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PROVA EM MATÉRIA CIVIL
Sumário
Sumário ( art.º 663º-n.º7 do Código de Processo Civil ): I. Os vícios previstos no art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível; “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, (…)”. II .Os factos objecto de julgamento e declarados provados numa acção judicial não podem ser considerados e declarados provados numa outra acção, distinta, com base na certidão da sentença na primeira acção proferida, bem como, não podem ser valorados os meios de prova de que aqueles factos emanam - salvo nas situações legalmente previstas no artº 421º do Código de processo Civil. III. “...Transpor os factos provados numa acção para a outra constituiria, pura e simplesmente, conferir à decisão acerca da matéria de facto um valor de caso julgado que não tem, ou conceder ao princípio da eficácia extraprocessual das provas uma amplitude que manifestamente não possui” - Ac. do STJ de 5/5/2005, in www.dgsi.pt
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
B. e outros, intentaram a presente acção declarativa de condenação com processo comum nº 795/15.7T8CHV, da comarca de Vila Real – Chaves – Inst. Local – Secção Cível, contra C. e outros, pedindo sejam os Réus condenados no pagamento aos Autores da quantia em divida de 15.000 €; acrescida dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde 15 de Abril de 2009 e até efectivo e integral pagamento.
Alegaram os Autores que eram os anteriores sócios da sociedade comercial por quotas denominada «D. Lda» com sede na Rua…, de que os Réus são os actuais sócios, e, tendo em 13 de Abril de 2009 os Autores transmitido aos Réus as suas quotas na sociedade comercial nos termos e condições constantes de escritura pública, em 14 de Abril de 2009, os adquirentes Camilo e Andreia, na qualidade de representantes da sociedade «D., Lda» declararam que a sua representada devia a cada um dos ex-sócios vendedores a quantia de 5.000 €.
A falta de pagamento motivou o requerimento executivo n.º 270/11.9TBCHV, ao qual a executada «D., Lda» deduziu oposição, tendo sido proferida sentença que julgou improcedente a oposição e condenou a executada como litigante de má fé.
Interposto recurso desta decisão o Tribunal da Relação anulou o julgamento para ser ampliado o teor do título. O Tribunal de 1ª Instância repetiu o teor da sentença e a Relação proferiu o Acórdão de que se junta certidão sob doc.5, tendo na parte decisória do aludido Acórdão se declarado que: «Da matéria assente resulta que essa dívida resulta de parte do preço da cessão de quotas, que não foi pago no acto da escritura apesar de da mesma constar a sua liquidação integral.
- … sendo certo que ficou provado que a dívida é dos sócios e não da sociedade executada…»
Notificados do referido acórdão os Réus, até à data, nada pagaram aos autores, pelo que, além da quantia de 5.000 € cada um são devedores dos correspondentes juros de mora.
Regularmente citados contestaram os Réus, arguindo a excepção dilatória da nulidade de todo o processado por omissão ou absoluta falta de causa de pedir em relação aos Réus, alegando ter sido a sociedade comercial «D., Lda» que no dia 14 de Abril de 2009 declarou que devia 5.000 € a cada um dos Autores, e que a falta de pagamento motivou o requerimento executivo com o n.º 270/11.9TBCHV. Trazem ainda aos autos os autores, uma sentença e um acórdão, ambos proferidos no apenso de oposição à execução do citado processo em que figuram como exequentes e a identificada sociedade comercial como executada.
Mais invocam a inexistência de legitimidade passiva dos Réus para os termos da presente acção, e, apresentam defesa por impugnação alegando que nada devem aos autores, seja a que titulo for.
Pugnam pela procedência das excepções e a sua consequente absolvição da instância, ou, caso assim não se entenda pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador julgando improcedentes as excepções dilatórias arguidas pelos Réus e, dispensou-se a audiência prévia, proferindo-se despacho a fixar o objecto do litígio e delimitando-se os temas de prova.
Realizado o Julgamento foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se os Réus do pedido.
Inconformados vieram os Autores recorrer, interpondo recurso de Apelação.
O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo
Nas alegações de recurso que apresentam, os apelantes formulam as seguintes conclusões:
I – Na situação sub judice a interposição do recurso afigura-se quase obrigatória, pelo facto de a decisão recorrida respeitar a uma ação baseada numa “Declaração de Dívida”, fundamento distinto da situação dos autos em que a ação proposta ancora na factualidade provada do Acórdão da Relação (Proc. 270/11.9TBCHV-A.P2).
II – A Meritíssima Juiz não percecionou corretamente o articulado na petição dos ora recorrentes, elaborada em conformidade com a alínea d) do n.º 1 do art. 552.º do C.P.C., pelo que, impediu que o normativo funcione no sentido em que deve vigorar.
III – No caso concreto a julgadora deixou de se pronunciar sobre questões de que devia pronunciar, nos termos da alínea d) do n.º 1 e n.º 4 do art. 615.º do C.P.C. e,
IV – Condenou em objeto diverso do pedido, nos termos da alínea e) do n.º 1 e n.º 4 do art. 615.º do C.P.C..
V – Havendo troca de questões fundamentais, como acontece na sentença recorrida, no que concerne a factos e objeto da ação, não poderá haver ponderação sobre os argumentos decisivos da ação, como se nos afigura que devia haver, designadamente sobre a matéria da causa de pedir.
VI - A decisão em recurso violou o disposto no n.º 2 do art. 412.º e 413.º do C.P.C. relativamente ao conhecimento oficioso das provas e à consideração de todas as provas produzidas independentemente da parte que devia produzi-las.
VII – Na situação em apreço, dado o facto de as provas contribuírem decisivamente para a realização da justiça, deviam ter sido procurados e reunidos todos os elementos possíveis de análise e ponderação, sobretudo da causa de pedir e pedido.
VIII – A aludida decisão violou também o art. 799.º do C.C. na medida que não exigiu a prova de pagamento aos recorridos.
XV – Trata-se de um caso de inversão do ónus da prova, que se não for resolvido, obriga que a decisão a proferir seja contra quem estava obrigado a fazê-la.
Foram proferidas contra – alegações.
O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artº 635º-nº3 do Código de Processo Civil, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras “( artº 608º-nº2 do CPC).
E, de entre estas questões, excepto no tocante aquelas que o tribunal conhece ex officio, o tribunal de 2ª instância apenas poderá tomar conhecimento das questões já trazidas aos autos pelas partes, nos termos do artº 5ºdo CPC, não podendo a parte nas alegações de recurso e respectivas conclusões vir suscitar e requerer a apreciação de questões ou excepções novas.
Atentas as conclusões da apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar:
- alegada nulidade da sentença nos termos das alíneas d) e e) do artº 615º-nº1, do Código de Processo Civil.
- alegada violação do conhecimento oficioso das provas
FUNDAMENTAÇÃO
I) OS FACTOS ( factos declarados provados na sentença recorrida ):
1.Por escritura publicada datada de 13 de Abril de 2009 em que intervieram como primeiro, segundo e terceiro outorgantes os autores e como quarto outorgante o réu C. da como quinto outorgante a ré Andreia e como sexto outorgante André, os três primeiros cederam aos quarto, quinto e sexto outorgantes as suas quotas na sociedade comercial «D., Lda», pelo valor global de 190.000 €.
2.Nessa escritura declararam os primeiro, segundo e terceiro outorgantes que já tinham recebido a totalidade do preço mencionado em 1.
3.Por documento escrito denominado “Declaração” e datado de 14 de Abril de 2009 os réus Camilo e Andreia, na qualidade de sócios gerentes e em representação da sociedade comercial por quotas «D., Lda», declaram que a sua representada deve a quantia de 5.000 € (cinco mil euros) que deverá ser paga no prazo de uma no, a cada um dos senhores que a seguir se indicam: B., Lígia e Avelino.
4. Os autores instauraram contra a sociedade comercial «D., Lda» uma acção que executiva que correu termos no Tribunal Judicial de Chaves 1º Juízo sob o n.º 270/11.9TBCHV, e à qual a ali executada deduziu oposição.
5. Por decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, transitada em julgado em 02/07/2014, foi julgada procedente a oposição e determinada a extinção da execução por insuficiência da causa de pedir.
II) O DIREITO APLICÁVEL
1 - alegada nulidade da sentença nos termos das alíneas e) e d), do artº 615º-nº1, do Código de Processo Civil.
Nos termos do disposto nos n.º2 do art.º 608º e 5ºdo Código de Processo Civil, em obediência ao Princípio do Dispositivo, o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, e, ainda, só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes. E, nos termos do n.º2 do art.º 608º do CPC, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e, apenas estas, de acordo com o pedido e a causa de pedir formulados.
Deve, realçar-se que é a causa de pedir que determina o objecto da acção, devendo o juiz seleccionar e conhecer a matéria de facto que se mostre relevante para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
Nos termos do nº 4 do art. 581º, a causa de pedir consiste no acto ou facto jurídico simples ou complexo, mas sempre concreto donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer.
Assim, as questões suscitadas pelas partes e a dirimir devem ter correspondência com o objecto de discussão resultante da petição inicial, e não com qualquer outro, traduzindo-se já em questões impertinentes e dilatórias as suscitadas e que se revelem desajustadas e sem conexão com tal objecto jurídico, tratando-se, neste caso de questões inúteis.
“A causa de pedir consiste na alegação do núcleo essencial dos factos integrantes da previsão das normas de direito substantivo concedentes do direito em causa.” – cfr. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 31/1/2007, in www.dgsi.pt.
No caso em apreço, tendo os Autores pedido a condenação dos Réus no pagamento aos Autores da quantia em divida de 15.000 €, acrescida dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde 15 de Abril de 2009 e até efectivo e integral pagamento, alegando, cfr. do relatório supra consta, que os Autores eram os anteriores sócios da sociedade comercial por quotas denominada «D. Lda» com sede na Rua …, de que os Réus são os actuais sócios, e, tendo em 13 de Abril de 2009 os Autores transmitido aos Réus as suas quotas na sociedade comercial nos termos e condições constantes de escritura pública, em 14 de Abril de 2009, os adquirentes Camilo e Andreia, na qualidade de representantes da sociedade «D., Lda» declararam que a sua representada devia a cada um dos ex-sócios vendedores a quantia de 5.000 €, tendo a falta de pagamento motivado o requerimento executivo n.º 270/11.9TBCHV, ao qual a executada «D., Lda» deduziu oposição, tendo sido proferida sentença que julgou improcedente a oposição e condenou a executada como litigante de má fé, interposto recurso desta decisão o Tribunal da Relação anulou o julgamento para ser ampliado o teor do título. O Tribunal de 1ª Instância repetiu o teor da sentença e a Relação proferiu o Acórdão de que se junta certidão sob doc.5, tendo na parte decisória do aludido Acórdão se declarado que: «Da matéria assente resulta que essa dívida resulta de parte do preço da cessão de quotas, que não foi pago no acto da escritura apesar de da mesma constar a sua liquidação integral - … sendo certo que ficou provado que a dívida é dos sócios e não da sociedade executada…», e, notificados do referido acórdão os Réus, até à data, nada pagaram aos autores, pelo que, além da quantia de 5.000 € cada um são devedores dos correspondentes juros de mora, veio na sentença recorrida a conhecer-se da indicada causa de pedir, declarando-se, expressamente: “..... Juntaram ainda os autores certidão do processo 270/11.9TBCHV-A que correu termos no 1º juízo deste Tribunal e em que figuram como exequentes Luís, Avelino e Lígia e executada «D., Lda». Do mencionado processo resulta que, não obstante, terem os aqui autores na data da celebração da escritura de cessão de quotas declarado que receberam a totalidade do preço, tal não corresponde à realidade uma vez que apenas receberam cerca de 100.000 €, divididos pelos cedentes na proporção das suas quotas. Da decisão que dos autos é fls. 33 a 45 resulta que foi julgada improcedente a oposição à execução deduzida pela ali executada e condenada esta como litigante de má fé em multa processual e no pagamento de uma indemnização aos exequentes. Por sua vez, da decisão proferida em sede de recurso pelo Tribunal da Relação, e em que se revoga a decisão da 1ª instância, determinando a extinção da execução por insuficiência de causa de pedir consta: «Da matéria assente resulta que essa dívida resulta de parte do preço da cessão de quotas, que não foi pago no acto da escritura, apesar de na mesma constar a sua liquidação integral.» Ora, da prova documental feita nos autos o que se pode concluir é que, efectivamente, os autores cederam aos réus as suas quotas sociais pelo valor de 190.000 € (não sendo objecto da presente acção apurar se a totalidade do preço foi paga tal como as partes declararam na escritura), e que, no dia seguinte ao da cessão de quotas, a sociedade «D.» representada pelos já sócios Camilo e Andreia, declarou dever 5.000 € a cada um dos autores (Luís, Lígia e Avelino). Da acção executiva e respectiva oposição que correu termos neste Tribunal sob o n.º 270/11.9TBCHV não se pode retirar as conclusões extraídas pelos autores. Assim, se se atentar no teor das decisões proferidas, em nenhum momento é ali dado como provado que se está perante uma divida dos sócios e não da sociedade. O que se discutiu nos identificados autos, efectivamente, foi a necessidade de alegação ou não da relação subjacente à emissão do título executivo. E foi por entender que essa alegação era necessária que o Tribunal da Relação do Porto decidiu julgar procedente a oposição e determinar a extinção da execução por insuficiência da causa de pedir. Em nenhum momento foi objecto do litígio, ao que se depreende das decisões juntas aos autos, a titularidade passiva da dívida, sendo que, na matéria de facto tal não se encontra assente. Apenas em sede de fundamentação o Tribunal da Relação referiu que tal divida era uma divida dos sócios, ficando por esclarecer se, em algum momento a sociedade assumiu tal divida.
(...)
Ora, e conforme supra se referiu em sede de fundamentação da matéria de facto, a titularidade/responsabilidade pelo pagamento constante da declaração não foi objecto da lide no âmbito do mencionado processo executivo, onde se discutia a validade/suficiência do título, pelo que não sendo precedente lógico nem fazendo parte dos fundamentos da decisão, não existe decisão com força de autoridade de caso julgado a esse respeito. Também não está causa a eficácia extraprocessual da prova produzida num processo, pois que os autores não pretendem aproveitar na presente lide meios e elementos probatórios produzidos nos autos executivos. A propósito de tal matéria, o art. 421º, do Cód. Proc. Civil determina no seu n.º1 que os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º3, do artigo 355º, do Código Civil. O princípio da eficácia extraprocessual da prova significa que a prova produzida (depoimentos e perícias) num processo pode ser utilizada contra a mesma pessoa num outro processo, para fundamentar uma nova pretensão, seja da pessoa que requereu a prova seja de pessoa diferente, mas apoiada no mesmo facto. «No entanto, tal não se pode confundir com os factos que no primeiro processo foram tidos como assentes, já que estes fundamentos de facto não adquirem valor de caso julgado quando são autonomizados da respectiva decisão. Transpor os factos provados de uma acção para outra constituiria, pura e simplesmente, conferir à decisão acerca da matéria de facto um valor de caso julgado que não tem, ou conceder ao princípio da eficácia extraprocessual das provas uma amplitude que, manifestamente, não possui.» - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/05/2005, proferido no Proc.05B691 e disponível em www.dgsi.pt. Transpondo os mencionados ensinamentos para a situação dos autos, constata-se, desde logo que, não se está perante as mesmas partes nas duas acções, além de que, pretendem os autores que uma conclusão retirada nesse âmbito tenha o valor de facto provado nestes autos“, nestes termos se conhecendo e apreciando o pedido e causa de pedir concretamente formulados nestes autos, inexistindo, ainda, a apontada nulidade de sentença por conhecimento diverso do pedido, prevista na al.e) do nº1 do citado artº 615º do CPC.
Acresce que os vícios previstos no art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível; “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, (…)”.
Assim, e, no que à omissão de pronúncia se refere, reporta-se a lei a um desconhecimento absoluto da questão objecto da decisão (Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 6/5/2004, p.04B1409, in www.dgsi.pt), situação que se não verifica no caso sub judice.
Inexiste, consequentemente, ainda, a invocada nulidade de sentença por omissão de pronúncia nos termos do artº 615º-nº1- alínea d) do CPC, tendo-se o Tribunal “ a quo ” pronunciado sobre todas as questões suscitadas e as que constituíam objecto do litigio e a dirimir.
Nestes termos improcedendo a invocada verificação de nulidades de sentença.
- alegada violação do conhecimento oficioso das provas
Mais alegam os Autores/apelantes que a decisão em recurso violou o disposto no n.º 2 do art. 412.º e 413.º do C.P.C. relativamente ao conhecimento oficioso das provas e à consideração de todas as provas produzidas independentemente da parte que devia produzi-las, pretendendo a valoração da factualidade, pretendo os apelantes a valoração da matéria de facto descrita na apelação da acção nº 270/11.9TBCHV-AV”, considerada provada no Acórdão de 27/05/2014, transitado em 02/07/201, alegando que ficou provado que a dívida é dos sócios e não da sociedade executada.
Carecem de razão aos apelantes, sendo que a inclusão na presente acção dos factos declarados provados na indicada acção judicial determinaria a violação do art.º 621º do Código de Processo Civil, o qual determina e fixa os efeitos de caso julgado, dispondo o indicado preceito legal que “A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga (…)”.
Assim os efeitos do caso julgado reportam-se à própria decisão e não aos respectivos fundamentos ( entre muitos outros, Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 23/2/78, in BMJ 274/191; de 22/3/78, in BMJ 235/158; de 21/7/72, in BMJ 219/158; Manuel de Andrade, Noções Elementares de processo Civil, pg, 317 e sgs.; ), muito menos os fundamentos de facto (- sendo, ainda, que como resulta dos factos provados ( facto provado nº 5 ) e certidões juntas- “Por decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, transitada em julgado em 02/07/2014, foi julgada procedente a oposição e determinada a extinção da execução por insuficiência da causa de pedir” ).
“ O caso julgado forma-se directamente sobre o pedido, que a lei define como o efeito jurídico pretendido pelo Autor. (…) Os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia de caso julgado (…) O caso julgado não cobre, entretanto, toda a causa de pedir, da qual podem decorrer muitos outros efeitos além do deduzido pelo Autor na acção “ _ A. Varela, in Manual de Processo Civil, pg. 690 e sgs. ) .
Assim, os factos objecto de julgamento e declarados provados numa acção judicial não podem ser considerados e declarados provados numa outra acção, distinta, com base na certidão da sentença na primeira acção proferida, bem como, não podem ser valorados os meios de prova de que aqueles factos emanam; - salvo nas situações legalmente previstas no artº 421º do Código de processo Civil, e que se não verificam no caso sub judice, dispondo o indicado artigo, e, sob a epígrafe “ Valor extraprocessual das provas”, que nº1: “ Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artº 355º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer ás partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova", nº 2 – “ O disposto no número anterior não tem aplicação quando o primeiro processo tiver sido anulado, na parte relativa á produção da prova que se pretende invocar”, sendo as condições de admissibilidade as previstas no citado artigo, designadamente, e como o preceito indica, que os depoimentos e perícias produzidos num processo, o tenham sido com audiência contraditória da parte, e que venham a ser invocados noutro processo contra essa mesma parte; que o regime de produção da prova do primeiro processo ofereça ás partes garantias não inferiores às do segundo; que o processo em que a prova foi realizada não tenha sido anulado, na parte relativa á produção da prova que se pretende invo-car” ( v., neste sentido M.Teixeira de Sousa, in “As partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa “; A. Reis, in CPC, anotado, Vol III, pg.344 e sgs.), sendo, ainda, que é á parte que dela se pretende aproveitar, que incumbe o ónus de indicação da produção da prova extraprocessual, na parte que se pretende invocar no processo, e, de forma especificada, relativamente, aos Temas de Prova enunciados, ou na falta destes, aos factos fundamentos da acção, com indicação precisa dos depoimentos ou parte dos depoimentos e testemunhas que os produziram, á parte, ainda, incumbindo “formalizar” a apresentação da prova extraprocessual, nomeadamente, por via da junção de cópia certificada ou gravação das declarações em causa – “No segundo processo ( processo cível ) a prova emprestada - gravação ou registo escrito – será apresentada no momento normal em que se faria ou requereria a respectiva produção” - Prof. Dr. Rui Pinto in “Separata de Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. José Lebre de Freitas- “Valor Extraprocessual da Prova Penal”, pg. 1194/1195, FDUL, - desde logo, não tendo no caso os ora Réus/apelados tido intervenção na indicada acção executiva ( v. certidão de fls. 32 e sgs. dos autos ), não se verificando os demais requisitos de procedibilidade de atendimento da prova extraprocessual, nesta parte, consequentemente, igualmente improcedendo os fundamentos da apelação.
Salientando-se, em qualquer caso, e como se refere no citado Ac. do STJ de 5/5/2005, in www.dgsi.pt, e é já referido na sentença recorrida: “Não pode é confundir-se o valor extraprocessual das provas produzidas (que podem ser sempre objecto de apreciação noutro processo) com os factos que no primeiro foram tidos como assentes, já que estes fundamentos de facto não adquirem valor de caso julgado quando são autonomizados da respectiva decisão judicial. Transpor os factos provados numa acção para a outra constituiria, pura e simplesmente, conferir à decisão acerca da matéria de facto um valor de caso julgado que não tem, ou conceder ao princípio da eficácia extraprocessual das provas uma amplitude que manifestamente não possui”.
Concluindo-se, nos termos expostos, pela total improcedência do recurso de apelação.
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.