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ALEGAÇÕES
PRAZO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA
Sumário
A consideração do prazo suplementar de dez dias, previsto no nº6 do art. 698º do CPC, não está condicionada à manifestação, no requerimento de interposição do recurso, da pretensão de reapreciação da prova gravada.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
1. RELATÓRIO.
B……………….., residente na Rua……….., n.º…., ……, Gondomar,
veio intentar acção, sob a forma ordinária, contra
C…………….., residente na Rua…………., n.º….., …….., Gondomar,
pedindo fosse declaro nulo e de nenhum efeito o testamento em que D…………….. havia instituído a Ré como sua universal herdeira do remanescente da sua herança.
O processo seguiu os seus termos, com vicissitudes várias que não relevam para o caso que aqui importa solucionar, tendo sido realizada audiência de julgamento com gravação da prova nela produzida, vindo a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido na acção formulado.
Do assim sentenciado foi pela Autora interposto recurso de apelação, sem que no respectivo requerimento fizesse qualquer outra menção que não o propósito de interpor tal recurso (fls. 488).
Proferiu-se despacho a admitir esse recuso como apelação, o que chegou ao conhecimento do mandatário da Autora em 9.1.2006, o qual apresentou as competentes alegações em 20.2.2006, perseguindo a revogação do decidido, para o efeito pondo em causa a decisão da matéria de facto, assim tendo o recurso por objecto a reapreciação da prova produzida e gravada.
Subsequentemente, veio a ser proferido despacho a julgar deserto tal recurso de apelação, por as respectivas alegações terem sido apresentadas para além do prazo de 30 dias previsto no art. 698, n.º 2 do CPC, argumentando-se que, apesar do aludido recurso ter por objecto a reapreciação da prova gravada, incumbia ao recorrente, para poder beneficiar do prazo adicional previsto no n.º 6 do citado art. 698, manifestar a intenção de que o recurso abrangia aquela reapreciação, antes de decorrido o prazo normal contemplado no n.º 2 do mencionado artigo, assim devendo as alegações dar entrada em juízo no prazo normal de 30 dias para poderem ser consideras.
Desta última decisão interpôs a Autora recurso de agravo – o que nesta sede compete apreciar – em cujas alegações concluiu pela revogação daquele despacho, por deverem considerar-se tempestivas aqueloutras (alegações) referentes ao aludido recurso de apelação, dado beneficiar do prazo adicional previsto no n.º 6 do art. 698 do CPC, na medida em que nele vinha pretendida a reapreciação da prova gravada.
Inexiste resposta a tais alegações.
Corridos os vistos legais, cumpre tomar conhecimento do mérito do agravo, sendo que a instância mantém a sua validade.
2. FUNDAMENTAÇÃO.
A materialidade a reter para a apreciação do presente agravo vem já suficientemente enunciada no relatório supra, motivo pelo qual nos dispensamos aqui de a repetir.
Em face das conclusões formuladas, o objecto do recurso poderá ser circunscrito à questão essencial de curar saber se, no caso em presença, a agravante, enquanto recorrente da sentença proferida nos autos, beneficia do acréscimo do prazo de 10 dias consignado no n.º 6 do art. 698 do CPC para apresentação das alegações referentes à apelação que interpôs daquela sentença.
Já vimos que o tribunal “a quo” considerou intempestivas as ditas alegações relativas ao mencionado recurso apelação, posto a agravante, para poder beneficiar do aludido prazo acrescido de 10 dias, dever manifestar, ainda antes do decurso normal do prazo (30 dias) para apresentação das alegações da apelação, a intenção de que visava a reapreciação da prova gravada, sem o que estava-lhe vedado aproveitar-se daquele prazo acrescido (de 10 dias).
Não é esta, porém, a tese que perfilhamos. Passemos a demonstrar.
Sendo certo que o art. 698, n.º 2 do CPC fixa o prazo normal de 30 dias para a apresentação de alegações no recurso de apelação, constituindo excepção poder esse prazo ser acrescido de 10 dias, quando tal recurso tenha por objecto a reapreciação da prova gravada (n.º 6, do cit. art.), já não temos como certo que decorra do normativo em referência ou daqueles que mais directamente se relacionam com a problemática em análise (v.g., arts. 684, n.º 3, 687, n.º 1 e 690-A, n.º 1, todos do CPC) a necessidade da aludida invocação no mencionado prazo, por forma a que o recorrente beneficie do falado prazo acrescido de 10 dias.
Desde logo, fazendo o cotejo dos citados arts. 684, n.º 3 e 687, n.º 1, só excepcionalmente terá o recorrente de indicar o fundamento por que pretende impugnar a decisão recorrida, pois que, não vindo indicado esse fundamento, o recurso abrange tudo o que na sua parte dispositiva for desfavorável ao impugnante.
Tal fundamentação deverá sim suceder em sede alegações, quer o recurso verse sobre matéria de direito (art. 690, n.º 2, do CPC) – indicando-se as normas jurídicas violadas, a incorrecta interpretação e aplicação concedida às normas jurídicas em que se fundamentou a decisão, o erro na determinação da norma aplicável, com indicação do normativo jurídico aplicável – quer tenha em vista a impugnação da matéria de facto (art. 690-A, n.º 1, do CPC) – especificando-se os concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios que impõem decisão diferente da recorrida.
Assim, temos como certo que só excepcionalmente deve o recorrente com antecipação – nomeadamente no requerimento de interposição de recurso – indicar o fundamento pelo qual pretende impugnar a decisão que lhe é desfavorável, no que estarão incluídas designadamente aquelas situações em que a faculdade de recorrer pode suceder independentemente do valor da causa e da sucumbência – v., neste aspecto, Teixeira de Sousa, in “Estudos…”, pág. 515 e Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 3.ª ed., págs. 142 a 143, bem assim Ribeiro Mendes, ao afirmar que “o ónus de indicação do fundamento do recurso se circunscreve àquelas decisões que, em regra, são irrecorríveis”, in “Os Recursos no CPC Revisto”, pág. 65.
Por esta via de raciocínio, o controlo da tempestividade das alegações poderá ser feito “a posteriori”, ou seja, tendo a prova sido objecto de gravação e sido interposto recurso do sentenciado, sempre o tribunal poderá averiguar se o recorrente fez ou não uso indevido dum prazo acrescido para apresentação das competentes alegações, avaliando se nestas últimas é pretendida a reapreciação da prova gravada, quanto é certo, como vimos, nas mesmas (alegações) dever o recorrente objectivar os fundamentos por que pretende impugnar a decisão recorrida.
Este entendimento, segundo cremos, tem a cobertura dos princípios da adequação formal, do aproveitamento dos actos processuais praticados pelas partes, da economia e celeridade processuais que informam o direito processual civil, sendo que a dinâmica do processo introduzida pela Reforma de 1997 importa a remoção “de todos os obstáculos injustificados à obtenção de uma decisão de fundo, que opere a justa e definitiva composição do litígio, privilegiando-se assim claramente a decisão de fundo sobra a mera decisão de forma” – v. Preâmbulo do DL n.º 329-A/95 de 12.12.
Equivalerá o expendido, ao contrário do decidido pelo tribunal “a quo” e face ao teor das alegações apresentadas pelo agravante relativamente ao recurso de apelação que interpôs, onde questiona a decisão da matéria de facto, através da reapreciação da prova gravada, que facultada lhe estava apresentar aquelas até ao termo do prazo acrescido a que alude o n.º 6 do art. 698, como sucedeu.
Não poderá, assim, acolher-se a decisão recorrida, ao julgar deserto o recurso interposto pela agravante da sentença proferida nos autos, na base da argumentação utilizada e acabada de analisar.
3. CONCLUSÃO.
Pelo exposto, decide-se conceder provimento ao agravo e, nessa medida, revogando-se o despacho recorrido, considera-se que o recurso de apelação interposto pela Autora se não encontra deserto, por não se ter esgotado o prazo para apresentação das correspondentes alegações.
Sem custas, por não serem devidas.
Porto, 22 de Novembro de 2007
Mário Manuel Baptista Fernandes
Fernando Baptista Oliveira
José Manuel Carvalho Ferraz