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CARTA DE CONDUÇÃO
VALIDADE
Sumário
Não constitui título válido de condução em Portugal a carta de condução emitida pela República de Angola.
Texto Integral
Acordam, em audiência, na 2.ª Secção Criminal:
*
I. No processo comum singular n.º …/05.8GBMTS do ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, o arguido B………. foi absolvido do crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3.°, n.° 2, do DL n.º 2/98, de 02.01, de que estava acusado.
Inconformado com a decisão, o Ministério Público veio dela interpor recurso, com os fundamentos que constam da respectiva motivação e as seguintes conclusões:
-“...
1. São elementos objectivos constitutivos do crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, p° e p° pelo art.° 3°, n°s 1 e 2, do D.L. n° 2/98, de 3 de Janeiro- a condução de veículo automóvel; - na via pública ou equiparada; -sem estar habilitado nos termos do Código da Estrada;
2. Sendo o arguido titular de carta de condução n° .. - ….., emitida pela República de Angola, em 15 de Agosto de 1998, válida até 22 de Novembro de 2011, tal título de condução não habilita o arguido a conduzir o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ..-..-EB em Portugal, porquanto era necessário que o mesmo tivesse procedido à troca de tal título, conforme preceituado no art° 129°, n°6, do C.E..
3. Assim, tal carta de condução, emitida pela República de Angola em data posterior a 11 de Novembro de 1975, não pode ser reconhecida em Portugal com base no regime legal que vigorou antes do reconhecimento da sua independência, face ao regime aplicável nesse caso de sucessão de Estados - artigos 16° e 17°, da Convenção de Viena de 1978;
4. No presente caso foram dados como provados todos os elementos objectivos do tipo de crime referido em 1, tendo ainda sido dado como provado o elemento subjectivo do mesmo crime.
5. A douta sentença recorrida violou pois o disposto nos art.°s 3°, nos 1 e 2, do D.L., n° 2/98, de 3 de Janeiro, 121º, 125° e 129°, n°6, do C.E.
6. Por tal, entendemos que a mesma deve ser revogada e substituída por outra em que o arguido seja condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p° e p° pelo art° 30, n°s 1 e 2, do D.L., n° 2/98.”
O arguido respondeu, concluindo:
- “…
1- O tribunal "a quo" absolveu o arguido, da prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3°, n° 2 do DL 2/98 de 3 de Janeiro.
2- O arguido é titular da carta de condução n ..-….., emitida pela República de Angola, em 15 de Agosto de 1998 e válida até 22 de Novembro de 2011.
3- Tal título de condução é reconhecido em Portugal com base no regime legal que vigorou em Angola até ao reconhecimento da Independência, face ao regime aplicável no presente caso de sucessão de Estados aos artigos 16° e 17° da Convenção de Viena de 1978.
4- Não podia o Tribunal proferir outra decisão que não a de absolver o Arguido.
5- Deste modo a decisão proferida pelo Tribunal "a quo" foi a única possível, de molde a ser feita justiça.
Como tal, impõe-se o não provimento do recurso, o que a verificar-se consubstanciará a realização integral do Direito e da Justiça!”
Neste Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer pelo provimento do recurso.
II. Colhidos os vistos legais, foi efectuada a audiência, cumprindo agora apreciar e decidir.
A questão a decidir é tão só a de saber se a matéria de facto provada consubstancia a prática pelo arguido do crime de que estava acusado.
A sentença sob recurso deu como assente a seguinte factualidade:
-“…
1 – No dia 14 de Outubro de 2005, pelas 23:55 horas, na ………., ………., Matosinhos, o arguido B………. foi surpreendido pela autoridade policial a conduzir o veículo automóvel de passageiros de matrícula ..-..-EB, de que é proprietário.
2 – O arguido é titular de carta de condução nº ..–….., emitida pela República de Angola, em 15 de Agosto de 1998, válida até 22 de Novembro de 2011.
3 – No dia 8 de Julho de 2005, o arguido requereu na Direcção Geral de Viação a troca da carta de condução angolana de que é portador por título nacional, tendo então sido informado que tal troca estava condicionada à aprovação em novo exame de condução.
4 – Nesse mesmo dia solicitou a devolução da referida carta de condução, uma vez que, face a motivo imprevisto, tencionava deslocar-se a Angola.
5 – O arguido não chegou a realizar o exame de condução acima referido, encontrando-se, no entanto, actualmente, inscrito na “C……….” a fim de obter carta de condução da Categoria B.
6 - O arguido agiu de vontade livre, consciente e deliberada, seguro que não podia conduzir aquele veículo na via pública e que a sua conduta era proibida e punida por lei.
7 – O arguido tem o 10º ano de escolaridade, trabalha na construção civil, auferindo cerca de 400 € mensais, reside com companheira, que recebe igualmente cerca de 400 € mensais, tem uma filha com 5 anos e paga a título de renda da casa que habita 135 €.8 – O arguido não tem antecedentes criminais.”
Com estes factos, o arguido foi, não obstante, absolvido pelas seguintes razões:
- “…
O arguido vem acusado da prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nºs. 1 e 2, do DL nº 2/98, de 3 de Janeiro. Consta do nº 1 deste dispositivo que “Quem conduzir veículo a motor na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada é punido com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.”. Por seu turno, o nº 2 preceitua que “Se o agente conduzir, nos termos do número anterior, motociclo ou automóvel, a pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias.”.
O Código da Estrada (DL nº 114/94, de 3 de Maio, com as alterações provocadas, nomeadamente, pelo DL nº 44/2005, de 23 de Fevereiro, abreviadamente, “CE”), no seu art. 121º, nº 1, dispõe que “Só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito.”, precisando o art. 122º, nº 1, que o documento que titula a habilitação para conduzir automóveis designa-se “carta de condução”.
O bem jurídico protegido por estas disposições não pode deixar de ser, primacialmente, a segurança da circulação rodoviária, ainda que, de forma indirecta, se protejam outros bens jurídicos que se prendem com a segurança das pessoas face ao trânsito de veículos, como a vida ou a integridade física.
Conforme se extrai do nº 1 do referido art. 3º do DL 2/98, são elementos constitutivos deste tipo-de-ilícito, por um lado, a condução de veículo a motor na via pública ou equiparada e, por outro, que tal condução ocorra sem que o agente detenha a devida habilitação legal.
A estes dois pressupostos acresce ainda o elemento subjectivo, consistente na orientação da vontade do agente para a realização do facto tipificado pela lei como crime.
Quanto ao primeiro, e tal como resulta da factualidade dada como provada, desde logo se diga que o arguido, efectivamente, conduzia veículo a motor na via pública.
No entanto, relativamente ao segundo pressuposto – a não detenção de habilitação legal para tal condução -, a situação que se nos apresenta exige uma abordagem mais desenvolvida.
Na verdade, o artigo 125º do CE enumera outros títulos, além da carta de condução, que habilitam o seu portador à condução de veículos a motor.
Ora, o arguido, de facto, conduzia um veículo automóvel, numa via pública sem se encontrar munido de carta de condução emitida pela Direcção-Geral de Viação Portuguesa. Possuía, porém, a carta de condução com o nº ..–….., emitida pela República Popular de Angola em 15 de Agosto de 1998, válida até 22 de Novembro de 2011.
O ponto fulcral do caso dos autos reside em saber, precisamente, se o arguido possui (ou não) licença de condução que o habilite a conduzir no nosso País.
Vejamos mais demoradamente.
Nos termos do nº 1 do supra citado artigo 125º, habilitam também à condução licenças especiais de condução (alínea a)) as licenças de condução emitidas pelos serviços competentes da administração portuguesa do território de Macau (alínea b)), as licenças de condução emitidas por outros Estados membros do espaço económico europeu (alínea c)), as licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro que o Estado Português se tenha obrigado a reconhecer, por convenção ou tratado internacional (alínea d)), as licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais (alínea e)), e as licenças internacionais de condução, desde que apresentadas com o título nacional que lhes deu origem (alínea f)).
Reveste particular importância para o caso dos autos o disposto na alínea d) daquele preceito – ou seja, importa aferir se Portugal se obrigou, ou não, por convenção ou tratado internacional, a reconhecer as cartas de condução emitidas pela República de Angola.
Ora, Portugal aprovou, por adesão, através do DL nº 39 904, de 13 de Novembro de 1954, a Convenção de Genebra sobre o trânsito rodoviário, de 23 de Agosto a 19 de Setembro de 1949. Esta Convenção teve o seu início de vigência, em Portugal, a 27 de Janeiro de 1956 conforme consta do Aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros, publicado no Diário do Governo, nº 116, I Série, de 7 de Junho de 1956.
O artigo 24º da referida Convenção estabelece, no seu nº 1, que: “Cada Estado Contratante autorizará os condutores que entrem no seu território, desde que preencham as condições previstas no anexo 8, a conduzir sem novo exame, nas suas estradas, veículos automóveis de categorias definidas nos anexos 9 e 10 para os quais lhes tenha sido passada uma licença de condução válida, depois de prestarem provas de aptidão, pela autoridade competente de outro Estado Contratante ou de uma das suas subdivisões, ou por uma associação habilitada por essa autoridade”.
Explicitando, o anexo 8 prevê que a idade mínima autorizada para a condução de um veículo automóvel, nas condições designadas no artigo 24º da Convenção, é de 18 anos. Já o anexo 9 estabelece o modelo de licença de condução; por sua vez, o anexo 10 define o modelo de licença internacional de condução.
Por outro lado, o nº 2 do supra referido artigo 24º dispõe que: “Todavia, um Estado Contratante poderá exigir que um condutor que entre no seu território seja portador de uma licença internacional de condução conforme com o modelo contido no anexo 10, em particular quando se tratar de um condutor proveniente de um país onde não se exija uma licença nacional de condução ou onde a licença nacional não se ajuste ao modelo contido no anexo 9.”.
Ou seja, pela Convenção de Genebra estabeleceu-se a validade, entre os vários países signatários, das cartas de condução que tivessem modelos idênticos, sendo certo que a carta de condução angolana tem um modelo idêntico ao da carta de condução nacional. Porém, ressalvou-se também a possibilidade de, ainda assim, os Estados Contratantes poderem exigir uma licença internacional de condução.
Por seu turno, a Portaria nº 16 842, do Ministério do Ultramar, de 22 de Agosto de 1958, publicada no Diário do Governo, nº 181, I Série, ordenou a entrada em vigor, nas províncias ultramarinas, do referido Decreto-Lei nº 39 904 (relembre-se: o diploma que aprovou a vigência, em Portugal, da referida convenção de Genebra).
No entanto, já em 19 de Janeiro de 1956, a Delegação Permanente de Portugal junto da Organização das Nações Unidas havia notificado a Secretaria-Geral das Nações Unidas que o Governo Português tornou a aplicação da mencionada Convenção extensiva às províncias ultramarinas (à excepção de Macau), em relação às quais, nos termos do artigo 28º da referida Convenção, começou a vigorar em 18 de Fevereiro de 1956, conforme constava do Aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros supra referido.
Sublinhe-se que o mencionado artigo 28º estabelecia a possibilidade de qualquer Estado Contratante, no momento de assinatura, ratificação ou adesão, ou em qualquer outro momento ulterior, declarar, por notificação dirigida ao Secretariado-Geral das Nações Unidas, que as disposições da Convenção em questão seriam aplicadas a qualquer território de cujas relações internacionais tivesse a responsabilidade.
Ora, perante o desmembramento das colónias portuguesas e consequente independência, importa agora saber se a República Popular de Angola se mantém, ou não, vinculada aos Tratados e Convenções celebrados pela República Portuguesa, da qual fazia então parte.
Importa aqui acentuar que, nos termos do art. 8º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, “As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português”. Na opinião de JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, in Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2005, Tomo I, pág. 88, “Em face das normas constitucionais e no contexto global da Lei fundamental, deve entender-se (e esta é a opinião quase unânime dos Autores) que o art. 8º consagra um sistema de recepção automática (…)”, ou seja, “(…) as normas internacionais vigoram enquanto tais na ordem interna portuguesa sem necessidade de transformação em normas constitucionais ou legais.”.
Tal recepção é igualmente plena, uma vez que diz respeito a quaisquer normas internacionais, independentemente das matérias.
Por fim, deve reconhecer-se a eficácia interna de todo e qualquer costume internacional e não apenas àqueles em cuja formação Portugal tenha intervindo ou a que tenha dado aceitação tácita, atribuindo-se assim o alcance mais consentâneo com a universalidade do Direito Internacional.
Nesta perspectiva, recorrendo às normas do Direito Internacional Público, o princípio vigente, na hipótese de desmembramento de um Estado ou de separação de uma parcela do seu território, é o da subsistência de Tratados anteriores. É isto mesmo que se extrai dos arts. 34º e 35º da Convenção de Viena de 1978, assinada sob a égide da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas em 23 de Agosto, relativa à sucessão de Estados quanto a Tratados. Pela sua relevância, transcrevamos tais preceitos, com sublinhados nossos:
“Art. 34º (Sucessão de Estados em caso de separação de partes de um Estado):
1- Quando uma parte ou partes do território de um Estado se separarem para formar um ou vários Estados, continue ou não a existir estado predecessor:
a) Todo o Tratado que estivesse em vigor na data da sucessão de Estados relativamente à totalidade do Estado predecessor continuará em vigor relativamente a cada estado sucessor assim formado.
b) Todo o tratado que estivesse em vigor na data da sucessão do estado relativamente a apenas à parte do território do Estado predecessor que tenha passado a ser um Estado sucessor continuará em vigor apenas relativamente a esse Estado sucessor
2 – O nº 1 não se aplicará:
a) se os Estados interessados convencionarem outra coisa;
b) se resultar do Tratado ou constar de outro modo que a aplicação do Tratado relativamente ao Estado sucessor seria incompatível com o objecto e o fim do Tratado ou alteraria radicalmente as condições da sua execução
“Art. 35º (Situação no caso de um Estado continuar a existir depois da separação de parte do seu território):
Quando, depois da separação de uma parte do território de um Estado, o Estado predecessor continuar a existir, todo o Tratado que na data da sucessão de Estados estivesse em vigor relativamente ao Estado predecessor continuará em vigor relativamente ao resto do seu território, a menos:
a) que os estados interessados convencionem outra coisa,
b) que conste que o Tratado se refere apenas ao território que se separou do Estado predecessor;
c) que resulte do Tratado ou conste de outro modo que a aplicação do Tratado relativamente ao Estado predecessor seria incompatível com o objecto e fim do Tratado ou alteraria radicalmente as condições da sua execução. “
Assim, segundo o art. 34º, nº 1, al. a), a Convenção de Genebra continua em vigor relativamente ao Estado Angolano; por outro lado, nos termos do art. 35º, o mesmo acontece relativamente ao Estado Português.
Ora, assim sendo, constata-se que, afinal, pese embora o facto de a República Popular de Angola não figurar, de forma expressa, na lista de países aderentes à Convenção de Genebra relativa ao trânsito rodoviário, o Estado Português encontra-se obrigado a reconhecer as cartas de condução emitidas por este País, uma vez que, como vimos, nos termos da convenção de Viena de 1978, tal Tratado continua em vigor em ambos os Estados.
Deste modo, entendemos que não se verifica, no caso em apreço, um elemento do tipo objectivo do crime de condução sem habilitação legal – precisamente, a falta de título que habilite legalmente a condução. É que, nos termos do art. 125º, nº 1, al. e), o Estado Português, através da adesão à Convenção de Genebra, obrigou-se a reconhecer as licenças de condução emitidas pelo Estado Angolano. Consequentemente, irrelevante se torna a apreciação do tipo de ilícito subjectivo.
Por todo o exposto, deverá o arguido B………. ser absolvido da prática do crime por que vinha acusado.”
Dispensando-nos de repetir as normas invocadas na sentença recorrida, importa salientar, como o faz o Ministério Público, a regra geral contida no art. 16.º da Convenção de Viena sobre a Sucessão de Estados em Matéria de Tratados, de 23 de Agosto de 1978:
“ Posição relativamente aos tratados do Estado predecessor
Nenhum Estado de recente independência estará obrigado a manter em vigor um tratado ou a passar a ser parte dele pelo fato de, na data da sucessão de Estados, o tratado estar em vigor relativamente ao território a que se refere a sucessão de Estados.”
Por sua vez, dispõe o art. 17.º:
“Participação em tratados em vigor na data da sucessão de Estados
1. Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3, um Estado de recente independência poderá, mediante uma notificação de sucessão, fazer constar a sua qualidade de parte em qualquer tratado multilateral que, na data da sucessão de Estados, estivesse em vigor relativamente ao território a que se refere a sucessão de Estados.”
A situação de Angola relativamente a Portugal revê-se precisamente nestas normas, de que decorre que os tratados a que Portugal aderiu não tiveram continuidade nesse Estado de recente independência e que deveria ter procedido à notificação prevista no citado art. 17.º, o que não é o caso.
O arguido vinha acusado da prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs. 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 3 de Janeiro.
Comete este crime (no que ao caso interessa) quem conduzir veículo automóvel na via pública, sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada.
No caso que nos ocupa, está provado que o arguido conduzia na via pública um automóvel munido da carta de condução n.º ..–….., emitida pela República de Angola, em 15 de Agosto de 1998, válida até 22 de Novembro de 2011.
Dispõe o art. 121.º do CE:
“1 – Só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito.”
E o art. 122.º:
“1 – O documento que titula a habilitação para conduzir automóveis…designa-se «carta de condução».”
Nos termos do art. 125.º, n.º 1, al.s d) e e) do CE, habilitam também à condução de veículos com motor as licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro que o Estado Português se tenha obrigado a reconhecer, por convenção ou tratado internacional e as licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro, desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais.
Nem num nem noutro caso se inclui a carta de condução exibida pelo arguido, não tendo cabimento o apelo aos art.s 34.º e 35.º da Convenção referida, já que outra coisa muito diferente resulta da regra geral a que se aludiu. Certo é que nem existe reciprocidade entre Angola e Portugal no reconhecimento das respectivas cartas de condução nem Portugal se obrigou a reconhecer as licenças de condução por aquela emitidas.
A carta de condução de que o arguido é titular não é, pois, título válido para a condução de veículos automóveis na via pública em Portugal. E, tanto assim é, que o arguido requereu inicialmente a troca dessa carta e, advertido de que tinha de se sujeitar a exame, se inscreveu numa escola de condução, em conformidade com o disposto no art. 129.º, n.º 6, do CE.
Isto é, o arguido conduzia um veículo automóvel na via pública sem, para o efeito, estar devidamente habilitado. E, está igualmente provado, fê-lo de vontade livre, consciente e deliberada, seguro que não podia conduzir aquele veículo na via pública e que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Temos, pois, que o arguido se mostra incurso na prática de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03.01, crime pelo qual se impõe a sua condenação.
A este crime corresponde pena de prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias.
O arguido não tem antecedentes criminais.
Tem o 10.º ano de escolaridade.
Trabalha na construção civil, auferindo cerca de €400,00 por mês.
Reside com a companheira que recebe igualmente cerca de €400,00 por mês.
Pagam €135,00 de renda de casa.
Têm uma filha com 5 anos de idade.
A ilicitude não assume particular significado.
O dolo é directo.
Tudo ponderado, afigurando-se adequada uma pena não privativa da liberdade, de acordo com o critério definido no art. 70.º do CP, entende-se ajustada uma pena de sessenta dias de multa, à taxa diária de cinco euros, no montante global de trezentos euros.
III. Pelo exposto, concede-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida nos seguintes termos:
1.º O arguido B………. vai condenado, como autor material de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 02.01, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), no montante global de €300,00 (trezentos euros);
2.º Custas a cargo do arguido, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (com o acréscimo legal de 1%) e a procuradoria em um terço.
Elaborado e revisto pela primeira signatária.
Porto, 24 de Outubro de 2007
Airisa Maurício Antunes Caldinho
António Luís T. Cravo Roxo
Joaquim Rodrigues Dias Cabral
Arlindo Manuel Teixeira Pinto