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NRAU
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
REDUÇÃO
RENDA
Sumário
I - No contrato de arrendamento ocorrendo privação parcial do gozo da coisa, imputável ao locador, pode o locatário suspender, em medida proporcionada, o pagamento da renda, ao abrigo do regime da excepção do não cumprimento, desde que: -a falta assuma relevo significativo: -se observe proporcionalidade ou adequação entre essa falta e a recusa do excipiente. II - No regime do arº 1040°/2 CC o prejuízo efectivamente sofrido pelo arrendatário (ou pelo locatário) não tem de ser medido em função da duração do período que ele já vem ocupando o prédio por força do contrato. A expressão” duração do contrato” usada no art. 1040°/2 CC tem o significado de prazo (estipulado ou estabelecido, supletivamente, por lei) porque, em princípio, o contrato deve manter-se, independentemente de eventuais renovações.
Texto Integral
Desp-renda-2029-08.1TBVNG.P1-771-10TRP
Trib Jud Vila Nova de Gaia-.JCv
Proc. 2029-08.1TBVNG
Proc. 771-10 -TRP
Recorrente: B………. e outros
Recorrido: C………. e mulher
Relator: Ana Paula Pereira Amorim
Adjuntos: José Alfredo Vasconcelos Soares Oliveira
António Mendes Coelho
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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
Na presente acção que segue a forma de processo ordinário em que figuram como:
- AUTORES: C………. e mulher D………. residentes no ………., freguesia de ………., concelho de Arouca; e
- RÉUS: B………., Lda com sede na Rua ………., nº. – .º esquerdo, ………., Lisboa; e
E………. residente na ………., nº .. – .º andar esquerdo, ………., Vila Nova de Gaia;
F………. residente na Rua ………., nº .., …, .º esquerdo, ………., Vila Nova de Gaia
pedem os Autores que:
- se declare a resolução do contrato de arrendamento objecto dos autos;
- a condenação da Ré no despejo imediato do locado, entregando-o livre de pessoas e bens;
- a condenação da Ré a pagar aos Autores as rendas, até à presente data, no total de € 4.627,16 e as vincendas até ao trânsito em julgado da sentença que venha a decretar o despejo;
- a condenação da Ré no pagamento aos Autores a título de indemnização, do dobro da renda mensal em vigor, na data da extinção do contrato, por cada mês que decorra entre a data da sua extinção – independentemente da sua causa – e a data em que a Ré entregue aos Autores os locados;
- a condenação da Ré a pagar o condomínio até à data da instauração da acção, no total de € 300,00 e os vincendos até ao trânsito em julgado da sentença que venha a decretar o despejo;
- a condenação da Ré a pagar aos Autores os juros de mora vencidos, no montante de € 45,92 e todos os vincendos à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.
Alegam para o efeito e em síntese que são donos da fracção autónoma “ D “ correspondente a um escritório, na sobreloja esquerda, com entrada pelo nº …. da ………., na freguesia de ………., Vila Nova de Gaia.
Mais referem que em 01 de Novembro de 2004 através de documento escrito celebraram com a Ré B………. um contrato de arrendamento mediante o qual cederam à Ré a referida fracção, para escritório, mediante o pagamento da renda mensal de € 617,36, a qual por efeito da actualização legal situa-se em € 667,00.
Mais refere que a partir de Agosto de 2007 a Ré cessou o pagamento da contrapartida devida, ascendendo o montante em divida à data da instauração da acção a € 4 627,16.
Acresce a este valor as quantias devidas a título de comparticipações para o condomínio, no montante de € 300,00, cujo pagamento a Ré assumiu.
Os Réus E………. e F………. assumiram a qualidade de fiadores, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, pelo que são responsáveis pelo pagamento das quantias em divida.
Por fim, referem que a falta de pagamento das rendas constitui fundamento para a resolução do contrato, pois atenta a gravidade do incumprimento não se mostra exigível a manutenção do contrato.
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Citados os Réus contestaram defendendo-se por impugnação e por excepção e deduziram pedido reconvencional.
Alegam, em síntese, que por se verificar uma situação de privação de parte da utilização do escritório arrendado pela Ré, por facto imputável aos Autores, a Ré suspendeu o pagamento das rendas a partir de Setembro de 2007.
A partir de 2005 um dos gabinetes apresentava sinais de infiltrações de água, facto que se comunicou ao senhorio. A partir dessa data a situação agravou-se com queda de parte do estuque e água. Em Março de 2006 estes factos foram comunicados à empresa que procede à administração do condomínio.
A deterioração causada naquele espaço impediu a Ré de usar o escritório para sala de reuniões e para receber os clientes e tiveram que retirar os documentos e computadores que ali estavam instalados. A humidade alastrou-se ao corredor central e no armário ali existente constatou-se que várias resmas de papel de carta e capas com o logótipo de empresa estavam inutilizados.
Neste contexto a Ré cessou o pagamento da renda e comunicou a causa ao senhorio, solicitando de novo a realização de obras de reparação.
Alegam, ainda, que o Autor e a sua filha deslocaram-se em duas ocasiões à fracção e assumiram a necessidade de realizar obras. Posteriormente, a Ré foi contactada pelo perito averiguador, a solicitação de uma empresa seguradora. Contudo, nada foi feito no sentido de regularizar a situação, mantendo-se as infiltrações de água, com danificação do estuque, pavimento de madeira e revestimento de madeira nas paredes.
Em Maio de 2008 a Ré solicitou junto do senhorio a realização de obras, fixando um prazo para a sua realização, sob pena de considerar resolvido o contrato celebrado.
Referem que os Autores não aceitaram realizar as obras e solicitaram a entrega das chaves do arrendado até ao dia 30.06.2008. A Ré requereu a prorrogação do prazo, por 40 dias, atenta a dificuldade em arranjar um local para arrendar e ainda, apresentou uma proposta para facultar as visitas ao local arrendado, por terceiros interessados, mas não obteve qualquer resposta.
Concluem que mostra-se legítimo invocar a excepção de não cumprimento, para suspender o pagamento das rendas devidas a partir de Setembro de 2007, pois o local arrendado não estava em condições de satisfazer as necessidades e fim para que foi cedido.
Em reconvenção pedem os Réus a condenação dos Autores:
- na redução do valor das rendas peticionadas pelos Autores/reconvindos pela quantia de € 2.710,44;
- no pagamento de indemnização pela quantia de € 31.251,67, atentos os prejuízos decorrentes para a Ré / Reconvinte B………., Lda descritos na peça em razão da privação de utilização parcial do escritório arrendado; bem como,
- nas despesas decorrentes da cessação do contrato por facto imputável aos Autores / Reconvindos, em consequência da necessidade de mudança do recheio do imóvel arrendado, bem como consequentes e alterações do registo comercial, custos cuja liquidação relegam para liquidação de sentença.
Alegam, para o efeito, que pelo facto da Ré arrendatária estar privada do uso de uma parte da fracção arrendada, assiste-lhe o direito à redução proporcional desse valor, no montante das rendas devidas durante esse período. Por outro lado, uma vez que não podia receber os clientes nas suas instalações passou a deslocar-se ás instalações dos clientes ou a promover reuniões em locais alternativos o que importou um prejuízo de € 31.251,67. Refere, por fim, que a resolução do contrato, por facto imputável aos Autores obrigou a Ré a procurar um local para as novas instalações, com despesas acrescidas e tempo ocupado, danos cuja liquidação relega para liquidação de sentença.
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Na Réplica os Autores mantêm a posição inicial, impugnando os factos alegados pelos Réus, na medida em que pretendem com os mesmos justificar o não cumprimento.
Concluem por pedir a alteração da causa de pedir e do pedido, por confissão dos Réus, porquanto a primeira Ré confessa que procedeu à resolução do contrato por verificação da condição resolutiva que apresentou, os Réus admitem, ainda, por acordo, ter deixado de liquidar rendas em Agosto de 2007, devendo por isso as rendas de Setembro de 2007 até à presente data e a Ré não procedeu à entrega do imóvel na data em que se propôs fazê-lo – 10 de Agosto de 2008 -, nem em data posterior, apesar da visita ao imóvel pela filha dos Autores. Concluem, assim, que a Ré está em mora com as consequências previstas no art. 1045º CC.
Formulam os seguintes pedidos:
- que se julgue improcedente a excepção de não pagamento das rendas com fundamento na privação do gozo parcial do escritório arrendado pela sociedade Ré;
- a absolvição dos Autores dos pedidos reconvencionais;
- que por confissão dos Réus aceite pelos Autores, seja considerada procedente a alteração da causa de pedir e do pedido, baseado na resolução do contrato de arrendamento, por verificação da condição resolutiva, e em consequência:
> a condenação dos Réus a pagar, solidariamente, aos Autores as rendas vencidas, até à presente data, no total de € 8.629,16;
> a condenação dos Réus a pagar, solidariamente, aos Autores a quantia indemnizatória de € 4.314,58, igual a 50% do que for devido, por constituição da primeira Ré em mora na liquidação das rendas, nos termos do art. 1041º/1 CC;
> a condenação dos Réus a pagarem solidariamente aos Autores a título de indemnização, o dobro da renda mensal em vigor, na data de extinção do contrato, por cada mês que decorra entre a data da sua extinção – independentemente da sua causa – e a data em que a primeira Ré entregue aos Autores o local arrendado, nos termos do art. 1045º CC;
- a condenação dos Réus a pagar solidariamente aos Autores o condomínio até à presente data, no total de € 600,00 e os vincendos até à data em que a primeira Ré entregue aos Autores o locado.
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Em 15.12.2008 os Autores comunicaram, junto dos autos, que em 31 de Outubro de 2008 a primeira Ré procedeu à entrega do locado objecto da presente acção livre de pessoas e bens e declararam que consideram ser essa data a ter em conta para cálculo dos pedidos que dependiam directamente da efectiva entrega do imóvel.
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Proferiu-se despacho que julgou extinta a instância quanto aos pedidos formulados em a) e b) na petição.
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Elaborou-se o despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto, despacho do qual não coube reclamação.
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Realizou-se o julgamento com observância do legal formalismo.
O despacho que contém as respostas à matéria da base instrutória consta de fls. 332 a 337.
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Proferiu-se sentença que julgou:
- parcialmente procedente, por provada, a acção e condenou solidariamente os Réus “B………., Lda, E………. e F………. a pagar aos Autores C………. e D………. a quantia de € 15.008,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% a vencerem sobre cada uma das rendas desde o dia 08 do mês anterior a que disser respeito até Junho de 2009, inclusive e sobre o valor de € 667,00 por cada um dos meses de Julho a Outubro do mesmo ano até integral pagamento.
- absolveu os Réus da parte restante do pedido;
- julgou improcedente o pedido reconvencional e em consequência absolveu os Autores-reconvindos do pedido.
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Os Réus B………., Lda, F………. e E………. vieram interpor recurso da sentença.
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Nas alegações que apresentaram os recorrentes formularam as seguintes conclusões:
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Concluem por pedir a revogação da sentença e que se julgue procedente a excepção de não cumprimento do contrato, por parte do inquilino, bem como a existência de prejuízos.
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Os Autores não apresentaram contra-alegações.
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O recurso foi admitido como recurso de apelação.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Fundamentação
1. Delimitação do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 685º- A CPC.
As questões a decidir consistem em saber:
- se ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia;
- se a limitação ou privação, ainda que parcial, do gozo da fracção arrendada justifica a dispensa de pagamento da renda acordada, ao abrigo do regime da excepção de não cumprimento; e
- se a limitação ou privação, ainda que parcial, do gozo da fracção, não imputável ao locador, confere ao arrendatário o direito de indemnização, sob a forma de redução do montante da renda.
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2. Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
- 1). No dia 01/11/04 os Autores declararam dar de arrendamento à Ré «B………. …» a fracção autónoma designada pela letra «D», correspondente a escritório na sobreloja esquerda, entrada pelo n.º …. do edifício sito na ………., n.º …., ………., Vila Nova de Gaia, pela renda mensal de € 617,36, a pagar no 1.º dia útil do mês anterior a que respeitar, sendo actualmente de € 667, por um ano, com início em 01/11/04, obrigando-se os Réus E………. e F………. como «fiadores e principais pagadores» tudo conforme fls. 7 a 10 cujo teor se dá por reproduzido (A sendo a parte a negrito aditada por as partes estarem de acordo em relação à mesma).
2). A Ré «B………. …» não paga as rendas referentes aos meses de Setembro de 2007 e seguintes (B).
3). A Ré «B………. …» não pagou a prestação referente ao 4.º trimestre de 2007 e o 1.º trimestre de 2008 do condomínio (C).
4). Existe infiltração de água num dos gabinetes da fracção mencionada em 1), virado para a ………., com área de cerca de 17,50 m2 ocupado pelo Réu E………. (D) detectada pelo menos em 19/12/07 (1.º).
5). A existência dessa infiltração foi comunicada pelo referido Réu E………. aos Autores que declararam verificar a situação (E).
6). Dá-se por reproduzido o teor de fls. 97 e 99 e 100 (carta datada de 17/03/06 enviada pela Autora a G………., Lda. onde se menciona que é necessário providenciar pela reparação do tecto do arrendado, tendo caído a pintura e que foi a empresa interpelada para tal resolução há pelo menos três meses, registada com data de 20/03/04 e recebida por tal empresa) – al.F-.
7). A Ré «B………. …» enviou à mandatária dos Autores carta datada de 27/11/07, via fax do mesmo dia, onde refere que ocorreu violação pelo senhorio de compromisso assumido há mais de 18 meses quanto à infiltração de água num gabinete, conforme fls. 101 e 102 cujo teor se dá por reproduzido (G e 12.º).
8). A certa altura, após o início da infiltração, o gabinete em questão foi desocupado de pessoas e de equipamentos (H).
9). O Autor deslocou-se ao imóvel em causa pelo menos duas vezes a fim de aferir da mencionada infiltração tendo constatado a sua existência e do estado do tecto e pavimento e que iria diligenciar para aferir a origem da infiltração de água e encontrar uma forma de solucionar o problema (I).
10). Foi aprazada vistoria pela Companhia de Seguros H………. para 19/12/07(J).
11). Em 22/07/08 no tecto do gabinete é visível o cimento da placa em alguns espaços e a água acumula-se no chão (L).
12). A Ré «B………. …» enviou a G………., Lda. carta datada de 13/05/08, registada em 13/05/08 e recebida por tal empresa em 14/05/08 onde concede oito dias para que se procedam às obras necessárias para resolver a acima mencionada infiltração sendo que decorrido tal prazo e não sendo realizadas as obras, a referida Ré comunica «desde já» a resolução do contrato de arrendamento, tudo conforme fls. 109 a 113 cujo teor, na parte aqui mencionada, se dá por reproduzido (M).
13). Posteriormente ao envio da carta mencionada em 13), o Autor deslocou-se ao arrendado tendo manifestado intenção de resolver a questão (N).
14). G………., Lda. enviou à Ré «B………. …» fax datado de 03/06/08 pedindo a entrega do locado devido à comunicação de resolução referida em 12, tudo conforme fls. 114 e 115 cujo teor se dá por reproduzido (O).
15). A Ré «B………. …» respondeu a tal carta enviando carta a G………. … e ao Autor onde refere que constatam não ser intenção dos senhorios realizar as obras e que marca o dia 30/06/08 para entrega das chaves do imóvel, carta com registo de 06/06/08 e recepção em 09/06/08, tudo conforme fls. 117 a 124 cujo teor se dá por reproduzido (P).
16). Os Autores aceitaram prorrogar por 40 dias, após 30/06/08 a entrega das chaves do imóvel (Q).
17). Dá-se por reproduzido o teor de fls. 128 (fax datado de 20/06/08, enviado por «G………. …» à Ré «B………. …» solicitando qual a disponibilidade desta para nos dias 26 ou 27 de Junho de 2008 se realizar vistoria por Companhia de Seguros) – al.R-.
18). A mencionada Ré respondeu a tal pedido conforme consta de fls. 129 cujo teor se dá por reproduzido (indica a disponibilidade diária e horário) – al.S-.
19). O arrendado tem área coberta de 146 m2 (T).
20). A 1.ª Ré entregou à Autora, em 31/10/08, o imóvel referido em 1), livre de pessoas e bens (U).
21). A infiltração de água referida em 4) fazia correr água para a fracção referida em 1) de forma contínua (3.º).
22). A referida infiltração de água provocou a queda de tinta e argamassa de gesso no chão do gabinete referido em 4), existindo água no chão do mesmo provinda de tal infiltração (4.º e 5.º), tendo a infiltração alastrando-se ao tecto do corredor central anexo ao referido gabinete (8.º), ficando o armário com humidade e mofo com resmas de papel de carta e capas estragadas (9.º) e tendo parte do pavimento flutuante que reveste o chão do gabinete inchado e levantado (16.º), sendo que parte da madeira que reveste o gabinete sempre mencionado se deteriorou (17.º).
23). O referido gabinete também se destinava a ser usado como local de realização de reuniões nomeadamente com clientes da Ré «B………. …» (6.º).
24). Em virtude do mencionado em 22, a Ré «B………. …» entendeu não ter condições para usar tal gabinete (7.º), sendo o corredor utilizado para trabalhos de secretariado (10.º).
25). Por entender que os Autores não solucionavam a infiltração em questão e que a mesma lhe impossibilitava o uso do referido gabinete a Ré «B………. …» decidiu suspender o pagamento do montante total das rendas referidas em 1) – facto 11.º-.
26). A Ré «B………. …» colocou baldes no chão para evitar que a água provinda da infiltração sempre referida deteriorasse a madeira (13.º).
27). Tal gabinete tinha de ser limpo devido à sujidade provocada pela infiltração e consequente queda de estuque (14.º) sendo tal limpeza mais necessária após períodos de encerramento do gabinete (15.º).
28). A Ré «B………. …» procurou novo imóvel para se instalar (18.º).
29). Foi realizada vistoria por uma Companhia de Seguros em 19/12/07 a fim de aferir da proveniência da infiltração de água que afectava a fracção referida em 1) – facto 20.º-.
30). A Ré «B………. …», por força das condições em que se encontrava o acima mencionado gabinete fez algumas reuniões fora do mesmo (21.º).
31). A Ré «B………. …», através dos seus gerentes, fez deslocações a alguns pontos do País em reuniões de trabalho (23.º).
32). A Ré «B………. …» teve perda de tempo e gastos com a mudança de instalações tendo tido de comunicar tal mudança a clientes, fornecedores e parceiros (24.º, 25.º).
33). A infiltração referida em 4) tem origem na casa de banho da fracção «F» situada por cima da fracção D) – facto 27.º -.
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3. O direito
A apelante não impugna a matéria de facto, pois não questiona a relação dos factos dada como assente na primeira instância.
Como tal, têm-se tais factos como pacíficos, já que também se não vê razão para a modificabilidade da decisão da matéria de facto, ao abrigo do disposto no art. 712º do CPC (cfr. artº 713º, nº6, do CPC).
Impõe-se, por isso, passar à apreciação das questões suscitadas nas conclusões da apelação.
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- Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia –
Os recorrentes nos pontos 14 e 15 das conclusões de recurso consideram que na sentença o Juiz do tribunal “ a quo “ não se pronunciou a respeito de parte dos prejuízos alegados pelos Réus, em sede de reconvenção, quando o deveria ter feito face à matéria apurada e consignada sob os pontos 30 e 31, o que configura a nulidade prevista no art. 668º/2 CPC.
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Analisando.
Os recorrentes enquadram o vício que determina a nulidade da sentença na previsão do nº2 do art. 668ºCPC.
Contudo, tal referência, por certo, resulta de um lapso, já que o vício a que se alude no nº2, reporta-se à “falta de assinatura da sentença”, que no caso não se verifica.
A nulidade invocada – omissão de pronúncia - vem prevista no art. 668º/1 d) CPC e abrange os casos afins da omissão de conhecimento e do conhecimento indevido.
Enquadram-se na primeira situação os casos da sentença não se pronunciar sobre questões de que o tribunal devia conhecer, por força do disposto no art. 660º/2 CPC e na segunda hipótese, o conhecimento de questões que a sentença não podia julgar, por não terem sido postas em causa.
Decorre do disposto no art. 660º/2 CPC que o juiz deve conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção, cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade.
Neste sentido podem ler-se: Antunes Varela “Manual de Processo Civil”, pag. 690 e Lebre de Freitas “Código de Processo Civil – Anotado”, vol II, pag. 670.
No caso em análise verifica-se que a sentença não padece de qualquer dos apontados vícios, pois na apreciação do caso, o Juiz do tribunal “a quo”, em sede de reconvenção, analisou os vários pedidos e respectivos fundamentos, ainda, que de forma genérica.
Em sede de reconvenção, os Réus formularam vários pedidos e entre esses, pediram a condenação dos Autores:
- “no pagamento de indemnização pela quantia de € 31.251,67, atentos os prejuízos decorrentes para a Ré / Reconvinte B………., Lda descritos na peça em razão da privação de utilização parcial do escritório arrendado.”
Os factos consignados em 30 e 31 reflectem a resposta aos pontos 21 e 23 da base instrutória. A matéria dos pontos 21 e 23 julgou-se parcialmente provada, atenta a resposta restritiva a tal matéria e para além deste aspecto, o ponto 22, julgou-se não provado.
No ponto 22 perguntava-se se a Ré teve uma despesa de € 31.251,67 (com o facto de realizar as reuniões fora do escritório).
Na sentença recorrida em sede de fundamentação de direito escreveu-se:
“Do pedido reconvencional.
Toda a factualidade que sustentava este pedido – existência de danos causados pelo senhorio devido a infiltração de água -, não se provou, resultando afastada qualquer responsabilidade do senhorio na mesma pelo que não procede a arguida excepção de não pagamento de renda. (…)”
Julgou-se, assim, não ser de atribuir qualquer responsabilidade ao senhorio, porque não se provaram os factos que sustentavam o pedido, considerando-se nomeadamente improcedente a excepção de não pagamento de renda.
Conclui-se, que o Juíz do tribunal “a quo” apreciou e decidiu a matéria objecto do pedido reconvencional, sendo analisados de forma mais detalhada alguns aspectos deste pedido que se prendiam com questões de direito, mais propriamente com a aplicação do regime previsto no art. 1040º CC.
Do exposto resulta que a sentença não padece do vício apontado e nessa conformidade, julgam-se improcedentes as conclusões formuladas sob o ponto 14 e parte do ponto 15.
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- Da dispensa de pagamento da renda acordada, ao abrigo do regime da excepção de não cumprimento, por limitação ou privação, ainda que parcial, do gozo da fracção arrendada -
Os recorrentes consideram ter legitimidade para invocar a excepção de não cumprimento e suspender o pagamento das rendas, pois recai sobre o Autor senhorio a obrigação de assegurar o gozo do locado para os fins a que se destina, sendo certo que por efeito das infiltrações de água, um gabinete e a entrada anexa, da fracção arrendada, não mantinham condições para ser utilizados e ocupados, facto que era do conhecimento do Autor desde 2004. Neste contexto justifica-se que a Ré tenha procedido à resolução do contrato, ao abrigo do art. 1083º/1/4 CC.
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Analisando.
A presente acção de despejo tinha como fundamento a resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas, ao abrigo do art. 1083º/1/3 CC, na redacção da Lei 6/2006 de 26/02.
Contudo, porque na pendência da acção o arrendatário procedeu à entrega da fracção, mas sem liquidar as quantias peticionadas a título de rendas, o processo prosseguiu os seus termos para apurar este segmento do pedido.
Em sede de recurso não se questiona a qualificação jurídica do contrato e os elementos de facto que constam dos autos, não permitem outro enquadramento, para além do que foi consignado na decisão proferida em 1ª instância.
Dando, pois, por assente que estamos perante um contrato de arrendamento comercial, cumpre apurar se as rendas peticionadas são devidas, apesar de na área de um dos escritórios da fracção arrendada, se detectar infiltrações de água.
A análise da questão deve ser resolvida ao abrigo do Novo Regime do Arrendamento Urbano – Lei 6/2006 de 26/02 – apesar do contrato ter sido celebrado no domínio do RAU – DL 321-B/90 de 15/10.
O NRAU – Lei 06/2006 de 27/02 – entrou em vigor em 27 de Junho de 2006.
O art. 59º/1 do citado diploma, sob a epígrafe “Aplicação no Tempo”, passou a dispor:
“O novo regime do arrendamento urbano aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como ás relações contratuais constituídas que subsistam dessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias.”
O nº3 do mesmo preceito prevê:
“As normas supletivas contidas no novo regime do arrendamento urbano só se aplicam aos contratos celebrados antes da entrada em vigor da presente lei quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável.”
O art. 60º determina, ainda:
“É revogado o Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo DL 321-B/90 de 15/10, com todas as alterações subsequentes, salvo nas matérias a que se referem os artigos 26º e 28º da presente lei.”
A nova lei estabeleceu um conjunto de normas transitórias considerando o facto da existência de contratos celebrados ao abrigo do RAU e celebrados antes da entrada em vigor do RAU.
Maria Olinda Garcia refere a este respeito, que para proceder à exacta delimitação do regime aplicável aos arrendamentos vigentes à data da entrada em vigor do novo regime deverá atender-se à distinção feita pelo nº2 do art. 12º do Código Civil. Refere, ainda, que: “… as normas da nova lei que dispõem sobre condições de validade substancial ou formal do arrendamento não devem ter aplicação retroactiva, continuando, portanto, essa matéria a ser disciplinada pela lei vigente à data da celebração do contrato. Pelo contrário, as normas que dispõem directamente sobre o conteúdo da relação de arrendamento abrangem as relações já constituídas, tendo, portanto, aplicação imediata.” (A Nova Disciplina do Arrendamento Urbano, pag. 51).
A propósito desta matéria Cunha de Sá e Leonor Coutinho referem que:
“Os arrendamentos urbanos de pretérito que subsistam à data da entrada em vigor do NRAU são por ele abrangidos, nos termos estabelecidos pelos art. 59º/1 e 26º e seguintes, epigrafados “ normas transitórias”.
Uma vez que o arrendamento se traduz numa situação duradoura, o NRAU respeita o passado decorrido sob a égide da lei antiga e para o futuro abrange na sua disciplina, em termos específicos, os efeitos que se vierem a produzir após a sua entrada em vigor. “
Esses termos específicos são estabelecidos pelo NRAU tendo em atenção a espécie do contrato e a data da sua celebração.” (Arrendamento 2006- Nova Lei, pag. 61-62).
Concretizando esta posição e em anotação ao art. 59º do NRAU os citados autores referem:
“Conjugando todos os preceitos do NRAU que se relacionam com a sucessão das leis durante a vigência dos arrendamentos urbanos, para fins habitacionais e não habitacionais, que subsistam à data da entrada em vigor do NRAU, temos o seguinte quadro:
- é a lei em vigor ao tempo da conclusão do contrato que regula as condições da validade substancial e o potencial dos seus efeitos;
- quanto aos efeitos jurídicos do contrato que se traduzem em situações duradouras, respeitam-se os efeitos já produzidos sob o domínio da lei antiga e os efeitos futuros passam a reger-se:
> pelos preceitos imperativos do NRAU;
> pelos preceitos supletivos do NRAU, mas apenas quando não forem de sentido oposto ao de norma supletiva da lei vigente ao tempo da celebração do contrato, caso em que é esta a norma aplicável;
> pelos preceitos resultantes das normas transitórias do NRAU ( artigos 26º a 58º, 59º/2 ), a saber:
(…) contratos sem duração limitada
- transmissão por morte do arrendatário – contrato para habitação: art. 26º/2, 28º e 57ºdo NRAU; (…)
- denúncia pelo senhorio – arrendamentos para habitação:
> art. 26º/4/5, art. 28º do NRAU;
> art. 1101º a 1104º do CC;
> art. 107º do RAU”. (ob. cit., pag. 111).
No caso concreto, o contrato foi celebrado em 01 de Novembro de 2004, portanto em data anterior à entrada em vigor do novo regime do arrendamento. Contudo, os factos imputados ao inquilino, a título de incumprimento do contrato – falta de pagamento da renda -, ocorrem, pelo menos, a partir de 2007 e desenvolvem-se ao abrigo da nova lei.
O NRAU não veio estabelecer normas transitórias que regulamentam esta matéria.
Desta forma, quanto à natureza das obrigações assumidas pelos contraentes e grau de vinculação, cumpre atender ao novo regime instituído.
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Em tese geral o contrato de arrendamento consiste no contrato através do qual o senhorio cede o gozo temporário de um imóvel a terceiro mediante o pagamento de uma contrapartida mensal (art. 1022º, 1023º CC).
Decorre do disposto no art. 1031º CC, que constituem obrigações do senhorio:
a) a entrega ao locatário da coisa locada;
b) assegurar ao arrendatário o gozo da coisa para os fins a que se destina.
Por sua vez, determina o art. 1038º a) CC que constitui obrigação do inquilino pagar a renda ou aluguer.
A excepção de não cumprimento, cujo regime decorre dos art. 428º a 431º CC, traduz-se no direito que tem qualquer das partes de uma relação sinalagmática de recusar o cumprimento enquanto a outra, por seu turno, não efectue a prestação correspondente a que se encontra vinculada.
A aplicação do instituto no âmbito do contrato de arrendamento suscitou algumas reservas por se poder considerar que o regime da excepção não se conciliava com a disciplina vinculística do arrendamento, em particular com as regras que tendo em vista a protecção do arrendatário fixam taxativamente os fundamentos da resolução e da denúncia do contrato por iniciativa do locador.
Contudo, presentemente, de forma praticamente unânime, a doutrina e a jurisprudência admitem a invocada excepção no domínio do contrato de arrendamento, assumindo particular relevo no sentido de marcar posição sobre a questão o Ac. STJ de 11.09.1984, posteriormente comentado pelo Professor Almeida Costa na Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 119, pag. 137.
Do estudo do Professor Almeida Costa sai reforçada a ideia que a excepção opera sempre que exista correspectividade entre a prestação que o locador ou o locatário pretenda recusar e aquela cuja falta se invoca.
Admite-se, assim, em tese geral, que no caso de privação parcial do gozo da coisa, imputável ao locador, pode o locatário suspender, em medida proporcionada, o pagamento da renda.
Contudo, para accionar o instituto mostra-se necessário que a falta assuma relevo significativo e ainda, que se observe proporcionalidade ou adequação entre essa falta e a recusa do excipiente.
Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quanto se torne necessário para garantir o seu direito.
Como refere o Professor Almeida Costa: “A ideia de proporcionalidade ou equilíbrio das contraprestações, manifesta-se no instituto da redução. (…) Pelo que toca à locação, a mesma directiva aflora a propósito da redução da renda ou do aluguer, se o locatário sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa locada, ou da sua revisão (art. 1040º e art. 12º, 27º/3, 34/1 da Lei 76/77 de 29/09).” (RLJ - Estudo citado)
Desta forma, não se justifica a suspensão integral do pagamento das rendas, quando se verifica uma situação de privação parcial do arrendado, ainda que imputável ao locador, por ser contrária à ideia de proporcionalidade ou equilíbrio das prestações.
Neste sentido decidiu-se em:
- Ac STJ 21.02.2006 – Proc. 05A3593 (www.dgsi.pt)
“… poder-se-á retirar já uma conclusão no sentido de ser admitida a "exceptio", com incidência em suspensão do dever de pagamento da renda, quando a falta de condições de habitabilidade (5) ou apresentar vício que não permita ao prédio realizar cabalmente o fim a que é destinado, se verifique no início da vigência do contrato.
Isto é, a obrigação de entrega "cabal" da coisa, por parte do locador, tem como correspectivo o pagamento da renda, por banda do inquilino.
E, assim, se o senhorio, na decorrência de um contrato de arrendamento, não propicia, por motivo a si imputável, ao inquilino o gozo da coisa, quer por o locado revelar vício que não permita realizar cabalmente o fim a que é destinado, quer por carecer o mesmo de qualidades por si asseguradas, pode o inquilino, invocando a "exceptio" suspender o pagamento das rendas. Ora, considerando a factualidade dada como provada, verifica-se que o locado não foi entregue à inquilina por forma a que este cumprisse o fim a que se destinava - estabelecimento comercial aberto ao público, dispondo de cave e rés do chão, quando era do conhecimento do ora recorrente que a aludida cave não estava imune a infiltração das águas das chuvas, não podendo, consequentemente, aí, exercer a actividade de comércio, já que as referidas infiltrações de água, naturalmente que deterioravam as peças de vestuário aí acondicionadas.
Donde resulta que pode invocar a recorrida a "exceptio" e, sendo a privação parcial do gozo do prédio, imputável ao senhorio, o arrendatário pode suspender o pagamento da renda, sendo certo que conforme se assinalou no Acórdão recorrido: "(...) afigura-se-nos perfeitamente legítima e concordante com os princípios da boa fé a conduta da Ré, que privada do gozo de parte substancial do arrendado, pretendeu, apesar disso, efectuar o pagamento de parte significativa da renda, o que, porém, veio a ser recusado pela locadora. Existindo, como existe, incumprimento parcial por parte da A., a Ré podia, pois, recusar o cumprimento da sua obrigação ao abrigo do disposto no art. 428° n° 1 (...)".”
- Ac. STJ 11.10.2007 – Proc. 07B2934 (www.dgsi.pt)
“Os contratos bilaterais ou sinalagmáticos originam obrigações para ambas as partes, havendo uma relação de reciprocidade e interdependência entre elas.
Na génese do contrato é intenção de cada uma das partes que a obrigação contraída por um deles seja a razão de ser da assumida pelo outro. E, no desenvolvimento da relação obrigacional, é intenção das partes a manutenção dessa correspectividade ou interdependência.
Diz-nos A. Varela(4). que "a obrigação de pagar a renda, imposta ao locatário, faz parte do sinalagma contratual, na medida em que se contrapõe à obrigação fundamental, imposta ao locador, de proporcionar o gozo da coisa".
“O sinalagma, continua o mesmo mestre, liga entre si as prestações essenciais de cada contrato bilateral, mas não todos os deveres de prestação dele nascidos”.
Não basta que o contrato seja bilateral para que se possa invocar a excepção de não cumprimento do contrato; necessário se torna ainda que entre as obrigações haja correspectividade, que uma seja a causa da outra.(5).
É também este o ensinamento de Vaz Serra(6). “a excepção pressupõe que a prestação exigida e a que se invoca para justificar a recusa são correlativas, recíprocas ou correspectivas: deve estar-se em face de prestação e contraprestação, pois só então, por haver correspondência, se justifica que o não cumprimento de uma baseia a recusa da outra”.
Em face desta doutrina, tem-se entendido que no contrato de arrendamento, o pagamento da renda tem como correspectivo a cedência do arrendado e não também a obrigação de fazer obras no arrendado(7)..
De igual forma se tem entendido que aos vícios da coisa não corresponde, no sinalagma do contrato, o pagamento da renda.(8).
No caso dos autos, o batelão para nele funcionar o restaurante foi entregue pela A. à R.
Como correspectivo, impunha-se a esta o pagamento das rendas.
As demais obrigações que o contrato impunha à A., resumidas no trecho do Acórdão acima transcrito “(9)”. não são correspectivas da obrigação de pagar a renda. Por isso, a exceptio invocada, no caso concreto, não opera.
O não cumprimento dessas obrigações, definidos no Acórdão recorrido como “incumprimento definitivo parcial” concediam à R. o direito de resolver o contrato ou de pedir a redução da renda e não o de suspender o seu pagamento.
Como, porém, não usou tal direito e se manteve no uso do bem arrendado, evidente se torna que a decisão recorrida não merece qualquer reparo, designadamente ao reduzir equitativamente a 10% o seu montante.”
- Ac STJ 09.12.2008 – Proc. 08 A 3302 (www.dgsi.pt)
“Na situação ajuizada, valorando os factos apurados à luz das considerações expostas, a Relação ponderou que: “...considerando a factualidade dada como provada, verifica-se que o locado pouco depois de ser entregue foi objecto pela primitiva inquilina de uma demanda judicial da senhoria, para a realização de obras de reparação da placa de tecto, com vista à eliminação de todas as infiltrações de água e humidades e para a redução da renda mensal em 1/3 do seu montante.
Mas não se provou que a actividade de comércio tivesse deixado de aí ser exercida, ou tivesse sofrido uma significativa diminuição, em razão desses vícios, nem então, nem depois, sob a exploração do ora apelante.
Donde resulta que, o arrendatário apenas poderia invocar a “exceptio” pela privação parcial do gozo do prédio, imputável ao senhorio, na forma de suspensão parcial do pagamento da renda, ou pagamento parcial da renda.
Tal redução constitui, no caso, a consequência adequada à falta cometida pela senhoria e concordante com o princípio da boa fé.
Assim, no caso de privação parcial do gozo do prédio ou da existência de vícios, imputáveis ao senhorio, que não comprometam de forma significativa a sua utilização para os fins destinados, o arrendatário tem apenas o direito de suspender o pagamento da parte proporcional da renda.
Tal consequência mostra-se conforme com o preceituado no artº 1040º do CC, alusivo à redução da renda ou aluguer : “Se, por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofrer privação ou diminuição da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta, sem prejuízo do disposto na secção anterior”.
Essa, aliás a opção tomada pela primitiva inquilina na acção supra referida e que veio a ter a sua procedência nos seguintes termos: - “…condenar a ré AA a efectuar obras de reparação da placa do tecto do rés-do-chão do arrendado, com vista a eliminar todas as infiltrações de águas e humidades…. E a ver diminuída a renda mensal na proporção de 1/7 do seu montante, enquanto perdurarem as humidades” – cfr. certidão de fls. 391.
No caso, não é legítima a “exceptio” invocada pelo apelante respeitante à falta de pagamento total das rendas vencidas respeitantes a Fevereiro de 2003 e seguintes.
E, não o sendo, o despejo, com fundamento em tal não pagamento deve proceder”.
Está perfeitamente correcto o julgamento emitido pelo acórdão recorrido, tanto mais que, para além de tudo quanto ali se pôs em relevo, ficou ainda provado que a recorrida pagou oportunamente as despesas determinadas em assembleia de condóminos para as obras de reparação nos estragos na fracção (facto 14).
Deste modo, uma vez que o réu deixou de satisfazer na totalidade a renda devida quando o máximo a que eventualmente teria direito seria, em função de tudo o que antecede, suspender o respectivo pagamento em medida proporcionada à privação parcial do gozo, a conclusão a extrair não pode ser outra senão a de que incorreu em mora, com as inerentes consequências, correctamente decretadas pelas instâncias (resolução do contrato, entrega do arrendado, devoluto, à autora, e condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas).”
- Ac. STJ 10.09.2009 – Proc. 375/1999. C1.S1 (www.dgsi.pt)
“Da factualidade dada como assente, decorre, com interesse imediato, que o gozo do terreno objecto do contrato foi cedido à locatária para que ali instalasse oficinas mecânicas de serralharia civil, carpintaria, oficina de mecânica e reparação de veículos automóveis, estaleiro e local de arrumo de viaturas, existindo já nesse terreno instalada uma oficina de carpintaria e serralharia, passando a locatária a explorá-la.
Acresce que a locatária reconstruiu um pavilhão com cerca de 500 m2 de área coberta, já existente no arrendado, passando desde então a nele construir e reparar carroçarias para si e para terceiros e a montá-las, sempre podendo o arrendado ser utilizado como estaleiro e local de arrumo de viaturas.
E a locatária sempre pagou o montante da renda acordada desde o início do contrato, 30 de Outubro de 1996, até Abril de 1999, só então exigindo a redução do seu montante, que entendeu dever ser fixada em 10.000$00. Mas posteriormente procedeu ao pagamento integral da renda, sem qualquer redução.
Os locadores apenas se comprometeram a assinar os requerimentos que necessários fossem para realização das obras a levar a efeito no locado, não garantindo a possibilidade efectiva de serem realizadas e posteriormente licenciadas. A garantia deste licenciamento não era uma obrigação a que os locadores estivessem vinculados. Estes cederam à locatária o gozo do prédio para os fins apontados e, a partir desse momento, recaía sobre esta o correspectivo dever de pagamento da renda.
O licenciamento dessas obras não era correlativo da obrigação de pagamento da renda. E não havendo correspondência entre aquela prestação e esta contraprestação, o não licenciamento não justificava a recusa de pagamento integral da renda, isto é, a exceptio não podia operar nesta situação concreta.
Para além disso, não obstante o pavilhão reconstruído não poder ser licenciado por integrar zona agrícola e florestal, a verdade é que a locatária fruiu em pleno o locado, dele retirando as vantagens ou grande parte das vantagens que constavam do contrato. Efectivamente, explorou a oficina de carpintaria e serralharia já nele montada e no pavilhão reconstruído passou a construir, reparar e montar carroçarias, tendo ainda o terreno aptidão para ser utilizado como estaleiro e local de arrumo de viaturas.
E importa frisar que não vem demonstrado, por nem sequer ter sido alegado, que o não licenciamento das obras tivesse assumido qualquer importância impeditiva do cabal desenvolvimento da actividade contratualmente prevista para o locado. Antes pelo contrário, a locatária, enquanto durou o contrato, fruiu todas as utilidades a que se propusera e, ao longo de quase três anos de duração do contrato, não considerou essa impossibilidade de licenciamento das obras relevante, tendo procedido, sem reclamação, ao pagamento integral do montante da renda estipulado.
Não chegando a haver privação parcial do gozo do locado, não se justifica, desde logo, a pretendida redução da renda. Por outro lado, o facto da locatária ter fruído plenamente o locado e pagar ainda a renda estipulada, ao vir agora invocar a impossibilidade de licenciamento das obras para conseguir uma redução dessa renda sempre estaria claramente a exorbitar do exercício deste direito, excedendo os limites impostos pela boa fé, o que neutralizaria o exercício desse direito subjectivo, em conformidade com o disposto no art. 334º C.Civil.”
No caso presente apurou-se que em 01.11.2004 os Autores deram de arrendamento à Ré a fracção “D” do edifício sito na ………., nº …., ………., Vila Nova de Gaia, mediante o pagamento da contrapartida mensal de € 617,36, que por efeito da actualização legal ascendia na data da instauração da acção ao montante de € 667,00 (alínea A)).
A Ré não pagou as rendas referentes aos meses de Setembro de 2007 e seguintes (alínea B)).
Apurou-se, ainda, que existe infiltração de água num dos gabinetes da fracção virado para a ………., com a área de cerca de 17,50 m2 ocupado pelo Réu E………., detectada pelo menos em 19.12.2007 (alínea D) e ponto 1).
O local arrendado tem a área coberta de 146 m2 (alínea T)).
A infiltração de água fazia correr água para a fracção de forma contínua (ponto 3.º).
A referida infiltração de água provocou a queda de tinta e argamassa de gesso no chão do gabinete, existindo água no chão do mesmo provinda de tal infiltração (ponto 4.º e 5.º), tendo a infiltração alastrado ao tecto do corredor central anexo ao referido gabinete (ponto 8.º), ficando o armário com humidade e mofo com resmas de papel de carta e capas estragadas (ponto 9.º) e tendo parte do pavimento flutuante que reveste o chão do gabinete inchado e levantado (ponto 16.º), sendo que parte da madeira que reveste o gabinete sempre mencionado se deteriorou (ponto 17.º).
O referido gabinete também se destinava a ser usado como local de realização de reuniões nomeadamente com clientes da Ré «B………. …» (ponto 6.º).
A Ré «B………. …» entendeu não ter condições para usar tal gabinete, face ao estado em que se encontrava por efeito das infiltrações (ponto 7.º), sendo o corredor utilizado para trabalhos de secretariado (ponto 10.º).
Após o inicio da infiltração, o gabinete em questão foi desocupado de pessoas e de equipamento (alínea H)).
Apurou-se de igual forma, que a infiltração tem origem na casa de banho da fracção “F”, situada por cima da fracção “D” (ponto 27 ).
Da conjugação dos factos resulta que os Réus não lograram provar que a infiltração de água detectada num dos escritórios da fracção impediu a ocupação da fracção arrendada para o fim que consta no contrato – instalação de escritórios.
Desta forma, a Ré arrendatária mantinha a obrigação de proceder ao pagamento da renda, uma vez que ocupava o local arrendado, usando e fruindo as suas disponibilidades. A suspensão do pagamento integral da renda não se mostra proporcional, nem adequada à privação de parte do local arrendado, pelo que não se encontram preenchidos os pressupostos para fazer actuar a excepção de não cumprimento. Com efeito, o espaço afectado corresponde a cerca de 10% da área total coberta da fracção arrendada.
Acresce referir que no decurso das diligências desenvolvidas pela Ré (alíneas F), G), J), M), N), O), P), R), S)) que culminaram com a resolução do contrato, em momento algum propôs a redução da renda, sendo certo que a recusa de pagamento da renda não se mostrava adequada para garantir a satisfação do seu direito.
Aliás, apurou-se que os factos que determinam a limitação no uso do local arrendado vêm a ocorrer em momento ulterior à suspensão do pagamento, já que a infiltração num dos gabinetes é detectada em 19.12.2007 e a cessação do pagamento reporta-se a Agosto de 2007.
De igual forma, não se justifica a suspensão do pagamento das rendas face à necessidade de obras no locado, por a obrigação de efectuar estas não se contrapor à obrigação de pagar a renda. Falta aqui a necessária correspectividade das obrigações, para se invocar a excepção de não cumprimento.
Por outro lado, constata-se que a infiltração de água num dos gabinetes da fracção resulta de facto não imputável ao senhorio, não sendo o senhorio responsável por actos de terceiro, pelo que não estava obrigado a realizar as obras de reparação.
O facto do senhorio manifestar interesse em resolver o problema, deslocando-se ao local e mantendo contactos com o inquilino e o proprietário da outra fracção, apenas revela zelo e diligência no sentido de assumir as suas responsabilidades, mas não significa que assumiu, no caso, os prejuízos causados na fracção, por acto de terceiros.
Cumpre também referir, atenta a alegação genérica no ponto 5 das conclusões de recurso, que a resolução do contrato por iniciativa da Ré, não se questionou no âmbito dos autos, sendo certo que o senhorio aceitou a atitude da Ré.
Desta forma, porque o tribunal de recurso apenas tem por função reapreciar as decisões e porque esta matéria constitui uma questão nova que não foi suscitada nos articulados, não se conhece da mesma.
Conclui-se, assim, que não se mostra justificada a suspensão da obrigação de pagamento integral da renda, no período compreendido entre Agosto de 2007 e Junho de 2008 (data da cessação do contrato, por resolução do inquilino).
Refira-se a este respeito que conforme resulta das conclusões de recurso, os Réus delimitaram o objecto do recurso à reapreciação da decisão na parte em que se pronunciou sobre a excepção do não cumprimento, pelo que, não cumpre apreciar dos demais fundamentos da decisão, a respeito das quantias devidas pelos Réus, nomeadamente quanto à data a partir da qual cessa a obrigação de pagar a renda e a Ré entra em mora em relação à obrigação de entrega do local arrendado.
Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob os pontos 1, 2, 3, 4, 5, 6.
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- Da limitação ou privação, ainda que parcial, do gozo da fracção, não imputável ao locador e o direito de indemnização, sob a forma de redução do montante da renda -
Os recorrentes consideram que a não se entender que a excepção pudesse ser usada na totalidade deveria ser acautelado o direito dos apelantes de redução proporcional da renda.
Os apelantes referem que as infiltrações de água são imputáveis ao senhorio, mas mesmo que assim, não se entenda ao abrigo do regime previsto no art. 1040º/2 CC assistia ao arrendatário o direito à redução da renda, não aceitando os recorrentes o critério a que se atendeu na sentença para que se reconhecesse à Ré esse direito.
Concluem que, nesta parte, deveria ser dado como procedente o pedido reconvencional dos apelantes.
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Analisando.
Como já se referiu, no contrato de arrendamento, recai sobre o senhorio a obrigação de assegurar ao inquilino o gozo da coisa para os fins a que se destina.
Esta última obrigação desdobra-se por sua vez numa obrigação de conteúdo positivo, na medida em que o senhorio tem a obrigação de manutenção da coisa, ou seja, efectuar as reparações necessárias para que o gozo do arrendatário não seja afectado, e ainda, numa obrigação de conteúdo negativo, pois deve abster-se de actos que impeçam ou diminuam o gozo da coisa pelo locatário (Pereira Coelho “Arrendamento”, pag. 129, Aragão Seia “Arrendamento Urbano, pag. 60, Pinto Furtado “Manual do Arrendamento Urbano”, pag. 32).
Contudo, o senhorio não é obrigado a assegurar ao inquilino o gozo do prédio contra actos de terceiros, conforme decorre do disposto no art. 1037º/ 1CC.
Por outro lado, no que concerne à responsabilidade do locador pelos vícios da coisa, a lei distingue consoante os mesmos se reportam ao momento da entrega ou a data posterior, sendo certo que apenas merecem relevo, de acordo com o art. 1032º CC, considerando-se o contrato não cumprido, o vício que não permita realizar cabalmente o fim a que a coisa é destinada e o facto de carecer de qualidades necessárias a esse fim ou asseguradas pelo locador.
Contudo, como esclarece Pereira Coelho, a respeito da interpretação do preceito, tratando-se de vícios anteriores ou contemporâneos à data da entrega da coisa “a lei presume que o locador conhecia o defeito, pelo que a sua responsabilidade só fica excluída se provar que o desconhecia sem culpa; pelo contrário, os defeitos posteriores à entrega da coisa só responsabilizam o locador se o locatário provar que o vício surgiu por culpa daquele.” (Arrendamento, pag. 128 e no mesmo sentido Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 384).
Portanto, tratando-se de vício posterior à entrega e não logrando o inquilino provar a culpa do locador considera-se cumprido o contrato e nessa medida, não assiste ao locatário o direito de exigir indemnização pelos prejuízos sofridos, ou a reparação dos danos.
Salienta, porém, o Professor Pires de Lima e Antunes Varela, em anotação ao preceito: “… o facto de o contrato se considerar cumprido e carecer o locatário de qualquer direito de indemnização contra o locador, não obsta a que ele possa reclamar redução da renda, nos termos do art. 1040º, nem a que possa resolver o contrato, se o defeito da coisa assumir a gravidade prevista na alínea b) do art. 1050º do CC” (Código Civil Anotado, vol. II, pag. 384).
Com efeito, determina o art. 1040º CC:
“1. Se, por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta, sem prejuízo do disposto na secção anterior.
2. Mas, se a privação ou diminuição não for imputável ao locador nem aos seus familiares, a redução só terá lugar no caso de uma ou outra exceder um sexto da duração do contrato.”
Como se refere no estudo de Laurinda Gemas, Albertina Pedroso e Caldeira Jorge em anotação à disposição legal: “o preceito encontra o seu fundamento no carácter sinalagmático do contrato, visando equilibrar as prestações devidas por cada um dos contraentes, salientando a sua reciprocidade e interdependência.” (Arrendamernto Urbano” pag. 60)
Resulta da análise deste preceito que a privação ou diminuição do gozo da coisa locada imputável ao locador ou aos seus familiares concede ao arrendatário o direito à redução da renda proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta.
Contudo, se não for imputável a nenhum destes, só há direito à redução quando a privação ou diminuição exceda um sexto da duração do contrato.
Na interpretação da expressão “um sexto da duração do contrato” mostram-se relevantes os argumentos expostos no Ac. STJ 14.11.1996 (BMJ 461, pag. 441), quando refere que a expressão “duração do contrato” surge em diversas disposições do regime do arrendamento, retratado no Código Civil e “todas estas expressões aparecem-nos com o sentido de duração inicialmente previsto para o contrato, não estando em causa o período que efectivamente o contrato vier a durar, por efeito de sucessivas renovações.”
Analisando a razão de ser do instituto, refere-se que: “O prejuízo efectivamente sofrido pelo arrendatário (ou pelo locatário) não tem de ser medido em função da duração do período em que ele já vem ocupando o prédio por força do contrato. Parece-nos evidente que a redução da renda só se justifica pelo prejuízo que a privação do prédio locado acarreta para o locatário, e esse prejuízo, no caso de o locador não ter tido culpa nessa privação, tem a ver com o prazo convencionado ou fixado na lei para a duração do contrato, isto é, com o período de vigência que se espera ele venha a ter, independentemente das suas eventuais renovações.
(…) Em regra, o tempo que o contrato já durou é um factor anódino na ponderação do prejuízo a atender para o efeito da redução da renda.
Consequentemente, a expressão “duração do contrato” usada no art. 1040º/2 CC tem o significado de prazo (estipulado ou estabelecido, supletivamente, por lei) porque, em princípio, o contrato deve manter-se, independentemente de eventuais renovações.”
Entendemos, nós, que face aos fundamentos do preceito, o prazo previsto tem associada a ideia de gravidade na privação ou diminuição do gozo do local arrendado, que justifica a quebra dos vínculos do contrato e por isso, o critério a atender deve ser uniforme, independentemente do prazo efectivo de duração do contrato.
Retomando a apreciação dos factos em concreto, resulta da sua análise, como já se referiu, que a privação do uso de parte da fracção arrendada, não resulta de facto imputável ao senhorio.
Contudo, por efeito, do regime previsto no art. 1040º/2 CC, assiste ao arrendatário – recorrente – o direito à redução da renda, porque se verifica que a privação parcial do local arrendado excede um sexto do prazo convencionado para a duração do contrato.
O contrato em causa foi celebrado em 01.11.2004, pelo período de um ano.
A infiltração num dos gabinetes da fracção, com a área de 17,50 m2 é detectada em 19.12.2007 (alínea D), quesito 1º).
Em 22.07.2008 no tecto do gabinete é visível o cimento da placa em alguns espaços e a água acumula-se no chão (alínea L))
Em 08.06.2008 operou-se a cessação do contrato, por resolução do arrendatário (alínea P)).
O local arrendado tem a área coberta de 146 m2 (alínea T)).
A infiltração de água fazia correr água para a fracção de forma contínua (ponto 3.º).
A referida infiltração de água provocou a queda de tinta e argamassa de gesso no chão do gabinete, existindo água no chão do mesmo provinda de tal infiltração (ponto 4.º e 5.º), tendo a infiltração alastrado ao tecto do corredor central anexo ao referido gabinete (ponto 8.º), ficando o armário com humidade e mofo com resmas de papel de carta e capas estragadas (ponto 9.º) e tendo parte do pavimento flutuante que reveste o chão do gabinete inchado e levantado (ponto 16.º), sendo que parte da madeira que reveste o gabinete sempre mencionado se deteriorou (ponto 17.º).
O referido gabinete também se destinava a ser usado como local de realização de reuniões, nomeadamente, com clientes da Ré «B………. …» (ponto 6.º).
A Ré «B………. …» entendeu não ter condições para usar tal gabinete, face ao estado em que se encontrava por efeito das infiltrações (ponto 7.º), sendo o corredor utilizado para trabalhos de secretariado (ponto 10.º).
Após o inicio da infiltração, o gabinete em questão foi desocupado de pessoas e de equipamento (alínea H)).
A Ré «B……….…» colocou baldes no chão para evitar que a água provinda da infiltração sempre referida deteriorasse a madeira (ponto 13.º).
Tal gabinete tinha de ser limpo devido à sujidade provocada pela infiltração e consequente queda de estuque (ponto 14.º) sendo tal limpeza mais necessária após períodos de encerramento do gabinete (ponto 15.º).
Da conjugação dos factos resulta que a infiltração de água prolongou-se por um período superior a dois meses, ou seja, por um período superior a um sexto da duração do contrato, pois o prazo do contrato é de um ano e tendo-se detectado a infiltração em Dezembro de 2007, verifica-se que Julho de 2008 ainda existe água acumulada no chão e é visível o cimento da placa.
Neste âmbito e pelos motivos já expostos, não se acolhe a posição defendida na sentença, no sentido de considerar que o período de “duração do contrato” corresponde ao período de duração efectiva do mesmo.
Conclui-se, pois, que assiste ao arrendatário o direito à redução da renda, a qual deve ser calculada de forma proporcional à privação do arrendado e duração da mesma.
De acordo com um juízo de equidade e ponderando os factos provados, nomeadamente, a área coberta da fracção, a área do gabinete que deixou de ser utilizada, a renda praticada à data da instauração da acção e o período de tempo em que o arrendatário ficou privado de parte do local arrendado (Dezembro de 2007 a Junho de 2008), atribuindo o valor locativo de € 77,00 (setenta e sete euro) ao gabinete mostra-se proporcional e adequado fixar a redução da renda no valor global de € 462,00 (quatrocentos e sessenta e dois euro).
Não se atende para o efeito ao valor calculado pelos recorrentes - € 2.710,44 -, pois na operação realizada consideraram o período de Setembro de 2005 a Julho de 2008 e conforme resulta dos factos provados, a infiltração apenas é detectada a partir de Dezembro de 2007 e a cessação do contrato ocorre em Junho de 2008.
Do exposto conclui-se que, nesta parte e quanto ás conclusões formuladas sob os pontos 7 a 13, o recurso merece parcial provimento e nessa conformidade, reconhece-se que assiste aos Réus o direito a uma redução, no montante das rendas devidas no período compreendido entre Dezembro de 2007 e Junho de 2008, no valor de € 462,00 (quatrocentos e sessenta e dois euro).
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Nos termos do art. 446º CPC as custas da acção e reconvenção são suportadas por Autores e Réus, na proporção do decaimento e em ambas as instâncias, pela seguinte forma:
- da acção, a cargo de Autores e Réus, na proporção do decaimento.
- da reconvenção, a cargo dos recorrentes (Réus) e recorridos (Autores), na proporção do decaimento, ou seja, 7/8 e 1/8, respectivamente.
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III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e conceder em parte provimento ao recurso, revogando-se, consequentemente, a decisão na parte em que julgou totalmente improcedente o pedido reconvencional.
Nessa conformidade, confirma-se a sentença quanto aos fundamentos do pedido e julga-se parcialmente procedente o pedido reconvencional e reconhece-se que assiste aos Réus o direito a uma redução, no montante das rendas devidas no período compreendido entre Dezembro de 2007 e Junho de 2008, no valor de € 462,00 (quatrocentos e sessenta e dois euro), confirmando-se quanto ao mais o teor da sentença recorrida.
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Custas, em ambas as instâncias:
- da acção a cargo de Autores e Réus, na proporção do decaimento.
- da reconvenção, a cargo dos recorrentes (Réus) e recorridos (Autores), na proporção do decaimento, ou seja, 7/8 e 1/8, respectivamente.
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Porto, 20 de Setembro de 2010
(processei e revi – art. 138º/5 CPC)
Ana Paula Pereira de Amorim
José Alfredo de Vasconcelos Soares de Oliveira
António Manuel Mendes Coelho
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SUMÁRIO (art. 713°/7 CPC):
I. No contrato de arrendamento no caso de privação parcial do gozo da coisa, imputável ao locador, pode o locatário suspender, em medida proporcionada, o pagamento da renda, ao abrigo do regime da excepção do não cumprimento
II. Contudo, para accionar o instituto mostra-se necessário que a falta assuma relevo significativo e ainda, que se observe proporcionalidade ou adequação entre essa falta e a recusa do excipiente. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quanto se torne necessário para garantir o seu direito.
III. No regime previsto no art. 1040º/2 CC o prejuízo efectivamente sofrido pelo arrendatário (ou pelo locatário) não tem de ser medido em função da duração do período em que ele já vem ocupando o prédio por força do contrato. A redução da renda só se justifica pelo prejuízo que a privação do prédio locado acarreta para o locatário, e esse prejuízo, no caso de o locador não ter tido culpa nessa privação, tem a ver com o prazo convencionado ou fixado na lei para a duração do contrato, isto é, com o período de vigência que se espera ele venha a ter, independentemente das suas eventuais renovações.
IV. A expressão “duração do contrato” usada no art. 1040º/2 CC tem o significado de prazo (estipulado ou estabelecido, supletivamente, por lei) porque, em princípio, o contrato deve manter-se, independentemente de eventuais renovações.”