ADVOGADO
SEGREDO PROFISSIONAL
Sumário

A simples qualidade de advogado é insuficiente para determinar o funcionamento do segredo profissional, sendo ainda necessário que os factos a provar se encontrem em conexão com o exercício da advocacia nos termos definidos no art. 87º do Estatuto da OA.

Texto Integral

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

1.

B………., advogado, propôs contra C………. e D………., acção declarativa, de condenação, sob a forma de processo sumário.

Pediu a condenação das rés a pagar a quantia de 4.070,19 euros, acrescida de juros de mora legais, a contar desde a citação.
Alegou, para tanto, ter sido contratado pela primeira ré para representar a segunda, menor na altura, num inventário por morte do avô paterno da última. Nesse âmbito, estudou o processo, participou em nove conferências, consultas diversas, gastando, no mínimo, sessenta horas de trabalho. Sucede que, a 5 de Abril de 2001, apresentou a sua nota de honorários e despesas, a qual, contudo, não foi paga por qualquer uma das rés.
Contestou a ré D………., alegando que nada contratou com o autor, não podendo, assim, ser responsabilizada pelo pagamento da quantia peticionada.
Por seu turno a ré C………. contestou invocando ser parte ilegítima, uma vez que a mandante era a ré D………., pois era esta a herdeira, por direito de representação, sendo certo que o mandato conferido ao autor o foi em sua representação, pelo facto de ser menor. Mais impugnando os factos alegados pelo autor na petição inicial, dizendo que o autor não cumpriu o mandato que lhe foi conferido, não lhe deixando outra alternativa que não fosse a da respectiva revogação.
Respondeu o autor nos termos, pugnando pela legitimidade da ré C………. .
Por decisão de fls. 75 a 77, foi julgada improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade invocada pela ré C………. e foi julgada parte ilegítima a ré D………. e, em consequência, foi a mesma absolvida da instância.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

2.

Nesta, foi, por despacho, indeferido um requerimento da ré, que pediu se oficiasse à Ordem dos advogados no sentido de se apurar se às testemunhas do autor – todas advogados – tinha sido concedida autorização de levantamento do sigilo profissional, sob pena de se considerarem os seus testemunhos irregulares.
Para tanto expendeu a Sra. Juíza:
«Atento o estatuído no artº87º do Estatuto da Ordem dos Advogados, afigura-se-nos que o depoimento da testemunha a cuja inquirição se processa, não viola qualquer segredo profissional, uma vez que o mesmo até agora apenas se limitou a revelar o trabalho desenvolvido pelo autor no âmbito dos factos que constam na petição inicial».

Inconformada com tal despacho dele agravou a ré.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1 – O despacho de 31/10/2006 (fls. …), reputou que os depoimentos das testemunhas inquiridas (Advogados) não violam qualquer segredo profissional, indeferindo, por isso, o requerimento da recorrente/agravante, no sentido de que os Srs. Advogados (testemunhas) teriam que estar previamente autorizados pelo Presidente do Conselho Distrital respectivo para deporem.
2 – O despacho de fls. … incide sobre o depoimento de testemunhas que tomaram conhecimento de factos relevantes para prova da matéria controvertida na presente acção, no âmbito do exercício das suas funções ou prestação dos seus serviços.
3 – Isto é, factos essenciais para aferir: da constituição do mandato a favor do A., para requerer a abertura de inventário por óbito de E………., estando em causa interesses duma menor; da intervenção do A. nas diversas diligências realizadas, do tempo aí dispendido; da dificuldade do assunto; e da forma como o A. se propôs acautelar e zelar pelos interesses da sua mandante.
4 – Torna-se necessário saber de factos que as testemunhas tomaram conhecimento no âmbito, e por causa, da prestação dos seus serviços como Advogados. Designadamente, factos que se prendem com, o valor da herança, o valor do quinhão de cada herdeiro, os bens que compõem a herança e o valor que lhes seria atribuído, os eventuais créditos ou débitos da herança, a forma da partilha, etc.
5 – Ou seja, factos: que lhes foram comunicados pelo representante de co-interessado do seu constituinte; de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhes deram conhecimento durante negociações para acordo que visavam pôr termo ao diferendo; de que tiveram conhecimento no âmbito de negociações malogradas, orais ou escritas, em que intervieram.
6 – Nos termos do artigo 87º do E.O.A., o advogado está obrigado a segredo profissional quanto a factos por si conhecidos no exercício da sua profissão, e seja qual for a origem da fonte.
7 – Importa violação do sigilo profissional a divulgação dos factos conhecidos por via e no exercício da advocacia, seja por declarações orais seja por qualquer outro meio.
8 – O dever de segredo profissional só poderá deixar de verificar-se mediante prévia autorização do presidente do conselho distrital respectivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respectivo regulamento.
9 – Ao advogado não é admitida a quebra o segredo profissional e o que resultar da violação do dever de reserva é irrelevante para prova em juízo.
10 – O despacho recorrido incorre na violação do disposto no n.º 4 do artigo 87º do E.O.A.

3.

Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo, a final, sido proferida sentença que:

Julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a ré C………. a pagar ao autor a quantia de 2.500,00 euros (dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, sem prejuízo de outras que venham legalmente a vigorar, a contar desde o trânsito em julgado da decisão e até integral pagamento.

4.

Mais uma vez inconformada apelou a ré.

Terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1 – Decorre do n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados:
“1 - Na fixação dos honorários deve o advogado proceder com moderação, atendendo ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, à importância do serviço prestado, às posses dos interessados, aos resultados obtidos e à praxe do foro e estilo da comarca.”
2 – A douta sentença enferma de vício ao considerar como provada a matéria constante da alínea c) “Por força do facto referido na aliena anterior, o autor estudou o processo, participou em pelo menos, 9 conferências realizadas com os herdeiros do falecido, deslocando-se à ………. e a ………., e realizou consultas, gastando, no mínimo sessenta horas de trabalho (artigo 3.º da petição inicial e artigos 13.º e 14.º da contestação da ré C……….)”.
3 – É o próprio Autor/recorrido que instado para prestar esclarecimentos no processo de Laudo, vem adicionar 2 novas reuniões, precisando uma duração normal de 3 horas cada, num total de 33 horas, acrescidas do tempo de deslocação.

4 – Estaríamos assim perante 33 horas de trabalho intelectual e, presumivelmente, 11 horas de trabalho material. E nunca as 60 horas peticionadas e dadas por assentes. Tal circunstância traduz-se em erro, não só de apreciação da prova, mas também da sua valoração.
5 – Verifica-se contradição insanável entre a matéria assente e a factualidade considerada para efeitos da elaboração do Laudo. Factualidade essa “fornecida” pelo próprio autor.
6 – No que concerne à verificação e preenchimento dos critérios emanados do n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, com vista à fixação dos honorários devidos, o tribunal “a quo” decidindo apenas com base na matéria assente peca por excesso de pronúncia. Pois, da matéria assente apenas resulta verificado (ainda que de forma pouco clara) o critério atinente ao tempo gasto.
7 – E, mesmo quanto a este, não é feita qualquer distinção entre o tempo gasto na realização de trabalho intelectual e o gasto na realização de trabalho material, que não deve, nem pode, ser contabilizado para efeitos de honorários com o mesmo valor/hora que o trabalho intelectual.
8 – A Mm.ª Juiz “a quo” a reproduzir as conclusões expressas no Laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados, sem aferir da “efectiva verificação” dos demais critérios decorrentes do n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.
9 – Tendo em conta a conclusão do mencionado Laudo, de que “(…) em termos técnico-jurídicos, não pode afirmar-se que os trabalhos desenvolvidos numa partilha extrajudicial por morte, como é o caso, revista especial dificuldade ou complexidade técnica.”
10 – Bem como, não tendo sido elaboradas quaisquer peças processuais, mas tão somente uma relação de bens que, apesar de extensa, se conclui ter sido elaborada por outra colega, não se materializam quaisquer actos, judiciais e/ou jurídicos, especificamente praticados pelo Autor que “mereçam” ser pagos pela quantia arbitrada (€ 2.500).
11 – Como terceiro factor a considerar temos a natureza, valor e importância do serviço prestado. Que, no caso em apreço e à data da constituição do mandato, se revelava de curial interesse para a recorrente, por estarem em causa direitos da sua filha menor. E porque o mandato constituído o foi para requerer a abertura de inventário por óbito de E………., estando em causa, à data, interesses duma menor, filha da recorrente.
12 – Torna-se necessário, para aferir da dificuldade do assunto e da forma como o A. se propôs acautelar e zelar pelos interesses da sua mandante, saber de factos que se prendem com, o valor da herança, o valor do quinhão de cada herdeiro, os bens que compõem a herança e o valor que lhes seria atribuído, os eventuais créditos ou débitos da herança, a forma da partilha, etc.. Em momento algum o autor/recorrido fez prova da dificuldade de tal assunto, nem mesmo dos esforços que desenvolveu para o concretizar.
13 – Não moveu as diligências necessárias e prévias à propositura do inventário, designadamente, solicitação de certidões de óbito, nascimento e casamento do autor da sucessão e respectivos herdeiros, requerimento da relação de bens junta ao processo de imposto sucessório, bem como, das certidões das descrições e inscrições de eventuais prédios constantes da herança, e ainda dos respectivos artigos matriciais, etc. Em suma, o autor/recorrido não cumpriu com o mandato que lhe foi conferido.
14 – Aliás, o autor/recorrido viu o seu mandato ser-lhe revogado precisamente porque, passado que era quase um ano desde a constituição do mesmo, o recorrido não tinha intentado o inventário para o qual havia sido mandatado.
15 – E eis que somos chegados ao critério dos resultados obtidos, que no caso em apreço, pelos motivos já expostos, foram absolutamente nulos. Pois, apesar do tempo decorrido, o autor/recorrido não logrou chegar a “lugar nenhum”.
16 – Quanto às posses da interessada, o recorrido terá “confundido” o benefício que a filha da recorrente obteria, e que é decorrente do exercício do direito de representação adquirido por óbito do seu pai, F………., pré-falecido à data da abertura de sucessão do identificado E………., seu avô paterno falecido em Maio de 2000, com um qualquer benefício que abstractamente coubesse à recorrente.
17 – A recorrente não obteve, nem esperava obter de tal partilha qualquer benefício. Tendo sido a sua intervenção completamente acessória e decorrente da qualidade de legal representante da sua filha menor. Logo, nunca a dívida referente aos honorários resultantes de tal mandato poderia ser considerada como responsabilidade da Recorrente, que à data contaria que chegada a altura seria a sua filha, entretanto maior, a pagar tais honorários.
18 – Contudo, e muito embora refira que quanto a este critério nada foi alegado, a Mm.ª Juiz “a quo”, baseia a sua conclusão em mera suposição:
“(…) nada faz supor que os obrigados ao pagamento de honorários os não possam satisfazer, na medida em que os mesmos se destinam a remunerar o trabalho desenvolvido em seu benefício ou em benefício de quem representam, neste caso, por força da lei.”
19 – Tal suposição trata-se de um juízo meramente presuntivo, que se encontra ilidido à partida se considerarmos os motivos pelos quais à recorrente foi concedido o benefício de protecção jurídica nos presentes autos.
20 – Também quanto à aplicação do critério atinente à praxe do foro e ao estilo da comarca a Mm.ª Juiz “a quo” tem por base conclusões, que não se coadunam com a realidade da comarca. Na medida em que é de uso em qualquer comarca a constituição de uma provisão monetária suficiente para cobrir as despesas ocorridas no processo. Provisão essa que o autor/recorrido nunca solicitou.
21 – Dada a intervenção e desempenho do autor/recorrido no processo em causa (ou falta deles), o montante da condenação é em tudo exagerado, contrariando em tudo os usos, costumes e estilo de qualquer comarca.
22 – Acresce que, o Laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados é omisso quanto à discriminação de tal quantia (€ 2.500). Ou seja, não especifica se tal quantia é referente às alegadas 60 horas de trabalho, ou se só às 33 horas de trabalho intelectual, acrescidas das 11 horas de trabalho material.
23 – Resulta da leitura do parecer constante do Laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados que há contradição entre a fundamentação exposta neste e a decisão final. Contradição essa que a Mm.ª Juiz “a quo” acaba por transpôr para a sentença em crise. Pois, não obstante tal Laudo estar sujeito ao princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal, acaba por ser valorado de forma excessivamente extensiva, atenta a factualidade assente.
24 – Acresce que, a prova produzida em juízo pelo autor/recorrido resultou do depoimento das testemunhas inquiridas (Advogados). Testemunhas cujo depoimento foi admitido, não obstante tais Advogados não estarem previamente autorizados pelo Presidente do Conselho Distrital respectivo para deporem, com violação do sigilo profissional.
25 – O depoimento de testemunhas incidiu sobre factos de que tomaram conhecimento no âmbito, e por causa, da prestação dos seus serviços como Advogados. Nomeadamente, factos que se prendem com, o valor da herança, o valor do quinhão de cada herdeiro, os bens que compõem a herança e o valor que lhes seria atribuído, os eventuais créditos ou débitos da herança, a forma da partilha, etc.
26 – Ou seja, forçosamente, factos:
- que lhes foram comunicados pelo representante de co-interessado do seu constituinte;
- de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhes deram conhecimento durante negociações para acordo que visavam pôr termo ao diferendo;
- de que tiveram conhecimento no âmbito de negociações malogradas, orais ou escritas, em que intervieram.
27 – Desta forma, importa ter presente que o sigilo deve abranger especialmente os “factos referentes a assuntos profissionais que lhe tenham sido revelados pelo cliente ou por sua ordem ou conhecidos no exercício da sua profissão” (de advogado) bem como os “factos de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo amigável e que sejam relativos à pendência”.
28 – Nos termos do artigo 87.º do E.O.A., o advogado está obrigado a segredo profissional quanto a factos por si conhecidos no exercício da sua profissão, e seja qual for a origem da fonte.
29 – “E o sigilo profissional do advogado interessa ao confidente e ao cliente que lhe confia os factos secretos, bem como ao interesse social e geral na confidencialidade e secretismo que deve existir nas relações do advogado no exercício da sua profissão, cuja actividade se desenvolve na área de privacidades das pessoas (v. Ac. STJ, de 15/04/2004, em ITIJ/net, proc. 04B795). Daí a razão do dever de reserva, não devendo divulgar, por qualquer meio, os factos adquiridos na confidencialidade da profissão e pela confiança do cliente no profissional quanto à reserva dos factos confiados. Sem verificação das situações previstas no artº 81º/4 do EOA, ao advogado não é admitida a quebra o segredo profissional e o que resultar da violação do dever de reserva é irrelevante para prova em juízo. (Sublinhado nosso)
“Importa violação a divulgação dos factos conhecidos por via e no exercício da advocacia, seja por declarações orais seja por qualquer outro meio, nomeadamente por junção de documentos, que os revelem, ao processo com que tais factos se relacionam.” (Acórdão do TRP, de 30-03-2006, in www.dgsi.pt)
30 – A sentença recorrida incorre na violação do disposto no n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto - Lei n.º 84/84, de 16 de Março, alterado pela Lei n.º 80/2001 de 20 de Julho, alterado pela Lei n.º 6/86, de 23 de Março, pelos Decretos - Leis n.ºs 119/86, de 28 de Maio, e 325/88, de 23 de Setembro, e pelas Leis n.ºs 33/94, de 6 de Setembro, e 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e o n.º 4 do artigo 87.º do E.O.A., na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 15/2005 de 26 de Janeiro.

5.

Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 690º do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes:

5.1.
Do agravo.

(In)eficácia dos depoimentos das duas testemunhas do autor, porque, sendo advogados, violaram o segredo profissional, pelo não cumprimento do nº4 do artº 87º do EOA.

5.2.
Da apelação.

(In)adequação do valor fixado a título de honorários.

6.
Apreciando.

6.1.
Do agravo.
6.1.1.
Estatui o artº 87º do EOA aprovado pela lei nº15/2005 de 26 de Janeiro.
“1 - O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente:
“a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste;
“b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados;
“c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração;
“d) A factos comunicados por co-autor, co-réu ou co-interessado do seu constituinte ou pelo respectivo representante;
“e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio;
“f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo.
“2 - A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço.
“3 - O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, directa ou indirectamente, com os factos sujeitos a sigilo.
“4 - O advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho distrital respectivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respectivo regulamento.
“5 - Os actos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo.
“6 - Ainda que dispensado nos termos do disposto no n.º 4, o advogado pode manter o segredo profissional.
“7 - O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no n.º 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua actividade profissional, com a cominação prevista no n.º 5.
“8 - O advogado deve exigir das pessoas referidas no número anterior o cumprimento do dever aí previsto em momento anterior ao início da colaboração.”
A interpretação que –na perspectiva da acção judicial - deste preceito temos por mais adequada e consentânea com a equilibrada salvaguarda dos valores que prossegue e afecta: a defesa do sigilo profissional e a descoberta da verdade material com a consequente realização da justiça – é a seguinte:
Ele reporta-se, essencialmente:
- ao advogado que representa uma das partes ou interessados no processo;
- a serviços por ele prestados a tal parte ou interessado que constituem o objecto do pedido ou cuja prova ou não prova possa influir decisivamente no desfecho da acção.
Tal dimana das alíneas do nº1 - rectius a d), e) e f) - nas quais fulcralmente se expende relativamente a «co-autor, co-réu ou co-interessado do seu constituinte», «parte contrária do cliente» e «negociações malogradas…em que tenha intervindo».
Nestes casos há efectivamente que cumprir o nº4 do artº 87º, sendo exigível a prévia autorização do presidente do conselho distrital respectivo e atender ao demais estatuído em tal normativo.
O qual, em todo o caso, temos para nós, se afigura demasiado rigoroso na defesa do sigilo profissional dos advogados, o que, naturalmente e em certas situações, pode prejudicar a consecução de objectivos que, ética e socialmente se apresentam como mais valiosos, como seja, e no que ora nos interessa, a realização da justiça.
Basta atentar no disposto no nº6 do mencionado preceito, que coloca na livre - e, quiçá, arbitrária - vontade pessoal do advogado, manter o segredo profissional, mesmo que de tal segredo tenha sido dispensado pela Ordem nos termos do nº4.

Já nos casos em que o advogado não representa ninguém nos autos ou os serviços por ele prestados não se reportem á essência do pedido ou ao objecto do processo, não há – pelo menos necessária e rigorosamente - que cumprir o ritualismo do artº 87º.
Pois que, ainda que se aceite que os bens jurídicos que iluminam a tutela do segredo profissional - quais sejam a confiança entre o advogado e o seu cliente, a necessidade social da confiança em certos profissionais, a protecção do normal funcionamento das instituições, evitando-se a degradação da sua imagem e desconfiança entre o público - podem conferir ao segredo profissional dos advogados matizes valorativas de ordem pública, certo é que estes valores têm de ceder perante outros de dignidade e relevância social acrescidas, como seja a descoberta da verdade e a justa composição do litígio, com vista à realização da justiça e à obtenção do equilíbrio e da paz social – cfr. Ac. Relação de Lisboa de 29.06.2006 dgsi.pt, p.4949/2006-6.
Nestes casos o advogado pode depor como testemunha, pois, antes de ser advogado é um cidadão de pleno direito. Na verdade, o regime legal do segredo profissional do advogado não se destina a impedir o depoimento da testemunha por ser advogado. A limitação ao seu depoimento é excepcional só devendo ocorrer na medida do estritamente necessário à salvaguarda do escopo que preside ao estabelecimento de um segredo profissional.
Havendo que chamar á colação o disposto no artº266 do CPC, que permite ao juiz ouvir os mandatários das partes convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que tenha por pertinente e no artº 519º que impõe a todas as pessoas o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade. Tudo sem prejuízo do direito que assiste ao visado de recusar a sua cooperação se invocar fundamento para tal, designadamente a violação do sigilo profissional, como decorre do nº3 deste preceito e do artº 618º nº3.
Do que resulta que, mais do que uma prévia autorização da respectiva entidade reguladora, impende, em primeiro lugar, sobre o obrigado a sigilo profissional, o poder/dever de pedir escusa de depor, sempre que entender que o seu depoimento poder vir a por em risco o sigilo profissional a que deve obediência. O que o juiz do processo, analisará, não tomando o depoimento e comunicando o sucedido à respectiva Ordem se concluir pela violação ou aceitando-o no caso contrário. Podendo, neste caso, a parte que entender que esse testemunho não poderá vir a fazer prova nos autos, alegar a nulidade do mesmo, para tanto invocando e discriminando os pontos de facto que ressaltaram do depoimento prestado, suas razões, etc., que quanto a si, foram violadoras do sigilo profissional a que a testemunha estava adstrita.
Assim sendo, a simples qualidade de advogado é insuficiente para determinar o funcionamento do segredo profissional. Sendo outrossim necessário que os factos a provar se encontrem em conexão com o exercício da advocacia nos termos definidos em tal preceito - cfr. Acórdãos da Relação do Porto de 16.01.2007, dgsi.pt p.06265 e da Relação de Lisboa de 23.05.2007, p.9597/2006-3.

6.1.2.
No caso vertente e bem vistas as coisas, as testemunhas indicadas pelo autor, ainda que advogados, não representam neste processo, ninguém que tenha, directa ou indirectamente, interesse na causa.
Assim e contrariamente ao defendido pela recorrente o caso, meridianamente, não se subsume na previsão das als. a) a e) do nº 1 do artº 87º do EOA.
Dúvidas se poderão colocar no que tange à al.f) e à parte final do nº2.
Pois que, conforme se alcança do teor da fundamentação da decisão de facto, o tribunal a quo, para a prova desta:
«…teve em atenção o depoimento das testemunhas…advogados que intervieram em representação de outros herdeiros nas reuniões referidas e onde estiveram presentes o autor, como advogado da ré C………. …tais reuniões deram conta de que se tratava de um processo complexo, quer pelos muitos bens pertencentes à herança, quer pelas divergências existentes entre os vários herdeiros…».
Daqui decorre que as testemunhas intervieram nas reuniões, ainda que na qualidade de advogados, em defesa de interesses de terceiros que são estranhos á presente acção e ao pedido nela formulado.
As «negociações malogradas» a que se reporta a alínea f) - e nas quais tais causídicos participaram - e os «serviços» a que alude o nº 2 in fine – e os quais eles eventualmente terão prestado – foram-no a tais terceiros cujos interesses não estão a ser discutidos no presente processo.
Por outro lado há que atender na natureza e alcance dos factos sobre que as testemunhas depuseram, na sequência do alegado pelo autor.
E a singeleza e inoquídade dos mesmos – na perspectiva dos valores que o segredo profissional dos advogados defende – ressalta à evidência.
Na verdade as testemunhas, ainda que advogados, apenas se pronunciaram sobre se existiram, ou não, reuniões com vista á partilha dos bens pelos interessados em inventário orfanológico, sobre a maior ou menor complexidade de tais reuniões e sobre o número das mesmas.
Ora não se alcança em que medida o relato destes escorreitos e objectivos factos possa prejudicar os valores prosseguidos com o segredo profissional dos Srs. Advogados e supra expressos, como sejam a confiança entre o advogado e o seu cliente, a necessidade social da confiança em certos profissionais, a protecção do normal funcionamento das instituições, evitando-se a degradação da sua imagem e desconfiança entre o público.
Já que os mesmos – desacompanhados de quaisquer descrições de cariz subjectivo ou pessoal, quer atinente á sua qualidade de advogados, quer respeitante aos seus clientes, o que, até prova em contrário, tem de conceder-se ter-se verificado - não contendem com aspectos de índole privada com dignidade bastante para merecerem ser legalmente tutelados no âmbito do segredo profissional.
Aliás nem se vislumbra outra prova mais adequada e objectiva para aferir de tais factos que não seja a opinião abalizada de profissionais do foro.
Sendo certo que mesmo que assim não fosse ou não se entenda e se considere existir um conflito de interesse – traduzido na supra aludida antinomia valorativa: segredo profissional versus verdade e justiça - entre o autor, advogado, e um seu ex-cliente, contra quem litiga, a resolução de tal conflito sempre passaria pela conciliação dos mesmos mediante o seu exercício proporcional, justo, equitativo, o que implicará que aquele apenas possa lançar mão dos factos que conhece, somente na justa medida do seu interesse profissional, e não para devassar a vida, os negócios ou os interesses dignos de tutela do seu ex-cliente.
E desde que observada essa proporcionalidade, esse equilíbrio, não há qualquer violação do segredo profissional, não podendo, em nome dele, ser coarctado ao Advogado, designadamente, o patrocínio em causa própria e, muito menos, o arrolamento de testemunhas que, não obstante a sua qualidade de advogados, contêm os seus depoimentos dentro daqueles limites ou parâmetros – cfr. Ac. da Relação do Porto de 04.12.2006, dgsi.pt, p.0656351
Nada nos autos, como se viu, nos permite concluir que, in casu, foram ultrapassados estes limites. Antes pelo contrário.
Pelo que, neste particular, soçobra a pretensão da agravante.

6.2.
Da apelação.

6.2.1.
Como já se viu a acção foi julgada parcialmente procedente, por provada e, consequentemente, a recorrente foi condenada a pagar ao autor a quantia de 2.500,00 euros.
Com base nos seguintes factos:
O autor é advogado na comarca de Aveiro, com escritório na Rua ………., n.º .., ………., fazendo da advocacia profissão habitual e lucrativa (artigo 1º da petição inicial);
A ré C………. conferiu ao autor poderes para representar a sua filha menor, D………., num inventário, por morte de E……….., avô paterno da mesma (artigo 2º da petição inicial).
Por força do facto referido na alínea anterior, o autor estudou o processo, participou em, pelo menos, 9 conferências realizadas com os herdeiros do falecido, deslocando-se a ………. e a ………., e realizou consultas, gastando, no mínimo, sessenta horas de trabalho (artigo 3º da petição inicial e artigos 13º e 14º da contestação da ré C……….);
O autor apresentou à ré C………. a nota de honorários e de despesas, cuja cópia se encontra junta a fls. 5 e 6, datada de 5 de Abril de 2001, a qual, no que respeita ao inventário aludido, é no valor de 4.070,19 euros (artigo 5º da petição inicial);
A ré C………. não pagou tal quantia até à data (artigo 8º da petição inicial).

A recorrente contesta o valor fixado a título de honorários com base nos seguintes argumentos:
1º- Errada fixação fáctica com base na qual foi decidido, pois que apenas se provou que o autor efectivou 33 horas de trabalho intelectual e, presumivelmente, 11 horas de trabalho material. E nunca as 60 horas peticionadas e dadas por assentes.
2º- Excesso de pronúncia da julgadora, a qual se limita a reproduzir as conclusões expressas no Laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados, sem aferir da “efectiva verificação” dos demais critérios decorrentes do n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, os quais ou não se verificaram, ou se verificaram com amplitude e relevância que não justificam a quantia arbitrada.
3- Depoimento das testemunhas do autor com violação do sigilo profissional.

6.2.2.
Vejamos.
Quanto a este último argumento já emitimos pronúncia na apreciação do recurso de agravo, no sentido do seu desatendimento.
O que não é de somenos para a apreciação do 1º fundamento, acima referido, da presente pretensão da recorrente, a qual, no fundo, se reporta à impugnação da factualidade dada como assente.
Pois que há que considerar, tal como emana da fundamentação da decisão de facto, que esta não se alicerçou apenas no laudo da OA, mas, outrossim, nos depoimentos das testemunhas inquiridas.
Ora estas afirmaram que o autor participou em 3 reuniões até ao Natal de 2000, em mais 4 ou 5 até Março de 2001 e que antes já tinham existido outras; que tais reuniões eram longas e complexas, devido ao grande número de bens da herança, a divergências entre os herdeiros e aos negócios deixados pendentes pelo inventariado (nomeadamente contratos promessa). Tendo concluído considerarem razoável ter o autor despendido 60 horas de trabalho.
O que, aliás e bem visto o laudo, também no mesmo tal período de trabalho é admitido, como se alcança a fls.140. Pois que o período de 44 horas é em tal laudo referido como apenas atinente às reuniões, como resulta do seguinte período: «deste modo, é possível constatar que parte substancial do tempo, ie. das mencionadas 60 horas mínimas – foi empregue em trabalho intelectual, embora as mencionadas deslocações (que despenderam 11 horas) tenham que ser consideradas trabalho material».
Sendo de admitir que o restante período de tempo que foi gasto - consistente na diferença entre estas 44 horas e aquelas 60 horas – o tenha sido designadamente no estudo do caso, o qual, como se viu, não tanto pela natureza técnico-jurídica, mas pelas especificidades da situação concreta, implicava alguma complexidade com a consequente dificuldade da sua análise.
Daqui resulta que a julgadora de primeira instância formou a sua convicção pela análise e ponderação de toda a prova produzida, maxime a testemunhal e documental, o que lhe era permitido, nos termos, designadamente, do disposto no artº 655ºdo CPC.
Havendo que acreditar que relativamente aos factos dados como provados, mesmo que exista alguma dúvida por parte da julgadora de 1ª instância, ela se situa em grau razoável, ainda admissível perante alguma margem de aleatoriedade que inelutável e inexoravelmente sempre existirá no âmbito e no âmago das relações humanas ao que a função jurisdicional, na aplicação do direito, não está imune.
E havendo que dar prevalência, salvo casos de evidente erro crasso, manifesto ou palmar, na apreciação da prova – que se apresentam real e estatisticamente ínfimos– à decisão do julgador porque tal juízo foi formulado dialecticamente e no âmbito dos princípios da imediação e da oralidade, na apreciação e ponderação de toda a prova produzida.
Na verdade: «considerando que, por força dos princípios da oralidade e da imediação, o julgador de primeira instância, se encontra muito melhor habilitado a apreciar a prova produzida – maxime a testemunhal – só em situações extremas de ilogicidade, irrazoabilidade e meridiana desconformidade, perante as regras da experiência comum, dos factos dados como provados em face dos elementos probatórios que o recorrente apresente ao tribunal ad quem, pode este alterar, censurando, a decisão sobre a matéria de facto» – cfr. Ac. da Relação de Lisboa de 16.01.2007, dgsi.pt, p.5673/2007-1.
Não se podendo concluir, no caso sub júdice, perante esta prova e em face dos elementos probatórios invocados pelo recorrente, que a decisão sobre a matéria de facto se mostre irrazoável, porque meridianamente desconforme a tal prova.

6.2.3.
Quanto ao segundo aspecto que a recorrente classifica, ainda que com pouca precisão terminológica, de excesso de pronúncia – quando, summo riggore, quereria dizer inexistência de fundamentos de facto que justifiquem a decisão, o que acarretaria a sua nulidade nos termos do artº 668º nº1 al.b) do CPC – há que dizer que não lhe assiste razão.

Em primeiro lugar porque, como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas a falta de motivação de facto ou de direito apenas releva quando é total e absoluta e não já quando se apresenta deficiente ou insuficiente.
A necessidade da fundamentação – prevista no artº205º, nº1 do Const. da Rep. Port. e no artº158º do CPC - prende-se com a garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação da decisão judicial.
Na verdade a fundamentação permite fazer, intraprocessualmente, o reexame do processo lógico ou racional que lhe subjaz.
Ela é garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões.
Porque a decisão não é, nem pode ser, um acto arbitrário, mas a concretização da vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à apreciação jurisdicional, as partes, «maxime» a vencida, necessitam de saber as razões das decisões que recaíram sobre as suas pretensões, designadamente para aquilatarem da viabilidade da sua impugnação.
E mesmo que da decisão não seja admissível recurso o tribunal tem de justificá-la.
É que, uma decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos, pois que estes destinam-se a convencer que a decisão é conforme à lei e à justiça, o que, para além das próprias partes a sociedade, em geral, tem o direito de saber – cfr. Alberto dos Reis, Comentário, 2º, 172 e Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, 1982, 3º vol., p.96.
Mas se assim é, dos textos legais e dos ensinamentos doutrinais se retira que apenas a total e absoluta falta de fundamentação pode acarretar a nulidade.
Na verdade a lei não comina com tão severo efeito uma motivação escassa, ou, mesmo deficiente. E onde a lei não distingue não cumpre ao intérprete distinguir.
Nem tal exigência seria de fazer considerando a «ratio» ou finalidade do dever de fundamentação supra aludidos.
O que a lei pretende é evitar é a existência de uma decisão arbitrária e insindicável. Tal só acontece com a total falta de fundamentação. Se esta existe, ainda que incompleta, errada ou insuficiente tal arbítrio ou impossibilidade de impugnação já não se verificam.
O que nestes casos apenas sucede é que a própria decisão pode convencer menos, dada a debilidade ou incompletude dos seus fundamentos. Mas pode ser sempre atacável e modificável –cfr. neste sentido e entre outros: Ac. do STA de 18.11.93, BMJ, 431º, 531; Acs. do STJ de 26.04.95, CJ(stj), 2º, 57, de 17.04.2004, de 16.12.2004 e de 03.11.2005, dgsi.pt e Acórdão da Relação de Lisboa de 09.05.2006 in dgsi.pt, p. 1815/2006-1.

Em segundo lugar porque certo é que não está quedo ou vedado ao julgador - antes pelo contrário - que, no seu munus de aplicar o direito para operar a justiça do caso concreto, proceda a uma interpretação dos factos apurados, no sentido de deles retirar outros que, sem os contrariar ou desvirtuar, constituam a sua emanação ou consequência normal e lógica. Socorrendo-se, nomeadamente, das presunções, legais ou judiciais, que constituem um verdadeiro meio probatório – artº 349º e sgs. do CC.
O que, pelo menos em parte, parece ter sido feito pela julgadora.
A qual fundamentou a sua decisão, essencialmente, nos seguintes termos:
«Neste aspecto, assume especial importância o art. 65º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo DL 84/84, de 16 de Março, nos termos do qual “Na fixação dos honorários deve o advogado proceder com moderação, atendendo ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, a importância do serviço prestado, às posses dos interessados, aos resultados obtidos e à praxe do foro e estilo da comarca”.
Muito embora o preceito citado aponte os critérios que deverão nortear a fixação de honorários, tal tarefa dependerá do preenchimento a efectuar in casu de tais critérios (cfr. Ac. do STJ, de 14 de Maio de 1996, in CJ, II, pág. 69), sem que se estabeleça entre cada um deles uma hierarquia.
O laudo emitido pela Ordem dos Advogados, apesar de sujeito ao princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal (art. 389º do Código Civil e arts. 611º e 655º, n.º 1, do Código de processo Civil), tem o valor informativo próprio de qualquer perícia e merece respeito e atenção, dada a especial qualificação de quem o emite (cfr. Ac. do STJ, de 19 de Setembro de 2002, in www.dgsi.pt).
O primeiro daqueles factores consiste no tempo gasto.
No caso em apreço, sabemos que o autor, por força do facto referido na alínea a) dos factos provados, estudou o processo, participou em, pelo menos, 9 conferências realizadas com os herdeiros do falecido, deslocando-se a ………. e a ………., e realizou consultas, gastando, no mínimo, sessenta horas de trabalho.
No que concerne à dificuldade do assunto, não pode afirmar-se que os trabalhos desenvolvidos numa partilha extrajudicial por morte revista especial dificuldade ou complexidade técnica, embora seja de atender, naturalmente, aos concretos contornos da situação tratada.
O terceiro factor a considerar é a natureza, valor e importância do serviço prestado. Ora, em causa estavam os direitos e interesses de uma menor, cujo pai tinha já falecido, desconhecendo-se, embora, quais os eventuais benefícios e vantagens que resultaram para aquela.
Relativamente às posses dos interessados, nada foi alegado. Contudo, nada faz supor que os obrigados ao pagamento de honorários os não possam satisfazer, na medida em que os mesmos se destinam a remunerar o trabalho desenvolvido em seu benefício ou em benefício de quem representam, neste caso, por força da lei.
Por último, deverá atender-se à praxe do foro e ao estilo da comarca, que, dada a sua dimensão, será de aceitar que se regulem por padrões elevados.
Subsumidos os factos aos critérios legais apontados, também não podemos deixar de reconhecer que nesta tarefa está ínsita uma certa discricionariedade, mas “no sentido civilístico que tem muito a ver com a boa fé que impregna toda a relação contratual e ainda que em tal fixação de honorários há que ter em conta não só os custos fixos, elevados de um escritório de advogado, mas também os riscos da profissão liberal” (cfr. Ac. da RL, de 20 de Junho de 2002, in www.dgsi.pt; Ac. do STJ, de 30 de Novembro de 1995, in BMJ 451, pág. 370 e CJ, III, pág. 130, e Ac. do STJ, de 7 de Julho de 1999, in CJ, VII, pág. 19).
No caso sub judice, à luz da matéria fáctica apurada, temos como seguro que o laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados foi fundamentado e está de acordo com os critérios previstos nas referidas normas legais (art. 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados e art. 1158º, n.º 2, do Código Civil).
Assim, fixa-se o montante devido a título de honorários, incluindo despesas, em 2.500,00 euros».
(sublinhado nosso)
Alcança-se, assim e desde logo, que o valor fixado, o foi em consideração das 60 horas de trabalho, como já dimanava do laudo, e não de 33 ou 44, como a recorrente parece defender.
E no que concerne aos outros requisitos, índices ou parâmetros delimitadores ínsitos no artº 65º do EAO e por nós supra sublinhados na decisão, há que convir que, e operando a mencionada interpretação dos concretos factos alegados e provados pelo autor – relação de mandato num processo de inventário em que foram necessárias pelo menos 9 reuniões e em que despendeu, no mínimo 60 horas de trabalho – é lícito à julgadora concluir pela sua verificação nos termos e com magnitude e relevância com que o fez, atingindo um valor – 2.500,00 euros.
O qual se apresenta como um minus relativamente ao impetrado pelo autor e que ascendia a pouco mais de 4000 euros.
Que se encontra suficientemente sustentado no principal meio probatório em causa, qual seja o laudo emitido pela própria O.A.
E que, em todo o caso, se vislumbra, adequado e justo, ou, pelo menos, o que já suficiente, integrado dentro de limites aceitáveis, sendo certo que, em sede de fixação de honorários, senão impossível, é pelo menos muito difícil, consecutir uma quantia, que rigorosa e matematicamente se ajuste ao caso concreto.
Efectivamente a acção de honorários a advogado implica a emissão de um juízo com certa componente de discricionariedade, já que, para além da ponderação dos elementos do artigo 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados, impõe que se atente no laudo da Ordem e se considerem critérios de equidade – cfr. entre outros, o Acórdão do STJ de 01-03-2007, dgsi.pt, p.07A119.cisão Texto Integral:
Cumprindo finalmente dizer que é, de todo, insustentável a tese da recorrente quando afirma que não obteve, nem esperava obter de tal partilha qualquer benefício.
E que, tendo sido a sua intervenção completamente acessória e decorrente da qualidade de legal representante da sua filha menor, nunca a dívida referente aos honorários resultantes de tal mandato poderia ser considerada como responsabilidade sua, sendo antes a sua filha a pagar tais honorários quando atingisse a maioridade.
Pois que tal questão se prendia com a sua (i)legitimidade para a acção, a qual já foi decidida no sentido da sua legitimidade e se encontra arrumada pelo transito em julgado da respectiva decisão.

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda negar provimento aos recursos e, consequentemente, confirmar as respectivas decisões.

Custas pela recorrente.

Porto, 2008.01.29
Carlos António Paula Moreira
Maria da Graça Pereira Marques Mira
António Guerra Banha