral fossem interpostos para o tribunal da relação os mesmos recursos que caberiam da sentença proferida pelo tribunal de comarca, a menos que as partes tivessem renunciado aos recursos ou autorizado os árbitros a julgarem segundo a equidade, o que no caso não fizeram.
Quando o processo arbitral foi iniciado corria o ano 2015 e estava em vigor a Lei da Arbitragem Voluntária aprovada pela Lei 63/2011 (LAV), que estabelece regras de recurso mais restritivas. Porém, foram ressalvados os recursos permitidos à data da celebração de convenções arbitrais anteriores, mantendo em tal caso as partes o direito aos recursos que caberiam da sentença arbitral, nos termos do artigo 29 da velha LAV, caso o processo arbitral houvesse decorrido ao abrigo deste diploma (n.º 3 do art. 4.º da Lei 63/2011).

Em janeiro de 2003, vigorava o velho Código de Processo Civil na redação do DL 329-A/95, de 12 de dezembro, já com várias alterações, mas na versão imediatamente anterior à introduzida pelo DL 38/2003, de 8 de março, que admitia a modificação da decisão de facto pela Relação nos termos definidos pelo então art. 712 e desde que o recorrente cumprisse as regras impostas pelo art. 690-A (especificação dos concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados e dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impusessem decisão diversa da recorrida sobre os pontos da matéria de facto impugnados).
Os recorrentes cumpriram os ónus impostos pela norma e constam dos autos todos os elementos necessários à reapreciação da prova, nomeadamente depoimentos que foram prestados por escrito (em conformidade com o art. 11, n.º 2, do Regulamento do Tribunal Arbitral, transcrito no relatório), ou, no caso dos poucos prestados em audiência, gravados (cfr. art. 12, n.ºs 3 e 4, do mesmo Regulamento).
Este tribunal da Relação tem, portanto, ao seu dispor todos os elementos de que o tribunal a quo dispôs para formar a sua convicção.

Os tribunais da Relação procedem à efetiva reapreciação da prova produzida (nomeadamente dos meios de prova indicados no recurso, mas também de outros disponíveis e que entendam relevantes) da mesma forma – em consonância com os mesmos parâmetros legais – que o faz o juiz de 1.ª instância.
Tanto significa que os juízes desembargadores apreciam livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão (art. 607, n.º 5, do CPC).
Na sua livre apreciação, os juízes desembargadores não estão condicionados pela apreciação e fundamentação do tribunal a quo. Ou seja, o objeto da apreciação em 2.ª instância é a prova produzida (tal como em 1.ª instância) e não a apreciação que a 1.ª instância fez dessa prova (neste sentido, exemplificativamente, os Acórdãos do STJ de 11/02/2016, proc. 907/13.5TBPTG.E1.S1, de 10/12/2015, proc. 2367/12.9TTLSB.L1.S1, e de 14/02/2012, proc. 6283/09.3TBBRG.G1.S1, este último à luz do CPC anterior).
As citadas normas aplicam-se de igual forma quando está em causa uma sentença proferida em 1.ª instância por um tribunal arbitral, que seja impugnável na sua decisão de facto, como sucede no caso sub judice. Não encontramos no ordenamento aplicável qualquer norma que autorize o afastamento das citadas.

Em síntese: porquanto dito, assiste às recorrentes o direito de recorrerem da sentença arbitral, incluindo da decisão sobre a matéria de facto, pelo que passamos a reapreciar a prova e a apreciar as impugnações da decisão de facto.

(...)
d) Nota intercalar
As alterações introduzidas na decisão de facto foram pontuais, muitas delas resultantes de acordo entre as partes, e não são decisivas para a decisão que, a final, vamos proferir.

D. Do contrato celebrado entre as partes
O cerne da resolução do litígio que se instalou entre as partes e que, neste recurso, permanece consiste em saber por que forma cessou a relação contratual, se a Ct. é civilmente responsável por essa cessação e, na positiva, em que medida a C. deve ser ressarcida. As respostas a estas questões, e a várias outras que com elas se conexionam, exige detida análise do contrato. O que diremos nesta parte D é crucial não só para a compreensão, como para a resolução do problema que se atingirá na parte E.

a) Interpretação do contrato que as partes celebraram
Em certo dia do ano 2003, por acordo escrito que intitularam «contrato de consórcio», as ora partes e ainda duas outras sociedades que essencialmente as detinham estipularam um conjunto harmonioso de considerandos e cláusulas, que foi o culminar de um processo negocial complexo e deu início a uma relação contratual de muitos anos. É o texto desse documento (reproduzido por fotocópia a fls. 295 e ss. dos autos e acima transcrito nos factos 29, 31 e 32) que importa interpretar para perceber o seu conteúdo, designadamente a que atribuições contratuais as partes se comprometeram.
Nas primeiras cláusulas do contrato, as partes declararam constituir-se em consórcio para a promoção e realização de certo empreendimento imobiliário que previam levar a cabo em dado terreno da Ct., de acordo com o plano de urbanização, de pormenor ou de loteamento que de comum acordo iriam gizar.
Logo definiram o significado de «empreendimento» para efeitos do contrato como o conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda (cláusula 1.ª, n.º 3). A este tema, fundamental, voltaremos.
As contribuições das partes para o objetivo comum – atribuições contratuais principais – ficaram estabelecidas na cláusula 2.ª. À Ct. competia suportar todos os custos relativos ao «empreendimento», designadamente, os relativos a aquisição do terreno, realização de estudos, assessorias ou consultorias e realização de projetos, pagamento de licenças, taxas, impostos, compensações, emolumentos e encargos similares, realização e obras de infraestruturas e de construção, indemnizações, compensações ou ressarcimento de terceiros por atos ou factos causados pela execução de obras e que não fossem suportados pelos empreiteiros, financiamentos, despesas de comercialização e de comissões de venda, seguros ou garantias bancárias.
À C., por seu turno, competia coordenar e orientar a elaboração de estudos, anteprojetos e pedidos de licenciamento e de quaisquer outros necessários ou convenientes para a implantação do empreendimento, proceder à indicação das entidades candidatas à prestação de serviços, colaborar na elaboração dos cadernos de encargos e demais peças necessárias à contratação de serviços por concurso público, acompanhar todos os atos e diligências necessários à regularização e manutenção das obrigações jurídicas e administrativas, promover as atividades necessárias à comercialização do empreendimento.
Dizer que à Ct. competia suportar os custos de aquisição do terreno, de realização de estudos, consultorias e projetos, de licenças, taxas, impostos, de obras de infraestruturas e de construção, financiamentos, despesas de comercialização e de comissões de venda, seguros, etc., é o mesmo que dizer que a Ct. contribuía para o objetivo comum com o terreno, os estudos e projetos, as obras de infraestruturas e construção, a comercialização, etc. (sem prejuízo de essas obras e serviços serem contratados a terceiros).
As contribuições (de bens ou atividades) das duas partes eram contribuições para o objetivo ou fim comum de promoção e realização do empreendimento imobiliário; não eram contribuições para qualquer património comum que as partes não previram existir (nem seria compatível com o contrato de consórcio que declararam celebrar). De outro prisma, não haveria exercício em comum de uma atividade, mas exercícios de atividades autónomas que se coordenariam com vista à consecução de um objetivo comum (este traço distingue o consórcio da sociedade – v.g., Raúl Ventura, «Primeiras notas sobre o contrato de consórcio», ROA, 41, III (set.-dez. 1981) pp. 609-690 (641-643), ou Oliveira Ascensão, Direito Comercial, Parte Geral, I, Lisboa, 1988, lições de 1986/87 policopiadas, p. 331). Cada uma das partes manteve-se como pessoa autónoma, nenhuma terceira pessoa foi constituída, e os seus patrimónios mantiveram-se separados.
Sendo ambas sociedades comerciais, ambas pretendiam vir a lucrar com esta colaboração (considerandos L) e M) e cláusula 9.ª).
No contrato há referências ao «lucro do consórcio». Porém, da análise do mesmo, sobretudo da sua cláusula 9.ª, percebe-se que os lucros que existissem seriam da Ct. – e só ulteriormente seriam repartidos pelas partes de acordo com certa fórmula.
Por «lucro do consórcio» entendia-se a eventual diferença positiva entre, por um lado, o valor das receitas que, direta ou indiretamente, emergissem do empreendimento e, por outro lado, a totalidade dos custos desse mesmo empreendimento aí se incluindo também a remuneração do capital próprio utilizado pela Ct. na cobertura dos custos. Note-se que apenas a Ct. adquiria bens e serviços e apenas a Ct. suportaria o eventual resultado negativo do consórcio.
Receitas do consórcio seriam as receitas da venda a terceiros dos produtos imobiliários que resultassem do empreendimento, fosse qual fosse o fim a que se destinavam, e ainda quaisquer outras receitas que resultassem de penalidades contratuais e do aproveitamento dos espaços ou construções existentes no prédio. Sendo o prédio da Ct. e sendo ela a adquirente dos bens e serviços, as receitas seriam receitas suas (sem prejuízo de, a partir delas, se apurar o lucro que as partes acordaram repartir de certa maneira, de forma a remunerar as contribuições da C.).
Declararam as partes que a C. não teria direito a qualquer participação no «lucro do consórcio» nem teria direito a qualquer outra remuneração pela sua participação no mesmo, a não ser em caso de apuramento de «lucro do consórcio» nos termos definidos.
De mencionar, ainda, que as partes consignaram no contrato que estavam conscientes de que a viabilidade económica do empreendimento, dado o elevado preço de aquisição do terreno, oferecia um risco mais elevado que o corrente no mercado, nomeadamente considerando que o PDM apontava para um cenário de apenas 237.225 m2 de construção; e, ainda, que, ao participar no consórcio, a C. estava disposta a aceitar nada receber pela sua contribuição se o consórcio não gerasse lucro.

b) Qualificação
Apesar de nas alíneas c) e d) que se seguem voltarmos à interpretação de aspetos do texto do contrato cruciais para a apreciação dos recursos dos autos (sendo, aliás, esses os aspetos que maiores problemas hermenêuticos colocam), o que fica dito na alínea a) é suficiente para procedermos à qualificação do concreto contrato pelas partes celebrado (sobre a relação entre a qualificação dos contratos e a sua interpretação, Rui Pinto Duarte, Tipicidade e Atipicidade dos Contratos, Almedina, 2000, pp. 63-4, obra que trata dos problemas de qualificação, e sobre os problemas da interpretação, do mesmo Autor, A interpretação dos contratos, Almedina, 2016).
De dizer que as partes não discutem a celebração do contrato, o seu conteúdo escrito e a sua execução até certo ponto; e também estão de acordo quanto à sua qualificação jurídica como contrato de consórcio, qualificação que o Tribunal Arbitral acolheu. Discutem, como veremos adiante, a interpretação de estipulações que não são determinantes para a qualificação como contrato de consórcio.
Aquando da celebração do contrato, as partes intitularam-no como consórcio e, a par e passo, descreveram a sua relação recorrendo a tal termo («constituem-se em consórcio», «o consórcio será interno», «durante a vigência do contrato de consórcio…», «o lucro do consórcio», «por lucro do consórcio entender-se-á», entre outras referências).
Como é sabido, a qualificação feita pelas partes não é necessariamente a que melhor se relaciona com a materialidade do clausulado, mas não deixa de ser um índice do tipo, ou seja, um indício de que as partes quiseram submeter a sua relação contratual, naquilo que expressamente não previram, ao regime legal do contrato de consórcio (sobre a importância da estipulação do tipo e neste sentido, Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos atípicos, Almedina, 1995, pp. 129-137).

i. O contrato de consórcio na lei portuguesa
O contrato de consórcio é regulado pela primeira vez no nosso país pelo DL 231/81, de 28 de julho, até à data sem alterações (de ora em diante DL 231/81 ou LCC, sigla Lei do Contrato de Consórcio). Vejamo-lo panoramicamente com incidência nas normas necessárias à apreciação da causa.
Conjugando os seus primeiros dois artigos, consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou coletivas, que exercem uma atividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição com um (ou mais) dos seguintes fins: a) realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma atividade contínua; b) execução de determinado empreendimento; c) fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; d) pesquisa ou exploração de recursos naturais; e/ou e) produção de bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio.
O objeto imediato do contrato de consórcio é, então, a realização concertada de uma atividade, ou a efetuação de contribuições concertadas, com vista à preparação ou execução de um empreendimento, a fornecimentos a terceiros, à pesquisa ou exploração de recursos naturais, ou à produção de bens a repartir pelos consorciados. Ou seja, o objeto imediato não é a realização de uma qualquer atividade ou a efetivação de uma dada contribuição. Também não é a realização concertada de uma qualquer atividade ou a efetivação concertada de uma dada contribuição. O objeto imediato do consórcio é complexo e exige a realização concertada de uma atividade ou a efetivação concertada de contribuições para um dos mencionados fins.
Em nosso abono, Manuel António Pita e Carlos Ferreira de Almeida. Do primeiro: «Fim imediato do contrato é a realização de uma das atividades taxativamente enumeradas no art. 2.º. (…) Para além deste fim imediato, poderemos considerar o fim mediato que será aquele interesse futuro que levou as partes a contratar. (…) De acordo com a análise anterior, defini-lo-emos como o contrato em que duas ou mais empresas concertam a sua participação no desenvolvimento de uma das seguintes atividades: a) Realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento quer de uma atividade contínua; b) (…)» (Manuel António Pita, «Contrato de consórcio», Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXX, n.º 2 (abril-jun. 1988) pp. 189-235 (200)).
Nas palavras do segundo: «o consórcio tem como objeto (no sentido de fim imediato, à semelhança do objeto das sociedades) a preparação ou execução de um certo empreendimento (alínea a), 1.ª parte, e alínea b) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 231/81) ou o exercício de uma atividade contínua por tempo limitado, com ou sem repercussão externa (alínea a), 2.ª parte, e alíneas c), d) e e) do artigo 2.º)» (Carlos Ferreira de Almeida, Contratos III, Contratos de liberalidade, de cooperação e de risco, Almedina, 2012, p. 126).

Conjugando os dois primeiros artigos da LCC, concluímos que o contrato de consórcio pode ter por objeto: i) atividades contínuas ou reiteradas (fornecimento de bens a terceiros, pesquisa ou exploração de recursos naturais, produção de bens que possam ser repartidos em espécie entre os membros do consórcio); ou ii) atividades delimitadas pela consecução de um dado resultado (realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios, quer de uma atividade contínua quer de um determinado empreendimento, e execução de determinado empreendimento).
No primeiro caso, por força do disposto no art. 11, n.º 2, da LCC, o consórcio extinguir-se-á decorridos dez anos sobre a data da sua celebração, sem prejuízo de eventuais prorrogações expressas, a menos que (cfr. 1.ª parte do mesmo número com al. c) do n.º 1 do mesmo artigo) as partes tenham fixado ab initio prazo mais longo.
No segundo caso, o consórcio extingue-se pela realização do seu objeto ou por este se tornar impossível (al. b) do n.º 1 do art. 11 da LCC), o que eventualmente sucederá num período de tempo superior a dez anos (são normas distintas, dirigidas a situações distintas).
Na interpretação que acabámos de fazer da conjugação dos artigos 2.º e 11 cremos ser acompanhados por Carlos Ferreira de Almeida, na seguinte passagem: «O caráter temporário do contrato resulta do próprio conceito de empreendimento ou, em relação a “atividades contínuas”, do efeito de caducidade provocado pelo decurso do prazo que se presume não exceder dez anos» (Contratos, III, Contratos de liberalidade, de cooperação e de risco, Almedina, 2012, pp. 126).
Bem como por Oliveira Ascensão, quando escreveu: «O consórcio refere-se, genericamente, a um determinado empreendimento. Por isso supõe um caráter transitório. Mas incluem-se objetos que poderão ser perpétuos (al. c) ou de longa duração (al. d). Por isso, o art. 11.º/2 prevê que o consórcio se extinga passados 10 anos, sem prejuízo de eventuais prorrogações.» (Direito Comercial, Parte Geral, I, Lisboa, 1988, lições de 1986/87 policopiadas, p. 332).
Ainda, anteriormente, Raúl Ventura, pai do diploma, nas seguintes passagens: «A duração do contrato de consórcio será mais ou menos longa conforme a espécie de empreendimento; por definição, não é neste caso fixada em função do tempo, mas sim da realização do objeto.
Uma vez que as cinco alíneas do artigo 2.º enumeram objetos determinados do contrato de consórcio, podem os objetos contidos nas alíneas c), d) e e) ser exercidos continuadamente. Os atos preparatórios referidos na alínea a) são por natureza concretos e finitos e, se não existisse a alínea a), poderiam ser considerados um “determinado empreendimento” para os efeitos da alínea b)» («Primeiras notas sobre o contrato de consórcio», ROA, 41, III (set.-dez. 1981) p. 647).
Adiante, nas pp. 665-6, alcança-se a mesma interpretação: «a frase inicial do n.º 2 - «não se verificando nenhuma das hipóteses previstas no número anterior» - tanto pode ser entendida como «não se tendo verificado antes dos dez anos nenhuma das hipóteses previstas no número anterior, entre as quais o fim do prazo inferior a dez anos» ou como «não se verificando nenhuma das hipóteses previstas no número anterior, entre as quais ter o contrato fixado um prazo, ou eliminado qualquer prazo, findo o qual o contrato se extingue». Inclino-me para a segunda interpretação.».

No art. 20 da LCC proíbe-se a constituição de fundos comuns em qualquer consórcio, pelo que qualquer modalidade de cooperação entre empresas que dê origem a uma pessoa jurídica diversa dos seus elementos ou mesmo a um simples património autónomo não será um consórcio, face à lei portuguesa, pelo que não se lhe aplicarão de forma direta as normas do DL 231/81.

O contrato está sujeito a forma escrita, se forma mais solene não for exigida em caso de transmissão de bens imóveis entre os membros do consórcio (art. 3.º do DL 231/81).

Sobre a atual figura do contrato de consórcio, na doutrina portuguesa, além dos citados Raúl Ventura, Oliveira Ascensão, Carlos Ferreira de Almeida e Manuel António Pita, v. António Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, I, 2.ª ed., Almedina, 2007, pp. 637-650, José A. Engrácia Antunes, Direito dos contratos comerciais, Almedina, 2009, pp. 398-405, Rui Pinto Duarte, «Formas jurídicas de cooperação entre empresas», Direito das Sociedades em Revista, ano 2, vol. 4 (set. 2010) pp. 137-157.

ii. Correspondência entre a ocorrência e o modelo
O contrato dos autos, acima descrito nos n.ºs 29 a 32 da matéria de facto e, no essencial, sumariado e interpretado na precedente alínea a), reconduz-se ao modelo descrito e regulado no DL 231/81. Com efeito, as estipulações das partes, nomeadamente a respeito das atribuições contratuais de cada uma, têm correspondência na descrição do conteúdo do modelo contratual em causa feita nos primeiros artigos do diploma. As partes obrigaram-se a concertadamente praticar atos para a promoção e realização de dado empreendimento imobiliário, o que se enquadra na previsão dos artigos 1.º e 2.º da LCC.

Apenas a expressão «lucro do consórcio» utilizada no texto do contrato poderia suscitar algumas dúvidas. Como é sabido, o contrato de consórcio não dá corpo a uma nova pessoa jurídica, nem sequer a um património autónomo, pelo que as suas receitas, custos ou lucros sê-lo-ão apenas dos seus membros. Vimos na predita alínea a) que, apesar da expressão, resulta claramente do contrato que as receitas, os custos e, subsequentemente, os lucros são da Ct. e que a expressão «lucro do consórcio» é apenas uma abreviação do resultado que as partes acordaram apurar e repartir entre elas como resultado da colaboração mantida no acordado consórcio interno.
No consórcio interno, que foi o estabelecido entre as partes, as atividades ou os bens são fornecidos a um dos membros do consórcio e só este estabelece relações com terceiros; e as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a terceiros por cada um dos membros do consórcio, sem expressa invocação dessa qualidade (n.º 1 do artigo 5.º da LCC). Neste tipo de consórcio (interno) é usual as partes convencionarem a participação nos lucros, perdas, ou ambos, aplicando-se em tal caso, por via do disposto no art. 18 da LCC, o disposto no artigo 25, destinado ao contrato de associação em participação.
A expressão «lucro do consórcio» na aceção que as partes lhe conferiram é, portanto, consentânea com a modalidade de consórcio acordado entre as partes.

c) Significado de «empreendimento» no âmbito do contrato
Aprofundaremos nesta alínea e na próxima a interpretação de duas cláusulas contratuais que são fundamentais para percebermos se o contrato de consórcio pertencia a um subtipo suscetível de terminar automaticamente pelo decurso do prazo de dez anos e, na negativa, por que meio cessou a relação contratual.
As prestações características do celebrado contrato de consórcio, já acima o dissemos, consistem em determinadas contribuições das partes, através de certas atividades, contratações de terceiros e pagamento de despesas, para a consecução do «empreendimento». Este foi logo definido na cláusula 1.ª, n.º 3, do contrato como o conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda.
Repare-se que o «empreendimento» assim definido não é sequer o conjunto dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio. O «empreendimento» definido pelas partes muito menos consiste naquilo que em geral viria à ideia com a palavra: não consiste no conjunto de construções com diversos destinos (habitação, escritórios, instalações de serviços públicos, etc.), com os arruamentos e espaços circundantes de uso comum, num todo harmónico correspondente à noção de bairro ou conjunto de bairros de uma cidade. O «empreendimento» visado no contrato é o conjunto das ações que serão objeto da colaboração entre as partes e tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda.
As contribuições das partes para o objetivo comum correspondem às acima descritas – pela Ct., suportar os custos, designadamente, os relativos a aquisição do terreno, realização de estudos e realização de projetos, pagamento de licenças, taxas e impostos, realização e obras de infraestruturas e de construção, financiamentos, despesas de comercialização e de comissões de venda, seguros ou garantias bancárias, e, pela C., coordenar e orientar a elaboração de estudos, anteprojetos e pedidos de licenciamento, acompanhar todos os atos e diligências necessárias à regularização e manutenção das obrigações jurídicas e administrativas, promover as atividades necessárias à comercialização do empreendimento… –, e são estes conjuntos de ações que foram designados no n.º 3 da cláusula 1.ª como «empreendimento».
Ou seja, «empreendimento» no âmbito do contrato integra ainda as prestações contratuais das partes, o objeto correspondente ao interesse primário ou final das partes no consórcio, e não o interesse secundário ou fim de emprego como, à partida, seríamos levados a pensar. Sobre a relação entre a finalidade que motiva a celebração do contrato (também dita interesse secundário ou fim de emprego) e aquilo a que as partes se comprometem e que consubstancia o seu interesse primário ou final no contrato, v. Adriano Vaz Serra, «Impossibilidade superveniente por causa não imputável ao devedor e desaparecimento do interesse do credor», BMJ 46 (jan. 1955) maxime pp. 134-42; ainda sobre o interesse do credor, Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil português, II, Direito das obrigações, t. I, Almedina, 2009, pp. 325-34; Almeida Costa, Direito das obrigações, 12.ª ed., Almedina, 2009, pp. 109-13; Ribeiro de Faria, Direito das obrigações, I, Almedina, 1990, pp. 48-52; Paulo Mota Pinto, Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, I, Coimbra Editora, 2008, pp. 491-2; Galvão Telles, Direito das obrigações, 7.ª ed., Coimbra Editora, 1997, pp. 13-5; Antunes Varela, Das obrigações em geral, I, 10.ª ed., Almedina, 2000, pp. 157-60.
De assinalar que as partes deixaram fora do consórcio a fase de edificação dos prédios para venda, mas não atos, contemporâneos ou posteriores à edificação, destinados à venda dos imóveis edificados. Isso mesmo resulta da cl. 2.ª, n.º 1, al. i), segundo a qual a Ct., no âmbito do consórcio, suportará as despesas de comercialização e de comissões de venda. Tanto significa que as partes previram uma longa vida para o consórcio, de tempo que não fixaram mas que seria provavelmente superior a dez anos. O que não significa – atenção – que tivessem previsto que a fase inicial de planificação, sem qualquer aprovação camarária, pudesse ultrapassar tal período e, muito menos, que se conformassem com isso se o tivessem previsto (ponto a que tornaremos).
A total realização do «empreendimento» (conjunto de atos tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, ainda que não englobando a fase de edificação de prédios para venda), ou seja, a total execução do contrato era previsivelmente muito longa, também porque estava dependente de atos e vontades de terceiros, nomeadamente de aprovações e licenças camarárias.

d) Cláusula 10.ª, n.º 1 – cláusula acessória ou objeto imediato do contrato?
Na cláusula 10.ª, n.º 1, as partes estipularam que o acordo duraria até ao final da execução do «empreendimento». Estamos agora em condições de perceber o sentido e a natureza desta cláusula.
No decurso dos autos foi amplamente discutida a sua interpretação, tendo sido colocadas duas hipóteses: constituiria um termo, ainda que incerto quanto ao momento da ocorrência; ou constituiria uma condição, dada a incerteza da própria ocorrência do final da execução.
A primeira foi defendida no parecer de António Pinto Monteiro e acolhida no acórdão recorrido: o contrato celebrado entre as partes estaria sujeito a prazo consubstanciado na «execução do empreendimento», por força da cláusula 10.ª, n.º 1 (que estabelece que «o presente acordo durará até ao final da execução do Empreendimento»).
A segunda hipótese foi afirmada no parecer de José A. Engrácia Antunes: «A Cláusula 10.ª, n.º 1, do contrato de consórcio que estabelece, que "o presente acordo durará até ao final da execução do Empreendimento", constitui inequivocamente uma condição, e não um termo ou "prazo", no sentido do art. 11.º, n.º 1, c) da LCC. Por conseguinte, inexistindo um prazo convencional previsto pelas partes, aplica-se supletivamente o prazo legal de 10 anos previsto no art. 11.º, n.º 2 da LCC».
Quid juris?
A condição está definida no art. 270 como um acontecimento futuro e incerto ao qual as partes subordinam a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz‐se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva. Ao «termo» alude o art. 278 do CC, estabelecendo que, se for estipulado que os efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento, é aplicável à estipulação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 272 e 273 (referentes à condição). Ambos – termo e a condição – são elementos acidentais de um contrato, cláusulas acessórias pelas quais as partes subordinam a eficácia inicial ou final do mesmo a um acontecimento futuro, e de ocorrência incerta no caso da condição, ou de ocorrência certa, ainda que eventualmente incerto o momento dela, no caso do termo (clara abordagem em Inocêncio Galvão Telles, Manual dos contratos em geral, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2002, pp. 257-81).
O «empreendimento» dos autos tem um ponto de contacto com a condição, na medida em que, a sua cabal consecução, está dependente de atos de terceiros (que não estão vinculados a praticá-los), o que lhe confere uma nota de incerteza. No entanto, não se trata de uma condição, nem tão-pouco de um termo.
Relembramos que, no âmbito do contrato, o «empreendimento» consiste no conjunto de ações nas quais as partes se comprometeram a colaborar, tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio (cl. 1.ª, n.ºs 1 e 3). O «empreendimento» corresponde, assim, às atribuições contratuais das partes no consórcio. Logo, quando as partes afirmam que o contrato durará até ao final da execução do «empreendimento», estão a dizer que durará até à sua (do contrato) execução.
A cláusula 10.ª, n.º 1, não constitui, portanto, nem termo nem condição, mas referência à realização do objeto imediato do contrato, à execução das prestações das partes. Isto mesmo vem a ser afirmado no parecer de Menezes Leitão, junto em sede de recurso (p. 26 do mesmo), embora não partilhemos todas as consequências aí tiradas dessa afirmação.
A cláusula, tal como a interpretamos, pode parecer supérflua. A LCC, no seu artigo 11, n.º 1, al. b), consagra norma idêntica ao estabelecer que o consórcio se extingue pela realização do seu objeto. Também no Código Civil encontramos implícita a mesma norma: o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado (art. 762, n.º 1) e há um capítulo dedicado às «causas de extinção da obrigação além do cumprimento» (arts. 837 e ss.). «Ao mesmo tempo que meio normal de satisfação do interesse do credor e forma regular de libertação do devedor, o cumprimento é uma causa extintiva da obrigação» (Antunes Varela, Das obrigações em geral, II, 5.ª ed., Almedina, 1992, p. 167).
Todavia, se tivermos presente que a execução do consórcio dos autos tem algumas notas de aleatoriedade, a cláusula 10.ª, n.º 1, assume alguma utilidade. A execução final e total do «empreendimento» não estava apenas nas mãos das partes, estando dependente de atos alheios, nomeadamente da CMA, pelo que com a estipulação em causa as partes deixaram claro que, ainda assim, o consórcio se manteria enquanto o seu objeto não se realizasse e fosse realizável.
Foi perspetivado à partida que duraria muitos anos, eventualmente mais de dez, tanto assim que, decorridos dez anos, nenhuma das partes fez menção de cessar a colaboração e mantiveram a suas ações concertadas em vista do objetivo, como anteriormente (sobre a relevância da conduta das partes posterior ao contrato, enquanto elemento interpretativo deste, leia-se a já citada obra de Rui Pinto Duarte, A interpretação dos contratos, Almedina 2016, pp. 59-61).
Todavia, o facto de as partes terem claramente perspetivado que a execução do acordado consórcio pudesse ter vida superior a dez anos, não significa que pretendessem ficar eternamente vinculadas à tentativa de levar por diante um empreendimento que, decorridos mais de dez anos, estava praticamente na estaca zero…

e) O contrato e o tempo da sua execução
O contrato celebrado entre as partes, considerando os conteúdos das prestações acordadas, prolongar-se-ia necessariamente no tempo, por anos vários.
Classificam-se os contratos (ou, segundo os autores e as obras, as prestações contratuais, ou as obrigações) do ponto de vista da influência do tempo no conteúdo das prestações. Sem prejuízo de algumas diferenças terminológicas, distinguem-se contratos (prestações, obrigações) de execução instantânea e de execução duradoura (podendo esta ser continuada ou periódica, esta última também dita reiterada ou de trato sucessivo). Sobre esta classificação, subclassificações, e aspetos diferenciados dos respetivos regimes jurídicos, vide na doutrina portuguesa, nomeadamente, António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil português, II, Direito das obrigações, t. I, Almedina, 2009, pp. 523-36; Pessoa Jorge, Direito das obrigações, I, AAFDL, 1975/76, pp. 84-8; Castro Mendes, Teoria geral do direito civil, II, AAFDL, 1995, pp. 380-1; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria geral do direito civil, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2005, pp. 659-62; Inocêncio Galvão Telles, Direito das obrigações, 7.ª ed., Coimbra Editora, 1997, pp. 39-41 (prestação), e Manual dos contratos em geral, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2002, pp. 492-3 (contrato); João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em geral, I, 10.ª ed., Almedina, 2000, pp. 92-7.
O fator tempo está presente na execução de qualquer atividade ou prestação, mesmo na mais isolada ou instantânea. Porém, nos contratos de execução duradoura o tempo é indissociável da prestação, o devedor obriga-se a ir prestando – durante um período, pré-determinado ou indeterminado –, não tendo forma de cumprir antecipadamente, uma vez que o interesse do credor passa pela execução dessa prestação de forma contínua ou reiterada.
Dito de outro modo, o que está em causa nos contratos de execução duradoura não é apenas a circunstância de carecerem de tempo para a sua execução, mas a circunstância de essa execução, repetida ou continuada, fazer parte da prestação que realiza o interesse primário ou final do credor. A prestação de execução duradoura não se pode antecipar, concentrar num período curto ou num momento, pois o fator tempo influência o conteúdo da obrigação.
Nos contratos de execução instantânea, por seu turno, o que interessa ao credor é a realização (do resultado) da prestação quanto antes ou no momento acordado, não tendo qualquer interesse na sua realização prolongada.
Exemplificando: no contrato de arrendamento, interessa que o gozo seja facultado durante lapso de tempo, não podendo a prestação do senhorio executar-se de imediato, nem correspondendo à sua plena realização a cessão do gozo da coisa em período mais curto que o acordado; no contrato de trabalho, o que interessa ao empregador é dispor da atividade do trabalhador durante o tempo acordado ou por tempo indeterminado, não sendo a prestação de trabalho passível de se executar instantaneamente; no contrato de agência, interessa a promoção de contratos ao longo do tempo, não realizando a prestação o agente que interrompe a promoção, nem sendo possível ao agente concentrar a realização da prestação num dado momento.

Outros contratos há cuja execução implica a realização de atos ao longo de um período de tempo mais ou menos longo, mas em que o interesse primário do credor está apenas na obtenção do resultado que se alcança no final do processo. Assim sucede, por exemplo, em geral, nas empreitadas e nos contratos de mediação imobiliária. Apesar de entre a celebração do contrato de empreitada e a conclusão da obra decorrer um tempo que pode ser longo, isso deve-se a circunstâncias naturais, e não à necessidade jurídica de realizar a prestação duradouramente. O mesmo sucede na mediação imobiliária: apesar de entre a celebração do contrato respetivo e a obtenção ou apresentação de um interessado decorrer certo tempo, isso deve-se ao facto de o mediador poder não ser bem-sucedido de imediato. O interesse do credor está na realização da obra e na obtenção do interessado e não na perduração no tempo dos atos de execução da empreitada ou de publicitação do contrato a celebrar. A prestação está delimitada pelo resultado (obra, interessado) e efetua-se no momento da sua obtenção. São contratos de execução prolongada, os quais, tendo em conta a característica que aparta contratos de execução duradoura e contratos de execução instantânea (a dita influência do tempo no conteúdo da prestação), se integram na categoria dos de execução instantânea.

Em síntese: nos contratos com prestações de execução duradoura, a prestação que satisfaz o interesse do credor tem de ser executada, de forma contínua ou reiterada, durante a vida da relação contratual, sendo nessa execução duradoura que reside o interesse primário ou final do credor; nos contratos com prestações de execução prolongada, a atividade prestacional realiza-se de facto durante um lapso temporal considerável, mas o resultado que satisfaz o interesse do credor executa-se de modo instantâneo (sobre a distinção entre contratos de execução duradoura e contratos de execução prolongada, v. Pedro Romano Martinez, Da cessação do contrato, 3.ª ed., Almedina, 2015, pp. 225-8, e Higina Orvalho Castelo, O contrato de mediação, Almedina, 2014, pp. 346-51).

É usual subdividirem-se os contratos de execução duradoura em contratos com termo (prazo) ou por tempo indeterminado. Nos contratos duradouros celebrados por tempo indeterminado (sem prazo ou termo final) permite-se, em geral, que qualquer das partes coloque fim à relação através de declaração unilateral e discricionária (sem necessidade de justificação). É a forma de cessação que se designa por denúncia, em sentido estrito ou próprio, e que está positivada para o contrato de agência celebrado por tempo indeterminado, no art. 28 da Lei do Contrato de Agência – DL 178/86, de 3 de julho, alterado pelo DL 118/93, de 13 de abril.
Também os contratos de execução prolongada podem ser celebrados com prazo final ou sem tempo determinado. Por exemplo, um mandato para a aquisição de um dado imóvel pode ser conferido por dado prazo (três meses, um ano, qualquer outro) ou por tempo indeterminado; um contrato de empreitada para construção de um muro (ou de outra obra qualquer) pode ser celebrado por dado prazo (quinze dias, um mês, até fim do mês x ou meados do y), ou sem termo. Porém, estes contratos, mesmo quando celebrados por tempo indeterminado, têm um objeto delimitado (a celebração do contrato, a construção do muro), pelo que não é exato falar neles em vinculação perpétua, e a denúncia não se conta entre as suas formas de cessação.
Ainda assim, o protelamento da execução pode gerar legítimo desinteresse na contraparte, havendo normas que permitem a desvinculação unilateral imotivada (v.g., a desistência da empreitada pelo dono da obra no art. 1229 do CC, ou a revogação do mandato no art. 1170 do CC), sem prejuízo de deveres de indemnizar em dadas circunstâncias.

Pelo contrato de consórcio celebrado entre as partes, estas comprometeram-se a colaborar entre si para promover e realizar o que designaram por «empreendimento» (cl. 1.ª, n.º 1), ou seja, para promover e realizar o conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda (cl. 1.ª, n.º 3).
Nem sempre as ocorrências da vida em sociedade encontram perfeita correspondência nos modelos jurídicos criados para as explicar e regular e o contrato de consórcio dos autos é disso um exemplo. Observam-se nele características dos contratos de execução duradoura e dos contratos de execução prolongada, o que à partida parece um contrassenso uma vez que os últimos são uma subespécie dos de execução instantânea, que se opõem aos de execução duradoura.
O contrato de consórcio que nos ocupa tem no horizonte a realização de um empreendimento – conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda –, algo que é suscetível de ser concretizado que atingirá um fim (ponto final), o que o aproxima dos contratos de execução prolongada.
No entanto, por outro lado, o fim imediato do consórcio é a colaboração entre as partes numa sucessão de atos, pelo que o interesse final ou primário está também no perdurar dessa colaboração durante todo o processo. Acresce no caso concreto, que os atos que as partes se comprometeram a promover e realizar em colaboração, pela natureza e dimensão do empreendimento global de aproveitamento do prédio, teriam de se suceder no tempo em variadas fases, dependentes de várias negociações e acordos com entidades terceiras, nomeadamente públicas, bem como dependentes de futuras licenças e autorizações. As várias etapas necessárias à realização dos atos que se comprometeram a realizar de forma concertada não eram suscetíveis de ocorrer em paralelo, pelo que às partes interessava a mútua colaboração no decurso de todo o processo, necessariamente longo, fase após fase. É também importante a circunstância de a execução do «empreendimento» – sucessão de atos que as partes se comprometeram a levar a efeito em colaboração uma com a outra (tendentes à efetivação dos estudos, projetos, etc.) – estar parcialmente dependente de atos de terceiros, que estes podiam não vir a praticar ou não vir a fazê-lo em tempo útil, o que conduz a que a execução do «empreendimento» seja incerta e indeterminado o tempo que demoraria.

E. Da cessação do contrato
As partes discutem a forma como se extinguiu a relação contratual e as consequências dessa extinção. Aqui chegados Est.s em condições de debater por que forma cessou a relação entre as partes e as consequências dessa cessação.

a) Da invocada caducidade
Segundo a demandada Ct., o contrato teria caducado 10 anos volvidos sobre a sua celebração (ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 11 do DL 231/81), não tendo a C. direito a qualquer reparação. Para a demandada, o prazo de 10 anos previsto no artigo 11, n.º 2, é um prazo supletivo, aplicável caso as partes não fixem um outro prazo, mas é também um prazo máximo imperativo, não podendo as partes inicialmente estabelecer um prazo de duração do consórcio superior a 10 anos. Subsidiariamente entende que, ainda que as partes pudessem validamente fixar no contrato um prazo superior ao prazo de 10 anos, não o fizeram no caso vertente. Trata-se da posição assumida na contestação e mantida em recurso (v. conclusões I) a N) das suas alegações de recurso).
Contrapôs a demandante C., nas conclusões I) a P) da sua resposta ao recurso da Ct. que o contrato de consórcio celebrado entre as partes não caducou pelo decurso do prazo de 10 anos previsto no artigo 11, n.º 2, da Lei do Contrato de Consórcio, porquanto esse prazo não é injuntivo, e as partes estipularam um outro, na cláusula 10.ª, n.º 1, do contrato, que afastou a aplicação do prazo legal supletivo de 10 anos; além disso, as partes continuaram a executar o contrato depois de decorridos 10 anos sobre a sua celebração, o que significa que o prazo dos dez anos não tem aplicação ou que, tendo-a, as partes prorrogaram-no por mais dez anos.

Na cláusula 10.ª, n.º 1, as partes estipularam que o acordo duraria até ao final da execução do empreendimento; e na cl. 1.ª, n.º 3, definiram o empreendimento como o conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, não englobando, porém, a fase de edificação de prédios para venda ao no mercado.
Já acima tomámos posição no sentido de a cláusula 10.ª, n.º 1, não ser uma cláusula acessória de termo (não estipular um prazo para a execução do contrato), mas uma referência ao objeto do contrato.
Relembramos, em parte, o que acima escrevemos acima em III.D.b)i., c) e d). Conjugando os primeiros dois artigos da LCC, consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou coletivas, que exercem uma atividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição com um (ou mais) dos seguintes fins: a) realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma atividade contínua; b) execução de determinado empreendimento; c) fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; d) pesquisa ou exploração de recursos naturais; e/ou e) produção de bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio.
Daqui se alcança que o contrato de consórcio pode ter por objeto: i) atividades contínuas ou reiteradas (fornecimento a terceiros de bens, pesquisa ou exploração de recursos naturais, produção de bens que possam ser repartidos em espécie entre os membros do consórcio); ou ii) atividades delimitadas pela consecução de um dado resultado (realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios, quer de uma atividade contínua quer de um determinado empreendimento, e execução de determinado empreendimento).
No primeiro caso, por força do disposto no art. 11, n.º 2, da LCC, o consórcio extinguir-se-á decorridos dez anos sobre a data da sua celebração, sem prejuízo de eventuais prorrogações expressas, a menos que (cfr. 1.ª parte do mesmo número com al. c) do n.º 1 do mesmo artigo) as partes tenham fixado ab initio prazo mais longo.
No segundo caso, o consórcio extingue-se pela realização do seu objeto ou por este se tornar impossível (al. b) do n.º 1 do art. 11 da LCC), o que eventualmente sucederá num período de tempo superior a dez anos (são normas distintas, dirigidas a situações distintas). Mais extensa fundamentação, com algumas referências doutrinárias, supra, em «III.D.b)i. O contrato de consórcio na lei portuguesa». Sobre a natureza da cláusula 10.ª, n.º 1, remetemos para o que acima escrevemos em III.D.d).
De acrescentar que, tanto a partes estavam tão conscientes de que deviam continuar a colaboração até à realização final do empreendimento que, decorridos dez e mais anos, continuaram a colaboração acordada, executando o contrato da forma como sempre haviam feito.

Concluindo:
Porquanto explicámos supra, especialmente em III.D.c) e d), a cláusula 10.ª, n.º 1, não é uma estipulação de prazo de execução do contrato, mas uma referência ao objeto imediato do contrato;
Remetendo para quanto expusemos em III.D.b)i., o contrato de consórcio apenas está sujeito a prazo (dez anos na falta de outra estipulação) quando visa uma atividade contínua ou reiterada não delimitada pela preparação ou realização de um empreendimento; o contrato dos autos tinha por objeto uma atividade de colaboração continuada, mas delimitada pela realização de um empreendimento que também constituía objeto dessa atividade – na definição das partes, e para efeitos do contrato, o conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento de certo prédio –, pelo que não terminou por caducidade ao cabo de dez anos sobre a sua celebração.

b) Da alegada justa causa de resolução pela Ct.
Nas conclusões O) a Y) das suas alegações de recurso, a Ct. defendeu que, mesmo que se concluísse que o contrato não tinha caducado por decurso do prazo legal, haveria que reconhecer – ao abrigo do disposto no art. 10, n.º 2, al. a) do DL 231/81 – a existência de fundamento para a Ct. proceder à sua resolução, uma vez que, em maio de 2014, a T. (anteriormente B.T., sociedade que detém a recorrida e que é parte do contrato), se apresentou a Processo Especial de Revitalização (“PER”) no qual foi aprovado e homologado um plano de recuperação.
Na sua resposta, a C. entende que o PER homologado não é uma figura sucedânea da concordata homologada, pelo que não encontra justa causa de resolução do contrato por parte da Ct..
Quid juris?
Lembramos que o artigo 10 do DL 231/81 estabelece que o contrato de consórcio pode ser resolvido, quanto a alguns dos contraentes, por declarações escritas emanadas de todos os outros, ocorrendo justa causa; e que se considera justa causa para resolução do contrato de consórcio quanto a algum dos contraentes a declaração de falência ou a homologação de concordata (n.º 2, al. a) do art. 10 – sublinhado nosso).
A resolução operaria apenas em relação à parte sujeita a concordata (atual PER para efeitos da norma, segundo posição de parte da doutrina), que não é a demandante C., pelo que, sem necessidade de entrarmos noutras disputas sobre o tema, expostas no acórdão recorrido e nos pareceres juntos aos autos, julgamos que a apresentação a PER da T. não constitui justa causa de resolução relativamente à C..

c) Forma de cessação do consórcio dos autos
Se o contrato não caducou pelo decurso de prazo e se não havia justa causa de resolução, cessou efetivamente a relação contratual entre as partes?
Ambas as partes o desejam, o defendem e em conformidade agiram, na medida em que deixaram de executar atos próprios do contrato (concertadamente), a partir de 2015.
Como acima escrito, com data de 2 de abril de 2015, a S. e a Ct. remeteram à TPL, SGPS, SA, carta na qual afirmaram que os seus consultores constataram a caducidade, em janeiro de 2013 e por força da lei (do n.º 2 do art. 10 do DL 231/81), do contrato de consórcio celebrado com a C. e a então T. em janeiro de 2003; mais referiram que, sem prejuízo da caducidade do contrato que tinham por inquestionável, o facto de supervenientemente terem tomado conhecimento através de terceiros da apresentação de um Plano Especial de Recuperação (PER) por parte da T., e das obrigações de fiança nele assumidas pela C., inviabilizaria qualquer possibilidade futura de virem a acordar em termos de prorrogação/permanência do referido contrato (facto 171).
Com esta carta, a Ct. afirmou o termo da relação e a sua intenção de não a retomar; a C., por seu turno, conformou-se com essa cessação, pretendendo apenas ser indemnizada, uma vez que, em seu entender, a cessação configura uma resolução sem justa causa e, portanto, ilícita, mas, considerando que foi quebrada a relação de confiança necessária à vigência do contrato, não há condições para que o mesmo se mantenha.
Os autos não reúnem elementos que permitam afirmar um incumprimento da C. no qual a Ct. pudesse alicerçar a resolução do contrato; nem um incumprimento da Ct., diga-se, pelo menos até ao momento em que colocou termo à relação (v. facto 179 - A Ct. nunca impediu a C. de liderar a atuação do consórcio e não poupou nos custos para tingir o objetivo). Pelo contrário tudo indica que as partes, ambas as partes nestes autos, colaboraram entre si da forma suposta e acordada.
Também não podemos afirmar que, aquando da carta de cessação, o empreendimento (o que as partes entenderam por tal) se tivesse tornado impossível; quando muito, levá-lo a bom porto estava dificultado pela nova posição da CMA e, com esta, muito mais difícil se tinha tornado a possibilidade de vir a ser lucrativo (facto 177).
Mesmo que se considere que a cessação impulsionada pela Ct. foi ilícita, ela acabou por ser eficaz pela aceitação da situação pela C.. Ainda que não a tivesse aceitado, como afirmado no acórdão arbitral, «em relações personalizadas, subscritas intuitu personae e dominadas pela confiança, o facto de uma das partes, com razão ou sem ela, comunicar à outra que resolve o contrato provoca danos irreversíveis na relação entre ambas. Não é possível manter a vinculação, nessas condições».

Porquanto dito, o contrato cessou algures em 2015. Resta aferir da (i)licitude da cessação.
Doze anos volvidos sobre o seu início, não só estava longe de se concluir, como mal se tinha iniciado o designado empreendimento (conjunto das ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento de certo prédio). E assim é, não obstante o muito que a Ct. despendeu. Os custos acumulados do empreendimento suportados pela Ct., incluindo o preço de aquisição do imóvel, em 2003 (€ 52.500.000,00) ascendiam a € 77.341.641,04 (facto 176) – isto sem que um projeto geral estivesse sequer aprovado (factos 180 e 181). Devemos recordar que o papel da Ct. era o de todas aquelas ações pagar e quanto mais tempo decorresse até à conclusão, mais a Ct. teria a haver a título de remuneração do capital investido e, consequentemente, menor o «lucro do consórcio» (considerando as definições das partes no contrato).
Tendo decorrido 12 anos sem a aprovação de um projeto inicial, sem um alvará de loteamento ou instrumento administrativo que o substitua, tudo indicando que a CMA não aprovará o projeto que está efetuado se lhe for submetido, tendo passado a dizer que os projetos que foram realizados a pedido e sob orientação das partes não terão viabilidade, será conforme ao direito constituído obrigar as partes, qualquer delas, a manterem o vínculo, a manterem-se obrigadas a colaborar em ações que, por muito que façam e que despendam, poderão nunca gerar retorno e demorar anos indeterminados até à sua conclusão, na medida em que esta depende também da vontade de terceiros?
Relembramos (remetendo para III.D.e)) que há escapes para obviar a vinculações sem termo certo, quer quando as prestações contratuais são contínuas ou reiteradas (caso da denúncia no contrato de agência), quer quando as prestações estão delimitadas por um resultado concreto (a desistência da empreitada pelo dono ou a revogação do mandato pelo mandante), ainda que a razão principal destas últimas formas de cessação não resida na não vinculação perpétua. Outros institutos poderiam ter sido chamados para justificar a cessação da relação contratual das partes, nomeadamente a resolução do contrato por alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar (art. 437 do CC), mas a Ct., que impulsionou a cessação, não seguiu esse caminho.

Cabe aqui uma referência ao n.º 2 da cláusula 10.ª na qual as partes estipularam: «Se decorrer o prazo de 5 anos sobre a data do alvará de loteamento ou instrumento administrativo que o substitua sem que o Empreendimento seja totalmente executado, a CT. terá direito a pôr fim ao Consórcio, mediante o pagamento à C. de uma quantia que remunere a sua contribuição para o Consórcio segundo os critérios de repartição de lucro fixados na cláusula 9.ª deste contrato e no seu anexo B como se o Empreendimento houvesse sido completamente executado, admitindo, então, para esse efeito, que ritmo de execução do Empreendimento se manteria igual».
A demandante quer extrair desta cláusula o seguinte raciocínio: se as partes apenas previram expressamente a possibilidade de cessação da relação após decurso de 5 anos sobre a data do alvará de loteamento sem que o empreendimento estivesse totalmente executado, foi porque nunca quereriam cessar a relação sem que sequer existisse aquele alvará.
O argumento não nos parece proceder. Ele será, no mínimo tão válido como o seguinte: se as partes previram que o contrato pudesse cessar mesmo já havendo alvará de loteamento e caso o empreendimento não estivesse concluído em cinco anos após o alvará de loteamento, por certo nunca teriam entendido possível que decorressem doze anos sem sequer haver alvará de loteamento.

Perante tudo o exposto concluímos com segurança que a cessação do contrato foi unilateral (é certo que houve uma conformação ulterior da C. com a cessação, mas que decorreu da falta de confiança gerada pela posição da Ct., e não de uma vontade que, somada à declaração da Ct., possa constituir um acordo revogatório), e discricionária (afastámos a bondade das causas invocadas – caducidade e resolução justificada pelo PER da T.), mas eficaz (pela impossibilidade de forçar a colaboração objeto do contrato). Porém, não necessariamente lícita. Bem como não necessariamente ilícita.
Perante a regra máxima de que pacta sunt servanda, cabia à demandada alegar e provar factos suficientes à conclusão da licitude da cessação. Não o fez.

F. Responsabilidade/dever de indemnizar, danos e sua indemnização
O tribunal a quo considerou que a declaração de cessação da Ct. constituía uma resolução ilícita e expressou que, nessas circunstâncias, os danos devem reparar-se através da indemnização que colocaria a C. na posição que teria se o contrato tivesse sido totalmente cumprido até final (interesse contratual positivo).
Nada opomos a que o prejuízo causado por uma resolução ilícita seja indemnizado atendendo ao interesse contratual positivo. Além das referências do acórdão arbitral para a obra de António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, IX, 3.ª ed., 2017, p. 937, e para o Parecer de António Pinto Monteiro, junto aos autos, damos como exemplos no mesmo sentido a obra de Paulo Mota Pinto, Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, II, Coimbra Editora, 2008, sobretudo pp. 1639-55, ou o artigo de Maria de Lurdes Pereira e Pedro Múrias, «Obrigação primária e obrigação de indemnizar», in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Carlos Ferreira de Almeida, II, 2011, pp. 605-36.
Porém, uma coisa é certa: a indemnização pressupõe a existência de danos e, no caso, adiantamos que eles não se verificam, pois não podemos concluir do acervo fáctico que, a manter-se o consórcio, houvesse uma razoável probabilidade de o mesmo gerar lucro (como definido no contrato de consórcio).

Passamos a justificar, começando por relembrar uma passagem do acórdão arbitral, ainda na parte da ilicitude, culpa e causalidade:
«III. Os presentes autos revelam um procedimento "polémico" por parte da CMA. Com efeito:
· no dia 4 de julho de 2005, com receção a 15 do mesmo mês, o Presidente da CMA dirigiu ao Dr. Mário D., na qualidade de "Presidente da Ct", o ofício n.º 335, onde se lê, designadamente:
A escolha de G Birne Arquitetos Associados e N. Foster & Partners vem na sequência de reunião de trabalho com a C. e de um extenso processo de consulta, tendo por base critérios curriculares, competência e a qualidade que a Câmara Municipal da Amadora pretende para a zona pelo que solicitamos que diligenciem no sentido de proceder à sua contratação.
[supra, facto 68]
— no dia 16 de março de 2007, foi celebrado um "acordo quadripartido" entre o Município da Amadora, a Ct., a Foster e a GB Arquitetos, Lda. que, em anexo, continha a minuta do contrato com a Foster;
[supra, factos 80 e 81]
· no dia 5 de setembro de 2007, foi realizada, em Londres, no atelier da Foster & Partners, uma reunião em que participaram o Presidente da CMA, dois vereadores e um consultor da Câmara, além de quadros e dirigentes da Ct., da C., da GB e da FP, onde foi apresentado o Plano;
[supra, facto 93]
· na reunião interveio o Presidente da CMA, com palavras de apoio e de incentivo:
9.02 Joaquim Raposo, Mayor of CMA, stated that the concept breaks with the system and this is something that is appreciated. The proposal is modern and advanced. Amadora will become a new metropolitan center.
The works should continue to a more detail phase in order to schedule a public presentation in the, final of November.
[supra, facto 95]
· os autos dão nota de uma reunião ocorrida em 27 de setembro de 2010 com o Presidente da CMA e mais dois representantes do executivo camarário, em que o Master Plan da Foster mantinha atualidade;
[supra, facto 119]
· em 2011, a CMA determinou que se verificasse a compatibilidade dos Master Plan elaborados pelas diversas entidades (entre as quais a Foster) com a alteração do PROT ALL decidido pelo Conselho de Ministros;
[supra, facto 123]
· os autos dão nota de uma reunião ocorrida em 22 de setembro de 2010 com o Presidente da CMA e mais dois representantes do executivo camarário, em que o Master Plan da Foster mantinha atualidade;
[supra, facto 124]
· em 9 de setembro de 2013, realizou-se uma reunião na CMA, com a presença, designadamente do Presidente, Joaquim Raposo e da Vice-Presidente (atual Presidente), Dra. Carla Tavares. Aí, foi, designadamente, dito:
O Sr. Presidente da Câmara referiu que este Plano é estratégico e no folheto dos compromissos divulgado na atual campanha eleitoral assim vem de novo referido.
Pretende-se reabilitar e qualificar a zona e elogiou o Arq. Byrne por estar a desenvolver um bom trabalho para o efeito, juntamente com os outros terrenos à volta da Qta da Falagueira. Já conheceu os 3 Master Plans das 3 unidades de execução pelos gabinetes respetivos e gostou das soluções.
A Sra. Vice-Presidente referiu depois que também pretende avançar com os Planos por ser uma área estratégica a resolver.
[supra, facto 136]
IV. Qualquer operador normal entenderia que a CMA, conscientemente, conhecia o Plano Foster e apoiava a sua concretização. Causa surpresa que a agora Presidente modifique o destino do prédio, "com mais serviços e menor habitação" (facto 177). Também surpreende que ela declare desconhecer a matéria, tendo visto o Plano sem conservar cópia (facto 178). Não é credível que a CMA escolha a FP, assine um contrato com ela, vá a Londres, ao mais alto nível, ver o Plano, remeta sucessivas comunicações de apoio e, depois, declare ignorar o sucedido. Por certo que poderia mudar de posição: mas, ex bona fide que se aplica, constitucionalmente (artigo 266.º/2 da Constituição), aos municípios, teria de o fazer com um mínimo de fundamentação e tomando precauções para não causar danos. O comportamento contraditório da CMA, que nunca poderia ser justificado com a alteração na presidência, tanto mais que a Vice-Presidente de então deu o seu selo ao procedimento "Foster", custou, ad nutum, mais de vinte milhões de euros aos contribuintes. Não se pode esquecer que a Ct. é pública e que foi ela quem financiou o Plano Foster e todas as demais iniciativas, como foi provado. O Tribunal não tem jurisdição para aprofundar essa matéria: mas aqui deixa nota do sucedido.
V. Pergunta-se, agora: perante a conduta da CMA, haverá culpa da Ct.? Em abstrato, a Ct. deveria ter lutado pelos vinte milhões que gastara. Se acreditava no projeto — e temos de admitir que sim — tinha a obrigação de evitar a pura destruição de riqueza que a sinuosidade municipal provocou. Os autos nada documentam a não ser uma pura desistência. Também surpreende, de resto, que o Arq. B. Soares venha declarar nestes autos que não conhece o Master Plan (facto 144): vai decidir o futuro da Amadora e nem quis saber o que, para o efeito, foi pensado por um dos melhores ateliers do Mundo, atelier esse que teve o apoio explícito da CMA, que contratou com a própria FP e foi a Londres ver o trabalho? E tendo o Master Plan sido pago pelos contribuintes? Mais comentários são inúteis.
VI. O Tribunal conclui que a conduta da CMA não exonerou a Ct. de deveres de diligência tendentes a minimizar os danos e a reaproveitar, quanto possível, o FP. A eventual culpa da CMA — pois não compete ao Tribunal verificá-la — não desculpa a Ct.. Esta não ilide, assim, a presunção de culpa que sobre ela recai.
VII. A causalidade, na responsabilidade contratual, é de fácil determinação: são imputáveis, ao agente, os danos correspondentes às vantagens contratuais suprimidas pelo inadimplemento.» [Negrito nosso]
Concordamos. Poderíamos até ser mais contundentes, mas a questão que se coloca agora é a de saber se a má gestão da res publica e o prejuízo para os cidadãos – nomeadamente para os da Amadora, que não desfrutaram até agora, nem se perspetiva que desfrutem a breve prazo dos espaços de que poderiam ter desfrutado, mas também para todos os contribuintes, que poderiam ter usufruído de um bom uso do dinheiro público e não usufruíam – constitui dano para a C.. E a resposta impõe-se negativa.

No elenco dos factos não constam danos suportados pela C.. Como se afirma no acórdão arbitral, «foram consumidos doze anos sem que chegasse, sequer, a entrar, na CMA, um projeto para apreciação. As variáveis são muitas: (a) que tipo de projeto seria aprovado? (b) quanto tempo demoraria a aprovação? (c) que novas condições imporia essa aprovação? (d) que empresários se interessariam pelas múltiplas operações de urbanização? (e) quando ficaria esta concluída? (f) que preço resultaria do mercado? (g) qual o ritmo de escoamento das unidades? Tratando-se de um empreendimento a longo prazo, as últimas quatro variáveis serão (ou não) impactadas por coordenadas gerais: (h) qual a evolução do País, nos planos político, financeiro, económico, social e demográfico? (i) qual o futuro da União Europeia e, em geral, dos condicionamentos internacionais, perante os quais o País está praticamente inerme? (j) como vão evoluir as alterações climatéricas? (k) como se concretizaram as condutas menos racionais dos operadores (p. ex., a "moda") daqui a dez ou vinte anos?
IV. Algumas das apontadas variáveis são francamente imprevisíveis. Ninguém adivinharia os acontecimentos do 11 de setembro de 2002, em Nova Iorque; poucos "previram" problemas com os sub primes e ninguém avisou quanto à amplitude da crise daí decorrente. Não se apostou nem no Brexit nem na eleição de Trump: mas aconteceram. Em suma: nenhum economista sensato pode fazer mais do que apontar tendências e construir cenários, quanto ao próprio médio prazo. A longo prazo, Est.s nas fronteiras da ficção científica.»

Até aqui, estamos de acordo. Em seguida o acórdão arbitral aprecia as várias avaliações juntas aos autos pelas partes (a que se reportam os factos 145 a 170) e constrói um cenário hipotético. Entendemos que aquelas avaliações não são suficientes para concluirmos ser provável que o consórcio, a manter-se, viesse a gerar lucro (na definição do contrato de consórcio). Trata-se de avaliações trazidas por uma e outra das partes, com objetos e critérios diferentes. As da Cushman, da Newman e da JLL (juntas pela C.) estimam margens de lucro a partir de índices de construção 1,0 (todas) e 0,72 (a Newman), que não são os que agora se perspetivam. As avaliações da Colliers, da Engivalor e a Worx (juntas pela Ct.) respeitam ao valor do terreno, que situam entre 9,6 e 13,7 milhões, muito aquém do montante pelo qual a Ct. o adquiriu, e mesmo do que se pensava valer, pois já não era novidade que o valor de aquisição tinha sido acima do de mercado (considerando N) do contrato – facto 29).
Relembremos os factos mais relevantes em matéria de (não) prova de lucros cessantes:
As partes assumiram no considerando O) que, «ao participar neste Consórcio e ao associar-se ao risco do Empreendimento, que é assim mais elevado, a T. e a C. estão dispostas a aceitar que esta última nada receba pela sua contribuição para o Consórcio se o mesmo não tiver lucro, mas recebendo, caso contrário, a sua quota-parte do lucro global do Consórcio à medida e na proporção em que o mesmo for sendo gerado, e de acordo com os critérios fixados neste contrato» (facto 29).
Foi, portanto, admitida desde o início, e até entendida como muito provável, a possibilidade de o consórcio não gerar lucro. Esta possibilidade relaciona-se com o facto de o prédio ter sido adquirido por preço superior ao de mercado (considerando N), facto 29).
Na cláusula 9.ª do contrato (facto 31), as partes acordaram o que se entendia por «lucro do consórcio» e como o mesmo seria achado (remetendo nesta parte para o constante do anexo B).
Lucro do consórcio seria a eventual diferença positiva entre, por um lado, o valor das receitas que direta ou indiretamente emergissem do empreendimento e, por outro lado, a totalidade dos custos desse mesmo empreendimento aí se incluindo também a remuneração do capital próprio utilizado pela CT. na cobertura dos custos, seja a título de capital social, prestações suplementares, prestações acessórias, suprimentos ou facilidades de tesouraria (n.º 2 da cl. 9.ª).
O eventual resultado negativo do consórcio seria suportado exclusivamente pela CT. (n.º 5 da mesma cláusula), ficando esclarecido que a C. não teria direito a qualquer participação no lucro do consórcio nem a qualquer outra remuneração pela sua participação no mesmo, a não ser em caso de apuramento de lucro do consórcio nos termos definidos nos números anteriores (n.º 6 da mesma).
Resulta, portanto, que só haveria lucro se a Ct. estivesse totalmente integrada dos valores despendidos com o empreendimento, incluindo a remuneração do capital próprio utilizado.
No anexo B estabelece-se que a repartição do lucro do consórcio é função do índice de construção, ainda por definir e que, de acordo com a nova orientação da CMA, será aquém do perspetivado pelas partes e dos constantes das avaliações feitas a pedido da demandante.
Entretanto, decorreram mais de 12 anos sem um projeto aprovado ou sequer formalmente submetido; não se sabe quantos anos mais decorrerão até que sejam aprovados os projetos necessários a que possam ser vendidos lotes; não se sabe quantos anos mais decorrerão até que se concluam as ações necessárias à efetivação dos estudos projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio, mesmo descontada a fase de edificação de prédios para venda no mercado; não se sabe quanto mais a Ct. teria de despender, sabendo-se, porém, o muito que já despendeu e que pode não ter qualquer tipo de aproveitamento, face à nova posição da Câmara; o lucro, que era à partida incerto (o que as partes logo admitiram, conformando-se a C. expressamente com a possibilidade de nada receber), é agora improvável; e quanto mais tempo decorre, mais improvável se torna.
Estes dados de facto não nos permitem concluir que, se a relação contratual não tivesse cessado, e se as partes tivessem continuado a executar os termos do contrato, haveria a final «lucro do consórcio». Pelo contrário, os factos sugerem que o mais provável seria que não houvesse para distribuir aquilo que as partes designaram por «lucro do consórcio».

G. Custas
A sentença arbitral terminou, para o que ora releva, com os seguintes pontos:
«IV. Mais decidem os árbitros, uma vez que ambas as partes agiram com total correção, não sendo individualmente responsabilizáveis pela presente ação, repartir igualmente as custas do processo por ambas. As correspondentes quantias foram já pagas, pelo que nada mais é devido.
V. Pela mesma ordem de razões, cada parte pagará ao seu ilustre e respetivo Mandatário.»

A Ct. recorreu desta parte, concluindo:
«PP)     Nos termos da cláusula 17.ª, n.º 4 e 5, do Regulamento de Arbitragem, a repartição das despesas com o tribunal e despesas próprias é feita em função do decaimento. Assim, atendendo ao decaimento de 98,634% da Recorrida, o Tribunal Arbitral violou o disposto no artigo 46.º, n.º 3, al. a), sub-al. iv) da LAV e o princípio da igualdade (artigo 30.º da LAV) ao repartir tais despesas em partes iguais e considerar que cada parte é responsável pelas despesas em que incorreu. Ainda que assim não se entendesse, essa decisão consubstanciaria um erro de julgamento, que haveria também que corrigir.
Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, requer-se a V. Excelências, Venerandos Desembargadores, concedam provimento ao presente Recurso nos termos supra alegados e, em consequência, revoguem o Acórdão Arbitral, substituindo-o por outro que:
a) Absolva a Recorrente de todos os pedidos formulados pela Recorrida na ação arbitral:
b) Condene a Recorrida no pagamento da totalidade das despesas com o Tribunal Arbitral e despesas próprias despendidas pela Recorrente, pagando-lhe € 467.370,89, acrescido de juros à taxa legal e das custas e despesas com o presente recurso;
Subsidiariamente
c) Caso decidam manter a decisão recorrida, no que não se concede, revogue os pontos IV e V do Acórdão Arbitral e condene as partes no pagamento de despesas com o Tribunal Arbitral e despesas próprias em função do decaimento, conforme estabelecido no Regulamento de Arbitragem, e, em consequência, condene a Recorrida a pagar à Recorrente € 456.088,79, acrescido de juros à taxa legal, aplicando o mesmo critério com as custas e despesas com o presente recurso;
Tudo com as legais consequências.»

As partes convencionaram sobre custas, como lhes é permitido pelo art. 42, n.º 5, da LAV.
No regulamento de arbitragem ficou estabelecido:
«16.º
(Honorários, encargos administrativos e despesas)
1. Aos honorários e encargos administrativos aplicam-se as tabelas do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, de 2014, com a distribuição prevista nesse mesmo Regulamento.
2. A competência deferida ao Presidente do Centro considera-se remetida para o próprio Tribunal.
3. As despesas ocasionadas pelos meios de prova, por pagamentos a peritos ou por deslocações extraordinárias do Tribunal, devidamente documentadas, são suportadas, por igual, por ambas as Partes, aplicando-se, a final, o disposto na cláusula 17.ª, n.º 4.
17.º
(Pagamento)
(…)
4. O acórdão final consigna a distribuição dos custos totais da arbitragem e as despesas razoáveis que se demonstrem ter sido incorridas por causa do processo, incluindo honorários com mandatários das partes, peritos, despesas com assessorias técnicas e jurídicas e deslocações de testemunhas, partes e peritos por cada uma das partes, em função de eventuais decaimentos, fazendo-se o acerto entre elas, consoante o decidido.
5. Para efeitos do número anterior, cada uma das partes não poderá apresentar despesas próprias com o processo superiores a € 250.000,00.»

Considerando a absolvição da Ct. por via do presente acórdão, ficam as custas a cargo da C., sem prejuízo da limitação de custas de parte, decorrente da norma por último transcrita.

H. Nota e síntese finais
O acórdão arbitral termina da seguinte forma:
IV – DECISÃO
55. Decisão
I. Pelo exposto, acordam os árbitros:
a) Em julgar improcedente a invocação da caducidade do contrato de 8 de janeiro de 2003 ou, em qualquer caso, em considerar que o mesmo se prorrogou por condutas concludentes de ambas as partes;
b) Em julgar irrelevantes as alterações subjetivas verificadas na Demandada;
c) Em subscrever o entendimento de que um PER não equivale a uma concordata, para efeitos de aplicação do artigo 10.º/2, a), do Decreto-Lei n.º 231/81;
d) Em considerar subsistente o contrato de consórcio de 8 de janeiro de 2003;
e) Em julgar que o mesmo não foi cumprido pela Demandada, tendo sido corretamente resolvido pela Demandante.
II. Mais decidem os árbitros:
f) Que o não-cumprimento do contrato não ocasionou danos emergentes pedidos (e provados) mas antes
g) Que desse não-cumprimento resultaram lucros cessantes provados de aproximadamente € 79.767.000,00.
h) Que essa cifra, descontados os custos contratualmente assumidos pela Demandada e feita a distribuição clausulada, dá lugar a uma indemnização de € 2.025.000,00.
III. Termos em que julgam a presente ação parcialmente provada e procedente, condenando-se a Demandada numa indemnização de € 2.025.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, contados a partir da notificação do presente acórdão.
IV. Mais decidem os árbitros, uma vez que ambas as partes agiram com total correção, não sendo individualmente responsabilizáveis pela presente ação, repartir igualmente as custas do processo por ambas. As correspondentes quantias foram já pagas, pelo que nada mais é devido.
V. Pela mesma ordem de razões, cada parte pagará ao seu ilustre e respetivo Mandatário.

O que consta dos pontos I. e II. são conclusões que justificam a decisão de mérito que consta do ponto III.  Como decorre da fundamentação do presente acórdão, concordamos com uma parte daquelas afirmações, mas não com todas. A nossa decisão vai revogar o ponto III., mas não se pronunciará sobre as declarações dos pontos I. e II. que são, em rigor, matéria de fundamentação e não de decisão.

Em síntese:
O caso foi julgado em 1.ª instância por tribunal arbitral ao abrigo de convenção de arbitragem acordada em janeiro de 2003, quando vigorava a LAV-1986, que permitia que da decisão arbitral fossem interpostos para o tribunal da relação os mesmos recursos que caberiam da sentença proferida pelo tribunal de comarca, a menos que as partes tivessem renunciado aos recursos ou autorizado os árbitros a julgarem segundo a equidade, o que no caso não fizeram.
Quando o processo arbitral foi iniciado corria o ano 2015 e estava em vigor a Lei da Arbitragem Voluntária aprovada pela Lei 63/2011, que, apesar de estabelecer regras de recurso mais restritivas, ressalvou os recursos permitidos à data da celebração de convenções arbitrais anteriores, mantendo em tal caso as partes o direito aos recursos que caberiam da sentença arbitral, nos termos do artigo 29 da velha LAV-1986.
Em janeiro de 2003, vigorava o velho Código de Processo Civil na redação do DL 329-A/95, de 12 de dezembro, já com várias alterações, mas na versão imediatamente anterior à introduzida pelo DL 38/2003, de 8 de março, que admitia a modificação da decisão de facto pela Relação nos termos definidos pelo então art. 712 e desde que o recorrente cumprisse as regras impostas pelo art. 690-A, o que as recorrentes fizeram, pelo que a prova foi reapreciada.
As alterações introduzidas na decisão de facto foram pontuais, muitas delas resultantes de acordo entre as partes, e não foram decisivas para a decisão final destes recursos.
Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou coletivas, que exercem uma atividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição com um (ou mais) dos seguintes fins: a) realização de atos preparatórios de um determinado empreendimento ou de uma atividade contínua; b) execução de determinado empreendimento; c) fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; d) pesquisa ou exploração de recursos naturais; e/ou e) produção de bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio.
O objeto imediato do contrato de consórcio não se reduz à realização de uma atividade ou à efetivação de uma contribuição, nem sequer à realização concertada de uma atividade ou à efetivação concertada de uma dada contribuição; o objeto imediato do consórcio é complexo e exige a realização concertada de uma atividade ou a efetivação concertada de contribuições para um dos mencionados fins.
As atividades que o contrato de consórcio tem por objeto podem ser: i) contínuas ou reiteradas (fornecimento de bens a terceiros, pesquisa ou exploração de recursos naturais, produção de bens que possam ser repartidos em espécie entre os membros do consórcio); ou ii) atividades delimitadas pela consecução de um dado resultado (realização de atos, materiais ou jurídicos, preparatórios, quer de uma atividade contínua quer de um determinado empreendimento, e execução de determinado empreendimento).
No primeiro caso, por força do disposto no art. 11, n.º 2, da LCC, o consórcio extinguir-se-á decorridos dez anos sobre a data da sua celebração, sem prejuízo de eventuais prorrogações expressas, a menos que as partes tenham fixado ab initio prazo mais longo.
No segundo caso, o consórcio extingue-se pela realização do seu objeto ou por este se tornar impossível, o que eventualmente sucederá num período de tempo superior a dez anos (são normas distintas, dirigidas a situações distintas).
No contrato dos autos, as partes constituíram-se em consórcio para a promoção e realização concertada do conjunto de ações tendentes à efetivação dos estudos, projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento de certo prédio, tendo estipulado que o acordo duraria até ao final da execução desse conjunto de ações, que designaram por «empreendimento», pelo que o contrato não caducou pelo decurso do prazo de dez anos sobre a sua celebração.
O contrato dos autos findou por declaração unilateral (a conformação ulterior da contraparte com a cessação decorreu da falta de confiança gerada pela posição da declarante, e não de uma vontade que, somada à declaração de cessação, possa constituir um acordo revogatório), e discricionária (sem justa causa), mas eficaz (pela impossibilidade de forçar a colaboração objeto do contrato).
Perante a regra máxima de que pacta sunt servanda, cabia à parte que pôs fim à relação contratual alegar e provar factos suficientes à conclusão da licitude da cessação.
À data da cessação do contrato, tinham decorrido mais de 12 anos sem um projeto aprovado ou sequer formalmente submetido; não se sabia quantos anos mais decorreriam até que fossem aprovados os projetos necessários à venda de lotes; nem quantos até à conclusão das ações necessárias à efetivação dos estudos projetos, construções e todas demais contratações necessárias à realização e venda dos produtos imobiliários resultantes do aproveitamento do prédio; tão pouco se previa quanto mais a demandada teria de despender, sabendo-se, porém, o muito que já tinha despendido e que pode não ter qualquer tipo de aproveitamento, face à nova posição da Câmara; o lucro, que era à partida incerto (o que as partes logo admitiram, conformando-se a demandante expressamente com a possibilidade de nada receber), passou a ser improvável.
O direito a uma indemnização não nasce da eventual ilicitude da cessação do contrato, mas da existência de danos (prejuízo causado ou benefício que se deixa de obter em consequência da lesão) e, no caso, os dados de facto não contemplam danos emergentes nem não nos permitem concluir que, se a relação contratual não tivesse cessado, e se as partes tivessem continuado a executar os termos do contrato, haveria a final «lucro do consórcio» para distribuir pelas partes.

IV. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação da Ct. e improcedente a apelação da C., revogando o acórdão arbitral e absolvendo a Ct. do pedido.

Custas pela C. (na Relação e em 1.ª instância, sendo de considerar os n.ºs 4 e 5 do art. 17 do Regulamento do Tribunal Arbitral).

Lisboa, 25/09/2018

Higina Castelo

José Capacete

Carlos Oliveira