CONTRATO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
IRREDUTIBILIDADE
FUNCIONÁRIO BANCÁRIO
TRABALHO NOCTURNO
INTERPRETAÇÃO DA VONTADE
MATÉRIA DE FACTO
ILAÇÕES
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
TRIBUNAL DE REVISTA
Sumário

I - O adicional de 25% passou a ser uma forma de retribuição devida aos funcionários bancários como contrapartida pela prestação de trabalho em horário "por turnos", ou no designado "turno da noite", mas que queria sempre designar, o que era prestado a partir das 18 horas, o acordado pelas partes.
II - Quando por acordo das partes o trabalhador passou a receber uma prestação autónoma por uma das suas actividades, não pode essa prestação ser suprimida depois.
III - A determinação da vontade das partes na celebração de um contrato e também na introdução de novas cláusulas, integra matéria de facto, alheia à competência do Supremo Tribunal de Justiça.
IV - As ilações a retirar dos factos provados revestem a natureza de matéria de facto, o que não está na competência do Tribunal de Revista.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
1. No Tribunal de Trabalho do Porto, os autores A, B, C, D, E, F, G, H, I e J intentaram acção com processo ordinário, invocando um contrato individual de trabalho, pedindo a condenação do réu, Banco Borges e Irmão, S.A., a reconhecer-lhes o direito de um acréscimo de 25% na sua retribuição mensal, sobre toda a base dessa retribuição, enquanto não retomarem, com o seu acordo, o horário de trabalho das 8 horas às 17 horas e ainda a pagar, a cada um, a parte dos acréscimos na petição especificados, que ainda não tenha pago, com os que se vencerem desde a propositura da acção até à sentença, e também os juros moratórios desde o vencimento de cada prestação em dívida, até ao seu pagamento.
Como motivação dos seus pedidos invocaram factos juridicamente pertinentes.
Contestando, o Réu não só impugnou os factos, como também, relativamente àqueles que reconhece terem-se verificado, não admite que se retirem as conclusões invocadas pelos Autores, contrapondo outras, acabando por pedir a sua absolvição dos pedidos.
Efectuado o julgamento da matéria de facto, foi proferida a sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, tendo reconhecido aos Autores o direito de receberem na sua retribuição o acréscimo de 25% sobre a totalidade da base, enquanto não tomarem, com o seu acordo expresso, o horário normal de trabalho; e ainda a pagar a cada um deles as diferenças salariais vencidas, que não tenham sido pagas pelo Réu, desde 15 de Julho de 1982, até à presente data e as vincendas até efectivo pagamento do determinado, remetendo-se o cálculo respectivo para a liquidação em execução de sentença. No mais, foi o Réu absolvido.
Apelou este para a Relação do Porto, que negou provimento ao recurso, decidindo "manter integralmente a douta sentença recorrida."
2. Inconformado com a decisão da Relação, veio o Réu interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo nas respectivas alegações, que se transcrevem resumidamente:
1. - Não obstante os Autores recorridos e o Réu terem acordado, em 1974/1978, que cada um deles tinha direito a receber um complemento ou subsídio correspondente a 25% sobre o valor da respectiva retribuição-base, enquanto praticasse o "horário por turnos" ou o designado "turno da noite", isto é, a partir das 18 horas, e manteria tal direito no caso de transferência para horário normal, por motivo que não lhe fosse imputável, nada impedia o Réu de ter passado a pagar, a partir de 1 de Outubro de 1981, o acréscimo de 25% sobre o respectivo nível de retribuição, acrescido de diuturnidades e subsídio de função em relação ao trabalho efectivamente prestado a partir das 20 horas e um subsídio "fixo" ou "dif", correspondente à diferença entre o complemento de 25% sobre o nível de retribuição e o acréscimo de 25% sobre o respectivo nível de retribuição, acrescido de diuturnidades e subsídio de função em relação ao trabalho nocturno efectivamente prestado a partir das 20 horas, subsídio "fixo" ou "dif" que continuou a ser pago até à sua completa absorção pelo aumento decorrente das revisões da tabela salarial, a primeira das quais se verificou em Julho de 1982.
2. - Se é óbvio que, depois da revisão da tabela salarial em Julho de 1982, os Autores passaram a receber, em consequência da alteração dos elementos que compunham a sua retribuição, algo menos do que receberiam se o Réu continuasse a pagar-lhes o acréscimo de 25% sobre o nível da retribuição, também é verdade que a alteração efectuada nunca se traduziu numa diminuição de retribuição devida, tomada na globalidade, retribuição que sempre se aumentou, como resulta dos documentos para que remete a resposta aos quesitos 5. e 15., não tendo havido, por isso, violação dos princípios da irredutibilidade da prestação, consagrada no artigo 21, n. 1, alínea c), da Lei do Contrato de Trabalho, ao contrário do que entenderam as decisões da 1. Instância e da Relação, a última em recurso.
3. - E não se diga que o acordado acréscimo de 25% sobre a retribuição-base resultou de um acordo entre os Autores e Réu e que o contrato só pode modificar-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos por lei, nos termos do artigo 406, n. 1 do Código Civil, pelo que não podia ser retirado esse acréscimo sobre o nível da retribuição.
4. - Na verdade, com base neste argumento, também o Banco Réu poderia sustentar que ainda hoje deveria pagar aos seus trabalhadores o que acordou pagar-lhes em 1977, 1978 ou 1981, como se não tivesse havido desde então aumentos das tabelas salariais.
5. - É certo que o referido artigo 406, n. 1 do Código Civil excepciona o caso de modificação do contrato por força da lei ou por força do Contrato Colectivo de Trabalho, que impõe ao Banco, pela revisão das tabelas salariais, uma retribuição-base superior à acordada, não tendo carácter excepcional a modificação do contrato por força da lei no âmbito da relação laboral, certo como é que esta sofre constantes mutações por força de disposições legais imperativas.
6. - Mas estas não impõem a acordada percentagem de 25% sobre a retribuição-base, como se todo o trabalho prestado fosse nocturno, mas apenas 25% sobre o nível da retribuição acrecido de diuturnidades e de subsídio de função quanto às horas de trabalho nocturno efectivamente prestadas.
7. - O decidido pelas instâncias legitima que se recolha da modificação do contrato, por força da lei ou do Contrato Colectivo de Trabalho, apenas as vantagens e não os inconvenientes contra o príncipio "ubi comoda, ibi incommoda", como se o regime jurídico do contrato dos trabalhadores recorridos pudesse passar a ser o resultante das disposições mais favoráveis de um determinado clausulado o que é juridicamente aberrante.
8. - Não se pode sustentar, como o fizeram as instâncias, que o Banco e os seus trabalhadores acordaram que estes receberiam o acréscimo de
25% sobre a retribuição-base, qualquer que esta viesse a ser em 1980, 1982, no ano 2000 ou no ano 3000.
9. - É certo que na alínea e) da especificação ficou assente que o Banco lhes pagou desde o início da prática do novo horário, o complemento de
25% sobre a retribuição-base, que é notório foi foi aumentando em 1978, 1979, 1980 e 1981.
10.- Mas isto apenas significa que o Banco e os Autores foram alargando o acordo inicial aos anos seguintes, apesar de ter aumentado a retribuição-base e não que o manteriam "ad aeternum", pois tão incrível acordo não resulta nem da resposta ao quesito 2., nem da sua fundamentação, que remete para os documentos de folhas 139, 140 e 141 dos autos, nem seria crível que as partes tivessem pensado sequer em acordo tão bizarro.
11.- Não é novo e foi também aceite na douta sentença do 1. Juízo do Tribunal do Trabalho do Porto, de 18 de Janeiro de 1978, no Boletim do Trabalho e Emprego, 2. Série, Fevereiro de 1979, página 322, o argumento segundo o qual o contrato só pode modificar-se por mútuo consentimento dos contraentes, pelo que não podia ser retirado o acordado acréscimo de 25% sobre o nível de retribuição, mas tal sentença foi revogada pelo Acórdão da Relação do Porto de 30 de Novembro de 1981, na Colectânea de Jurisprudência 1981, tomo 5, página 305, que decidiu no sentido unânime da jurisprudência expressa, entre outros, nos Acordãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de Junho de 1973, em Acordãos Doutrinais 142., página 1436 e de 27 de Julho de 1976, em Acórdãos Doutrinais 179., página 1511 e nos Acórdãos da Relação do Porto de 7 de Maio de 1979, na Colectânea de Jurisprudência 1979, 3, página 1027, de 19 de Novembro de 1979, em Acordãos Doutrinais 220., página 522 e de 28 de Fevereiro de 1983, na Colectânea de Jurisprudência 1983, 1., página 283.
12.- E é surpreendente como, ao arrepio de uma orientação unânime dos nossos tribunais, a douta sentença proferida em 1. Instância e o douto acórdão em recurso e a sentença proferida na acção citada pelos recorridos na sua petição, acção que sob o n. 8/78 correu termos pela
2. Secção, do 4. Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa e o acórdão da Relação de Lisboa que a confirmou decidiram ao contrário daquela unânime orientação jurisprudencial, com fundamentos que não resistem a uma mais profunda análise.
13.- De resto, o procedimento do Banco recorrente traduzido nos factos especificados na alínea f) e dados como provados nas respostas aos quesitos 3., 4. e 15.B e na resposta aos quesitos 5. e 15. bem se compreende pelo facto dado como provado na resposta ao quesito 15.A, isto é, que "a partir de 1 de Janeiro de 1981, os trabalhadores que preencheram as vagas no Departamento de Processamento, em horário nocturno, receberam apenas o acréscimo devido pelo trabalho nocturno prestado".
14.- Na verdade, o Banco Réu não podia continuar a descriminar os recorridos e os outros trabalhadores que preencheram as vagas no departamento de Processamento, em horário nocturno, posteriormente a
1 de Janeiro de 1981, continuando a pagar áqueles 25% sobre o nível de retribuição e a estes o acréscimo de 25% sobre o nível de retribuição acrescido de diuturnidades e subsídio de função só quanto às horas de trabalho nocturno efectivamente prestadas.
15.- Àquele facto dado como provado na resposta ao quesito 15. nem sequer se refere, porém, a douta sentença proferida na 1. Instância e o douto acórdão em recurso, que, a manter-se, daria cobertura a tão grave discriminação.
Termina o recorrente pedindo a procedência do recurso e a revogação do acórdão recorrido, com a consequente absolvição dos pedidos dos Autores.
3. Por sua vez, nas contra-alegações, os recorridos defendem a confirmação do aresto sujeito a revista.
O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público a folhas 343 emitiu parecer no sentido de ser negada a revista.
4. Tudo visto, cumpre decidir:
A Relação deu como provados os factos que passamos a descrever. a) Os Autores, com excepção do J, que passou à situação de invalidez em 1 de Agosto de 1990, trabalharam sob as ordens e direcção do Réu, mediante retribuição salarial sendo admitidos ao serviço:
- o A em 1 de Julho de 1968;
- o B em 15 de Julho de 1968;
- o C em 12 de Junho de 1972;
- o D em 1 de Setembro de 1967;
- o E em 1 de Março de 1971;
- o F em 1 de Agosto de 1973;
- o G em 22 de Novembro de 1973;
- o H em 1 de Fevereiro de 1973;
- o I em 22 de Novembro de 1965; e,
- o J em 2 de Maio de 1962. b) Desde 1981, os Autores estiveram integrados nos níveis salariais referidos no anexo II, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do sector bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego 42., 1. Série, de 15 de Novembro de 1990, e receberam as retribuições mensais de base discriminadas de folhas 10 a 13, que sob a rubrica "valor de retribuição e do acréscimo devido", se tem aqui por reproduzida. c) Desde o início e durante vários anos, os Autores praticaram ao serviço do Réu o horário - normal - de trabalho, que se iniciava de manhã, com a abertura dos estabelecimentos bancários ou seja, das 8 às 17 horas. d) Entre 1974 e 1977 o Réu propôs aos autores - como a outros trabalhadores seus - a sua passagem para o designado turno da noite, mediante um complemento ou subsídio correspondente a um acréscimo de 25%, sobre a totalidade do valor da sua retribuição-base. e) Os Autores aceitaram a proposta e o Réu pagou-lhes, desde o início da prática do novo horário aquele complemento de 25% sobre a totalidade da retribuição-base de cada um, incluindo tal acréscimo no subsídio de férias e de Natal. f) Os Autores e o Réu acordaram também que cada um daqueles demandantes tinha direito a receber o acréscimo remuneratório referido em d) e e), enquanto praticassem o horário por turnos ou no designado turno da noite - ou seja, a partir das 18 horas - e manteria tal direito no caso de transferência para horário normal, por motivo que não lhe fosse imputável. g) Os Autores aceitando a proposta supra referida em d), passaram a praticar os horários constantes de folhas 98 e 100, 101, 102 a 112 e 125 a 138, sendo certo que o Autor J passou ao horário normal do trabalho referido em c) a partir de Setembro de 1982. h) Em reunião de 14 de Outubro de 1981 o Conselho de Gestão do Réu, contra a vontade dos Autores deliberou o seguinte:
A) pagar-lhes no período compreendido entre 15 de Julho de 1981 e 30 de Setembro de 1981 o especificado acréscimo de 25% sobre o respectivo nível de retribuição;
B) pagar-lhes a partir de 1 de Outubro de 1981 o acréscimo de 25% sobre o trabalho nocturno respectivamente prestado;
C) pagar-lhes ainda, como subsídio fixo, as importâncias indicadas na coluna DIF da relação anexa, as quais deverão ser absorvidas em montante a definir pontualmente em futura revisão salarial. i) Na sequência da deliberação referida na alínea h):
A) o Réu pagou aos Autores o acréscimo de 25% sobre o respectivo nível de retribuição, acrescido de diuturnidades e de subsídio de função em relação ao trabalho efectivamente prestado a partir das 20 horas.
B) pagou ainda aos Autores o subsídio fixo ou DIF, correspondente à diferença entre o complemento supra e) e o acréscimo por trabalho nocturno acabado de referir na alínea i) A) - o subsídio fixo ou DIF referido na alínea i) B) continuou a ser pago até à sua completa absorção pelos aumentos decorrentes das revisões das tabelas salariais, a primeira das quais se verificou em Julho de 1981 (Secções 3, 4 e 5A). j) O Réu pagou aos Autores a importância constante dos documentos de folhas 160 a 166, 171 a 173, 178 a 180, 185 a 187, 192 a 194, 199 a 201, 206 a 208, 213 a 216, 220 a 222 e 227 a 229. l) A partir de 1 de Janeiro de 1981 os trabalhadores que preencheram as vagas no Departamento de Processamento em horário nocturno recebiam apenas o acréscimo pelo trabalho nocturno prestado. m) Os Autores sempre se manifestaram contra a eliminação do referido acréscimo sobre a totalidade da retribuição-base, tal como fora acordado e praticado até Outubro de 1981, nunca a aceitando, representando esta acção o culminar da sua discordância.
5. Sendo esta a matéria de facto fixada nas instâncias, importa agora aplicar-lhes o direito respectivo.
Foi apurado que, em dia indeterminado dos anos de 1974 a 1977, foi acordada entre o Réu e os Autores uma nova cláusula do respectivo contrato de trabalho, cuja obrigação duraria enquanto cada um dos Autores praticasse o novo horário, isto é, enquanto não fosse estabelecido outro horário, com o seu acordo, que estipulou um adicional de 25% sobre a retribuição-base, reconhecendo-se, deste modo, aos Autores o direito de receber, com a sua retribuição mensal, o mínimo de 25% sobre a totalidade daquela retribuição-base, enquanto não se retomasse, com o seu acordo expresso, o horário de trabalho das 8,00 horas às 17,00 horas.
Também está fixado pelas instâncias que o Banco Réu cumpriu esse acordo até 14 de Julho de 1981, data em que, unilateralmente e contra vontade dos Autores, decidiu revogar a aludida cláusula e passou apenas a cumprir a disposição legal relativa ao subsídio do trabalho nocturno, pagando um acréscimo de 25% sobre cada hora efectivamente prestada.
Assim, o Banco Réu, a partir de 1981, deixou de pagar a retribuição decorrente dessa cláusula, na parte em que tal retribuição era superior ao subsídio legal do trabalho nocturno, calculado com base na retribuição devida pelas horas efectivamente trabalhadas, do que resultou passar a pagar aos Autores uma retribuição global inferior àquela que eles receberiam se fosse cumprida a cláusula acordada e acima referida.
Entendeu-se na Relação do Porto que a questão, que lhe fora posta, consistia em saber se o Réu podia ou não alterar unilateralmente o regime retributivo aos Autores, relativamente ao aludido acréscimo de 25% sobre a retribuição-base, que lhes foi proposta e aceite pelos Autores.
A solução encontrada pelo acórdão recorrido foi negativa e acolheu o decidido pela sentença da 1. Instância, com base nos fundamentos nela expostos.
Em síntese, teve-se em conta que o regime do contrato invocado pelas partes, alterado pela cláusula inicialmente referida, que implicava o acréscimo de 25% sobre o vencimento-base como remuneração do horário nocturno, ou melhor, prestado depois das 18,00 horas, passou a impor ao Réu a obrigação de pagar tal trabalho aos Autores nesses precisos termos, não podendo alterar essa obrigação unilateralmente, tendo em consideração o disposto no artigo 406, n. 1 do Código Civil.
Tal foi, no caso vertente, a interpretação feita pelas instâncias da vontade das partes, quanto a tal cláusula, sem que tenham alterado os factos provados, sendo certo que a determinação da vontade das partes na celebração de um contrato e também na introdução de novas cláusulas, integra matéria de facto, alheia à competência do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28 Outubro de 1993 e de 8 de Fevereiro de 1995, nos Recursos ns. 3729 e 3583).
Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 21, n. 1, alínea c), do Decreto-Lei 42408, de 24 de Novembro de 1969 (conhecido também por Lei de Contrato de Trabalho), é proibido à entidade patronal diminuir a retribuição devida ao trabalhador, salvo nos casos excepcionais nesse preceito previstos, um dos quais é o acordo do próprio trabalhador.
Entendeu, pois, o douto Tribunal "a quo" que o adicional de 25% passou a ser uma forma de retribuição devida aos Autores como contrapartida pela prestação do trabalho em horário "por turnos", ou no designado "turno da noite", mas que queria sempre designar, no caso concreto, o que era prestado a partir das 18,00 horas, tal como havia sido acordado pelas partes.
Seguiu-se, de certo modo, no aresto em revista, "mutatis mutandis", com as devidas adaptações ao caso concreto, o entendimento adoptado no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1982 (in Acórdãos Doutrinais, n. 248/249, página 1156 e seguintes), segundo o qual "Quando por acordo das partes o trabalhador passou a receber uma prestação autónoma por uma das suas actividades, não pode essa prestação ser suprimida depois...".
No entanto, o Banco Réu defende que as instâncias não tiveram em consideração alguns factos, como o referido na alínea f) da especificação e os dados como provados nas respostas aos quesitos 3., 4. e 15., do questionário, dos quais se deveria concluir que "a partir de 1 de Janeiro de 1981, os trabalhadores que preencheram as vagas do Departamento de Processamento, em horário nocturno, receberam apenas o acéscimo devido pelo horário nocturno prestado", não podendo, a partir dessa data, passar a discriminar os trabalhadores Autores dos restantes, que passaram a prestar, a partir dessa data, trabalho em horário semelhante e naquele Departamento.
Estas considerações, constantes das conclusões 13., 14. e 15. das alegações do recorrente, aliás doutas, não podem agora ser tomadas em consideração pelo Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, por se tratar de matéria de facto fixada pelas instâncias e que não podemos modificar (cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1989 e 23 de Janeiro de 1991, proferidos nos Recursos ns. 2151 e 2542, que traduzem a jurisprudência firme e unânime deste Supremo Tribunal de Justiça sobre esta matéria).
É certo que o recorrente invoca a circunstância de as instâncias não haverem considerado tais factos para a sua decisão de direito, mas não podemos concordar com tal afirmação, na medida em que as instâncias não os consideraram juridicamente relevantes para dirimir a questão existente entre os Autores e o Réu, pois resulta da decisão recorrida que a Relação, como aliás a 1. Instância, entendeu que a circunstância de outros trabalhadores receberem a remuneração do trabalho nocturno em montantes diferentes dos deles, e nos termos do regime geral do trabalho nocturno, não podia implicar a revogação da cláusula inicial estabelecida por acordo das partes e que o Banco Réu não podia alterar unilateralmente.
Estamos, na verdade, perante realidades diferentes: uma coisa é a circunstância de as instâncias não terem considerado esses factos, invocados nas alegações do recorrente no recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, por não serem juridicamente relevantes quanto à decisão da questão que estava em causa, que era a de saber se a cláusula inicial podia ou não ser alterada unilateralmente; e outra bem diferente é a consequência que o recorrente pretende retirar desses factos, qual seja a de que, se os novos trabalhadores a prestar aquele trabalho nocturno passaram a receber uma remuneração fixada nos termos gerais para essa modalidade de trabalho, então também os Autores teriam que passar a receber idêntica remuneração.
Estaríamos, em tal caso, perante uma ilação a retirar dos factos provados, se fosse permitida a este Supremo Tribunal de Justiça fazê-lo, mas não
é, pois também as ilações dos factos provados revestem a natureza de matéria de facto, o que não está na competência de um Tribunal de Revista, como o é este Supremo Tribunal de Justiça (cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Janeiro de 1991, no Recurso 2542, já referido acima).
Mas, ainda que tal fosse permitido, seria inútil fazê-lo, pois concordamos com as instâncias no que respeita à irrelevância jurídica dos factos apontados pelo recorrente, nos pontos das conclusões das alegações acima referidos, para a decisão da questão de direito que as instâncias decidiram e, em nosso entender, bem.
6. Pelo exposto, decide-se negar a revista.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 10 de Maio de 1995.
Castelo Paulo.
Correia de Sousa.
Dias Simão.