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EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
SOLO APTO PARA OUTROS FINS
ARRENDAMENTO RURAL
Sumário
1. O arrendamento rural não constitui um ónus da propriedade, pelo que a indemnização atribuída ao arrendatário não deve ser deduzida na indemnização fixada ao proprietário. 2. A maquinaria e o equipamento que se revelam desnecessários em função da redução da área de cultivo ocasionada pela expropriação, constitui dano emergente indemnizável.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
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Pelo despacho n.º 11056-A/2003, de 09.05.2003, do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, publicado no Diário da República, n.º 128 de 03/006/2003, II série, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela de terreno com a área total de 17749m2, a destacar de um prédio rústico com a área de 28.940 m2, situado no Lugar ……….., freguesia de …………, concelho de Vila do Conde, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o art. 950, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.° 00542/0210230 e aí inscrito a favor dos expropriados, cuja posse administrativa foi concretizada em 23 de Janeiro de 2004.
É expropriante a IEP - Instituto das Estradas de Portugal, expropriados B……………… e C…………….. e interessada D……………….. casada com E……………….. (esta última na qualidade de arrendatária da parcela a expropriar).
Após a vistoria ad perpetuam rei memoriam, teve lugar a arbitragem.
Na decisão arbitrai, os árbitros, por unanimidade, concluíram pela atribuição, aos expropriados de uma indemnização € 196.081,98 e, aos interessados, de uma indemnização de €68.005,05.
Por sentença de fls. 78 e ss. foi adjudicada a parcela em questão à expropriante.
Proferiu-se sentença em que foi decidido:
a) € 196.081,98 (CENTO E NOVENTA E SEIS MIL E OITENTA E UM EUROS E NOVENTA E OITO CENTIMOS), a indemnização a ser atribuída aos expropriados em virtude da presente expropriação;
b) € 94.445,72 (NOVENTA E QUATRO MIL QUATROCENTOS E QUARENTA E CINCO EUROS E SETENTA E DOIS CENTIMOS) a indemnização a ser atribuída à arrendatária D…………………;
montantes estes a serem actualizados nos termos referidos supra.
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Desta sentença foram interpostos recursos pela entidade expropriante e pela arrendatária rural (interpostos e admitidos como de apelação).
Conclui a expropriada nas suas alegações:
I Questão – matéria de facto
1- Os recorrentes impugnam a decisão sobre a matéria de facto assente, pois que a mesma é incompleta, tendo em conta as várias soluções possíveis de direito, não compreendendo factos que resultam provados, com base em documentos constantes dos autos e nas respostas dos peritos aos quesitos.
2- Porque essa prova resulta de elementos constantes dos autos, a matéria de facto deve ser ampliada pelo tribunal «ad quem» e, consequentemente, aditados aos factos assentes os factos enunciados no ponto 5 supra, uma vez que são importantes para a mais correcta apreciação e ponderação dos Relatórios periciais constantes dos autos, nomeadamente no que tange ao apuramento dos prejuízos decorrentes da perda de produção e à extensão desses prejuízos.
II Questão – prejuízo pelo subaproveitamento dos meios de produção da arrendatária
3- O cálculo e fixação da indemnização autónoma à arrendatária rural, nas suas várias vertentes é uma questão de índole técnica e de grande especialização, devendo o tribunal, naturalmente, socorrer-se dos Relatórios periciais, mormente do maioritário, subscrito pelos três peritos do tribunal, dois dos quais – muito apropriadamente – engenheiros agrónomos, estavam especialmente vocacionados e preparados para este tipo de avaliação.
4- O tribunal pode discordar do relatório maioritário dos Sr.s Peritos, mas a razão da sua discordância tem de ser fundamentada e, nomeadamente, resultar da matéria de facto cuja livre apreciação lhe incumbe – o que não ocorreu.
5- No caso em apreço, o Mmo Julgador afastou, mal, a parcela indemnizatória que os Sr.s Peritos tinham atribuído a este factor do subaproveitamento, precisamente porque não teve presente (e não deu como provando, quando o deveria ter feito) que a exploração agro-pecuária era bem dimensionada e administrada, dispondo os arrendatários das instalações e equipamentos adequados à exploração agro-pecuária que desenvolviam, facto que foi o fundamento apontado pelos Sr.s Peritos no seu relatório para a fixação da indemnização pelo subaproveitamento.
6- Não é confundível o prejuízo que decorre para os arrendatários pela quebra de produção futura (lucro cessante) e o prejuízo que lhes advém de terem feito investimentos em meios de produção adequados a uma exploração agropecuária com X animais e passado a ter um efectivo pecuário menor, para o qual lhes bastaria terem feito um investimento muito mais reduzido, sendo patente que tiveram um dispêndio económico 25% superior ao que necessitariam de ter tido, se previssem que a sua exploração agrícola ficaria reduzida a ¾ após a presente expropriação.
7- Trata-se de um prejuízo real e efectivo sofrido pelos arrendatários, que já pagaram aquelas máquinas e instalações e que as não podem ora devolver, que os Sr.s Peritos consideraram no seu Relatório, sendo que o respectivo cálculo analítico foi devidamente fundamentado, teve por base os valores discriminados do equipamento e máquinas, não tendo sido um número «atirado» ao acaso, os 22.912,50€ de prejuízo apurado, que corresponde precisamente a 25% do valor (à data da DUP) daqueles meios de produção.
8- Este prejuízo, com o devido respeito, não se encontra indemnizado com a quantia apurada pela perda de rendimentos, ao contrário do que defende o Mmo Juiz «a quo», pois é de distinta natureza.
9- Dispõe o artigo 564º do Código Civil, aplicável ex vi do artigo 30º nº 5 do Código das Expropriações, que o dever de indemnizar compreende tanto o prejuízo causado (danos emergentes) como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucros cessantes).
10- Ora, constituem danos emergentes os prejuízos resultantes da venda forçada ou do subaproveitamento dos bens de produção pertença do arrendatário.
11- Ao não seguir o laudo dos Sr.s Peritos que computaram todos os danos emergentes da expropriação que, em relação aos arrendatários, resultaram provados, a sentença recorrida, para além de fazer tábua rasa da matéria a propósito provada, violou o disposto no artigo 30º nº 5 do CE e o artigo 564º do Código Civil.
III Questão – cômputo do prejuízo pelos lucros cessantes
12 - Tal como é entendimento unânime da nossa jurisprudência, a indemnização por expropriação do direito ao arrendamento, enquanto encargo autónomo, deve abranger os danos futuros, desde que previsíveis.
13- Quando não é possível ao arrendatário substituir a área expropriada, tal como concluíram os Sr.s peritos e o Julgador, o arrendatário tem direito à contabilização dos prejuízos emergentes da DUP, até à data do termo do contrato.
14- Em termos de regras de experiência comum e dentro de um critério de normalidade, é previsível que a arrendatária, porque filha dos proprietários, se mantivesse como arrendatária da exploração agro-pecuária em causa durante o período da sua vida útil de trabalho (mais 19 anos desde a DUP).
15- Daí que melhor andaria o tribunal «a quo» se, dentro do seu livre arbítrio e de acordo com o Princípio da Livre Apreciação das Provas, considerasse de 19 anos o lapso temporal para efeitos da indemnização pela dita perda de rendimentos, nos termos peticionados no recurso arbitral, de forma a se aproximar da Justa Indemnização.
16- Não é rigorosa a afirmação de que com a indemnização pela perda de rendimentos, a arrendatária já estaria colocada na situação em que se encontraria se não fosse a DUP, já que, de acordo com as regras da experiência comum e em face dos elementos constantes dos autos (certidão de nascimento) a arrendatária, se não fosse da expropriação, continuaria inquilina da exploração, pelo menos mais 19 anos, e não os 12 considerados.
17- A sentença recorrida violou o disposto no artigo 564º nº 2 do Código Civil e 30º nº 5 do Código das Expropriações.
TERMOS EM QUE DEVE SER PARCIALMENTE REVOGADA A DECISÃO EM CRISE E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE PROCEDA Á AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO, FIXAÇÃO DA INDEMNIZAÇÃO PELO SUBAPROVEITAMENTO DOS MEIOS DE PRODUÇÃO DA ARRENDATÁRIA, A TÍTULO DE DANOS EMERGENTES E AUMENTO DA INDEMNIZAÇÃO PELA PERDA DE RENDIMENTOS, A TÍTULO DE LUCROS CESSANTES; (…).
Por seu turno concluiu a expropriante nas suas alegações:
1. O relatório de avaliação dos peritos do tribunal está submetido à livre apreciação do julgador e deve ser objecto uma leitura critica, tendo em conta a sua comparação com os demais elementos dos autos;
2. O relatório dos peritos do tribunal não fundamenta as suas opções, não revelando as qualidades necessárias para lograr convencer o tribunal e justificar a indemnização proposta;
3. O relatório do perito da expropriante é isento, fundamentado e obediente aos critérios legais e constitucionais de fixação da justa indemnização;
4. Considerando o método seguido pêlos Srs. Peritos no cálculo do valor do solo agrícola, estes não poderiam considerar uma indemnização a título de desvalorização da parte sobrante:
5. O valor do solo expropriado é determinado através do recurso ao rendimento fundiário por hectare, capitalizando tal rendimento por um período de 25 anos;
6. O valor do solo expropriado foi calculado com base na expectativa e possibilidade de produção deste como uma unidade indivisa e total;
7. Porém, para efeitos de cálculo de indemnização a título de desvalorização da parte sobrante, já consideram que em virtude da separação das parcelas, resulta uma desvalorização da parte sobrante a Sul;
8. Calculando e atribuindo a sentença sob recurso uma eventual desvalorização da parte sobrante, deveriam ter considerado a mesma no cálculo efectuado ao terreno expropriado e a sua influência - o que acarretaria uma diminuição da produção - ou, não poderiam atribuir uma indemnização por desvalorização da parte sobrante localizada a Sul;
9. O raciocínio vertido na sentença sob recurso iria traduzir-se num claro locupletamento injustificado dos expropriados proprietários, os quais seriam indemnizados pela desvalorização da parte sobrante a Sul e simultaneamente indemnizados pelo rendimento resultante do cálculo do prédio expropriado como unidade indivisa;
10. A indemnização a atribuir ao arrendatário rural, deverá ser a que resulta dos critérios utilizados pelo perito da expropriante;
11. A indemnização que vier a ser definida para o proprietário deve ser deduzida na importância que se fixar a título de indemnização atribuída aos arrendatários, já que, esta última indemnização exprime a menos-valia ou o ónus que o arrendamento representa para a propriedade
12. A decisão recorrida, ao não os interpretar da forma acima assinalada, violou o disposto nos artigos 23.°, 25.° n° 1 e n.°3, 27.° n.° 3, 29.° e 31.° n.° 1 e n.° 2 do CE/99 e o n.° 2 do artigo 62.° da CRP.
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Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das de acordo com os arts.684º, nº3 e 690º, nº1 do C.P.C. as questões a decidir consistem:
Relativamente á recorrente expropriante:
- em saber se deve ser ampliada a matéria de facto;
- em saber se na expropriação parcial e no caso de solos aptos para outros fins utilizando o critério do rendimento fundiário (que faz um calculo prévio de toda a área expropriada e não expropriada) se a indemnização das partes sobrantes constitui uma dupla indemnização;
Relativamente à expropriada / arrendatária rural:
- se o sub aproveitamento das maquinas agrícolas em virtude da redução da área expropriada constitui um dano emergente para os efeitos do art. 30º, nº5 do CE.
- se deve a indemnização pela perda de rendimentos ter em atenção o período de vida activa da expropriada.
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Os Factos provados.
Ao abrigo do disposto no art.712º, nº1 a) do CPC e por assumirem relevância para a decisão da causa aditam-se os seguintes factos à matéria assente, assim julgando procedentes as alegações de recurso da expropriada D……………, nesta parte:
- A exploração agro-pecuária era bem dimensionada e administrada, dispondo os arrendatários das instalações e equipamentos adequados à exploração agro-pecuária que desenvolviam.
- A área agrícola era necessária, em termos de exploração forrageira, para alimentação do efectivo pecuário.
- A arrendatária D……………., nascida em 08-05-1962, é filha dos proprietários do terreno.
- O casal dos arrendatários depende economicamente, de forma exclusiva, da exploração agro-pecuária referida em e).
- o efectivo de máquinas e equipamentos da exploração agro-pecuária e respectivos valores apurados pelos Peritos.
Factos provados desde logo constantes da sentença:
a) Pelo despacho n.° 11056-A/2003, de 09.05.2003, do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, publicado no Diário da República, n.° 128 de 03/006/2003, II série, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela de terreno com a área total de 17.749m2, a destacar de um prédio rústico com a área de 28.940 m2, situado no Lugar …………, freguesia de …….., concelho de Vila do Conde, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o art. 950, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.° 00542/0210230 e aí inscrito a favor dos expropriados, cuja posse administrativa foi concretizada em 23 de Janeiro de 2004.
b) Tal parcela destinou-se à construção da "A7/IC5 - Póvoa do Varzim/Famalicão, Sublanços IC1 (Póvoa do Varzim) - EN 206 - Famalicão".
c) A parcela de terreno referida em a) tem as seguintes confrontações: Norte: parte sobrante e F……………. (parcela n.° 119); Sul: parte sobrante; Nascente: G……………. (parcela n.° 119); Poente: G…………….. (parcela n.° 119).
d) O terreno do qual é a destacar a parcela tem, por sua vez, as seguintes confrontações: Norte: caminho público; Sul: rego; Nascente: H……………..; Poente: I…………..
e) De acordo com o PDM de Vila do Conde, o terreno referido em d) estava integrado em área Reserva Agrícola Nacional (RAN) e Reserva Ecológica Nacional (REN) e, à data da vistoria "aí/ perpetuam rei memoriam", constituía, conjuntamente com outros prédios circundantes uma exploração agro-pecuária com área total de 7 hectares, arrendada à interessada D…………… pela renda anual de € 3.000,00.
f) A parcela a expropriar era constituída por terreno agrícola (aproveitado como tal), de topografia plana, constituído por solo profundo e fértil e que dispunha de água de rega proveniente de uma mina de consortes situada fora da parcela e de uma poço e um furo artesiano situados dentro da parcela.
g) Da expropriação resultaram duas partes sobrantes, situadas a Norte e a Sul da parcela expropriada, as quais não têm acesso directo entre si sendo necessário percorrer uma distância de aproximadamente 600 metros em vias públicas para aceder de uma á outra.
h) A parte sobrante a sul fica separada do assento da lavoura pela auto-estrada (sem ligação directa pelo interior da propriedade como acontecia antes da expropriação) implicando um aumento significativo dos trajectos (de 90m para cerca de 600m) para a exploração da mesma e a necessidade de percorrer vias públicas.
i) A parcela expropriada possuía as seguintes benfeitorias:
- tanque para armazenamento de água de rega, construído pêlos expropriados em blocos rebocados, com as dimensões em planta de 5,0m x 10,0 m e altura de l,0m.
- silo em terra a céu aberto com 5m x 8m realizado pêlos expropriados.
- Furo artesiano construído pela arrendatária, com cerca de 100 m de profundidade com uma cabine (paredes de 12 cm de espessura e laje de cobertura em betão armado de 7,5 cm de espessura) com as dimensões em planta de l,4m x l,4m. equipada com baixada eléctrica.
j) O prédio do qual a parcela expropriada foi destacada constituída, em conjunto com outros uma exploração agro-pecuária com uma área de 7 hectares.
1) O número de cabeças de gado de tal exploração era de 68, sendo 38 vacas leiteiras, 18 novilhos e, as restantes, crias de várias idades.
m) A respectiva cota leiteira era de 176.000 Kg.
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Os factos o direito e o recurso.
Subjaz a toda a expropriação, o direito à justa indemnização consagrado constitucionalmente (art.62º, nº2 C.R.P.), o qual inculca, desde logo a ideia de reconstituição integral dos prejuízos sofridos pelo expropriado em resultado da expropriação, como se pode inferir do art. 23º do CE.
Não se discute nestes autos a natureza do terreno expropriado, enquanto conceito determinante na fixação da “justa indemnização” por referência aos dois moldes legais de classificação do solo previsto no art. 25º do CE-99 – solo apto para construção e solo apto para outros fins – já que se encontra aceite que a parcela expropriada se classifica como solo apto para outros fins.
Afastado este ponto aceso e controverso na doutrina e na jurisprudência a questão que nos foi posta á consideração pela expropriada e expropriante, consiste em saber se adentro desta classificação a sentença fez uma correcta aplicação da lei tendo em conta os factos provados.
Sabemos que é interpretação doutrinal e jurisprudencial inultrapassável da legislação das expropriações, que o cálculo indemnizatório constitucional tem de ter como parâmetro o preço de mercado dos bens expropriados, valor de mercado “normal ou “habitual” (cfr. Alves Correia, A jurisprudência do Tribunal Constitucional por expropriações por utilidade publica e o Código de Expropriações de 1999, in RLJ, Anos 132º e 133º p. 233/234), como resulta do art. 23º, nº5 do CE. Para atingir este desiderato qual o critério ou método a seguir no processo de avaliação dos “solos aptos para outros fins”?
O problema deve ser solucionado de acordo com os arts.23º, nº 5, já referido e 27º do CE /99.
Preceitua directamente sobre esta situação o arts. 27º, nº 1 do CE, o seguinte: “o valor do solo apto para outros fins será o resultante da media aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuados na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com media anual mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial e à sua aptidão especifica”; e o nº 2 dispõe “para efeitos previstos no nº anterior, os serviços competentes do Ministério das Finanças deverão fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuados na zona e os respectivos valores”. Por ultimo o nº 3, estabelece “ caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no nº1, por falta de elementos, o valor do solo para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade publica, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstancias objectivas susceptíveis de influir no respectivo calculo”.
Dispõe o artigo 23º sob a epígrafe, justa indemnização, no seu nº 5 que “ sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do presente artigo, o valor dos bens calculado de acordo com critérios referenciais constantes dos arts. 26º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o expropriado, quando tal se não verifique requerer, ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor”.
Daqui podemos concluir que o valor dos solos aptos para outros fins (conceito residual que abarca todos os solos não classificados como aptos para construção como é o caso da parcela expropriada) deve ser introduzido primacialmente pela busca do seu valor real e corrente (art.23º, nº 5 do CE).
O valor do solo deverá corresponder ao valor de mercado aferido pelas leis da oferta e da procura para a região onde o mesmo está implantado, fazendo o confronto com as transacções aí efectuadas. Com efeito um determinado solo pode ter um valor concreto em determinada região, e outro solo em condições idênticas pode ter um valor completamente distinto noutra zona do país.
Se não for possível averiguar os bens por este critério então deverá recorrer-se ao método comparativo, ou seja deverá ser observado o funcionamento do mercado numa dada região, atendendo-se ao arquivo ou documentação fiscal (art. 27º, nº 1 e 2 do CE / 99).
Só quando não se revele possível estes critérios é que se opta pelo critério do rendimento fundiário (art.27º,nº3 do CE/99).
Assim o critério do rendimento fundiário constitui a ultima ratio, cfr. Ac. STJ de 31.05.2007, in www.dgsi.pt, e acs. Rel. Évora de 18.05.2006 in CJ, ano/2006, T. 3 p. 244 e Rel. Lx. 14.03.02 in www.dgsi.pt.
O legislador de 1999, ditou a natureza instrumental dos critérios legais da justa indemnização, previstos no art. 27º, quer ao constar da norma do art.23º nº 5 o atendimento a circunstâncias particulares, quer ao determinar o afastamento da regra rígida do art. 26º, nº 1 do CE de 91, quando impunha o apuramento do valor dos solos “aptos para outros fins” pelo método do valor “efectivo ou possível”.
Feita esta introdução analisemos os recursos.
A sentença recorrida perfilhou em termos essenciais o laudo maioritário, aplicando á determinação do valor do solo expropriado o método do rendimento fundiário, de acordo com o art. 27º, nº3, critério que também não foi posto em causa pelas partes.
Deste modo fazendo-se apelo ao estado, uso e fruição, e finalidade da parcela na data de declaração de utilidade pública, a única finalidade possível, fez-se avaliação tendo em vista os fins agrícolas.
Desta feita a indemnização foi calculada de acordo com esta finalidade, ou seja de acordo com o seu rendimento fundiário.
Pretende o expropriante que não deve ser atribuir-se indemnização pela desvalorização da parte sobrante, já que no cálculo no valor do solo expropriado se teve em consideração, com base na expectativa e possibilidade de produção atendendo ao solo como uma unidade indivisa e total. Atender-se à desvalorização que resulta das sobrantes constituirá uma dupla indemnização.
Recorre a expropriante, neste particular, sem razão.
Para materializar a norma constante do art. 27º, nº 3 do diploma que analisamos e seus parâmetros é critério tradicional (norma idêntica constava dos códigos de 76 e 91) apurar-se o rendimento liquido estimado da parcela total e depois capitaliza-lo, com taxas que se aproximem das obtidas com a remuneração normal do capital.
Foi o que fizeram os peritos. Calcularam o rendimento líquido referente a toda a área correspondente a toda a exploração agrícola, para em seguida dividir pela totalidade de m2 a fim de encontrar o valor dos 17.74 m2 de solo expropriado.
Encontrado o valor da parcela expropriada, ficou arrumado este item, já que o critério sobredito teve por finalidade apurar em concreto o seu valor.
Concluída esta tarefa, há que averiguar se existem outros danos indemnizáveis, o que no caso se reporta às partes sobrantes (trata-se de uma exploração agrícola que ficou “partida ao meio”) e consequente ocorrência de desvalorização, de acordo com o art. 29º, nº 2 do CE.
Neste particular, acompanhando a sentença recorrida, da expropriação resultaram duas partes sobrantes a norte e a sul da parcela expropriada, as quais não têm acesso entre si sendo necessário percorrer uma distância de aproximadamente 600m2 em vias publicas para aceder de uma à outra, com notórias implicações nos acessos e capacidade produtiva, dada a perda de continuidade da exploração.
Sobreveio, pois, desvalorização das partes sobrantes, e a sua indemnização é autónoma e acresce à indemnização correspondente ao preço da parcela expropriada, não existindo duplicação de indemnizações.
Pretende ainda a expropriante que ao valor atribuído ao proprietário deverá ser subtraído o montante de indemnização fixado à arrendatária. Defende a recorrente que o arrendamento se traduz numa menos valia, ou seja um ónus para a propriedade, apoiando-se no Acórdão da Relação de Lx. De 25.11.97, in BMJ 471-449.
Esta posição não é de acolher.
Nos dias de hoje com a crise do sector agrícola, o abandono dos campos e a carência de trabalhadores rurais, a circunstância de os prédios rústicos se encontrarem arrendados constitui, bem pelo contrário, uma mais valia. Muitos dos terrenos correm o risco de ficaram incultos e desaproveitados, com todas as consequências daí advenientes. Convém, alias salientar que estamos no âmbito de um terreno com vocação eminentemente agrícola, em que estará fora de causa a venda para especulações imobiliárias de construção.
Deste modo o arrendamento rural, ao contrário de outrora, deixou de ser um ónus, para ser um beneficio pelas vantagens que trás aos respectivos prédios evitando a sua aridez e esterilidade, ao serem ocupados e cultivados.
Improcedem as alegações de recurso da expropriante.
A expropriada, arrendatária rural centra o seu recurso no valor fixado ao sub aproveitamento das máquinas em 25% correspondente à percentagem da área expropriada, que a sentença recorrida não levou em consideração apesar de tal constar do laudo maioritário.
Entendeu a sentença recorrida, que foi fixado o valor do rendimento referente à parcela expropriada, isto é, o valor que aufeririam se não ocorresse a expropriação. O montante do sub aproveitamento das máquinas constitui, uma duplicação da indemnização. Se a expropriada foi indemnizada pelo resultado, ou seja pelo o rendimento estimado, as máquinas constituem um meio para obter este mesmo resultado, e portanto o sub aproveitamento está integrado naquela indemnização.
Compreendemos a tese e a perspectiva da sentença recorrida, defendida por Alípio Guedes, in “Valorização dos Bens Expropriados”, 2ª ed., p.101.
Todavia se atentarmos no laudo dos peritos, constatamos que não levarem em conta na atribuição do valor indemnizatório, à maquinaria existente e ao estado da exploração agrícola, no factor a atribuir a perda de ganhos dos expropriados, que se traduziu na perda de rendimento.
Estamos no âmbito de uma exploração agrícola bem apetrechada em termos de máquinas. Ora um dos factores a ter em conta consiste na mecanização, técnicas de cultivo e investimentos realizados.
Temos de ter em consideração que a expropriada e o marido vivem exclusivamente desta concreta exploração agrícola. A expropriada tinha 41 anos à data da expropriação, e portanto com mais de 20 anos de vida activa. Ora para aquela exacta exploração e com a dimensão que dispunha, a expropriada modernizou-a investindo em determinado equipamento, que afinal se revela não ser necessário dada a redução da sua área de cultivo. Este subaproveitamento constitui um dano emergente indemnizável nos termos do art. 30º, nº5 do CE (neste sentido Pedro Elias da Costa, in “Guia das Expropriações por Utilidade Publica” p.340), na medida em que pode levar a venda forçada de equipamento ou mesmo à sua inutilização.
Este montante foi levado em conta autonomamente pelos senhores peritos, e deve por isso ser atribuído à expropriada.
Por outro lado como são doutrina e jurisprudência dominantes a indemnização a atribuir ao arrendatário deve ter em conta em período de ajustamento a uma nova actividade, que normalmente se calcula entre 10 e 12 anos.
Não é de atender assim à pretensão da arrendatária ao pretender o cálculo da indemnização pelo seu tempo estimado de vida activa.
Acresce que a arrendatário não formulou pedido de indemnização pelo tempo da sua sub ocupação.
Por tudo o exposto acordam neste tribunal da relação do Porto:
1. Julgar improcedentes as alegações da expropriante e confirmar a decisão recorrida;
2. Julgar parcialmente procedente as alegações da expropriada, Arrendatária rural D……………… e revogar a sentença recorrida atribuindo-se – lhe a indemnização de € 22.912,50.
Custas pela expropriada na proporção do vencimento.
Porto, 19 de Dezembro de 2007
Maria das Dores Eiró de Araújo
Anabela Dias da Silva
António Luís Caldas Antas de Barros