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MARCA
RESCISÃO
Sumário
I- A palavra «CAPOTO» é uma imitação gráfica e tem a mesma fonética e o me mo significado na linguagem corrente ligada ao ramo da construção civil que a palavra «CAPPOTTQ». II- Estando provado que essas duas marcas foram registadas para assinalar produtos da mesma classe, que tais produtos não são fabricados pela titular do registo mas por ela adquiridos em Itália e comercializados e aplicados em Portugal, nas mesmas condições em que o fazem muitas outras empresas portuguesas do mesmo ramo de actividade, e que essas duas palavras são utilizadas na linguagem corrente na área da construção civil, desde há vários anos, tanto em Portugal como noutros países da União Europeia, para designar todos aqueles produtos e sistemas de revestimento e isolamento térmico, não tem carácter distintivo dos produtos que pretendem designar e, por isso, não podem constituir marca industrial protegida. III- Face ao disposto no artº 271º, nº 1 do Código de Processo Civil a legitimidade passiva da ré não foi afectada pelo facto de ter transferido para outrem, após a citação, a titularidade do registo de marcas cuja declaração de nulidade era pedida na acção.
Texto Integral
Apelação n.º 5720/08-2
NUIP ……/05.4TBPRD
Relator: Guerra Banha
Adjuntos: Anabela Dias da Silva
Maria do Carmo Domingues
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto
I
1. Na acção declarativa que correu termos no 1.º Juízo Cível da comarca de Paredes sob o n.º ……/05.4TBPRD, proposta por B……………, LDA, com sede em …………, Leiria, contra C………… LDA, com sede em Paredes, a autora pediu que fosse declarada a nulidade dos registos de marca com os n.ºs 363716 e 363717, o primeiro constituído pela palavra «CAPPOTTO» e o segundo constituído pela palavra «CAPOTO».
Fundamentou esta sua pretensão, alegando, em síntese, que nem a autora nem a ré não fabricam produtos ou sistemas de revestimento e isolamento térmico para a construção civil, mas ambos os compram a empresas que os produzem na União Europeia, sobretudo em Itália, para os revenderem e/ou aplicarem no mercado português; que a palavra «CAPPOTTO» é utilizada no mercado por centenas ou milhares de empresas na União Europeia, e sobretudo em Itália, para designar centenas de produtos ou sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração, que são comercializados com marcas que cada empresa cria, tendo na língua italiana o significado de «capa», «capote», «revestimento»; não tem, porém, qualquer capacidade distintiva, pelo que não goza de tutela jurídica, em Portugal ou na União Europeia, para constituir uma marca, em face do disposto nos arts. 222.º, n.º 1, 223.º, n.º 1, al. a), e 238.º, n.º 1, al. b), todos do Código da Propriedade Industrial e no Regulamento (CE) n.º 40/94, de 20/12/93; o mesmo se passando com a palavra «CAPOTO», que tem a mesma fonética daquela e de que é uma mera imitação gráfica.
A ré contestou por impugnação, alegando, em síntese, que a marca «cappotto» não se confunde com o produto que pretende identificar, já que este produto “é uma argamassa adesiva de base acrílica que tem como função permitir a compatibilidade de todos os produtos utilizados no sistema de impermeabilização conhecido pela designação ETICs”. Concluindo pela improcedência da acção.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a fls. 399-414, que, julgando a acção procedente, declarou a nulidade dos registos de marcas nacionais n.º 363716, constituído pela palavra «CAPPOTTO», e n.º 363717, constituído pela palavra «CAPOTO».
2. A ré, não se conformando com essa decisão, apelou para esta Relação, concluindo as suas alegações do seguinte modo:
a) A decisão recorrida declarou a nulidade dos registos das marcas nacionais n.º 363716, “CAPPOTTO”, e 363717, “CAPOTO”;
b) À data da contestação (25-10-2005), a ora Recorrente era, efectivamente, titular desses registos;
c) Em 02-08-2008, a titularidade dos registos das marcas nacionais n.º 363716 e 363717 foi transmitida para a sociedade D……….., S.A.;
d) Os actos de transmissão da titularidade dos referidos registos foram publicitados no Boletim da Propriedade Industrial n.º 9/2006, de 20-09-2006;
e) O Tribunal a quo deu como assente, no despacho saneador proferido em 06-10-2006, que a Recorrente era titular daqueles registos;
f) Sucede que, nessa data, a Recorrente já não era a titular dos referidos registos;
g) A Recorrente não reclamou desse despacho, por estar convictamente convencida de que a acção não tinha fundamento e, consequentemente, seria julgada materialmente improcedente;
h) Em face da surpreendente decisão recorrida, e da declaração de nulidade dos registos das marcas nacionais n.º 363716 e 363717, a Recorrente tem a obrigação de dar conhecimento a este Tribunal da sua ilegitimidade para defender a validade e eficácia dos referidos registos de marca, por serem da titularidade de um terceiro – a sociedade D…………, S.A.;
i) A ilegitimidade passiva é uma excepção dilatória que o tribunal deve conhecer oficiosamente em qualquer fase do processo, nos termos do disposto nos art.ºs 489.º, n.º 2, in fine, 494.º, al. e) e 495.º do C.P.C.;
j) A sentença recorrida seja revogada, e, consequentemente, ser a Recorrente absolvida da instância, por se verificar a excepção dilatória de ilegitimidade passiva – art.º 493.º, n.º 2 do C.P.C.;
k) Em qualquer caso, sempre se dirá que a sentença recorrida não podia declarar a nulidade do registo da marca nacional n.º 363717, “CAPOTO”, pois não resultou da matéria de facto dada como provada que essa expressão fosse utilizada na linguagem corrente do comércio, isto é, que fosse de considerar um elemento genérico;
l) Percorrendo a matéria de facto dada como provada, e exceptuando a referência ao registo da marca n.º 363717 (facto 4, na p. 2), não se vislumbra uma única menção à expressão “CAPOTO” que permita concluir que é um elemento genérico.
m) Ora, não tendo sido dado como provado que essa expressão é um elemento genérico, não lhe pode ser aplicável o disposto no art.º 223.º, als. c) e d), do Código da Propriedade Industrial;
n) A marca “CAPOTO” não é constituída exclusivamente pela expressão “CAPPOTTO”, mas por uma expressão com grafia diferente daquela;
o) A marca “CAPOTO” não é constituída precisamente pela expressão “CAPPOTTO”;
p) Ora, foi esta última expressão e não aquela, que o Tribunal a quo deu como provado ser uma expressão genérica;
q) Bastam pequenas alterações num elemento genérico para que o sinal assim constituído deixe de poder ser considerado exclusivamente constituído pelo elemento genérico;
r) Conclui-se que a sentença recorrida é ilegal, e deve ser parcialmente revogada, na parte em que declara a nulidade do registo da marca nacional n.º 363717, “CAPOTO”, por violar o disposto nos art.ºs 33.º, n.º 1, al. a), e 223.º, als. c) e d), do Código da Propriedade Industrial;
s) Nada foi dado como provado na sentença recorrida sobre a capacidade distintiva da expressão “CAPOTO”, mas somente sobre a palavra italiana “CAPPOTTO”.
t) O Tribunal a quo não podia, por isso, reconduzir a expressão “CAPOTO” a qualquer dos casos previstos no art.º 223.º, als. c) e d), do Código da Propriedade Industrial;
u) Conclui-se que a sentença enferma de nulidade, por os seus fundamentos (de facto) estarem em oposição com a decisão, nos termos do art.º 668.º, n.º 1, al. c) do C.P.C.
A ré contra-alegou, concluindo que o recurso deve ser julgado totalmente improcedente e mantida in totum a sentença recorrida.
3. Ao presente recurso é aplicável o regime processual anterior ao Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, porquanto respeita a acção instaurada antes de 1 de Janeiro de 2008 (foi instaurada em 19-09-2005) e, por força do disposto no n.º 1 do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 303/2007, o regime introduzido por este diploma legal não se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2008 (art. 12.º do mesmo decreto-lei).
De harmonia com as disposições contidas nos arts 684.º, n.ºs 2 e 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, são as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação que delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo das questões de que, por lei, o tribunal pode conhecer oficiosamente (art. 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela apelante, o objecto do recurso suscita duas questões:
1) ilegitimidade passiva da ré para defender a validade e eficácia dos registos de marca declarados nulos [conclusões das als. a) a j)], e
2) nulidade da sentença na parte em que declarou nulo o registo da marca n.º 363717, constituído pela palavra “CAPOTO”, por existir contradição entre os fundamentos e a decisão [conclusões das als. k) a u)].
Foram cumpridos os vistos legais.
II
4. O tribunal de 1.ª instância julgou provados os factos seguintes:
1) A autora é uma sociedade comercial por quotas e exerce a actividade de comercialização e/ou aplicação de produtos e sistemas de revestimento e isolamento térmico para construção civil.
2) A ré é também uma sociedade comercial por quotas e exerce a mesma actividade que a autora.
3) A requerimento da ré, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), por despacho de 9 de Setembro de 2002, procedeu a favor daquela ao registo da marca nacional n.º 363716, constituída pela palavra «CAPPOTTO»
4) A requerimento da demandada, o INPI, por despacho de 11 de Agosto de 2003, procedeu a favor daquela ao registo da marca nacional n.º 363717, constituída pela palavra «CAPOTO».
5) Ambas essas “marcas” foram registadas para assinalar produtos da classe 17 - «produtos e materiais isolantes, incluindo pinturas, vernizes e óleos, utilizados na construção, nomeadamente no revestimento de fachadas de edifícios; fibras de vidro para isolamento; fibras em matérias plásticas não para uso têxtil; placas isolantes para a construção, designadamente placas de poliestireno expandido», da classe 19 - «materiais de construção não metálicos incluindo argamassas e rebocos; revestimentos não metálicos» - e da classe 37 - «informações no âmbito da construção e reparação».
6) Nem a autora, nem a ré fabricam produtos ou sistemas de revestimento e isolamento térmico para construção civil.
7) Autora e ré compram-nos às empresas que os produzem na União Europeia, sobretudo em Itália, para os revenderem e/ou aplicarem no mercado português.
8) A ré requereu uma Providência Cautelar contra a autora, que correu seus termos pela 1ª Secção da 1ª Vara Cível de Lisboa sob o n.º ……/05.OTVLSB-A, na qual pediu fosse esta proibida de prosseguir com o uso da marca «CAPPOTTO», fosse determinada a apreensão de todos os produtos e materiais publicitários que, ostentando essa marca, se encontrassem na posse da ora demandante, e fosse a aqui autora condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 500,00 por cada dia de manutenção do uso da dita marca.
9) Sem a audição prévia da ora autora, tal Providência foi julgada procedente por despacho judicial de 3 de Novembro de 2004, tendo sido aí decidido: a) proibir aquela de prosseguir com o uso indevido da marca «CAPPOTTO»; b) ordenar a apreensão de todos os produtos que ostentassem essa marca, que se encontrassem na posse da aqui autora, bem como de todo o material publicitário, nomeadamente, catálogos fotográficos e cartazes, em que estivesse aposta a mesma marca; c) condenar a ora demandante a pagar uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 500,00, por cada dia em que se mantivesse a comercializar produtos com a marca «CAPPOTTO».
10) Porém, deduzida Oposição a essa Providência pela aqui autora, por despacho judicial de 19 de Abril de 2005 foi tal Oposição julgada procedente, por provada, e, consequentemente, revogada in totum a decisão cautelar sobredita, em virtude de o Tribunal haver considerado totalmente nulos os registos das marcas sobreditas.
11) Sendo que, nessa última decisão foram julgados provados os seguintes factos:
a) A requerente, tal como a requerida é uma empresa de comercialização de produtos de revestimento e isolamento térmico para construção civil.
b) Nem a requerente nem a requerida produzem produtos para Cappotto, apenas compram aqueles produtos para revenda.
c) Qualquer empresa portuguesa que faça uma navegação pela lnternet com o objectivo de procurar fornecedores e produtos para revender em Portugal, encontrará sites com a expressão “CAPPOTTO”.
d) A palavra “CAPPOTTO” é utilizada no mercado por várias empresas no Mundo, e, concretamente, na União Europeia, maxime em Itália, para designar centenas de produtos, sobretudo para designar empresas e/ou produtos do sector da construção civil, decoração e vestuário e é utilizada também para designar empresas e/ou produtos de outros sectores.
e) Em Itália a palavra “CAPPOTTO” é utilizada, no mercada, por dezenas de empresas, para designar, nomeadamente, produtos ou sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração.
f) Esses produtos são fabricados e comercializados por dezenas de empresas no mercado italiano com essa designação há vários anos, entre outras, pelos catálogos das empresas italianas 1 E………, S.P.A., 2 F………., S.R.L., 3 G……….., S.P.A., 4 H…….., S.A., 5 I…….. 6 e J…….., S.R.L.
g) A palavra “CAPPOO” é a designação corrente e comummente usada no mercado italiano há mais de 20 anos para identificar os produtos ou sistemas, sendo estes, em vários casos, comercializados com marcas que cada empresa cria e, normalmente, regista, e na língua italiana “Cappotto” significa “Capa”, “Capote” ou substantivo sinónimo.
h) Para além de ser de uso corrente no Mercado italiano para designar os sobreditos produtos ou sistemas, há mais de 20 anos, a palavra “Cappotto” não tem, ao menos relativamente a esses produtos ou sistemas, qualquer capacidade distintiva, servindo, pois, tão só para designar os produtos ou sistemas referidos.
i) A requerida comercializa em Portugal, há vários anos, pelo menos quatro, produtos de sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração fabricados por empresas italianas em Itália, onde são genericamente designados por “Cappotto”, os quais adquire a várias empresas italianas, sobretudo à K…………, 5. N. C., já com a designação “Cappotto” impressa nas respectivas embalagens, fichas técnicas, catálogos, facturas, etc., tal como a requerente também o faz, comercializando em Portugal produtos e sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração fabricados em Itália, onde são genericamente designados por “Cappotto”, que registou como marca a designação do próprio produto ou sistema, isto é, “Cappotto”.
j) A L……….., LOA., com sede na zona de Fátima, a M……., LOA., com sede na zona de Torres Novas, a N……, LOA., com sede na zona de Lisboa, comercializam em Portugal produtos e sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração fabricados em Itália, onde são genericamente designados por “Cappotto”.
k) Os bens apreendidos à requerida nem sequer são produtos ou sistemas “CÃPPOTTO”, mas apenas colo de várias marcas para esses produtos e sistemas, conforme consta das respectivas embalagens de origem.
l) O produto ou sis tema é de tal modo conhecido no mercado exclusivamente pela designação “cappotto”, que as fábricas produzem os respectivos acessórios identificando-os apenas como cola para cappotto, tinta para cappatto.
m) Os produtos apreendidos à requerida não ostentavam a palavra “Cappotto” como marca dos mesmos, mas apenas a identificação desses produtos, no caso, colante para Cappotto.
n) A requerida solicitou ao 1. N. P. 1. o registo da marca nacional “O………. - CAPPOTTO”, cujo processo corre aí com o n° 381066, conforme se prova pelo respectivo duplicado.
o) A generalidade da actividade da requerida consiste no referida comercialização em Portugal de produtos e sistemas de revestimento/isolamento destinados à construção civil e decoração fabricadas por empresas italianas em Itália.
p) Os produtos e sistemas são vendidos à requerida por essas empresas com a designação “CAPPOITO”, a qual, como se referiu, vem impressa nas respectivas embalagens, fichas técnicas, catálogos, facturas.
q) Com o procedimento cautelar foi denegrida a imagem comercial da requerida. S) As instalações comerciais da requerida foram objecto de apreensão, tendo tido intervenção dois soldados da Guarda Nacional Republicana, o que foi presenciado por trabalhadores, colaboradores e vizinhos da requerida, bem como por transeuntes, sendo do conhecimento público na mercado onde a requerida exerce a sua actividade comercial.
r) O deferimento deste tipo de providências chega rapidamente ao conhecimento do sistema bancário e das agências de informações, sendo registado por todas essas empresas.
s) A requerida ficou impossibilitada de utilizar e comercializar os bens apreendidos, bem como de comercializar quaisquer produtos ou sistemas “Cappotto” e acessórios para os mesmos, em face da sancão pecuniária compulsório determinada, o que a impede de desenvolver a generalidade da sua actividade comercial e, portanto, de auferir proveitos.
t) A requerida terá de suportar os honorários do ora signatário, bem como todos os demais custos decorrentes do preparação e tramitação deste processo.
u) A requerente causou avultadíssimos prejuízos à requerida, os quais não é por agora possível determinar, atenta a surpresa do procedimento cautelar em causa, tudo conforme se provará pela respectiva certidão judicial que, em virtude da demora na respectiva emissão, ora se protesta juntar tendo-se desde já aqui o seu conteúdo por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
12) Através de navegação na Internet com o objectivo de procurar fornecedores e produtos para revender em Portugal, encontram-se centenas ou mesmo milhares de sítios com a expressão «CAPPOTTO».
13) A palavra «cappotto» é utilizada no mercado por inúmeras empresas sobretudo da União Europeia e fundamentalmente em Itália, para designar, nomeadamente, produtos ou sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração.
14) Do que são exemplos os sítios da Internet referidos nos documentos de folhas 37 a 48 dos autos cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
15) Esses produtos ou sistemas são fabricados e comercializados por dezenas de empresas no mercado italiano com aquela designação há mais de 20 anos.
Conforme se alcança pelos catálogos d) as empresas italianas E……, S.P.A., F……., S.R.L., G……, S.P.A., H………, S.A., I……….., S.R.L., e P………., S.P.A., juntos de fls. 49 a 102, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
16) A palavra «CAPPOTTO» identifica e descreve comummente os produtos ou sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração, que existem à venda no mercado italiano, há mais de 20 anos, diversos acessórios para esses produtos ou sistemas, fabricados e comercializados por empresas distintas e sob diferentes marcas, nomeadamente tintas, colas e adesivos, os quais são identificados nas respectivas embalagens, catálogos e demais documentos a eles respeitantes, como «Cola para Cappotto» «Tinta para Cappotto», «Adesivo para Cappotto».
17) “CAPPOTTO” é a designação corrente e comummente usada no mercado italiano há mais de 20 anos para identificar e designar os produtos ou sistemas, sendo estes, em vários casos, comercializados com marcas que cada empresa cria e, normalmente, regista.
18) Na Língua italiana «CAPPOTTO» significa «CAPA», «CAPOTE», «REVESTIMENTO» ou substantivo sinónimo.
19) A autora comercializa e/ou aplica em Portugal, há vários anos, pelo menos cinco, produtos e sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração fabricados por empresas italianas em Itália, onde são genericamente designados por «CAPPOTTO».
20) Os quais adquire a várias empresas italianas, sobretudo à K…….., S.N.C., já com a designação «CAPPOTTO» impressa nas respectivas embalagens, fichas técnicas, catálogos, facturas, etc.
21) E como a ré também o faz, também comercializa e/ou aplica em Portugal produtos e sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração fabricados em Itália, onde são genericamente designados por «CAPPOTTO».
22) Os produtos ou sistemas de revestimento/isolamento referidos já eram designados no mercado pela palavra «CAPPOTTO» antes até de a ré ter iniciado a sua actividade.
23) Para além da autora e da ré, outras empresas comercializam e/ou aplicam em Portugal produtos e sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração fabricados em Itália, onde são genericamente designados por «CAPPOTTO», como é o caso da L………., LDA., com sede na zona de Fátima, da Q…………, LDA., com sede na zona da Benedita, da R…………, LDA., com sede na zona Santo Isidro, da M………, LDA., com sede na zona de Torres Novas, e da N………, LDA., com sede na zona de Lisboa.
24) Tais produtos e sistemas são já também conhecidos e designados em Portugal, há mais 10 anos, pela generalidade das empresas de construção civil portuguesas, por «CAPPOTTO».
25) No sítio geral português de arquitectura, engenharia e construção o catálogo «Sistema Térmico Cappotto Etics - Mapetherm AR1», da marca registada “E…….”, pertencente à sobredita E……, S.P.A, encontrava-se em 3° lugar do ranking de catálogos para a indústria de construção civil no mês de Dezembro de 2004.
26) Frequentemente donos de obras portugueses, privados e públicos, prevêem e exigem aos respectivos empreiteiros, que as suas obras sejam revestidas/isoladas «a cappotto», sem outra identificação.
27) E também em Portugal existe à venda no mercado, há mais de 10 anos, «Cola para Cappotto», «Tinta para Cappotto», «Adesivo para Cappotto» e outros acessórios «para Cappotto», com essa identificação nas respectivas embalagens, catálogos e demais documentos a eles respeitantes, os quais são fabricados em Itália por distintas empresas e sob diferentes marcas e revendidos em Portugal por várias empresas.
28) A generalidade das empresas que fabricam produtos ou sistemas de revestimento/isolamento pelo exterior destinados à construção civil e decoração comercializam-nos noutros países da União Europeia e do Mundo há mais de 20 anos, identificando-os e designando-os nesses países peta palavra «CAPPOTTO».
29) Nas feiras comerciais internacionais, os referidos produtos ou sistemas são expostos pelas várias empresas que os fabricam ou comercializam com a designação «CAPPOTTO».
30) As expressões «cappotto» e «capoto» constituem uma indicação que se tornou usual na linguagem corrente na área da construção civil.
31) A autora pretendeu registar a seu favor a marca “O…….. - CAPPOTTO”.
Estes factos não foram impugnados pela apelante, pelo que se têm por definitivamente fixados, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 684.º, n.ºs 2, 3 e 4, 690.º-A, n.º 1, e 712.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil.
III
5. Apreciando as questões suscitadas pela apelante, anteriormente enunciadas, a primeira prende-se com o pressuposto processual da legitimidade passiva da apelante, em termos que a própria define como “ilegitimidade para defender a validade e eficácia” dos registos de marca declarados nulos, por serem da titularidade de um terceiro.
Contextualizando, diz a apelante que, à data da contestação, em 25-10-2005, era ela, efectivamente, a titular desses registos, mas, em «02-08-2008», a titularidade dos registos das marcas nacionais n.º 363716 e 363717 foi transmitida para a sociedade D………….., S.A., e que os actos dessas transmissões foram publicitados no Boletim da Propriedade Industrial n.º 9/2006, de «20-09-2006», pelo que quando o tribunal proferiu o despacho saneador, em 06-10-2006, em que deu como assente que a ré era a titular daqueles registos, tal não era verdadeiro porque nessa data a ré já não era titular dos referidos registos de marca.
Em primeiro lugar, embora a apelante tenha escrito repetidamente, tanto nas alegações como nas conclusões, a data de «02-08-2008» como sendo a data da transmissão dos registos de marca, é de presumir ter havido lapso de escrita na indicação do ano de «2008», em vez de «2006», já que, se a publicação ocorreu em 20-09-2006, o acto da transmissão teria que ser realizado anteriormente, e não depois (e os documentos apresentados pela apelante com o recurso referem que a transmissão ocorreu em «2006» — em 02-08-2006).
Feita esta correcção, importa dizer que a questão da transmissão dos registos de marca aqui impugnados foi pela primeira vez invocada pela ré nas alegações deste recurso. Antes, enquanto o processo decorreu na 1.ª instância, a ré nunca deu conhecimento ao tribunal da realização dessa transmissão. E, por isso, o tribunal de 1.ª instância não conheceu nem podia ter conhecido de tal questão. O que quer dizer que a questão da transmissão dos registos de marca ora posta em sede de recurso configura-se, no âmbito deste processo, como uma questão nova.
Ora, decorre dos preceitos constantes dos arts. 676.º, n.º 1, e 684.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil e é entendimento uniforme na doutrina e na jurisprudência que o recurso só pode incidir sobre a decisão recorrida, visando a sua modificação, no todo ou em parte, e não a criar decisões sobre matéria nova (cfr. Aníbal de Castro, em Impugnação das Decisões Judiciais, Lisboa, 1981, p. 26; Jorge Augusto Pais do Amaral, em Direito Processual Civil, 3.ª edição, Almedina, p. 364; acs. do STJ de 20-09-2007 e 15-06-2008, em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ proc. n.º 07B1836 e 08B1558, e ac. do STA de 26-09-2007, em www.dgsi.pt/jsta.nsf/ proc. n.º 0109/07). E, portanto, o objecto do recurso só pode abranger questões que foram apreciadas e resolvidas na decisão recorrida, ou que o deviam ter sido por força do disposto no art. 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (sendo, neste caso, objecto do recurso a nulidade da sentença resultante da respectiva omissão de pronúncia – art. 668.º, n.º 1, al. d) e n.º 3, do Código de Processo Civil).
É que, como esclarece LEBRE DE FREITAS (em Código de Processo Civil Anotado, vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, p. 5) “os recursos ordinários são, entre nós, recursos de reponderação e não de reexame”, pelo que aos tribunais de recurso apenas cabe “controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último”, e, portanto, “não [lhes] cabe conhecer de questões novas (o chamado ius novorum), mas apenas reapreciar a decisão do tribunal a quo, com vista a confirmá-la ou revogá-la”.
Pelo que não é lícito às partes suscitar em recurso questões que não tenham sido objecto das decisões impugnadas.
Não obstante, sempre se dirá que, no caso, a questão da transmissão da titularidade do direito em litígio perde utilidade processual a partir do reconhecimento pela própria apelante de que, na data da apresentação da contestação, em 25-10-2005, e, portanto, também na data da citação, que ocorreu em 21-09-2005 (cfr. fls. 127), era efectivamente a titular dos registos de marca cuja nulidade era pedida pela autora e veio a ser declarada pelo tribunal. O que, como se irá demonstrar, lhe conferiu legitimidade não só para ser demandada, nos termos em que foi, mas também para prosseguir na acção até final.
Com efeito, acerca dos efeitos da citação, prescreve o art. 481.º, al. b), do Código de Processo Civil que a citação, além de produzir outros efeitos especialmente prescritos na lei, “torna estáveis os elementos essenciais da causa, nos termos do artigo 268.º”. É a consagração do princípio da estabilidade da instância a que alude o art. 268.º do Código de Processo Civil, segundo o qual, após a citação do réu, “a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei”.
Segundo escrevem ANTUNES VARELA, MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA (em Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 19894, p. 240-242), o direito português desdobra a constituição da relação processual em dois momentos distintos e sucessivos: o primeiro, relativo à propositura da acção, assenta na entrada da petição inicial em juízo, como estabelece o n.º 1 do art. 267.º do Código de Processo Civil, e é o que releva para efeitos do impedimento da caducidade e o que conta para a pendência da causa; o segundo, destinado a completar a relação processual (formação da lide), reside na citação do réu, que lhe dá conhecimento da acção contra ele proposta e o chama a juízo para se defender.
Com a citação do réu fica completado o esquema da relação processual, iniciado com a propositura da acção, quer quanto aos sujeitos, quer quanto ao objecto, constituído pelo pedido e pela causa de pedir. As modificações que, a partir daí, possam ocorrer na relação material controvertida só nos precisos e limitados termos previstos na lei processual podem provocar modificação da instância (art. 268.º do Código de Processo Civil).
Ora, no que respeita às hipóteses de modificação subjectiva da lide, em que se inserem os casos relacionados com a titularidade na relação material controvertida, a lei prevê dois tipos de situações: 1) as que visam o alargamento da lide a outras pessoas, através dos incidentes da intervenção de terceiros, nos termos e condições previstas nos arts. 269.º, 270.º, al. b), 320.º a 346.º do Código de Processo Civil; 2) e as que visam a substituição de algum dos sujeitos da lide (do autor ou do réu), por motivos de falecimento de alguma das partes ou de transmissão por acto inter vivos da coisa ou direito em litígio (arts. 270.º, al. a), 271.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), a realizar através do incidente de habilitação, regulado nos arts. 371.º a 375.º e 376.º do Código de Processo Civil, consoante se trate de sucessão por morte ou de transmissão entre vivos.
A situação exposta pela apelante refere-se à transmissão, na pendência da causa, da titularidade dos registos de marca impugnados pela autora. Insere-se, pois, na hipótese de substituição de um dos sujeitos da lide por motivos de transmissão, por acto inter vivos, do direito em litígio, na pendência da causa. E a questão que suscita consiste em saber se essa substituição era obrigatória e a sua omissão gera a excepção dilatória da ilegitimidade passiva da ré e conduz à absolvição da instância, como diz a apelante; ou se tal substituição era meramente facultativa e tinha que ser requerida por alguma das partes, e a omissão de tal procedimento não afectou a estabilidade da instância nem interferiu com a legitimidade da ré.
A resposta é dada pelo preceito do n.º 1 do art. 271.º do Código de Processo Civil, que dispõe que: “No caso de transmissão, por acto entre vivos, da coisa ou direito litigioso, o transmitente continua a ter legitimidade para a causa, enquanto o adquirente não for, por meio de habilitação, admitido a substituí-lo”.
Assim, de acordo com este preceito legal, ocorrendo na pendência da causa a transmissão, por acto inter vivos, do direito em litígio, o transmitente mantém legitimidade para prosseguir a acção até final, não sendo obrigatória a sua substituição na lide pelo adquirente. E o preceito do n.º 3 do mesmo artigo completa este regime, dispondo que “a sentença produz efeitos em relação ao adquirente, ainda que este não intervenha no processo, excepto no caso de a acção estar sujeita a registo e o adquirente registar a transmissão antes de feito o registo da acção”. (Se, no caso, a sentença vai ou não produzir efeitos em relação ao adquirente dos registos de marca é questão que não vem suscitada nem pode ser aqui apreciada e resolvida).
Inexiste, pois, fundamento legal para declarar a ilegitimidade da ré e absolvê-la da instância.
6. A segunda questão suscitada pela apelante refere-se à existência de nulidade da sentença, na parte em que declarou nulo o registo da marca n.º 363717, constituído pela palavra “CAPOTO”, por essa decisão estar em oposição com os respectivos fundamentos.
Embora enunciada pela apelante como uma causa de nulidade da sentença, quer-nos parecer, em face da configuração que à questão é dada nas alegações do recurso e consta sumariada nas conclusões, que não se trata, verdadeiramente, de uma contradição entre os fundamentos e a decisão, mas antes de eventual erro de julgamento ou de subsunção jurídica, decorrente de errada aplicação ao registo da marca n.º 363717, constituído pela palavra “CAPOTO”, das mesmas normas jurídicas que levaram à declaração de nulidade do registo de marca com o n.º 363716, constituído pela palavra “CAPPOTTO”.
Com efeito, a causa de nulidade da sentença prevista na al. c) do n.º 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil, expressamente referida pela apelante — que dispõe que “é nula a sentença … quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão” — supõe que a sentença contém os fundamentos da decisão proferida mas não existe coerência lógica entre os fundamentos e a decisão. Como escreve o Prof. ALBERTO DOS REIS, a contradição entre os fundamentos e a decisão ocorre quando “os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto” (em Código de Processo Civil Anotado, vol. V, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, p. 141). Também o recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-09-2008 (em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ proc. n.º 08A1438) refere que “a sentença é nula, nos termos do art. 668.º n.º 1 al. c) do C.P.Civil, quando se realiza um erro lógico. Os fundamentos usados não estão em sintonia com a decisão tomada. No processo lógico, as premissas de direito e de facto apuradas pelo julgador conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao oposto” (cfr. ainda no mesmo sentido o ac. do STJ de 04-12-2003, em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ proc. n.º 03B2667). De modo que, num raciocínio estruturalmente lógico e coerente, os fundamentos expostos na sentença deviam conduzir a uma decisão de sentido contrário ou, pelo menos, diferente da proferida.
Mas como também esclarece LEBRE DE FREITAS, “esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro de interpretação desta; quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade” (em A Acção Declarativa Comum – à luz do código revisto, Coimbra Editora, 2000, p. 298).
Ora, confrontando as próprias conclusões do recurso atinentes a este ponto [conclusões das als. k) a u)], a discordância que a apelante opõe à sentença recorrida não interfere com uma real oposição ou falta de coerência lógica entre os fundamentos e a decisão, mas antes que os factos provados não permitiam proferir tal decisão por não lhes serem aplicáveis as normas jurídicas que foram aplicadas. O que configura erro de julgamento, erro de subsunção jurídica ou erro de direito.
Neste sentido, diz a apelante na conclusão da al. k): “… a sentença recorrida não podia declarar a nulidade do registo da marca nacional n.º 363717, “CAPOTO”, pois não resultou da matéria de facto dada como provada que essa expressão fosse utilizada na linguagem corrente do comércio, isto é, que fosse de considerar um elemento genérico”. E na conclusão l) reafirma que “percorrendo a matéria de facto dada como provada … não se vislumbra uma única menção à expressão “CAPOTO” que permita concluir que é um elemento genérico”. E na conclusão da al. m) insiste que “não tendo sido dado como provado que essa expressão é um elemento genérico, não lhe pode ser aplicável o disposto no art. 223.º, als. c) e d), do Código da Propriedade Industrial”. Vindo a concluir, na al. r), que “a sentença recorrida é ilegal, e deve ser parcialmente revogada, na parte em que declara a nulidade do registo da marca nacional n.º 363717, “CAPOTO”, por violar o disposto nos art.ºs 33.º, n.º 1, al. a) e 223.º, als. c) e d) do Código da Propriedade Industrial”, quando, a existir a apontada nulidade, haveria que anular a sentença (art. 712.º, n.º 4, do Código de Processo Civil) ou suprir a alegada contradição (art. 715.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
O certo é que não se verifica nem a apontada nulidade da sentença, nem o eventual erro de julgamento. Sem prejuízo de se reconhecer que, no que concretamente respeita ao registo de marca n.º 363717, constituído pela palavra “CAPOTO”, a sentença podia e devia ter acrescentado uma referência mais explícita ao fundamento da nulidade do registo.
Com efeito, os fundamentos que a autora alegou para requerer a nulidade deste registo de marca foram exactamente os mesmos que alegou para o registo de marca n.º 363716, constituído pela palavra “CAPPOTTO”, por se tratar de uma imitação gráfica desta, ter a mesma fonética e ser utilizada na linguagem corrente com o mesmo significado.
Ora, ao contrário do que alega a apelante, a identidade entre as duas marcas consta expressa nos factos provados. Assim, sob o item 5) dos factos provados consta que “ambas essas marcas foram registadas para assinalar produtos da classe 17 - «produtos e materiais isolantes, incluindo pinturas, vernizes e óleos, utilizados na construção, nomeadamente no revestimento de fachadas de edifícios; fibras de vidro para isolamento; fibras em matérias plásticas não para uso têxtil; placas isolantes para a construção, designadamente placas de poliestireno expandido», da classe 19 - «materiais de construção não metálicos incluindo argamassas e rebocos; revestimentos não metálicos» - e da classe 37 - «informações no âmbito da construção e reparação»”. E sob o item 31) dos factos provados consta que “as expressões «cappotto» e «capoto» constituem uma indicação que se tornou usual na linguagem corrente na área da construção civil”.
A identidade de grafia, fonética e significado entre as duas marcas está também expressa em toda a fundamentação da sentença que levou à declaração da nulidade de ambas, justificada com base nas disposições dos arts. 222.º, n.º 1, 223.º, n.º 1, als. a) e d), e 33.º, n.º 1, al. a), todos do Código da Propriedade Industrial.
Assim, depois de referir que “a marca tem por função essencial permitir a identificação dos produtos ou serviços que designa e distingui-los de outros de origem diversa”, cita e transcreve o art. 222.º do Código da Propriedade Industrial, cujo n.º 1 dispõe que “a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, … desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”. E, complementarmente, cita e transcreve o art. 223.º do mesmo código, em cujas als. a) e d) do n.º 1 está estabelecido que “não satisfazem as condições do artigo anterior”, e portanto, não podem ser utilizadas como marcas industriais as palavras ou expressões desprovidas “desprovidas de qualquer carácter distintivo” e os “sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos legais e constantes do comércio”.
E não obstante ser predominantemente referida, ao longo da fundamentação, a marca «CAPPOTTO», não pode deixar de se reconhecer como, pelo menos, implícito que toda a argumentação aí desenvolvida se aplica indistintamente às duas marcas em causa. De tal modo assim é que a sentença concluiu essa fundamentação nos seguintes termos: “De todo o exposto resulta que essa palavra «cappotto», assim como a palavra «capoto» que mais não é que uma reprodução fonética e imitação gráfica daquela, não podem ser utilizadas como marca, nos precisos termos em que se encontram registadas, já que não têm carácter distintivo”.
E com efeito, bastam os factos descritos nos itens 5) e 31) dos factos provados, acima transcritos, para que também à marca «CAPOTO» sejam aplicáveis os preceitos dos arts. 222.º, n.º 1, e 223.º, n.º 1, als. a) e d), do Código da Propriedade Industrial, no sentido de que se trata de uma palavra que se “tornou usual na linguagem corrente na área da construção civil” [cfr. facto descrito no item 31)] e que não tem carácter distintivo dos produtos da ré designados por essa marca relativamente ao mesmo tipo de produtos (de isolamento e revestimento) comercializados e aplicados por outras empresas do mesmo ramo, incluindo a autora [cfr. facto descrito no item 5)]. E assim haver de concluir pela nulidade da marca, nos termos do art. 33.º, n.º 1, al. a), do Código da Propriedade Industrial.
7. Sumariando:
1) De harmonia com o disposto no art. 271.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o acto de alienação do direito em litígio, realizado na pendência da causa, após a citação do réu, não afecta a legitimidade processual do demandado para prosseguir na acção até final.
2) Deste modo, a legitimidade passiva da ré na acção, ora apelante, não foi afectada pelo facto de ter transferido para outrem, após a sua citação, a titularidade do registo de marcas cuja declaração de nulidade era pedida pela autora.
3) A oposição entre os fundamentos e a decisão que a al. c) do n.º 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil refere como causa de nulidade da sentença ocorre quando, num raciocínio estruturalmente lógico e coerente, as premissas de facto e de direito (fundamentos) consideradas pelo julgador devem conduzir a um resultado (decisão) de sentido oposto ou, pelo menos, diferente do alcançado.
4) Se o julgador interpretou erradamente os factos ou a norma jurídica aplicada, ou se errou na escolha da norma jurídica aplicável aos factos, o que existe é um erro de julgamento ou um erro de subsunção jurídica, mas não a nulidade da sentença.
5) A palavra «CAPOTO» é uma imitação gráfica e tem a mesma fonética e o mesmo significado na linguagem corrente ligada ao ramo da construção civil que a palavra «CAPPOTTO». Estando provado que essas duas marcas foram registadas para assinalar produtos da mesma classe (produtos ou sistemas de revestimento e isolamento térmico para construção civil), que tais produtos não são fabricados pela titular do registo mas por ela adquiridos em Itália e comercializados e aplicados em Portugal, à semelhança e nas mesmas condições em que o fazem muitas outras empresas portuguesas do mesmo ramo de actividade, incluindo a autora, e que essas duas palavras são utilizadas na linguagem corrente na área da construção civil, desde há vários anos, tanto em Portugal como noutros países da União Europeia, para designar todos aqueles produtos e sistemas de revestimento e isolamento térmico, é de concluir que qualquer delas não tem carácter distintivo dos produtos que pretendem designar e, por isso, não podem constituir marca industrial protegida.
IV
Pelo exposto, acorda-se em julgar totalmente improcedente a presente apelação e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante (art. 446.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
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Relação do Porto, 25-11-2008
António Guerra Banha
Anabela Dias da Silva
Maria do Carmo Domingues