Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
Sumário
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
"A" intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa acção declarativa com processo ordinário, contra "B, S.A.", pedindo a condenação da Ré, no pagamento das seguintes quantias:
a) Retribuições que deixou de auferir desde 31 de Março de 1994 com as deduções do artº. 13º, do DL 64-A/89, de 27/2;
b) Indemnização por despedimento;
c) 58.464,43 dólares americanos por não actualização do seu salário;
d) 36.979,00 dólares americanos de juros vencidos sobre a quantia de 58.464,43, bem como juros vincendos à taxa de 15%;
e) Despesas com o transporte aéreo ou marítimo do recheio da sua casa e dos seus bens pessoais, até ao limite, respectivamente, de 1.000 quilos e 2.500 quilos;
f) Despesas com a viagem aérea de regresso definitivo a Portugal do filho nos termos do ponto 11.2 do contrato firmado.
Essencialmente, sustenta a sua pretensão nos seguintes factos:
Celebração do contrato de trabalho com a Ré, inicialmente pelo prazo de dois anos que, posteriormente e por efeitos das respectivas renovações, se converteu em contrato sem prazo;
Cessação do contrato levada a cabo pela ré através de carta que lhe foi dirigida, com efeitos a partir de 31 de Março de 1994;
Não cumprimento das condições firmadas no âmbito do contrato, designadamente a actualização da respectiva retribuição, pagamento do transporte do recheio da casa e bens e custo de viagem do filho quando o mesmo regressou definitivamente a Portugal.
Contestou a Ré pugnando pela improcedência total da acção, defendendo, fundamentalmente:
Ter o contrato de trabalho celebrado com o Autor sido antecedido de um contrato de prestação de serviços;
Encontrarem-se todas as condições acordadas expressas no contrato;
Ser aplicável ao contrato a legislação Moçambicana que não dispõe de limitação à renovação sucessiva dos contratos a prazo;
Ter o contrato de trabalho cessado por acordo das partes.
Prosseguindo os autos seus regulares termos, após audiência da discussão e julgamento e dadas as respostas aos quesitos, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao Autor: o montante das retribuições que este deixou de auferir no período entre 26 de Agosto de 1994 e a data da sentença, incluindo férias, subsídio de férias e de Natal, a liquidar em execução de sentença, descontando o valor global de 4.580.809 escudos; indemnização de antiguidade pelo despedimento ilícito, a liquidar em execução de sentença; 58.464,43 dólares americanos, relativos a actualizações de salário; juros de mora sobre as referidas actualizações desde a data do vencimento de cada uma das retribuições em dívida até efectivo pagamento, à taxa de 15% até 30 de Setembro de 1995 e de 10% após esta data. No mais que estava pedido foi a Ré absolvida.
Decidindo da apelação interposta pela Ré, a Relação de Lisboa concedeu parcial provimento ao recurso, tendo revogado a sentença na parte em que condenou a Ré na quantia de 58.464,43 dólares americanos relativa à actualização da retribuição, mantendo-a no mais, aplicando contudo a taxa de juros legal fixada pela legislação americana, a liquidar em execução de sentença.
Inconformadas, ambas as partes recorreram da revista.
Na sua douta alegação formula a Ré as seguintes conclusões:
a) Está assente nos autos que ambas as partes assinaram os acordos constantes de folhas 8 e 9 e 10 a 12.
b) Tais acordos consubstanciam, a partir da data do segundo - 30 de Julho de 1990 - um contrato de trabalho a termo certo.
c) Com base em prova testemunhal foi quesitada, em sede de audiência de discussão e julgamento, a matéria constante do quesito 6º cfr. fls. 193 dos autos, - a que foi dada resposta afirmativa conforme consta de fls. 200 dos autos.
d) Tal matéria, porém, não podia ser dada como provada com base no depoimento de testemunhas, já que, a isso se opõe o artº. 42º, nº. 1 do Dec. Lei nº. 64-A/89, sob pena de se violarem, como se violaram as disposições dos artºs. 238º, nº. 1, 393º, nº. 1 e 394º, nº. 1, do Código Civil por outro lado,
e) Os factos referidos em 11-4, que estão sobejamente provados nos autos - dá-se aqui por reproduzido naquele ponto - inculcam, com suficiente certeza, que as partes, sempre tiveram como pressuposto à aplicação ou desenvolvimento, execução e cessação do contrato a lei vigente na República Popular de Moçambique.
f) Que, aliás, avoca a ré a resolução do problema, nos termos referidos no art. 1 da lei 8/85.
Mas, mesmo que de outra forma fosse entendido, isto é, se se entendesse que as partes nem sequer se configuraram a lei que seria aplicável ao desenvolvimento e cessação do contrato.
g) Sempre a este não seriam aplicáveis as disposições do artigo 41º e 42º do Código Civil Português.
h) Por a tal se oporem os princípios de direito internacional público, que o estado português tem que respeitar na ordem internacional.
i) O elemento de conexão essencial é, pois, no caso do contrato de trabalho, o local onde a prestação característica é executada.
Assim sendo:
j) Porque, na actualidade, o contrato de trabalho - mormente em Moçambique, como se pode verificar da simples leitura da lei 8/85 em vigor naquele País - está impugnado em grande parte dos seus elementos e cláusulas, por elementos de ordem pública.
l) É a "Lex Loci executionis" que deverá reger o contrato de trabalho, isto, no respeito que Portugal deve à soberania de outros países, mormente os de língua Portuguesa, nos termos do disposto nos artºs. 7º, nº. 1, 113º da Constituição da República Portuguesa. De resto,
m) Estando o contrato de trabalho sujeito à lei em vigor na República de Moçambique como estava, a cessação do mesmo ocorreu de forma legal.
n) O máximo que o Autor poderia exigir era a quantia referente às retribuições correspondentes aos meses de Março de 1994 a 18 de Fevereiro de 1995. Mas a verdade é que,
o) Nem a tal quantia o Autor tem direito, uma vez que as cartas constantes de fls. 13 a 15 consubstanciam, tanto segundo a lei Moçambicana como segundo a lei Portuguesa, uma revogação do contrato por mútuo acordo.
p) Isto, sob pena de se entender que o Autor actuou com reserva mental, o que consubstanciaria um inadmissível abuso do direito que lhe não pode aproveitar.
q) O douto acórdão recorrido violou, pois, nesse aspecto, o disposto nos artºs. 9º, nº. 1, e 11º ou no artº. 33º, nº. 1, alínea d) da referida lei 8/85 em vigor em Moçambique.
Em contra-alegação, o Autor defende a improcedência da revista da ré sublinhando ser a lei portuguesa aplicável ao contrato de trabalho celebrado, que não poderia ser a lei moçambicana aplicável por ofender princípios fundamentais de ordem pública, já que aquela, ao contrário da lei portuguesa e atento o disposto nos artºs. 58º e 59º da CRP, permite a livre rescisão do contrato por parte do empregador, e não existia qualquer acordo de cessação do contrato de trabalho, sabendo-se que a revogação do contrato exige, segundo o art. 8, da LCCT, documento escrito assinado por ambas as partes.
Por sua vez, o Autor remata a sua douta alegação de recurso, nos seguintes termos:
1) Os pontos do acórdão de que se recorre são os relativos aos quesitos 1, 2 e 3, e respectivas respostas, e à taxa aplicável dos juros de mora;
2) Na audiência de discussão e julgamento foram ouvidas testemunhas aos quesitos 1, 2 e 3 do questionário;
3) A ora - recorrida nada requereu nem se pronunciou sobre essa inquirição;
4) Assim, mesmo que nulidade houvesse, teria ela ficado sanada;
5) Mas mesmo que assim não fosse, afigura-se que o Acórdão, nesta questão, decidiu mal;
6) Na verdade, os quesitos 1, 2 e 3, e as respectivas respostas, não tiveram em vista provar qualquer cláusula contrária ou adicional ao contrato escrito de trabalho entre as partes, antes,
7) Se procurou e conseguiu - tão-só interpretar esse mesmo contrato - o que é perfeitamente legal nos termos do nº. 3 do artº. 393º do C.Civil;
8) Neste sentido, a Doutrina e Jurisprudência citadas nos itens 12, 13, 14, 15 e 16 do corpo das presentes alegações;
9) De resto, as alterações ao contrato de trabalho a termo não têm de ser reduzidas a escrito - nada na lei o obriga e em Direito laboral a regra é a do consensualismo, razão por que.
10) Não se aplica a essas alterações, nomeadamente às actualizações salariais, o artº. 394º do C.Civil;
11) As alterações ao contrato de trabalho a termo, nomeadamente os aumentos salariais, são normalmente verbais e produzem efeitos jurídicos;
12) E neste sentido a lição do Prof. Meneses Cordeiro referida no item 26 destas alegações;
13) Acresce ainda que as respostas aos quesitos 1, 2 e 3 foram - e são - fundamentadas por documentos juntos aos autos, designadamente pela correspondência trocada entre o recorrente e o ex-Presidente do Conselho da Administração da recorrida;
14) Por outro lado, o Acórdão recorrido adopta uma visão formalista e não actualista dos preceitos legais aplicáveis - afirmação que se faz com a ressalva do muito respeito e consideração que merecem os Senhores Desembargadores subscritores do aresto em causa;
15) Efectivamente, parece não se ter atentado na especificidade do contrato de trabalho, em geral, e do caso concreto, em particular;
16) Todos os dias e por razões de vária ordem (inflação, aumento de produtividade, subida de categoria, reposição do poder de compra, etc) são aumentadas as remunerações de trabalhadores, por ordem e instruções verbais, raramente reduzidas a escrito;
17) Aumentos que produzem efeitos jurídicos e podem ser provados em Tribunal, por testemunhas;
18) Também não colhe o argumento aduzida do item 3.1.1 do acórdão já que,
19) Por outro lado, não se provou que outros trabalhadores da Ré não recebessem também em dólares além de que,
20) A priori, não se sabia se as flutuações cambiais valorizariam ou desvalorizariam o dólar;
21) Em suma, neste processo (questão atinente às respostas dadas aos quesitos 1, 2 e 3) deve o acórdão ser revogado e substituído por decisão que julgue válida, para todos os legais efeitos, as referidas respostas, com a subsequente condenação da recorrida a pagar ao ora - alegante a quantia de 58.464,43 dólares a título de actualização da remuneração;
22) Foram violadas as normas insítas nos artºs. 221º, 341º, 376º, 392º, 393º e 394º, nº. 1, do Código de Processo Civil, e artigos 512º, nº. 1, 513º, 515º e 646º, nº. 4. do Código de Processo Civil.
23) Salvo o devido respeito, a questão da taxa dos juros moratórios foi mal decidida e deverá ser alterada;
24) É, aliás, indiferente saber se o Autor - recorrente "ganhou ou perdeu" por receber em dólares já que,
25) O Tribunal julga nos termos da lei e não segundo regras de equidade;
26) A Jurisprudência não está com a tese sufragada no acórdão como aí se reconhece;
27) Por isso, invocam-se os acórdãos referenciados no item 39 do corpo destas alegações;
28) Também aquele a que se alude no item 40;
29) A favor da tese que se defende está também a opinião do Prof. Meneses Cordeiro (Revista de Direito e Estudos Sociais de Janeiro - Março de 1988, Ano XXX, III da 2ª Série, nº. 1, páginas 69 seguintes);
30) Por outro lado, dir-se-á que o dólar funcionou apenas como moeda de referência (é hoje a mais internacional de todas as moedas) tanto mais,
31) Que parte do ordenado do recorrente era pago em meticais, devidamente convertidos;
32) Os Estados Unidos da América é que não têm nada a ver com o contrato;
33) Sendo assim, este passo do acórdão deve ser revogado e substituído por decisão que mande aplicar a taxa de juros fixada na Lei Portuguesa;
34) O aresto sob crítica violou as regras ínsitas nos artºs. 804º, 805º, 806º e 553º, todos do Código Civil, e nas Portarias nº. 339/87, de 29 de Abril, nº. 1171/95, de 25 de Setembro e nº. 263/99, de 12 de Abril.
Contra-alegou a Ré em defesa da improcedência do recurso do Autor dizendo, fundamentalmente:
A lei exige que, do contrato de trabalho a termo, para o qual exige a forma escrita, consta, entre outros elementos, a retribuição acordada.
É evidente que sempre que se verificar alteração de qualquer um dos elementos que devem constar do documento para que o contrato seja válido tal alteração apenas é válida se for feita por escrito.
As cartas constantes dos autos com que o recorrente pretende ver provadas as actualizações de remuneração não são documentos assinados pelas partes, antes de terminar que não suprem a exigência de forma escrita para o acto consubstanciado no contrato de trabalho a termo;
Estando em presença de obrigações valutárias, encontrando-se a retribuição acordada através do pagamento em dólares americanos, uma vez que o Autor nada alegou a respeito dos danos moratórios correspondentes, presume-se que os danos do não cumprimento da obrigação seria a taxa que ele podia obter nos EU em juros.
Neste Supremo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de ambas as revistas serem negadas.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
A matéria de facto apurada na 1ª. Instância foi o seguinte:
a) Em Agosto de 1970, o Autor que era funcionário público com a categoria de geofísico, seguiu para Moçambique onde passou a trabalhar na Direcção de Geologia e Minas, também leccionando na Faculdade de Ciências de Lourenço Marques (alínea a) da Esp.).
b) à data da independência, isto é, em Junho de 1975, o Autor celebrou um contrato de serviços com o Estado de Moçambique (alínea b) da Esp.).
c) Passou depois a cooperante e, em 1990, quando se preparava para regressar definitivamente a Portugal foi convidado pela Ré para trabalhar em Moçambique (alínea c) da Esp.).
d) Em 20 de Abril de 1990 Autor e Ré celebraram o acordo constante do doc. de folhas 8 e 9 cujo teor aqui dou por reproduzido (alínea d) da Esp.).
e) Posteriormente, em 30 de Julho de 1990, Autor e Ré celebraram o acordo de folhas 10 e 11 cujo teor aqui dou por reproduzido, igualmente (alínea E) da Esp.).
f) O Autor recebeu da Ré, com efeito a partir de 18 de Fevereiro de 1990 a remuneração mensal de 6.000 dólares, livre de impostos (alínea f) da Esp.).
g) Em 21 de Dezembro de 1993 foi entregue pessoalmente pela Ré ao Autor a carta de folhas 13 (alínea g) da Esp.).
h) O autor enviou em 25 de Março de 1994 à Ré o fax documentado a folhas 14 cujo teor aqui dou por reproduzido (alínea h) da Esp.).
i) A esse fax respondeu a Ré com o fax de folhas 15 cujo teor aqui dou por reproduzido (alínea i) da Esp.).
j) O Autor considerou o contrato rescindido pela Ré a partir de 31 de Março de 1994 (alínea j) da Esp.).
l) O autor é "aposentado" no Quadro dos Excedentes da Função Pública (alínea l) da Esp.).
m) Por essa razão o Autor recebeu em Abril de 1994 o ordenado de 286.400 escudos (alínea m) da Esp.).
n) Nos meses de Maio, Junho, Julho, Agosto e Setembro de 94 o Autor recebeu e receberá 238.667 escudos (alínea n) da Esp.).
o) Depois de Outubro de 1994 o Autor receberá 200.480 escudos mensais (alínea o) da Esp.).
p) Em 1991 os empregados da Ré foram aumentados desde Janeiro, ou, pelo menos, com efeitos retroagidos a Janeiro desse ano, na proporção de 11% (alínea p) da Esp.).
q) Em 1992 o aumento dos empregados da Ré foi de 10,36% (alínea q) da Esp.).
r) Em 1993 a percentagem de aumento dos empregados da Ré foi de 6% (alínea r) da Esp.).
s) Em 1994 o aumento dos empregados da Ré foi de 3,90% (alínea s) da Esp.).
t) O autor ainda não procedeu ao transporte do recheio da sua casa e dos seus bens (alínea t) da Esp.).
u) A Ré tem sede em Lisboa (alínea u) da Esp.).
v) De acordo com a certidão de registo comercial de folhas 33 e seguintes cujo teor aqui dou por reproduzido a Ré obriga-se: a) pela assinatura de um administrador a quem tinham sido delegados poderes de representação gerais ou especiais; b) pela assinatura de dois administradores; c) pela assinatura de um administrador e um procurador a quem, nesses termos, tinha sido conferida procuração; d) pela assinatura de um procurador com poderes bastantes para esse acto ou contrato (alínea x) da Esp.).
x) O Autor colocou à ré, na pessoa do, ao tempo, Presidente do conselho de administração, a questão da actualização anual da sua remuneração, não se tendo apurado, contudo, em que data tal ocorreu, pela primeira vez (resposta ao quesito 1).
z) Ao autor foi reiteradamente dito que a actualização salarial dos trabalhadores "B, S.A." era feita no início de cada ano civil e que sendo o autor trabalhador da ré essa actualização se aplicaria nos termos e na mesma proporção dos restantes trabalhadores, o que foi reafirmado, designadamente, pelo então Presidente do Conselho de Administração da Ré, Dr. C (resposta aos quesitos 2 e 3).
a1) Os acordos mencionados em (D) e (E) foram assinados pelos representantes da Ré em Lisboa (resposta ao quesito 4).
b2) Alguns dos contactos que entenderam a formalização dos acordos ocorreram em Moçambique (resposta ao quesito 5).
c3) Na ocasião referida em (D) pretendiam as partes fazer o acordo ali mencionado nos termos da lei portuguesa (resposta ao quesito 6).
d4) Os acordos mencionados em (D) e (E) foram assinados por ambas as partes em Lisboa (resposta ao quesito 8).
Esta factualidade foi objecto de censura pela Relação no que se refere às respostas dadas aos quesitos 1º, 2º, 3º, as quais foram declaradas "não escritas" nos termos do artigo 646º, nº. 4, do Código de Processo Civil.
Pelas razões que adiante serão explanadas, foi uma decisão acertada e assim, tem-se por definitivamente fixada a matéria fáctica assente pela Relação, que é a proveniente da Primeira Instância, com exclusão das referidas respostas.
Revista da Ré:
De acordo com as conclusões da alegação, são duas as questões submetidas à apreciação deste Tribunal:
1- determinação da lei aplicável ao contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes;
2- existência de rescisão do contrato por mútuo acordo.
A configuração da primeira questão a abordar pressupõe o consenso das partes quanto a um aspecto fundamental: encontrar-se subjacente à relação estabelecida nos autos e objecto do litígio, a celebração de um contrato de trabalho a termo certo.
Defende a Ré a aplicação da lei Moçambicana ao referido contrato, invocando os seguintes argumentos:
a) Não ser admissível prova testemunhal sobre a matéria constante do quesito 6º;
b) Evidenciarem os autos que as partes não quiseram submeter o acordo à lei portuguesa;
c) Não tendo as partes designado a lei aplicável ao contrato e não resultando qual o ordenamento que tiveram em vista, o acordo deverá ficar sujeito às normas legais materiais do país onde foi executado, isto é, do lugar da execução da prestação, nos termos da doutrina do Direito Internacional Privado, não sendo de aplicar as normas dos artºs. 41º e 42º, do Código Civil.
A solução a dar a esta questão prende-se com a problemática dos efeitos da cessação do contrato em causa, já que, contrariamente à legislação nacional, a moçambicana não estabelece limitação à renovação sucessiva do contrato de trabalho a termo determinado.
O acórdão recorrido, confirmando quanto a este aspecto o decidido na sentença, considerou que em face dos factos provados se impunha concluir que a legislação a aplicar ao caso é a portuguesa, não só por ter sido a escolhida tacitamente pelas partes, mas por se verificarem relativamente ao Estado Português importantes elementos de conexão objectiva: sede e nacionalidade dos sujeitos, os moldes do contrato (satisfazendo a generalidade das regalias concedidas aos trabalhadores portugueses), lugar da assinatura do contrato e, bem assim, pelo facto dos contraentes terem estipulado no mesmo a competência dos tribunais de Lisboa para apreciarem os litígios relativos ao contrato.
Considera a Ré que constituindo o contrato de trabalho a termo um negócio jurídico formal e sendo de admitir prova testemunhal relativamente a factos que versem sobre a averiguação da intenção ou vontade das partes expressas em documento, ainda que autêntico, não é possível aceitar-se a produção de tal prova relativamente a declaração que não possui no texto o mínimo de correspondência.
Conclui pois ser inadmissível a resposta dada ao quesito 6º, defendendo assim ser inaplicável o disposto no artº. 393º, nº. 3, do Código Civil, in casu em questão, por se não estar no domínio da interpretação do contexto do documento, tendo sido ainda violado o preceituado no artº. 238º, do mesmo Código.
Ao invés, a Relação considerou que "Descortinar qual a lei que as partes tinham em mente aplicar ao contrato firmado entre elas, constitui interpretação a fazer com base no acordado e constante do escrito que formalizaram", pela que concluiu que a formulação e a resposta ao quesito não mereciam censura.
Sob a formulação "Na ocasião referida em D), pretendiam as partes fazer o acordo ali mencionado nos termos da lei portuguesa?", o quesito 6º visava apurar da intenção das partes relativamente à lei aplicável ao contrato firmado.
O Tribunal da 1ª. Instância deu resposta afirmativa a tal quesito, tendo-se para o efeito socorrido do depoimento de testemunhas.
Trata-se de uma questão que cabe no âmbito da sindicância deste Supremo, por ser de direito (artº. 722º, nº. 2, do Código de Processo Civil).
Em causa encontra-se o contrato especificado em D), acordo constante de folhas 8 e 9 dos autos, datado de 20 de Abril de 1990, que constitui o contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes.
Tratando-se de um negócio formal (cfr. artº. 42º, nº. 1, do Regime Jurídico aprovado pelo DL n. 64-A/89, de 27/2, que passaremos a designar de LCCT, há que ter presente o preceituado nos artºs. 393º, 394º e 238º, do Código Civil, no que se reporta à admissibilidade dos meios de prova relativamente às declarações negociais atinentes ao mesmo.
Não se suscitou dúvidas que da conjugação dos preceitos citados se conclui pela admissibilidade do recurso à prova testemunhal na interpretação do contexto de um documento e para apuramento da vontade real dos declarantes, limitada, porém, pelo mínimo de correspondência no texto do documento (neste sentido, Ac. S.T.J. de 12/1/99, Revista nº. 1229/98, 1ª. secção).
Conforme referido e em sede de revista, coloca a Recorrente em questão a posição da 1ª. Instância (ao admitir o aditamento do quesito em referência e ao responder afirmativamente) e da Relação ao considerarem integrar interpretação do documento a determinação da lei a aplicar ao contrato que as partes tinham em mente quando o firmaram.
Vejamos:
Nos termos do nº. 1, do artº. 41º, do Código Civil, "As obrigações provenientes de negócio jurídico, assim como a própria substância dele, são reguladas pela lei que os respectivos sujeitos tiverem designado ou houverem tido em vista".
De acordo com a regra do nosso Dir. Int. Privado, a vontade das partes goza de autonomia na determinação da legislação regulamentadora das alegações decorrentes da celebração de um negócio jurídico, bem como da substância deste.
Este regime de designação da lei aplicável no domínio contratual vigora no âmbito laboral, dada a omissão de quaisquer regras específicas para as relações contratuais de trabalho plurilocalizados (vide Ac. do S.T.J., de 26/10/94, in AD nº. 400, pág. 472).
De acordo com o disposto no citado artº. 41º, nº. 1, do CC, não se impõe que a vontade das partes seja expressamente manifestada, bastando que estas "hajam contratado na suposição de que determinado ordenamento jurídico era o aplicável" (acórdão citado).
Neste sentido valerá a legislação que os termos do negócio possam reflectir como a pretendida pelas partes celebrantes, isto é, ainda que através de uma mera declaração tácita "houverem tido em vista".
Consequentemente, uma vez que inexiste no contrato qualquer estipulação expressa quanto à lei aplicável ao negócio, a formulação do quesito em referência teve por subjacente o apuramento da vontade das partes quanto a esse aspecto, em termos de indagação de facto, (vontade real e não de actividade interpretativa, com vista à fixação do sentido normativo vinculante de uma declaração negocial, de acordo com as regras legais a que a actividade interpretativa deve obedecer).
Acresce que ao contrário do sustentado pela Ré, é possível descortinar no texto do documento um mínimo de correspondência, sendo um deles a cláusula sétima, nos termos da qual "Em caso de litígio entre as partes ambas aceitam, para o dirimir o foro de Lisboa" pelo que não está em causa determinar o alcance das partes quanto a uma cláusula acessória ou adicional ao conteúdo do documento.
Por fim e relativamente a este aspecto importa ainda referir que, embora não seja absolutamente clara a compreensão da resposta dada ao quesito 6º, a mesma não pode ser restringida aos termos efectuados pela Recorrente, ou seja, de a prova efectuada apenas se reporta à lei aplicável e pretendida pelas partes relativamente à celebração do contrato, não quanto à execução e aos termos subsequentes ao mesmo.
Assim, a formulação do quesito e a sua resposta encontram-se conformes à lei, não tendo ocorrido a alegada violação dos artºs. 42º, nº. 1, da LCCT, 393º, nº. 1, 394º, nº. 1 e 238º, nº. 1, do Código Civil.
Entende a Recorrente que não obstante ter resultado da matéria provada (resposta ao quesito 6º) que as partes pretenderam fazer o acordo que constitui o contrato de folhas 8 e 9, nos termos da lei portuguesa, não resultou demonstrado que as mesmas o tenham querido relativamente ao desenvolvimento e execução do contrato, ou seja, que fosse regido, após a sua elaboração, pela lei portuguesa.
Defende, pois, que dos elementos dos autos resulta o contrário, isto é, que a execução do contrato e os termos subsequentes ao mesmo não deveriam ser regidos pela lei portuguesa.
Ainda que se considerasse legítimo o alcance restritivo dado à resposta ao quesito em referência (do que se discorda como acima se disse), nada nos autos, designadamente os elementos indicados pela Ré, permite concluir no sentido de que as partes tenham querido afastar a aplicação da lei portuguesa aos termos subsequentes à celebração do contrato, como passaremos a expor na abordagem do último dos argumentos trazidos pela Ré para sustentar a sua posição.
Sustenta que não resultando dos autos que as partes designaram a lei aplicável, nem tiveram em vista a aplicação de qualquer uma, o contrato de trabalho deverá reger-se pela ordem jurídica em vigor no País onde o mesmo é executado, de acordo com a posição uniforme da doutrina do DIP, bem assim, através de uma interpretação actualista das normas de conflitos em matéria de contrato individual de trabalho, por os artºs. 41º e 42º, do Cód. Civil se mostrarem inaptos para regularem as obrigações emergentes das relações laborais.
Na sequência do já acima referido, o regime de designação da lei aplicável no domínio contratual estatuída nos citados artigos, vigora no âmbito laboral, dada a omissão de quaisquer regras específicas para as relações contratuais de trabalho plurilocalizadas.
Por outro lado, a vontade das partes goza de autonomia na determinação da legislação regulamentadora das obrigações decorrentes da celebração de um negócio jurídico, encontrando a mesma a limitação do artº. 41º, nº. 2, do Cód. Civil, nos termos do qual "A designação ou referência das partes só pode, todavia, recair sobre lei cuja aplicabilidade corresponda a um interesse sério dos declarantes ou esteja em conexão com algum dos elementos do negócio jurídico atendíveis no domínio do direito internacional".
Sabendo-se que o citado nº. 1, do artº. 41, do Cód. Civil, não impõe uma manifestação expressa da vontade das partes, bastando que estas "hajam contratado na suposição de que determinado ordenamento jurídico era o aplicável", atender-se-á à legislação que os termos do negócio possam reflectir como a pretendida pelas partes celebrantes, ainda que através de uma mera declaração tácita "houverem tido em vista".
Conforme decorre dos autos, as partes não estipularem expressamente a aplicabilidade da lei portuguesa à relação contratual estabelecida, sendo que resulta dos factos provados (resposta ao quesito 6º) que na ocasião referida em D) pretendiam as partes fazer o acordo ali mencionado nos termos da lei portuguesa.
Consequentemente, a questão da aplicabilidade da lei portuguesa foi tacitamente pretendida pelas partes, sendo que o sentido a dar à resposta ao quesito, sublinhe-se, não é seguramente o de a restringir aos termos da celebração do acordo, já que o que está em causa na determinação da designação da lei pelas partes é a escolha da lei competente para reger as obrigações nascidas do negócio jurídico celebrado, mais precisamente, identificar a lei competente para o regular em caso de conflito.
Falece assim não só o argumento da Recorrente de aplicar o regime supletivo da "lex loci executionis" entendido pela doutrina quanto às relações laborais, como ainda existe um argumento que reforça a matéria de facto apurada - referência expressa feita no contrato aos tribunais portugueses para dirimir o litígio.
Não ocorre pois qualquer desajuste na realidade fáctica subjacente à celebração do contrato, o que legitima a conclusão no sentido preconizado pelas instâncias, sendo que, de acordo com o nº. 2 do artº. 41º, do Cód. Civil, a lei portuguesa pretendida encontra-se em conexão com, pelo menos, um dos elementos do negócio atendíveis no domínio do DIP - lugar da celebração do contrato.
Quanto à rescisão do contrato por mútuo acordo, pretende a Ré que tal aconteceu, alicerçando a sua tese na troca de correspondência levada a cabo entre as partes, consubstanciado nas cartas de folhas 13 e 14 dos autos.
Tal como foi decidido pelo acórdão recorrido, não é possível retirar das cartas referenciadas qualquer acordo de rescisão do contrato não só por razões de ordem formal, como e particularmente, face ao conteúdo dos mesmos.
No caso "sub judice", desde logo, não existe "documento" que formalize o pretendido acordo.
Acresce que mesmo a entender-se poder relevar tal ausência de formalidade, igualmente não resulta da troca de correspondência qualquer convergência de vontades na desvinculação.
A lei impõe a forma escrita para a revogação do contrato de trabalho por mútuo acordo das partes, obedecendo o documento aos requisitos previstos nos nºs. 1 e 2 do artº. 8º, da LCCT - documento assinado por ambas as partes, dele constando expressamente a data da celebração do acordo e do início da produção dos respectivos efeitos, ou seja, constitui elemento essencial do acordo revogatório a manifestação de vontade inequívoca, bilateral da desvinculação.
Das cartas que constam dos autos apenas é possível concluir pela existência de uma manifestação de vontade inequívoca por parte da Ré na extinção do vínculo laboral - "(...) vimos comunicar a decisão desta Administração de não renovar o contrato de trabalho celebrado com V.Exa.".
Porém, da carta enviada pelo Autor à Ré em resposta àquela missiva, apenas se pode concluir que o trabalhador pretende uma confirmação por parte da Ré da rescisão do contrato com efeitos a partir de 31/2 - "(...) a cumprir-se tal intenção e para que se possam regularizar questões pendentes entre as partes peço-lhe se digne confirmar-me por fax a decisão da "B, S.A." prescindir dos meus serviços a partir de 31 de Março p.f., substituindo-me de imediato pelo Sr. Eng. D do Banco ... em Maputo".
Aliás, assim foi compreendido, na altura, pela Ré, que, em resposta, enviou o fax documentado a folhas 15 do seguinte teor: "Confirmo a indicação que oportunamente lhe foi dada pela Administração da "B, S.A." de que terminará as suas funções como delegado do ... e "B, S.A." em Moçambique em 31 do corrente."
Face ao conteúdo da carta do Autor, não é possível concluir pelo assentimento deste na cessação do contrato de trabalho.
Por conseguinte, sendo a lei portuguesa aplicável ao contrato de trabalho celebrado entre as partes, não tendo ocorrido qualquer revogação do referido contrato, a desvinculação unilateral levada a cabo pela Ré, consubstanciada pela carta de folhas 13, posteriormente confirmada pelo fax de folhas 15, constitui, efectivamente, tal como decidiram as instâncias, uma cessação ilícita do contrato de trabalho - no âmbito de uma relação laboral que, inicialmente a termo foi, nos termos da lei, (artºs. 44º, nº. 3 e 47º, da LCCT) convertida em tempo indeterminado - por decisão unilateral da Ré, sem precedência de processo disciplinar e destituída de justa causa - artº. 12º, nº. 1, alínea a), da LCCT.
Revista do Autor:
Insurge-se o Autor contra o acórdão da Relação na parte em que lhe foi desfavorável e que se reporta às seguintes questões:
1. Actualização anual da sua remuneração;
2. Determinação das taxas de juro a aplicar.
No que tange à primeira questão está em causa a decisão da Relação que revoga a sentença na parte em que a mesma condenou a Ré a pagar ao trabalhador a quantia de 58.464,43 USD referente a actualizações da remuneração.
Ao invés da 1ª. instância, o acórdão considerou que o eventualmente acordado entre as partes relativamente à actualização anual da remuneração do ora Recorrente constituía uma estipulação adicional ou complementar ao contrato de trabalho firmado, não abrangida pela razão determinante da forma do documento em causa, pelo que os factos a ela atinentes "só poderiam ser valorizados se tivesse havido confissão ou se fossem provados por documento, ainda que menos solene".
Uma vez que o factualismo dado como provado (respostas dadas aos quesitos 1, 2 e 3) quanto a tal matéria apenas teve subjacente o depoimento de testemunhas (não tendo sido dada relevância à carta de folhas 58/60 dos autos, dado estar em causa uma carta particular subscrita por um ex-administrador da ré), foi o mesmo considerado como não escrito.
Considera o Autor que a 1ª. Instância podia ter respondido aos quesitos 1º, 2º e 3º, entendendo que o acórdão recorrido ao negar tal possibilidade adoptou uma perspectiva formalista, sendo que se lhe impunha uma interpretação actualista da lei, particularmente por se prender com matéria referente à remuneração do trabalho subordinado.
Para além disso e em defesa da sua tese sustenta:
- encontrar-se sanada a eventual nulidade do acto de inquirição das testemunhas;
- não estar em causa a prova de qualquer cláusula contrária ou adicional ao contrato, mas a interpretação do documento;
- não decorrer da letra nem do espírito da LCCT, a exigência de que as alterações introduzidas ao contrato originalmente escrito tenham de revestir a mesma forma.
Desde logo e no que se reporta ao primeiro dos fundamentos invocados, carece o Autor de razão.
Com efeito e como salienta a Ré, o argumento aduzido apenas teria cabimento se estivesse em causa, tão só, a prática de uma nulidade processual e nessa medida sujeita ao regime do artº. 205º, do C.P.C..
Porém, a questão da admissibilidade de prova testemunhal relativamente a determinado facto ultrapassa a questão meramente processual, situando-se no âmbito da lei substantiva, ou seja, da conformidade da decisão com as regras de direito probatório.
Pretende ainda o Autor afastar as regras de direito probatório previstas no artº. 394º., do Cód. Civil, defendendo que a actualização da sua remuneração nos termos acordados com a Ré constitui, ao contrário do decidido no acórdão recorrido, uma questão de interpretação do documento.
Na sequência do já referido aquando da apreciação da validade da resposta ao quesito 6º, mencionámos que, estando em causa um negócio formal (acordo constante de folhas 8 a 9 dos autos, datado de 20 de Abril de 1990, que constitui o contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes, bem como o aditamento de folhas 10 a 12, devendo entender-se, tal como já decidido na sentença que, não obstante os dois clausulados, se está apenas perante um único contrato), importa ter presente o preceituado nos artºs. 393º e 394º, do Cód. Civil, no que se refere à admissibilidade dos meios de prova relativamente às declarações negociais atinentes ao mesmo.
Sendo de admitir, neste tipo de documentos, o recurso à prova testemunhal na interpretação do seu contexto e para apuramento da vontade dos declarantes, tal admissibilidade tem por limite o mínimo de correspondência no respectivo texto - artº. 238º, do Código Civil.
Relativamente à retribuição dispuseram as partes:
"A remuneração do 2º. outorgante é fixada em moeda local, sendo-lhe desde já atribuída, a esse título, a quantia em meticais equivalente a 300 USD ao câmbio oficial do dia" - cláusula quarta.
No aditamento as partes referiram quanto à mesma matéria:
"1- O 2º. outorgante terá direito a uma remuneração mensal de 6.000 USD livre de imposto, com efeito a partir de 18 de Fevereiro de 1990.
Parte dessa remuneração será paga em Moçambique na moeda nacional do País, em montante equivalente a 300 USD e ao câmbio, entretanto, em vigor. Esta remuneração em moeda local terá efeito a partir de 1 de Agosto do ano corrente (...).
2- O 2º. outorgante terá direito à remuneração do 13º. mês nos termos da legislação de trabalho em vigor tomando por base o seu salário mensal de 6.000 USD".
Tendo em conta que na situação está em causa a questão da actualização anual da remuneração do trabalhador (note-se que foi alegado pelo Autor que tal questão havia sido colocada na altura da celebração do contrato, sendo que tal elemento temporal não foi possível apurar (cfr. resposta ao quesito 1º), mostra-se evidente que nada no contrato (no respectivo conteúdo) permite concluir que as partes ao celebrarem o mesmo tiveram tal aspecto em mente ou em consideração, pelo que não é possível entender a matéria das actualizações salariais como uma questão de interpretação do contexto do documento e da vontade das partes.
Porém, ainda que assim se não entendesse sempre estaria inviabilizada a admissibilidade da prova testemunhal pois que do documento não se vislumbra nesse sentido, o mínimo de correspondência ainda que imperfeitamente expresso.
Trata-se pois, tal como entendido no aresto impugnado, de uma cláusula adicional, uma vez que a matéria da actualização anual da retribuição situa-se para além do conteúdo do contrato.
Reportando-se a mesma a uma cláusula adicional não formalizada, ou seja, não abrangida pela razão determinante da forma do documento prescrito por lei, a sua demonstração nos autos apenas era legalmente permitida por duas formas:
confissão da Ré, ou documento (que não apenas por acordo escrito das partes, bastando mero documento subscrito pela Ré).
Acresce que inexiste qualquer documento nos autos (designadamente a carta de fls. 58/60) que permite considerar verificado um princípio de prova por escrito permissivo do acertamento das respostas aos quesitos em referência por meio de prova testemunhal.
Não merece, pois, censura, neste aspecto o acórdão objecto de recurso.
Refira-se, por fim, que o argumento do Autor no sentido de que não decorre da letra nem do espírito da LCCT, a exigência de que as alterações introduzidas ao contrato originalmente escrito tenham de revestir a mesma forma, parte de um equívoco quanto ao caso concreto em análise, já que confunde o problema da admissibilidade de prova testemunhal em matéria de estipulações acessórias ao documento com a questão da validade das mesmas, sendo que no processo apenas está em causa a primeira das situações.
Quanto à determinação das taxas de juro a aplicar:
O acórdão em crise, dando provimento à apelação da Ré, revogou a sentença na parte da condenação em juros à taxa legal de 15% até 30 de Setembro de 1995 e de 10% após essa data, considerando que os juros moratórios deverão ser calculados de acordo com as taxas fixadas pela legislação americana, por estar em causa uma obrigação que tem por objecto o dólar americano.
Embora a Relação se tenha debruçado sob essa questão, a mesma encontrava-se prejudicada pela decisão dada quanto à improcedência do pedido de actualização salarial, não sendo, por isso, de tomar conhecimento.
Na verdade, conforme ressalta da sentença da 1ª. Instância (alínea d)), os juros em que a Ré foi condenada apenas versaram sobre as actualizações das retribuições - "condena-a, por fim, a pagar juros sobre as actualizações referidas na alínea que entende, desde a data em que se venceram cada uma das retribuições a actualizar até efectivo pagamento ...", aliás de acordo com o pedido do Autor que, no respeitante a juros, apenas se circunscreve às actualizações de remuneração e não quanto aos demais montantes peticionados.
Porém e ainda que o conhecimento desta questão se não encontrasse prejudicado pela improcedência do pedido relativo à obrigação de que os juros assumem natureza acessória, sempre a teria de dividir no sentido do acórdão recorrido.
Em face de todo o exposto, acorda-se em negar ambas as revistas, confirmando-se o douto aresto impugnado que, por não haver violado qualquer disposição legal, não merece censura.
Custas pelos respectivos recorrentes.
Lisboa, 20 de Março de 2002
Dinis Nunes,
Mário Torres,
Vítor Mesquita.