ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ACTA DA ASSEMBLEIA
ASSINATURA
Sumário

I- A acta das assembleias dos condóminos serve para demonstrar a existência das respectivas deliberações, não se assumindo como pressuposto da sua validade.
II- A lei não estabelece sanção para a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia.
III- A falta de assinatura de todos os condóminos não afecta a validade da acta nem da deliberação.

Texto Integral

Proc. nº 3410/07.9TBPRD-B.P1 Apelação
Tribunal Judicial de Paredes 2º Juízo Cível
Recorrente: B…………
Relator: José Carvalho
Adjuntos: Desembargadores Rodrigues Pires e Canelas Brás

Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

O Condomínio do Edifício C…….., em Paredes, instaurou execução contra
B………, destinada a obter o pagamento da quantia de €6.275,37, alegadamente devida por este condómino.
O executado deduziu oposição à execução e à penhora, alegando, em síntese: a inexistência de título executivo, porquanto a quota extraordinária foi criada numa assembleia sem que esse tema constasse da ordem de trabalhos; que a acta não se encontra assinada por todos os condóminos; que aquela quota se destina a custear obras que pretendem modificar o arranjo estético do edifício, sendo exigível para a aprovação uma maioria de 2/3 e nem sequer 1/3 dos condóminos estava presente;
Concluía pela inexistência e inexequibilidade do título executivo e pela inexigibilidade da obrigação exequenda.
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O exequente contestou, sustentando a validade das deliberações, alegando que estas foram comunicadas ao opoente por carta registada, sem que tivesse sido arguida a falsidade da acta.

No despacho saneador, após se afirmar a validade e regularidade da instância, conheceu-se do mérito, julgando-se a oposição improcedente e determinando-se a prossecução da execução.
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Inconformado, o executado/opoente interpôs recurso, finalizando as alegações com as seguintes conclusões:
• O presente recurso vem interposto da douta decisão que julgou totalmente improcedente a oposição à execução deduzida.
• Salvo o devido respeito não andou bem o MM. Juiz a quo.
• Porquanto a acta dada à execução como título executivo não é certa, líquida e exigível.
• Não cumprindo deste modo os requisitos de que a lei faz depender a sua exequibilidade, de acordo com o disposto nos artigos 802.º do C.P.C. e 6.º, n.º 1, do DL n.º 268/94, de 25.10.
• De facto, para que acta constitua título executivo, é necessário que fixe a contribuição de cada um dos condóminos e o prazo para o seu pagamento, impondo-se que tal contribuição se encontre vencida no momento da instauração da execução.
• Todavia, da acta dada à execução e no que diz respeito à deliberação ora em apreço, apenas resulta o seguinte dispositivo: “ Criação de uma quota extra, que terá a designação de Quota Extra n.º 1/2007, no valor de duzentos mil euros (200.000,00 €) para financiamento inicial das obras que forem aprovadas. A Quota Extra n.º 1/2007 será paga em 18 mensalidades, com início em Maio de 2007. O não pagamento consecutivo ou interpolado de duas mensalidades obriga o pagamento imediato de 8 mensalidades (duas vencidas e seis vincendas).
Consequentemente, a Administração do Condomínio deverá aplicar as multas previstas no Regulamento do Condomínio e interpor acção judicial.”.
• Assim, e face ao exposto, a acta contém uma obrigação quantitativamente incerta, pois não fixa o montante devido por cada condómino, nem nela resulta fixado o prazo para o seu pagamento ou que a prestação esteja vencida.
• Nestes termos, não pode deixar de se considerar que não há título executivo bastante para a execução
• Assim sendo, impõe-se a revogação da sentença recorrida, com a consequente procedência da oposição e a extinção da acção executiva.

Os factos:
Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:
1- A exequente é a administradora do condomínio do edifício C……., em exercício, tendo sido eleita em Assembleia de Condóminos realizada no dia 1 de Março do ano de 2007.
2- O executado é proprietário das fracções designadas pelas letras “J” e “BL” ao nível da cave e 5º andar direito, do prédio em regime de propriedade horizontal denominado Edifício C……., sito na freguesia de ……., Paredes.
3- Em reunião da Assembleia de Condóminos realizada no dia 12 de Abril de 2007, em segunda convocatória, foi aprovado por unanimidade dos condóminos presentes, representativos de 49,40% do capital investido, a criação de uma quota extra denominada quota extra n.º 1/2007, no valor de € 200.000,00, a serem pagos 18 mensalidades, com início em Maio do ano de 2007, para financiamento inicial das obras que forem aprovadas para beneficiação do prédio, sendo que no momento da aprovação estavam presentes 32,60% do capital investido.
4- Mais foi deliberado, nos termos descritos em 3, que o não pagamento consecutivo ou interpolado de duas mensalidades obriga ao pagamento imediato de 8 mensalidades (duas vencidas e seis vincendas).
5- Ao executado foi enviada carta registada, com aviso de recepção, com cópia da deliberação descrita em 3 e 4, em 10 de Maio do ano de 2007- docs. de fls. 58 a 65 deste autos.
6- Em 23 de Maio de 2007, o executado/opoente declarou, por e-mail, impugnar a deliberação tomada em 3 e 4.- doc. de fls. 66 e 67 destes autos.
7- Por carta registada com aviso de recepção, em 23 de Julho de 2007, condóminos representativos de 18,9% do total do capital do edifício, comunicaram à administração do condomínio que “continuam a manifestar a sua discordância quanto à legalidade da aprovação da mesma, uma vez que a consideram ilegal, por carecer de qualquer fundamento legal ou base em que se possa sustentar”.
7- A acta da reunião em que foi tomada a deliberação descrita em 3 e 4 não se mostra assinada por todos os condóminos presentes, estando-o pela Presidente da Assembleia.
8- Da ordem de trabalhos da reunião ocorrida em 12 de Abril de 2007 constavam os seguintes pontos:
1. Apresentação, discussão e votação das propostas de orçamento para realização de obras de beneficiação do edifício;
2. Apresentação, discussão e votação da proposta da Câmara Municipal de Paredes para substituir o piso exterior da galeria comercial;
3. Discussão de outros assuntos de interesse dos Srs. Condóminos.
O direito
A questão principal consiste em apurar se o exequente dispõe de título executivo.
No presente recurso – ao qual é aplicada a legislação processual anterior ao DL nº 303/2007, de 24/8 – o recorrente questiona a validade da acta da assembleia de condóminos de 12 de Abril de 2007, invocando, em síntese: que não se encontra assinada por todos os condóminos presentes; que o deliberado (referente à criação de uma quota extra) não constava da ordem de trabalhos; que no momento da aprovação apenas estavam presentes 32,60% do capital investido; que a acta não fixava a contribuição de cada condómino, nem o prazo para o pagamento.
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A questão da falta de assinatura de todos os condóminos
Dispõe o nº 1 do artigo 1º do do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro:
“São obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado”
Se a validade das actas estivesse dependente da assinatura de todos os condóminos, os que não concordassem com uma qualquer deliberação tinham uma forma muito acessível de ver triunfada a sua posição (ainda que minoritária): não assinavam a acta. Tal seria contra o espírito da lei e poderia tornar impraticável, em muitas situações, a exequibilidade das decisões das assembleias dos condóminos. Ora, a acta serve para demonstrar a existência das respectivas deliberações, não se assumindo como pressuposto da sua validade. E a lei não estabelece sanção para a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia.
Conforme o decidido no acórdão desta Relação, de 4/6/2009, “A força executiva da acta da assembleia de condóminos não depende nem da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes) nem de, nela, se expressar o valor determinado e exacto da dívida de cada condómino, mas deve permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação desse valor” (disponível no site da DGSI, nº convencional JTRP00042706).
A falta de assinatura de todos os condóminos não afecta a validade da acta nem da deliberação.
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A questão da ordem de trabalhos
Segundo o estabelecido no nº 2 do artigo 1432º do CC, a convocatória deve indicar o dia, hora e local e ordem de trabalhos da reunião. A menção da ordem de trabalhos destina-se a permitir que os condóminos saibam previamente os assuntos que irão ser tratados e se preparem para a reunião.
No caso, da ordem de trabalhos não constava expressamente a criação de uma quota extra para financiamento das obras. E esta quota, que veio a ser aprovada, assumia um montante algo significativo, a requerer um sacrifício financeiro dos condóminos.
No despacho impugnado considerou-se que sendo um dos pontos da ordem de trabalhos a “Apresentação, discussão e votação das propostas de orçamento para realização de obras de beneficiação do edifício”, a quota-extra se destinava a financiar as obras de beneficiação que viessem a ser aprovadas. E escreveu-se a seguir: “Como tal, o que deliberação traduz é a aprovação de uma forma de financiar as obras de beneficiação, de sustentar tal realização quando as obras forem aprovadas e especificadas, o que não pode deixar de considerar-se relacionado com o ponto da ordem dos trabalhos elencado, que visava a aprovação, discussão e votação de propostas de orçamento para realizar tais obras, e a aprovação do meio de as fazer ou sustentar financeiramente não pode desligar-se da aprovação e discussão dos orçamentos para concretizar tais obras.
Como tal, cabe na ordem de trabalhos previamente anunciada, como tal, no âmbito da Assembleia de Condóminos realizada.”
É questionável este entendimento, uma vez que pode permitir, na prática, que se extravase da ordem de trabalhos, submetendo à votação propostas estranhas às matérias para as quais os condóminos foram convocados, invocando que um qualquer assunto, embora não mencionado na convocatória, está relacionado com a ordem de trabalhos.
A considerar-se que foi tomada uma deliberação sobre matéria estranha à ordem de trabalhos, seria a mesma anulável (nº 3 do artigo 174º do CC). Mas, o ora recorrente teve conhecimento do teor da deliberação em 10 de Maio de 2007. Dispunha de 10 dias a partir daquela data para exigir a convocação de uma assembleia extraordinária (art. 1433º, nº 2). Não usou dessa faculdade. Também não requereu a suspensão da deliberação, nem instaurou acção de anulação; e os prazos para usar tais meios processuais já expiraram. Ainda que a deliberação enfermasse de anulabilidade, esta estaria sanada por não ter sido arguida oportunamente.
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A questão da percentagem necessária à aprovação da proposta
O nº 3 do artigo 1432º estabelece que as deliberações são tomadas, salvo disposição legal em contrário, por maioria dos votos do capital representativo do capital investido.
Consta da acta (fls. 120, vº) que no decurso da discussão do ponto “Apresentação, discussão e votação das propostas de orçamento para a realização de obras de beneficiação no edifício”, alguns condóminos, entre os quais o ora recorrente, abandonaram a sala de reunião. E que, a partir de então, “os presentes representam 32,60% do capital investido do Edifício C……..” Aquando daquele abandono ainda não tinha sido aprovada a proposta de criação de uma quota extra. Esta foi aprovada por unanimidade dos presentes (fls. 121).
A percentagem de 32,60% era suficiente para a aprovação da proposta, porquanto a assembleia reunia em segunda convocatória e em tal caso basta a maioria de votos dos condóminos presentes (nº 4 do artigo 1432º). Não se exigia, no caso, qualquer maioria qualificada para a provação da proposta.

Se a acta constitui título executivo
Para o caso interessa o teor do nº 1 do artigo 6º do DL nº 268/94, de 25/10: “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, e ao pagamento de serviços de interesse comum que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixou de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
Consta da parte final da acta de 12/4/2007 que da mesma fazem parte os documentos aí enunciados, entre os quais “Lista de presenças na Assembleia”. Nessa lista (fls. 121, vº, a 122, vº), constam as diversas fracções (designadas pela letra), o piso a que correspondem, a permilagem correspondente, o nome do condómino e algumas assinaturas. Em relação ao ora recorrente, são mencionadas as fracções “J”, sita na cave e “BL”, no 5º Drtº-B, sendo as permilagens de 3,000 e 29,000, respectivamente (fls. 122). A proposta aprovada era do seguinte teor: “Criação de uma quota extra, que terá a designação de Quota Extra n.º 1/2007, no valor de duzentos mil euros (€ 200.000,00), para financiamento das obras que forem aprovadas. A Quota Extra nº 1/2007 será paga em 18 mensalidades, com início em Maio do ano de 2007. O não pagamento consecutivo ou interpolado de duas mensalidades obriga o pagamento imediato de 8 mensalidades (duas vencidas e seis vincendas).”
No requerimento executivo (fls. 126) indica-se que o executado não procedeu ao pagamento de qualquer quota extra, estando em falta 5 prestações já vencidas; e que cabia suportar mensalmente as quantias de €33,43 e €323,19, pelas fracções “J” e “BL”, respectivamente. Ora, atendendo ao total da “quota extra” e à permilagem das fracções do ora recorrente, através de uma operação aritmética ao alcance da generalidade das pessoas apura-se o montante a pagar mensalmente por cada uma das fracções, na sequência da mencionada deliberação.
Da acta (integrada pelos documentos anexos) constam os elementos necessários para calcular o montante que cada condómino se encontra obrigado a pagar. Tanto basta para que constitua título executivo (neste sentido: Acórdão desta Relação, de 21/01/2010, Proc. nº 741/097TBSTS.P1).
Em resumo: o exequente dispõe de título executivo válido, carecendo de fundamento o alegado pelo recorrente.

Decisão
Pelos fundamentos expostos, julga-se a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, nesta Relação e na 1ª instância.

Porto, 14.7.2010
José Bernardino de Carvalho
Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires
Mário João Canelas Brás