PROVIDÊNCIA CAUTELAR
EMBARGO DE OBRA NOVA
RATIFICAÇÃO JUDICIAL
COMPETÊNCIA MATERIAL
Sumário


É competente para conhecer e julgar a providência cautelar de ratificação judicial de embargo de obra nova requerida por um particular contra a Câmara Municipal em alegada violação do seu direito de propriedade o tribunal comum.
V.G.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


AA requereu, junto do Tribunal Judicial de Gondomar, a ratificação judicial do embargo extra-judicial de obra nova, contra a Câmara Municipal de Gondomar ( naturalmente, o Município de Gondomar).
Alegou que é proprietário de um prédio rústico, que identifica, o qual se encontra dividido pelo novo traçado da EN nº 219 ( supomos tratar-se da EN 209), entre o Porto e Gondomar; uma das parcelas encontra-se ladeada, por um lado pelo novo traçado da dita EN, e pelo outro traçado antigo; no dia 11/11/00, o requerente encontrou a trabalhar naquela sua propriedade uma máquina retro-escavadora e vários trabalhadores, que abriram uma vala com cerca de 4 metros de largura, 3 de fundo e 30 de extensão, na diagonal do respectivo terreno, iniciando-se na confrontação deste com o antigo traçado da EN 219 e prolongando-se em direcção ao novo traçado; tal obra iniciou-se e desenrolou-se à revelia do requerente, que a não consentiu; a prossecução da obra, com a colocação de manilhas de betão, com cerca de 1,50 metros de diâmetro e 3 de profundidade, torna impraticável a reintegração do requerente na plenitude do seu direito de propriedade, motivo por que, naquele mesmo dia, na presença de 2 testemunhas e da autoridade policial, comunicou ao responsável da obra que a mesma se encontrava embargada, tendo o mesmo dito que a obra era da Câmara Municipal de Gondomar, como tudo consta do auto de ocorrência lavrado pela PSP naquela data ( doc. agora junto a fls. 26).

Citada a requerida, deduziu oposição, na qual arguiu a excepção da incompetência material do tribunal judicial ( neste caso de Gondomar), a impossibilidade legal do presente embargo e a caducidade do mesmo; e defendeu-se depois da impugnação.
Para sustentar a incompetência material do tribunal judicial, alegou a CMG que estava a concluir uma obra iniciada em 1998 e que se destinava a enterrar uma conduta de água, para dessa forma guiar um curso de água que ali corria e a proceder ao aterro de um local que se apresentava como um anterior barranco; estas obras tinham sido acordadas entre a requerida e os três proprietários dos terrenos em causa, e haviam sido decididas por deliberações da CMG de 25/06/90 e de 21/12/92 ( doc. que junta a fls. 36 a 41); mais tarde, em 1998, quando foi construído o novo traçado da EN, decidiu a requerida, não só nivelar um dos terrenos, como os três para o que solicitou e obteve a devida autorização dos respectivos proprietários.
Consequentemente, sustenta a requerida, a obra decorre de acto administrativo, praticado pela Autarquia no exercício de um poder público e por causa dele, tratando-se por isso de acto de gestão pública, pelo que o tribunal competente é o administrativo: art. 3 do ETAF.
Em sede de impugnação, disse: que em 25/06/90 e 21/12/91, a CMG deliberou adquirir uma parcela de terreno contígua à do requerente (assinalada com “A” na planta de fls. 42), para possibilitar a construção do novo traçado da EN 209 ( doc. de fls. 36 a 41 e 42); no seguimento das deliberações tomadas, a CMG decidiu proceder à colocação de um colector de betão, com 1 metro de diâmetro, para drenagem das águas pluviais existentes no local, colector colocado entre 16/06/98 e 26/08/98, no limite entre o terreno assinalado com letra “A” e o terreno do requerente, assinalado com a letra “ B” na mesma planta; tal colector foi colocado com total consentimento do anterior proprietário do terreno ora do requerente; após a colocação do colector, foi o terreno do ora requerente e dos demais vizinhos aterrado em parte, através de colocação de terra por parte de desconhecidos; o que provocou fissuras no colector anteriormente ( colocado), pelo que a CMG se viu obrigada a proceder a um reforço de betão, trabalho esse iniciado em 17/10/00 e interrompido em 11/11/00, aquando do embargo extrajudicial; a intenção da requerida era reforçar o colector colocado em 1998 e depois proceder à regularização de todo aquele local, procedendo ao aterro dos três prédios existentes entre o novo e o antigo traçado da EN 209 ( doc. de fls. 42); assim, a regularização do terreno com a colocação do colector e posterior aterro já tinha sido acordada com os anteriores proprietários do prédio do ora recorrente; a CMG não tinha intenção de colocar quaisquer manilhas de betão no terreno do requerente, uma vez que tais manilhas já tinham sido colocadas em 1998, com conhecimento e autorização dos anteriores proprietários do terreno do ora requerente.

O Sr. Juiz proferiu então despacho, no qual conclui que se tratava de acto de gestão pública, pelo que materialmente competente não era o tribunal judicial, mas o administrativo, motivo por que julgou o tribunal incompetente em razão da matéria e absolveu a requerida da instância.

Recorreu o requerente de agravo para a Relação do Porto, que deu provimento ao recurso, revogou o despacho recorrido e mandou substituí-lo por outro que julgue o tribunal judicial de Gondomar competente em razão da matéria.
Para assim decidir, sustentou a Relação que a causa de pedir na presente acção (procedimento cautelar) é constituída basicamente pela realização de trabalhos em terreno do agravante, levados a cabo pela agravada sem seu consentimento; por isso, a obra em causa não assenta em qualquer acto de gestão pública; o colector foi colocado no limite entre o terreno assinalado com a letra “A” e o terreno do requerente, assinalado com a letra “ B”; por isso, o colector não está colocado no terreno do agravante, mas no limite do terreno deste com o terreno “A”; as alegadas deliberações da CMG tiveram unicamente como objecto a aquisição de uma parcela contígua à do agravante; os trabalhos em causa foram levados a efeito no terreno do agravante; não obstante a competência das CM, definida no art. 64º da Lei 169/99, de 18 se Setembro, tal norma visa só a construção, criação e gestão dos equipamentos, etc, integrados no património municipal ou colocados por lei sob administração municipal ( al. f) do nº 2); ora, as obras foram levadas a efeito no terreno do agravante, sendo que o colector necessitado de reparação não estava no terreno do agravante, mas no limite dele com o terreno “ A”.

Recorre agora a requerida, de novo de agravo, para este Supremo Tribunal.
Alegando, concluiu:
1) As obras em questão, objecto do embargo extra-judicial, já tinham sido anteriormente decididas pelas deliberações camarárias de 25/06/90 e de 21/12/92.
2) No Âmbito das citadas deliberações, a CMG adquiriu uma parcela de terreno contígua à do requerente, para possibilitar a construção de um novo traçado da EN 209.
3) No seguimento de tais deliberações, a requerida e ora recorrente decidiu proceder à colocação de um colector de betão, de 1 metro de diâmetro, no limite entre o terreno contíguo ao do recorrido e o seu próprio terreno, tendo em vista a drenagem das águas pluviais existentes no local.
4) Posteriormente à colocação de tal colector, foi o terreno do recorrido, bem como o dos vizinhos, aterrado em parte, através da colocação de terra por parte de desconhecidos.
5) O que significa que as obras embargadas decorrem de acto praticado pelo órgão da administração, no exercício de um poder público, sendo por isso acto de gestão pública, o que determina a competência dos tribunais administrativos.
6) O recorrido reconheceu expressamente, nas suas alegações de recurso, que a obra em causa se baseou em acto de gestão pública.
7) Seja como for, tais obras deviam ter sido consideradas como excluídas da competência dos tribunais comuns, nos termos do art. 414º do CPC.
8) De facto, face à nova redacção dada ao dito preceito do CPC, não podem subsistir dúvidas que as obras das autarquias locais, efectuadas em terrenos particulares, não podem ser embargadas.
9) A expressão “ relação jurídico-administrativa”, contida em tal preceito, não tem actualmente o mínimo de correspondência verbal na letra da lei: art. 9º, nº 2 do CC.
10) É que, se no âmbito da anterior redacção se entendia que o art. 414º, nº 1 não abrangia as obras das autarquias quando realizadas nos terrenos particulares, tal não sucede face à redacção introduzida pelo DL 329-A/95, de 12 de Dezembro.
11) Foram violados os art. 414º do CPC, 4, nº 1, e) e f) do ETAF, 18 da LOTJ e 66 do CPC.

O recorrido contra-alegou em apoio do decidido.

Neste STJ, o MP emitiu douto parecer no sentido de que materialmente competente é o tribunal judicial, confortando-se na doutrina de Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, 91, Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2.ª edição (1997), 229 e 245 e do acórdão deste STJ de 04/03/97, na CJ/STJ, V, 1, 125, argumentando que a presente providência cautelar é instrumental de uma acção de defesa da propriedade, portanto de natureza cível, para concluir que, no caso, a CMG surge despida do jus auctoritas, pelo que não se trata de acto de gestão pública.

A matéria de facto relevante é a que consta alegada pelas partes e dos documentos por elas referidos, juntos sem impugnação (nenhum foi impugnado), bem como do documento de fls. 7, por onde se vê que o prédio rústico designado “ Campos dos Lameirinhos e Toural”, ou “ Campo da Baleira Pequena e Campo de Cova Má”, descrito na CRP de Gondomar sob a ficha 00956/251191, foi registado (provisoriamente por dúvidas) em favor do requerente em 13/7/99.

A única questão posta é a de saber qual o tribunal materialmente competente: o comum ( judicial) ou o administrativo?
Antes de mais uma nota de esclarecimento: a questão acima alinhada sob os nºs 6 a 11 das conclusões da recorrente ( de o embargo não ser possível, no quadro do art. 414º do CPC) não se põe directamente a este Tribunal, como não chegou a colocar-se à Relação:
essa questão foi, sim, colocada na oposição da recorrida perante a primeira instância, mas não foi por esse Tribunal tratada nem resolvida, dado o mesmo ter decidido em função de uma questão prévia, que era a da incompetência material do tribunal, por entender tratar-se de um acto de gestão pública da requerida. Consequentemente, a primeira instância não se pronunciando sobre esta questão.
A impossibilidade de embargar aquela obra, por se tratar de obra de uma autarquia, nos termos do art. 414º do CPC, também não foi posta a Relação, até porque quem arguiu a incompetência foi a requerida e quem recorreu para a Relação foi o requerente.
Assim, tal questão está fora do âmbito de conhecimento deste Tribunal (art. 660º, nº 2, 661º, nº 1 e 667º, nº 1 do CPC), devendo, naturalmente, ser apreciada pelo Tribunal que vier a ser julgado materialmente competente.

Vejamos, portanto, a questão posta: competência material para conhecer do pedido de ratificação judicial do embargo extra-judicial de obra nova feita pelo Requerente.
Aplicável é o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (vulgo ETAF), aprovado pelo DL 129/84, de 27 de Abril, visto que a Lei 13/02, de 19 de Fevereiro, que o revoga e substitui, ainda não entrou em vigor ( seu art. 9º).
Isto posto, a jurisdição administrativa ( e fiscal) é exercida pelos tribunais administrativos, definidos como órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, incumbindo-lhes, na administração da justiça, assegurar a defesa dos interesses legalmente protegidos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativas (e fiscais): art. 1º e 3º do referido ETAF, aprovado pelo Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril.
Depois, distribuindo esta competência pelos diversos tribunais administrativos, estabelecida aquela lei que compete aos tribunais administrativos ( de círculo) conhecer, entre outras, das acções sobre responsabilidade civil do Estado, dos demais entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo acções de regresso: art. 51º, nº 1, h) do mesmo ETAF.
No entanto, encontravam-se excluídos da jurisdição administrativa (e fiscal) os recursos e as acções, que tivessem por objecto, entre outras, as questões de direito privado, ainda que qualquer das partes fosse pessoa de direito público: art. 4º, nº 1, f) do ETAF.
Por seu lado, a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de outra matéria; fora do âmbito da jurisdição administrativa ( e fiscal) é aplicável o disposto na lei de processo civil: art.s 1º e 4º, nº 4 da Lei de Processo Penal nos Tribunais Administrativos, vulgo LPTA, aprovada pelo Decreto- Lei nº 267/85, de 16 de Julho ( este também declarado revogado e substituído pela Lei 15/02, de 22 de Fevereiro, que também ainda não entrou em vigor: seu art. 7º).

Toda a questão reside em saber se ao actos (obras realizadas pela autarquia) deve ser considerados como actos de gestão pública ou como actos de gestão privada; bem como qual a natureza da relação jurídica em litígio: art. 3º e 51º, nº 1, h) do ETAF.
Porque, sem dúvida que são actos de um autarquia local, portanto uma pessoa colectiva de direito público.
Assim, se forem considerados actos de gestão pública, eles serão materialmente da competência dos tribunais administrativos ( art. 214º, nº 3 da CRP e art. 51º, nº 1, h) do mesmo ETAF). Se forem considerados actos de gestão privada, materialmente competentes serão os tribunais judiciais comuns ( art. 213º, nº 1 da CRP, art. 4º, nº 1, f) do ETAF e art. 66º do CPC).
Esta é portanto a questão.

Conceito de actos de gestão pública.

Pires de lima e Antunes Varela ( Código Civil Anotado, vol. III, 4.ª edição, 510/511) definem, em geral, os actos de gestão privada como “ aqueles que, embora praticados pelos órgãos, agentes ou representantes do estado ou de outras pessoas colectivas públicas, estão sujeitas às mesmas regras que vigorariam para a hipótese de serem praticados por simples particulares. São actos em que o Estado ou a pessoa colectiva pública intervém como um simples particular, despido do seu poder público.
Tratando-se de actos de gestão pública, a responsabilidade daquelas entidades deve naturalmente obedecer a princípios muito diferentes, visto se admitir a responsabilidade do estado pela prática de actos ilícitos (…) e nem sempre se conceder ao Estado e demais pessoas públicas o direito de regresso ( …)”.
Vaz Serra ( em anotação ao acórdão do STJ de 16/05/69, na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 103º, 350/351) seguiu idêntico critério para saber se o acto se integra, ou não, numa actividade de direito público: “ se ele se compreende numa actividade de direito privado duma pessoa colectiva pública, da mesma natureza da actividade de direito privado desenvolvida por um particular, o caso é de acto praticado no domínio dos actos de gestão privada; se, pelo contrário, o acto é praticado no exercício de um poder público, isto é, na realização de um poder público, isto é, na realização de função pública, mas não nas formas e para a realização de interesses do direito civil, o caso é de acto praticado no domínio dos actos de gestão pública”.
Critério que renovou na anotação que fez ao acórdão do STJ, de 19/05/75, na RLJ, ano 110-315.
Marcello Caetano ( Manual de Direito Administrativo, tomo II, 8.ª edição, 1134) ensinava que “ deve entender-se por gestão pública a actividade da Administração regulada pelo Direito Público e por gestão privada a actividade da Administração que decorra sob a égide do Direito Privado”. Para, logo a seguir, concretizar que “ como o Direito Público que disciplina a actividade da Administração é quase todo composto por leis administrativas, pode dizer-se que reveste a natureza de gestão pública toda a actividade da Administração que seja regulada por uma lei que confira poderes de autoridade para o prosseguimento do interesse público, discipline o seu exercício ou organize os meios necessários para esse efeito”.
Não encontramos, assim, divergências de monta entre os Autores: os actos praticados pelo estado ou por pessoas colectivas públicas serão de gestão pública ou de gestão privada em função da natureza do regime jurídico a que estejam subordinados: de gestão pública se sujeitos ao direito público, privada se sujeitos ao direito privado. E estarão sujeitos a um ou outro ramo de direito, conforme a natureza do próprio acto.
Também a jurisprudência não se tem afastado disto: acórdãos do Tribunal de Conflitos, de 15/11//81, no BMJ nº 311-195, de 10/12/87, com anotação de Afonso Queirós, na RLJ, ano 121-137 e de 31/05/01, proferido no Conflito Negativo de Jurisdição nº 368 e o acórdão deste STJ de 24/01/02, de 24/12/02, proferido no recurso 3241/01, da 1.ª secção, estes dois últimos com o mesmo Relator do presente e que julgamos inéditos; bem como, lapidarmente, o acórdão do STJ de 04/03/97, na CJ/STJ, ano V, tomo I, 125: “ os tribunais administrativos só dirimem litígios emergentes das relações jurídicas administrativas, e nunca questões de direito privado; daí que o embargo de obra nova que envolva só questões de direito privado seja da competência dos tribunais comuns”.
o critério determinante não é saber quem pratica o acto, ou a omissão, mas qual a natureza do acto e o fim tido em vista.
Bem como qual a natureza, civil ou administrativa, da relação jurídica pleiteada ( M. Andrade, Noções Elementares citada, 92).

Estamos perante um procedimento cautelar: ratificação do embargo extrajudicial de obra nova, que é um requisito da eficácia do embargo extrajudicialmente efectuado ( art. 412º, nº 3 do CPC).
O embargo de obra nova (ou a ratificação judicial do embargo extrajudicial de obra nova) não é uma acção declarativa, não aspira à tutela directa do direito substancial que se pretende ver definido; é sim, um meio de tutela indirecta desse direito, através da tutela directa do meio processual que a ele tende: art. 383º e 412º do CPC.
A composição provisória realizada através da providência cautelar solicitada ( neste caso, a ratificação judicial do embargo feito) destina-se a garantir a eficácia e a utilidade da própria tutela processual, sendo por isso instrumental perante a tutela processual e mediatamente instrumental em relação à própria situação jurídica substancial que se pretende ver acautelada: “ a composição provisória assegura a efectividade da tutela jurisdicional”. Por isso, o “ objecto da providência cautelar não é a situação jurídica acautelada ou tutelada, mas, consoante a sua finalidade, a garantia da situação, a regulação provisória ou a antecipação da tutela que for requerida” (assim, Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, 229). É em consequência da sua instrumentalidade em relação à acção de que é dependência que o procedimento cautelar deve ser apensado à acção principal ( art. 323º, nº 2 e 3), motivo por que corre necessariamente no Tribunal que for competente para a acção principal.
Daqui ressalta que o direito ( substantivo) litigado não é o embargo da obra nova ( este é um meio cautelar de defesa do direito litigado), nem é mesmo a obra feita ou iniciada, mas o direito que ( se diz que) a obra nova ofende: direito de propriedade.
O presente procedimento não se destina, por exemplo, a obter a declaração de nulidade ou a anulação do (alegado) acto administrativo que deliberou levar a efeito aquela obra, mas a acautelar o direito de propriedade: é instrumental de uma acção de defesa da propriedade. E, como nessa acção se pode pedir, não só o reconhecimento da propriedade, como por exemplo também uma indemnização por danos, está evidenciado que o tribunal competente só pode ser o comum.
A relação jurídica litigada, tal como o Autor a desenha e formula o pedido, não é de direito administrativo, mas de direito privado, pelo que materialmente competente é o tribunal comum ( José Oliveira Ascensão, Direito do Urbanismo, 340 a 342). Também assim o acórdão do Tribunal de Conflitos, de 13/04/72, em Acórdãos Doutrinais do STA, 125º, 774.
Pelo que competente é o tribunal comum (judicial), como decidiu a Relação, e de acordo com a doutrina deste STJ, em acórdão de 04/03/97, já citado.
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao agravo.

Lisboa, 21 de Maio de 2002
Reis Figueira
Faria Antunes
Lopes Pinto.