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NRAU
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
MORA
LOCATÁRIO
DESPEJO IMEDIATO
Sumário
I – O direito de alguma das partes resolver o contrato de arrendamento está (actualmente) dependente de existência de motivo que torne inexigível à outra parte a manutenção da relação contratual (art. 1083º, nº2, do CC, na redacção da Lei nº 6/2004), cabendo ao A. (que pretenda a resolução) a alegação e prova dos factos que permitam concluir, na situação, pela inexigibilidade da manutenção da relação contratual. II – Porém, caso de inexigibilidade da manutenção do contrato pelo senhorio é a mora do locatário por período superior a três meses no pagamento das rendas, encargos ou despesas (art. 1083º, nº3, do CC), o que não significa, necessariamente, que a mora se tenha de referir a rendas de três meses, mas antes que a mora se prolongue por mais de três meses. III – Enquanto não houver o pagamento de todas as rendas com o acréscimo da indemnização devida, e sendo as rendas seguintes recusadas pelo senhorio, é o locatário que está (continua) em mora, tudo equivalendo à falta de pagamento das rendas seguintes, ainda que o locatário as ofereça (em singelo) ao senhorio.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
1) - Na acção sumária – processo nº …./06, do .º Juízo Cível do tribunal judicial da comarca de Gondomar – proposta por B………. contra C………., com vista à resolução de contrato de arrendamento com esta celebrado e consequente despejo, veio aquela, em Outubro de 2007, alegar que esta, na pendência da acção, não pagou a renda de Junho/2007, na data de vencimento, em 01 de Maio (anterior), nem nos oito dias seguintes, apenas vindo a depositá-la a 14 de Maio de 2007, em singelo, sem a indemnização de 50%.
Nessa situação, assiste-lhe (à recorrente) o direito de recusar as rendas seguintes enquanto a ré não pagar a renda acrescida da indemnização, pelo que está esta em mora em relação a todas as seguintes (rendas) que vem depositando em singelo, não obstante a oposição da autora que vem recusando o seu recebimento.
Está já em dívida a quantia de € 569,50 – desde Maio a Outubro.
Em consequência requer que a ré seja notificada para proceder ao pagamento ou ao depósito das rendas vencidas e da indemnização devida, juntando prova disso nos autos.
A ré respondeu que apenas depositou a renda referente a Junho, vencida em 1/Maio, em 14 de Maio de 2007 porque esteve acamada com gripe e não teve a quem recorrer para realizar o pagamento atempado.
Diz não compreender o motivo da exigência da indemnização de 50% pois que, tendo a ré feito o pagamento da renda em 14/Maio, justificadamente, e, no mês seguinte, o pagamento tempestivo, não veio a autora invocar qualquer direito a indemnização, o que significa que não pretendeu exigi-la.
Assim, foi a autora que prescindiu da indemnização, pelo que é esta que está em mora ao não receber as rendas e não a ré, devendo improceder o pedido daquela.
A autora vem afirmar que não prescindiu da indemnização por tardio oferecimento da renda, mantendo-se a ré em situação de mora.
Seguidamente foi proferido o despacho - “a notificação a que alude o artigo 14º/4 do NRAU pressupõe a falta de pagamento das rendas por um período superior a três meses.
No caso concreto, a autora funda a sua pretensão no facto de a renda relativa ao mês de Junho de 2007 apenas ter sido paga em 14/05/2007 e na sua recusa de recebimento das rendas seguintes.
É assim manifesto que a situação dos autos não se enquadra no normativo em apreço, pelo que se indefere a requerida notificação”.
2) - Inconformada com este despacho recorre a autora.
Conclui as suas alegações nos seguintes termos:
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A recorrida responde defendendo a confirmação da decisão.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
3) - A factualidade a atender é a que consta narrada em 1).
4) – Em causa está, essencialmente, em apreciar se a agravada está em mora relativamente às rendas de período superior a três meses que permita o recuso ao procedimento previsto no artigo 14º/3 e 4, do NRAU.
Dispõe o artigo 14º do NRAU:
(…)
“3 – Na pendência da acção de despejo, as rendas vencidas devem ser pagas ou depositada, nos termos gerais.
4 – Se dentro o arrendatário não pagar ou depositar as rendas, encargos ou despesas, vencidas por um período superior a três meses, é notificado para, em 10 dias, proceder ao seu pagamento ou depósito e ainda da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que são contadas a final.
5 – Se, dentro daquele prazo, os montantes referidos no número anterior não forem pagos ou depositados, o senhorio pode pedir certidão dos autos relativa a estes factos, a qual constitui título executivo para efeitos de despejo do local arrendado, na forma de processo executivo comum para a entrega de coisa certa.”
O direito de alguma das partes resolver o contrato de arrendamento está (actualmente) dependente de existência de motivo que torne inexigível à outra parte a manutenção da relação contratual (artigo 1083º/2 do CC, na redacção da Lei nº 6/2004 – inaplicável à pretensão inicial da autora), cabendo ao autor (que pretenda a resolução) a alegação e prova dos factos que permitam concluir, na situação, pela inexigibilidade da manutenção da relação contratual.
Porém, caso de inexigibilidade da manutenção do contrato pelo senhorio é a mora do locatário por período superior a três meses no pagamento das rendas, encargos ou despesas (artigo 1083º/3). O que não significa, necessariamente, que a mora se tenha de referir a rendas de três meses, mas antes que a mora se prolongue por mais de três meses.
A falta do pagamento das rendas, nessa situação, é (como era) motivo de resolução, considerando a lei que a falta de pagamento da renda por período superior a três meses, constitui justa causa de resolução do contrato; e nessa situação é inexigível que o senhorio mantenha o arrendamento. Bastando para preencher essa cláusula geral de resolução a mora no pagamento das rendas nesses termos.
Aquele artigo 14º/4 e 5 harmoniza-se com esta disposição, criando um procedimento equivalente ao anterior despejo imediato, previsto no artigo 58º do RAU, por falta de pagamento das rendas, na pendência da acção de “despejo”.
No caso, está assente que a locatária (ré na acção) apenas depositou a renda de Junho/07, vencida no dia um de Maio anterior, a 14 deste mês, ultrapassando, assim, o prazo de mora de oito dias.
Ora, nestas situações dispõe o artigo 1041º do CC:
1 - Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento.
2 –
3 – Enquanto não forem cumpridas as obrigações a que o nº 1 se refere, o locador tem o direito de recusar o recebimento das rendas ou alugueres seguintes, os quais são considerados em dívida para todos os efeitos legais.
4 – A recepção de novas rendas ou alugueres não priva o locador do direito à resolução do contrato ou à indemnização referida, com base nas prestações em mora.
Só faz cessar a mora o pagamento (ou o depósito) do valor das rendas acrescido da indemnização (arts. 1041º/1 e 4 do CC e 14º/4 do NRAU – como antes, o artigo 58º/3 do RAU).
O senhorio, estando o locatário em mora quanto a alguma das rendas, pode recusar o recebimento das rendas seguintes sem o pagamento da renda em falta acrescida da indemnização, devida nos termos do citado artigo 1041º/1.
E essas rendas seguintes, cujo recebimento é legitimamente recusado pelo senhorio, consideram-se em dívida para todos os efeitos legais.
Inclusive para fundar a resolução e o despejo a pedido do senhorio.
Pelo que, enquanto não houver o pagamento de todas as rendas com o acréscimo da indemnização devida, e sendo as rendas seguintes recusadas pelo senhorio, é o locatário que está (continua) em mora. Tudo equivale à falta de pagamento das rendas seguintes, ainda que o locatário as ofereça (em singelo) ao senhorio.
Ora, na situação, a locatária não pagou a renda de Junho/2007, vencida em 1 de Maio anterior, até ao dia 8 desse mês, só o vindo a fazer, em singelo, em 14 desse mesmo mês de Maio.
Devia pagar a indemnização correspondente a 50% do valor dessa renda.
Não o fez.
A prestação deve ser realizada por inteiro e não por partes.
O pagamento ou depósito (em singelo) não é liberatório.
Vem a senhoria exigir a indemnização e recusa o recebimento das rendas seguintes.
Legitimamente o faz.
Quem está em mora é a locatária, que, nessa situação continua, pelo menos, até Outubro de 2007, por período superior a três meses.
A não existir motivo justificado para o não oferecimento da renda dentro do prazo legal, tinha a senhoria a faculdade de recusar o recebimento da renda em singelo, permanecendo a arrendatária em mora.
Na sequência do exposto, não está a razão na decisão recorrida.
A autora não “funda a sua pretensão no facto de a renda relativa ao mês de Junho de 2007 apenas ter sido paga em 14/05/2007 e na sua recusa de recebimento das rendas seguintes”.
Antes funda a pretensão na falta de pagamento das rendas por período superior a três meses (e de Junho a Outubro), já que, não oferecendo a locatária a indemnização devida, mas apenas as rendas em singelo, e recusando-se a autora a recebê-las sem a indemnização prevista no artigo 1041º/1 do CC, tudo se passa como se as rendas não fossem pagas (e oferecidas) – estão em “dívida para todos os efeitos legais”.
Incluindo para os efeitos previsto no citado artigo 14º/4.
Por isso que, não havendo qualquer outra razão que obste à pretensão da requerente, deve ordenar-se a notificação prevista nessa norma.
Na resposta ao requerimento da autora, vem a ré dizer que não pagou tempestivamente a renda de Junho por se encontrar acamada (por doença) e não ter a quem recorrer para efectuar o pagamento da renda, o que poderia constituir justo impedimento, ou força maior, que poderá obstar aos efeitos da falta de pagamento da renda no prazo legal. Apesar de se não notar haver sido oferecida prova (e a ela cabe fazer a prova do facto), a apreciação desta questão, não o tendo sido no tribunal recorrido, não pode, desde já, ser conhecida por este tribunal, sob pena de preterição de um grau de jurisdição.
Deve ser dado prosseguimento ao incidente.
5) – Pelo exposto, acorda-se nesta Relação do Porto em dar provimento ao agravo, revogando-se o despacho recorrido, devendo o tribunal recorrido dar prosseguimento ao incidente.
Custas pela agravada.
Porto, 27/11/2008
José Manuel Carvalho Ferraz
António do Amaral Ferreira
Ana Paula Fonseca Lobo