PRAZO SUPLEMENTAR
PAGAMENTO
MULTA
Sumário

A omissão da parte em solicitar a guia para o pagamento da multa até ao termo do primeiro dia posterior à prática do acto, nos termos previstos no nº 5 do art. 145º do CPC, não leva à imediata rejeição do acto, mas é penalizada com o agravamento da multa previsto no nº 6 do mesmo preceito; só o não pagamento desta multa, após a notificação aí referida, é que origina a rejeição do acto por extemporaneidade.

Texto Integral

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.

I

1. Nos presentes autos de acção declarativa de condenação com processo comum ordinário que correm termos na ..ª Vara Cível do Porto com o n.º …/97, que B………. moveu contra C………., e em que foram admitidos a intervir como associados da demandada D………., S.A., E………., S.A., F………., S.A., G………. e H………., por sentença de 23-10-2006, a fls. 1523-1545, foi decido julgar a acção totalmente improcedente por não provada e absolver do pedido a Ré e todos os intervenientes chamados no decurso do processo.
O Autor apelou dessa decisão e a Ré, na sua contra-alegação, suscitou a questão da extemporaneidade das alegações apresentadas pelo recorrente, concluindo a este respeito:
“A alegação do recorrente é extemporânea, pois que, foi apresentada depois do termo do prazo legal para o efeito, sem que o recorrente se tenha apostado a requerer e liquidar, de imediato, a multa devida pela sua apresentação tardia, pelo que deverá, “data venia”, julgar-se deserto o recurso por falta de apresentação tempestiva da alegação (cfr. arts. 145.º-3 e 5, 291.º-2 e 690.º-3 do Cód. Proc. Civil)”.
O Autor/apelante, pronunciando-se sobre esta questão, disse:
a) Por lapso, da signatária, na contagem do prazo das alegações, julgou esta que o termo do mesmo ocorria a 31-01-2007, quando, efectivamente, ocorria a 30.
b) Pelo que, quando dele se apercebeu (em 02-02-2007), logo solicitou a passagem de guias para pagamento da multa prevista no n.º 5 do art. 145.º do CPC, a qual foi liquidada pela secretaria em € 66,00, valor que foi pago dentro do prazo de que dispunha para tal (Port. n.º 42/2004, de 14-01).
c) Caso se entenda que o recorrente não procedeu ao pagamento atempado da multa devida nos termos do n.º 5 do art. 145.º, por ter solicitado e pago as respectivas guias apenas no 2.º dia após a prática do acto, não deve, ainda assim, o recurso ser julgado deserto com fundamento na intempestiva apresentação das alegações, pois o direito do faltoso não preclude até ser notificado pela secretaria, ou pelo próprio tribunal, nos termos e para os efeitos do n.º 6 e deixar passar o prazo que, então aí, lhe for fixado, e até hoje não foi aquele notificado nos termos e para os efeitos do n.º 6 do artigo que se vem referindo.
d) Pelo que deve julgar-se atempadamente paga a multa devida pela apresentação tardia das alegações, ou, caso assim não se entenda, julgar-se improcedente a preclusão do direito do recorrente, e consequente deserção do recurso, por ainda não ter ocorrido a notificação prevista no n.º 6 do art. 145.º do CPC.
Por despacho que consta a fls. 1724, o Sr. Juiz pronunciou-se sobre a invocada questão da extemporaneidade das alegações do recorrente, que decidiu nos seguintes termos:
«Como se constata dos elementos referenciados pelas partes e que resultam dos autos, o A. apresentou as suas alegações um dia após o término do prazo peremptório estipulado para o efeito.
Ao abrigo do disposto no art. 145.º, n.º 6, do Cód. Proc. Civil, a respectiva parte recorrente, devidamente notificada, procedeu ao pagamento da multa aplicável à prática do acto dentro do prazo dilatório.
Como tal, e diferente da situação referenciada no documento a fls. 1656, em que o aí interessado não procedeu à liquidação da multa, julgo tempestivo o acto praticado.
Notifique.»

2. A Ré, não se conformando com essa decisão, recorreu para esta Relação, recurso que foi admitido como agravo, com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo (fls. 1743).
Da sua alegação relativa a este agravo, a Ré extraiu as conclusões seguintes:
1) Da análise que se faça dos autos verifica-se que o prazo para apresentação da alegação do recurso de apelação interposto a fls. 1515 terminou em 30 de Janeiro de 2007;
2) A alegação foi, contudo, apresentada em 31 de Janeiro de 2007 (cfr. fls. 1606 dos autos), ou seja, no primeiro dia seguinte ao do termo do prazo para o efeito;
3) É sabido que o n.º 5 do art. 145.º do Cód. Proc. Civil permite que o acto seja praticado dentro dos três primeiros dias úteis seguintes ao termo do prazo, não obstante, a prática do acto nessas circunstâncias implica sempre o requerimento simultâneo do pagamento imediato da multa devida;
4) Ora, compulsados os autos constata-se que o A. não requereu, de imediato, o pagamento da multa devida pela apresentação tardia da alegação;
5) Efectivamente, apresentou a alegação em 31 de Janeiro e apenas se apostou a requerer o pagamento da multa no dia 02-02-2007 (data da emissão da guia para pagamento respectivo - cfr. fls. 1608), tal como se mostra confessado pelo Autor no ponto 34 de fls. 1688 e ss.;
6) A isto se aduz a circunstância de a multa, requerido que foi o pagamento apenas dois dias depois da prática do acto e já em terceiro dia de multa, apenas se mostrar paga pelo valor de ¼ da taxa de justiça inicial, ou seja, a correspondente ao primeiro dia;
7) O que tudo vale por dizer que a apresentação da alegação foi efectuada fora de prazo, não tendo o recorrente acompanhado a prática do acto do requerimento para imediato pagamento da multa devida e, por isso, o prazo tem-se pura e simplesmente por perdido;
8) Por outras e definitivas palavras: dada a natureza peremptória e preclusiva do prazo (cfr. art. 145.º-3 do Cód. Proc. Civil), perdeu o Autor a possibilidade de praticar validamente o acto,
9) o que deveria ter determinado que se tivesse julgado deserto o recurso de apelação interposto a fls. 1515 por falta de apresentação tempestiva da alegação (cfr. arts. 291.º-2 e 690.º-3 do Cód. Proc. Civil), o que agora, em revogação da decisão recorrida deverá, “data venia”, decidir-se, o que se requer com todas as legais consequências.
10) Foi violado o disposto nos arts. 145.º, 291.º, 690.º e 698.º do Cód. Proc. Civil.

2.1. Contra-alegou o Autor, concluindo:
a) Em primeiro lugar, não é preciso fazer acompanhar o acto, praticado fora de prazo, de requerimento a solicitar o pagamento da multa.
b) Em segundo, o pedido de passagem das guias e respectivo pagamento não tem que ser imediato, mas sim até ao final do 1.º dia útil seguinte ao da prática do acto.
c) Finalmente, não tendo sido paga a multa no prazo e montante previstos no n.º 5 do art. 145.º, a secretaria, ou o tribunal, notifica a parte faltosa para pagar a do n.º 6, quer o interessado tenha requerido as guias (e não as tenha pago), quer nem sequer as tenha requerido.
d) Ora, no presente caso, o agravado solicitou a passagem das guias, tendo pago o montante que foi liquidado pela secretaria.
e) Pelo que, na pior das hipóteses, o que poderá ser entendido é que, por ter pago a multa no 2.º dia útil após a prática do acto, dever-lhe-ia ter sido aplicada a do n.º 6 do art. 145.º e não a do n.º 5.
f) Mas aí tratar-se-á, salvo melhor opinião, de um lapso da própria secretaria ao proceder à liquidação da multa,
g) Devendo, quando muito, o agravado ser notificado para pagar a quantia em falta, mas nunca ser declarada a preclusão do seu direito.
h) O que nem se compreenderia, pois se a lei, através do n.º 6 do art. 145.º protege aquele que pratica o acto fora de prazo sem sequer requerer o pagamento da multa (cfr. arts. 07 a 13, supra), por maioria de razão terá que proteger aquele que o pratica fora de prazo, mas requer e paga a multa, embora em quantia inferior.
Nestes termos … deve ser negado provimento ao presente recurso de agravo, mantendo-se o despacho recorrido e, consequentemente, julgar-se tempestivamente apresentadas as alegações do ora agravado, no recurso de apelação por ele interposto (…).

2.2. O Sr. Juiz manteve o despacho agravado.

3. Estando assente, mesmo entre as partes, que as alegações relativas ao recurso de apelação foram apresentadas pelo Autor/apelante no 1.º dia útil posterior ao termo do prazo legal, a única questão que é posta no presente agravo consiste em saber se o Autor tinha que requerer de imediato, no momento em que entregou aquela peça processual, a passagem de guias para o pagamento da multa prevista no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil e qual a consequência jurídica de apenas se ter apresentado a solicitar guias para o pagamento dessa multa em 02-02-2007, ou seja, dois dias depois da entrega das alegações:
1) se deve considerar-se precludido o direito do Autor a praticar o acto fora de prazo e julgar-se deserto o recurso de apelação por falta de alegações nos termos do disposto no n.º 3 do art. 690.º do Código de Processo Civil, como defende a agravante,
2) ou se deve considerar-se válido o acto praticado, ainda que, eventualmente, condicionado ao pagamento pelo interessado (o Autor) do agravamento da multa previsto no n.º 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil, como defende o agravado.
Como a decisão deste agravo pode interferir com o conhecimento do recurso de apelação, há que apreciá-lo previamente.
Assim, colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II

4. Com interesse para a apreciação do objecto deste agravo, os autos revelam a seguinte factualidade:
1) Por requerimento entregue em 09-11-2006, o Autor interpôs recurso de apelação da sentença (fls. 1551).
2) Este recurso foi admitido por despacho de 11-12-2006, a fls. 1556.
3) Despacho que foi notificado aos ex.mos mandatários das partes por cartas registadas expedidas em 14-12-2006 (fls. 1557-1564).
4) As alegações do Autor, relativas ao recurso referido em 1), constantes de fls. 1565-1603, deram entrada na secretaria do Tribunal no dia 01-02-2007, mas foram remetidas por registo postal no dia 31-01-2007 (fls. 1606).
5) Só em 02-02-2007 o Autor solicitou guias para o pagamento da multa prevista no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil, guia que foi emitida nesse mesmo dia, pelo montante de € 66,00, constando da guia a indicação de que era pagável até 05-02-2007 (fls. 1607 e 1608).
6) O Autor efectuou o pagamento dessa multa, no referido montante de € 66,00, no dia 04-02-2007 (fls. 1618).

5. Importa começar por dizer que a questão posta neste agravo identifica-se com as que foram apreciadas nos recursos n.º 2222/07-1 e 6801/07-2 desta Relação, de cujos acórdãos fomos relator e o segundo foi decidido pelo mesmo colectivo, pelo que manteremos aqui a linha de interpretação que seguimos naqueles dois acórdãos, o primeiro dos quais está disponível, em texto integral, nas Bases Jurídico-documentais do ITIJ, em Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, com o endereço www.dgsi.pt/jtrp.nsf/, sob o n.º 0712222.
Trata-se aqui de saber se é ou não exigível, para que a parte possa beneficiar da faculdade prevista no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil, que requeira, logo no momento da prática do acto, a passagem de guia para pagamento da multa. Ou, dito de outra maneira, se é pressuposto de validação do acto praticado fora de prazo que seja de imediato requerida a passagem de guia para o pagamento da multa e o efectivo pagamento desta até ao termo do 1.º dia útil posterior.
Para se compreender a resposta à questão, tem interesse fazer a síntese da história do preceito e a evolução que foi assumindo com as diversas alterações legislativas a que foi sujeito.
O preceito do n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil foi introduzido pelo Decreto-Lei n.º 323/70, de 11 de Julho, que apenas permitia a prática de actos para além do prazo legal, “no 1.º dia útil seguinte ao termo do prazo”, fazendo depender a sua validade “do pagamento imediato de uma multa, (...)”. A expressão “pagamento imediato” não deixava dúvidas de que a multa teria que ser paga no próprio momento da prática do acto.
Tratando-se de uma sanção de natureza civil que funcionava como contrapartida pela prática do acto fora do prazo, o seu pagamento dependia apenas da iniciativa e liberdade de decisão da parte que pretendia praticar o acto fora do prazo. O não pagamento da multa não dava lugar a qualquer procedimento de cobrança coerciva; apenas tinha como consequência a não admissibilidade do acto praticado fora do prazo. Como agora ainda sucede.
O Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de Julho, alterou a redacção do preceito, alargando a possibilidade de o acto também poder ser praticado no segundo e terceiro dias úteis seguintes ao termo do prazo, e aditou o preceito do n.º 6. No que respeita ao momento do pagamento da multa, manteve o regime do “pagamento imediato”.
O Decreto-Lei n.º 92/88, de 17 de Março, introduziu pequenas alterações na redacção dos dois preceitos, sem, contudo, alterar o regime do “pagamento imediato” da multa. O mesmo sucedeu com os Decretos-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, e 180/96, de 25 de Setembro, que mantiveram o regime do “pagamento imediato” da multa.
Foi o Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, que alterou a redacção do n.º 5 para os termos que actualmente estão em vigor, substituindo a expressão “pagamento imediato”, pela expressão “pagamento, até ao termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto”. Alteração que teve em vista a sua compatibilização com as alterações introduzidas ao regime do art. 150.º do Código de Processo Civil, sobre a apresentação a juízo dos actos processuais pelos meios de comunicação à distância aí referidos (correio sob registo, telecópia e correio electrónico).
Parece, em todo o caso, evidente que o pagamento da multa, no âmbito do regime do n.º 5 do art. 145.º, continua a ser um ónus da exclusiva iniciativa da parte que pretende praticar o acto fora do prazo, apenas com a diferença de que deixou de ser exigível o pagamento imediato, no momento da prática do acto, para ser alargado o prazo de pagamento da multa até ao termo do dia útil seguinte.

6. Dito isto, há que questionar: Como se deve processar o pagamento desta multa? É ou não exigível que a parte requeira ou solicite, por escrito ou verbalmente, a passagem de guias para o pagamento da multa? Ou, como alguns defendem, funciona o regime de autoliquidação que já vigora para o pagamento da taxa de justiça.
O preceito do n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil, na redacção actualmente vigente, dada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27/12, dispõe do seguinte modo:
“Independentemente de justo impedimento, pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso, não podendo a multa exceder 3 UC”.
Como se constata, este preceito não esclarece o modo como deve ser processado o pagamento desta multa. Apenas refere a exigência de que deve ser paga até ao termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto e contém implícito o pressuposto, a que já fizemos referência, de que o pagamento da multa é um ónus da iniciativa da parte que quer prevalecer-se da faculdade de praticar o acto.
No acórdão de 13-06-2007, proferido no Recurso n.º 2222/07-1, acima citado, considerámos, e mantemos, que inexistia base legal que permitisse sustentar o regime de autoliquidação da multa nos termos que está regulado para o pagamento da taxa de justiça, porquanto nem a multa se integra no conceito de custas (v. arts. 1.º, n.º 2, e 74.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais), não lhe sendo, por isso, aplicável o regime de autoliquidação da taxa de justiça previsto no Código das Custas Judiciais, designadamente o art. 23.º, n.º 1, relativo ao pagamento da taxa de justiça inicial, nem existe qualquer norma legal que preveja o regime de autoliquidação da multa.
Pelo contrário, o art. 124.º do Código das Custas Judiciais, relativo às operações de tesouraria, dispõe no seu n.º 5 que “todos os outros pagamentos não abrangidos pelos números anteriores são efectuados através de guia a emitir pelo tribunal”. Ora, em nenhum dos números anteriores deste artigo está abrangida a forma de pagamento das multas previstas nos n.ºs 5 e 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil. Pelo que o seu pagamento cai no âmbito do regime previsto no n.º 5 do art. 124.º do Código das Custas Judiciais, ficando dependente da emissão de guia pela secretaria judicial.
Mas para que a secretaria emita a guia tem que ser solicitada pela parte interessada na prática do acto, de modo a que possa realizar o seu pagamento dentro do prazo estabelecido no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil, ou seja, até ao termo do 1.º dia útil posterior.
Com efeito, o pagamento da multa para efeitos do disposto no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil é um ónus da exclusiva iniciativa da parte que pretende praticar o acto fora do prazo, e não um acto que deva ser praticado oficiosamente pelo tribunal. À secretaria judicial a lei nada mais exige do que a emissão da guia, desde que solicitada, por escrito ou verbalmente.
Não consta da lei a exigência de que esta solicitação ou requerimento tenha que ser feito por escrito e no próprio momento da prática do acto. A exigência contida na lei refere-se ao momento do pagamento da multa. O que quer dizer que o pedido de emissão de guia pode ser feito verbalmente enquanto puder ser paga a multa e, portanto, até ao termo do prazo previsto no n.º 5 do art. 145.º para pagamento da multa devida.
Se a guia não for solicitada até ao termo do 1.º dia posterior à prática do acto, a actividade da secretaria judicial já se desenvolve nos termos do que dispõe o n.º 6 do art. 145.º, ou seja: compete-lhe, oficiosamente, notificar a parte para pagar a multa “agravada” prevista neste preceito legal, e já não a prevista no n.º 5.
Com efeito, prescreve o n.º 6 do art. 145.º que “decorrido o prazo referido no número anterior sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial, não podendo a multa exceder 20 UC”.
Da conjugação dos dois preceitos em causa ― do n.º 5 e do n.º 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil ― não se pode extrair o argumento restritivo de que a falta de requerimento ou de solicitação de guia, no momento da prática do acto, para o pagamento da multa faz precludir o direito de praticar o acto fora de prazo, como diz a agravante. A lei não prevê qualquer sanção nem retira qualquer consequência processual da falta de requerimento ou de solicitação da emissão da guia; retira-a é da falta de pagamento da multa dentro do prazo ali previsto.
É também do não pagamento da multa dentro desse prazo, e não da falta de requerimento, que a lei faz desenvolver o mecanismo previsto no n.º 6: notificação do interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial, com o limite de 20 UC.
O que quer dizer que tenha ou não tenha sido requerida a emissão da guia para pagamento da multa, decorrido o prazo previsto no n.º 5, compete à secretaria judicial notificar oficiosamente o interessado para pagar a multa agravada prevista no n.º 6. Que é a única penalização que a lei prevê para a omissão do pagamento da multa, por iniciativa do interessado, dentro do prazo previsto no n.º 5.
De modo que, e concluindo, a omissão da parte em solicitar a guia para o pagamento da multa até ao termo do 1.º dia posterior à prática do acto, nos termos previstos no n.º 5, não leva à imediata rejeição do acto, mas é penalizado com o agravamento da multa previsto no n.º 6,
Só o não pagamento da multa prevista no n.º 6 do art. 145.º, após a notificação aí referida, é que origina a rejeição do acto por extemporaneidade.

7. Neste caso, os elementos dos autos revelam que as alegações do Autor, embora recebidas no tribunal no dia 01-02-2007, consideram-se apresentadas no dia 31-01-2007, que é a data da efectivação do registo postal (art. 150.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil) e que corresponde a quarta-feira, dia em que os tribunais estavam abertos ao público.
Tendo o prazo legal de 30 dias (previsto no art. 698.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), terminado no dia 30-01-2007, que também era dia útil (terça-feira), decorre que o acto foi praticado no 1.º dia útil posterior ao termo do prazo.
Só no dia 02-02-2007 (sexta-feira), ou seja, dois dias depois de praticado o acto, é que a secretaria judicial emitiu a guia para pagamento da multa. E como se vê da liquidação de fls. 1607, embora nela se faça referência ao n.º 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil, a multa liquidada, no montante de € 66,00, corresponde a ¼ da taxa de justiça inicial devida, que, conforme consta da mesma liquidação, é de € 264,00. Correspondendo, portanto, à multa do n.º 5, e não à multa do n.º 6.
Ora, por um lado, não tendo o apelante solicitado a guia para realizar o pagamento da multa até ao termo do dia útil seguinte (dia 01-02-2007, quinta-feira), nos termos exigidos pelo n.º 5 do art. 145.º, impunha-se que a secretaria liquidasse a multa pelo montante agravado previsto no n.º 6 do art. 145.º. Independentemente de o apelante se ter apresentado no dia 02-02-2007 a solicitar a guia para o pagamento da multa. Porque o que releva, para este efeito, é que o apelante, por negligência sua, não tenha efectuado o pagamento da multa dentro do prazo previsto no n.º 5 do art. 145.º. Como aconteceu.
Sendo assim, o montante da multa a liquidar já não é o correspondente a ¼ da taxa de justiça inicial (€ 66,00), como foi liquidado, mas igual ao dobro da taxa de justiça inicial, com o limite de 20 UC. O dobro da taxa de justiça inicial perfaz € 528,00 (264 x 2), e é inferior a 20 UC (que perfazem o montante de € 1.920,00, à razão de € 96,00 o valor da UC no ano de 2007).
O que leva a concluir que, para que as alegações do apelante possam ser admitidas, este terá que efectuar o pagamento da diferença entre o que pagou (€ 66,00) e o que era e é devido (€ 528,00) por aplicação da sanção agravada prevista no n.º 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil.
Não merece, porém, provimento o agravo no que respeita à interpretação da norma do n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil no sentido de que a falta de requerimento para a emissão de guia no próprio momento da entrega das alegações do recurso fazia precludir o direito de praticar o acto fora do prazo, e, desse modo, que as alegações do Autor deveriam ser rejeitadas por extemporâneas, sem que lhe fosse dada a oportunidade de pagar a multa previstas no n.º 6 do art.145.º do Código de Processo Civil.
III

Pelo exposto, nega-se provimento ao agravo, mas determina-se que o Autor/apelante seja notificado, nos termos previstos no n.º 6 do art. 145.º do Código de Processo Civil, para pagar a diferença entre o montante da multa liquidada a fls. 1607, de € 66,00, e o montante devido nos termos daquele preceito legal (€ 528,00).
Custas pelo agravante (art. 446.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil).
*

Relação do Porto, 19-12-2007
António Guerra Banha
Anabela Dias da Silva
Maria do Carmo Domingues