PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
CONCLUSÃO
RESCISÃO PELO TRABALHADOR
Sumário


I – O prazo de 30 dias para proferir decisão no processo disciplinar, estabelecido pelo art.º 10, n.º 8, da LCCT, tem intenção meramente aceleratória, e daí que o seu incumprimento não tenha quaisquer
consequências preclusivas, podendo apenas ter reflexo na apreciação da justa causa invocada pela entidade patronal para o despedimento do trabalhador.
II – A falta de diligência da entidade patronal na condução e ultimação do processo disciplinar, só por si, não significa violação das garantias legais e convencionais do trabalhador.
III – Verificando-se a demora na ultimação do processo disciplinar a razões de índole processual (diligência necessária à descoberta da verdade), tem a mesma de se considerar justificada, não ocorrendo justa causa de rescisão do contrato de trabalho por parte do trabalhador, com aquele fundamento.

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


AA, identificado nos autos, intentou no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia, acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, em processo comum, contra Empresa-A, Lda., também nos autos identificada, na qual alegando os factos que teve por pertinentis, pediu:
"I - Deve a R. ser condenada a pagar ao A. a quantia de 4.050.000$00 (quatro milhões e cinquenta mil escudos) a título de indemnização por despedimento com justa causa, acrescida de juros de mora à taxa legal, até efectivo pagamento;
II. Independentemente da procedência ou não do pedido formulado em I, deve a R. ser condenada a pagar ao A.:

a) A quantia de Esc. 35.000$00 que o A. deixou de auferir a título de retribuição, na sequência do processo disciplinar ilegal ocorrido em 1997, acrescida de juros de mora à taxa legal até efectivo pagamento;
b) A quantia de Esc. 84.651$00, ilegal e infundadamente retida pela R. a título de sanção por faltas não justificadas, acrescida de juros de mora à taxa legal até efectivo pagamento;
c) A quantia de Esc. 85.462$00 referente a trabalho suplementar prestado e não retribuído, acrescida de juros de mora à taxa legal até efectivo e integral pagamento;
d) A quantia de Esc. 630.000$00 para reposição da situação subjacente à discriminação salarial de que o A. foi alvo, acrescida de juros de mora à taxa legal até efectivo e integral pagamento;
e) A quantia de Esc. 60.000$00, a título de férias não gozadas no ano da cessação do contrato de trabalho, e subsídio, acrescida de juros de mora à taxa legal até efectivo pagamento;
f) A quantia de Esc. 270.000$00 a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal com referência ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato de trabalho, acrescida de juros de mora até efectivo pagamento;
g) A quantia de Esc. 500.000$00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal de efectivo e integral pagamento".
Designado dia para audição das Partes, que se não realizou por ausência do legal representante da Ré - falta considerada justificada pelo despacho de fls. 68 - e designado dia para julgamento, veio a Ré contestar, apresentando a sua versão dos factos e concernindo que "a presente acção deve ser julgada improcedente e não provada, absolvendo-se a ré do pedido".

Entendendo que a Ré, na contestação que apresentou, "defende-se por excepção, alegando factos novos que, no seu entender, são determinantes para a improcedência da acção", o A. respondeu à contestação, concernindo como na petição inicial e reclamando a improcedência da matéria de excepção invocada.
Realizado julgamento e ditados para a acta os factos dados como provados, foi proferida a sentença de fls. 173 a 178 que decidiu " julgar a acção procedente em parte e consequentemente condenar a ré a pagar ao autor as seguintes quantias:
a) 1.020$00 pelo trabalho prestado, diz-se trabalho suplementar prestado a 3/10/95;
b) 8.160$00 pelo trabalho suplementar prestado de 6 a 23/10/95;
c) 6.120$00 pelo trabalho suplementar prestado de 6 a 11/11/95;
d) 7.140$00 pelo trabalho suplementar prestado de 2 a 8/1/96;
e) 2.040$00 pelo trabalho suplementar prestado a 26 e 27/6/96.
f) 60.000$00 pelas férias não gozadas;
g) 270.000$00 de proporcionais;
h) Nos juros de mora à taxa legal a contar das datas acima referidas. Antes da transcrita "Decisão" consta da sentença que "Relativamente às férias não gozadas e aos proporcionais [os juros de mora são contados], desde a data da cessação do contrato".

Inconformado, o A. apelou para o Tribunal da Relação do Porto, das suas alegações, a fls. 181 a 191, constando, a fls. 181vº que "Desde já se declara, para todos os legais efeitos, que o presente recurso fica limitado à apreciação da questão atrás referida [pagamento de indemnização por despedimento com justa causa, por iniciativa do trabalhador], uma vez que se conforma com o teor da decisão proferida, em relação ao demais que peticionou.".
E aí concluiu "que deve o presente recurso ser julgado procedente e por via disso ser parcialmente revogada a douta decisão recorrida, sendo a apelada condenada a pagar ao apelante a quantia de Esc. 3.240.000$00, a título de indemnização devida ao trabalhador por rescisão contratual com justa causa, acrescida de juros de mora à taxa legal, computados desde a rescisão contratual operada pelo apelante e até efectivo e integral pagamento".
O Venerando Tribunal da Relação do Porto, pelo Acórdão de fls. 231 e 232, usando dos poderes constantes do art. 713º, nº 6, do CPC, quanto à matéria de facto provada, e do nº 5, do mesmo artigo, quanto à fundamentação da decisão, confirmou a sentença Recorrida.
Continuando inconformado quanto à não concessão de indemnização pela rescisão do contrato de trabalho com justa causa, recorre o A. de revista, nas suas alegações, a fls. 242 a 254, concluindo:

"A) A recorrida negligenciou, sem fundamento válido, a produção de prova atempadamente requerida pelo então arguido no processo disciplinar, consubstanciada na inquirição da única testemunha de defesa apresentada, que se comprometeu a apresentar;
B) O processo disciplinar arrastou-se por vários meses, sem que a recorrida tivesse adiantado qualquer justificação para o facto;
C) Não ficou provado nos autos que o processo disciplinar subjacente tenha ficado suspenso a aguardar que a única testemunha anolada pelo recorrente se pronunciasse, conforme alegou a recorrida;
D) Nem ficou provado que o processo disciplinar subjacente aos autos tenha ficado suspenso a aguardar que o Centro Regional de Segurança Social respondesse ao que lhe foi solicitado, como também alegou a recorrida;
E) No processo de despedimento subjacente não foram acauteladas as garantias de controlo "a priori" e "a posteriori" da respectiva regularidade;
F) A conduta da recorrida violou garantias legais do recorrente, enquanto arguido em processo disciplinar laboral;
G) Tal actuação conferia ao recorrente motivo para rescisão contratual com justa causa por sua iniciativa e conferia o direito a reclamar a condenação no pagamento de uma indemnização calculada nos termos do disposto no artigo 13º, nº 3, aplicável "ex vi" do disposto no artigo 36º, ambos do DL nº 64-A/89, de 27-02, cujo valor ascende a Esc. 3.240.000$00;
H) Disposições legais violadas pela decisão recorrida:
artigos 10º, nº 5, 35º, nº 1 al. b), 36º, 13º, nº 3, todos do DL nº 64-A/89, de 27/02 e artigo 19º alínea a) e g) do DL nº 49408, de 24/11."

O Recorrido contra-alegou em defesa do julgado.
A Exma Procuradora-Geral Adjunta emitiu o Parecer de fls. 286 a 292, no sentido da negação da revista que, notificado às Partes, não suscitou qualquer resposta.
Foram colhidos os vistos.
É a seguinte a matéria de facto dada por provada pelas Instâncias, não passível de censura, no poder do STJ, nem carece de ampliação:
1) O autor foi admitido ao serviço da ré em 1/2/74, por contrato verbal e por tempo indeterminado, com a categoria de acabador não especializado - praticante de 1º ano, e o seu percurso profissional foi o seguinte:
- 1/2/75 - acabador não especializado - praticante de 2º ano;
- 1/2/76 - acabador não especializado - praticante de 3º ano;
- 1/2/77 - Polidor - praticante de 1º ano;
- 1/2/78 - Polidor - praticante de 2º ano;
- 1/2/79 - Polidor de 3ª;
- 1/2/81 - Polidor de 2ª;
- 1/6/82 - Desenhador praticante até 3 anos;
- 1/6/85 - Desenhador praticante com mais de 3 anos.

2) Por regra as funções do autor foram desempenhadas nas instalações fabris da ré, sitas na R. 25 de Abril, 1136, Perosinho, vila Nova de Gaia.
3) Enquanto ao serviço da ré, o autor por prévia e expressa determinação desta, cumpria normalmente o seguinte horário semanal de trabalho:
- Segunda a quinta-feira: das 8.00h. às 13.00h., e das 14.00h. às 18.00h.;
- Sexta-feira das 8.00h. às 12.45h..
4) Auferia ultimamente a retribuição mensal base ilíquida de 120.000$00.
5) Por carta registada com A/R a ré enviou ao autor uma carta datada de 11/6/97, junta como doc. 1 com a P.I., cujos dizeres se dão por reproduzidos, que constitui uma nota de culpa e lhe é comunicada a intenção de proceder ao seu despedimento.
6) O autor apresentou resposta a essa nota de culpa, nos termos do doc. 2 junto com a P.I., cujos dizeres se dão por reproduzidos.
7) Nessa resposta o autor além do mais requereu a inquirição de 3 testemunhas.
8) As testemunhas indicadas pelo autor foram inquiridas, conforme P.D. junto por linha.
9) Por carta datada de 9/9/97 a ré remeteu ao autor a conclusão desse processo disciplinar, conforme doc. 3 junto com a P.I., cujos dizeres se dão por reproduzidos, onde declara que considera provados os factos imputados e lhe aplica a sanção de seis dias de suspensão do trabalho sem direito a retribuição, que resultou na perda do valor de 35.000$00 pelo autor.
10) Dou por reproduzido o teor do P.D. junto por linha.
11) No âmbito desse processo não foi feita ao autor nenhuma comunicação para estar presente na inquirição de qualquer uma das testemunhas por si indicadas.
12) Em data indeterminada de Junho de 97, pelas 11.45 m., o chefe de departamento de Desenho, Sr. BB, (chefia imediata do autor), deu instruções ao autor para este colocar no computador alguns desenhos (cerca de seis), a fim de serem seleccionados e aprovados por si.
13) Quando o Ref. BB se preparava para seleccionar e aprovar os desenhos estes não apareceram.
14) O autor instado pelo Sr. BB não soube explicar onde se encontravam os desenhos. Foi então chamado o colega CC, encontrando-se os três junto ao computador a proceder à busca.
15) Com o auxílio desse outro colega os desenhos acabaram por ser descobertos.
16) Quando o ref. superior hierárquico procurou o autor para comentar o que se havia passado, verificou que o mesmo se tinha ausentado sem se despedir ou dar qualquer explicação.
17) Passavam então um a dois minutos das 12.00h., hora de saída do autor.
18) o 1º dia útil seguinte, o ref. chefe, dirigiu-se ao autor e pediu-lhe que justificasse o seu comportamento anterior.
19) Travou-se então entre ambos um diálogo, tendo o autor referido ao Sr. BB que saíra na sua hora, tendo-lhe então o Sr. BB referido que podia ter dito que ia embora. O autor respondeu então que se queria fazer queixa ao patrão, fizesse.
20) No dia 27/5/97 o autor foi ouvido no P.D., tendo recusado assinar o auto de declarações.
21) A partir de determinada altura, alguns dias antes da ocorrência de Junho de 97, por ocasião dos aumentos dos salários, a relação do autor relativamente a sua chefia imediata alterou-se, tornando-se tensa; por não lhe ter sido dado o aumento que julgava adequado, circunstância que o autor imputava àquela chefia. Desde essa data o autor passou a revelar algum desinteresse pelo desempenho das suas funções, cumprindo de forma deficiente algumas ordens do seu imediato superior hierárquico.
22) Por carta datada de 10/3/00 a ré remeteu ao autor nova nota de culpa, conforme doc. 4 junto com a P.I., cujos dizeres se dão por reproduzidos.
23) Antes de proferida qualquer decisão no âmbito desse processo, a ré procedeu à retenção da quantia de 84.651$00 no vencimento do autor, relativas ao período em apreço naquele P.D..
24) O autor apresentou resposta a tal nota de culpa, por missiva enviada por fax a 22/3/00, conforme fls. 30 a 34, cujos dizeres se dão reproduzidos, posteriormente enviada por registo com A/R.
25) O autor arrolou na resposta uma testemunha, a Srª Drª DD.
26) O autor por intermédio do seu mandatário enviou à ré uma carta a 10/4/00, solicitando a marcação da inquirição daquela testemunha, conforme doc. de fls. 37 e 38, cujos dizeres se dão por reproduzidos.
27) O autor por intermédio do seu mandatário enviou à ré nova carta a 12/5/00, reiterando a solicitando a marcação da inquirição daquela testemunha, conforme doc. de fls. 39 e 40, cujos dizeres se dão por reproduzidos.
28) A ré, na sequência do pedido de inquirição da ref. Drª. DD, enviou a carta constante de fls. 23 do P.D., solicitando a esta prestasse por escrito as suas declarações, impreterivelmente até ao dia 30/4, carta essa enviada para a direcção que consta do registo junto a fls. 2 do mesmo P.D., cujos dizeres se dão por reproduzidos.
29) Na sequência de tal carta A ref. DD não respondeu, nem a ré fez qualquer outra diligência para a ouvir, nem o autor foi alguma vez notificada para estar presente a qualquer inquirição.

30) Como diligência instrutória a ré solicitou um parecer sobre a situação ao Centro Regional de Segurança Social - conforme fls. 13 do P.D..
31) O Centro Regional, apesar de insistências por parte da ré, apenas se pronunciou a 31/8/00, nos termos do doc. fls. 32 a 34 do P.D..
32) Dou por reproduzido teor do P.D., junto por linha.
33) Em 3/1/00 o autor apresentou na empresa uma declaração passada pela Administração Regional de Saúde do Norte, onde a médica Drª DD, declarou que o autor necessitava de prestar assistência inadiável por um período provável de 12 dias à filha EE.
34) A ausência do autor ao trabalho com a alegação de assistência inadiável acabou por se prolongar até 23/1/00 - fls.- 7 e 8 do P.D..
35) Em 10/12/00 a ré solicitou ao autor que fizesse prova da inexistência de qualquer outro familiar que pudesse prestar assistência à filha.
36) Face ao pedido o autor apresentou uma nova justificação, emitida em 21/2/00 pela Administração Regional de Saúde, onde se aludia a que o familiar a necessitar de assistência inadiável seria a mulher, FF, e não a filha.
37) A demora na resolução da situação profissional do autor esteve na origem de alguma perturbação emocional para este.
38) Ao autor nasceu uma filha em finais de 99, de que resultava acréscimo de despesas e encargos com alimentos, medicamentos e vestuário necessários a um recém-nascido.
39) O autor dependia do vencimento que auferia no exercício das suas funções ao serviço da ré para subsistência da sua família.

40) O autor por intermédio de comunicação à ré datada de 31/8/00, rescindiu o seu contrato de trabalho alegando justa causa, conforme doc. 12 junto com a P.I., cujos dizeres se dão por reproduzidos.
41) Enquanto trabalhador ao serviço da ré o autor utilizava no seu trabalho programas e software informático necessários à execução de desenho mecânico.
42) Enquanto instrumento de trabalho, tais programas sofriam constantes modificações e actualizações, que implicavam a necessidade de actualização por parte de todos os funcionários da ré que à semelhança do autor deles se serviam.
43) Nessa medida e para esses efeitos, o autor tinha de frequentar os cursos de formação indicados pela ré, que eram ministrados no seu local de trabalho.
44) Todavia, tais cursos eram ministrados em parte para além, do horário de trabalho, e implicavam em média, cerca de 1 hora para além do período normal de trabalho, durante o período de duração do curso de formação.
45) O autor, nessas circunstâncias, frequentou pelo menos os seguintes cursos de formação;
. Em 3/10/95 - doc. 3;
. Em 16 a 23 de 10/ de 95 - Doc. 14;
. Em 6 a 11/11 de 95 - Doc.15;
. Em 2 a 8/1 de 96 - Doc. 16;
. Em 26 a 27/6/96 - Doc. 17;

46) Em 4/4/00 a ré mais uma vez solicitou ao autor a frequência de mais um curso de formação.
47) Face a tal solicitação o autor declarou estar disposto a frequentar o curso, desde que lhe fosse concedida a contrapartida a que se julgava com direito.
48) Após tal declaração a ré acedeu conceder ao autor uma compensação de 1 dia de férias em troca de 8 horas de formação em horário pós laboral.
49) O autor aceitou tal solução, formalizando por escrito essa aceitação, conforme doc. 19 junto com a P. I..
50) No ano em que ocorreu a cessação do contrato o autor não gozou o período de férias correspondente a uma semana de férias, nem auferiu o correspondente subsídio (com referência às férias vencidas a 1/1).
51) A esse título estão em dívida a quantia de 60.000$00.
52) A ré não procedeu ao pagamento dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, estando em dívida a este título a quantia de 270.000$00.
53) Em data indeterminada de 92, o autor foi objecto de uma participação feita pelo funcionário GG do departamento comercial da ré, na qual este referia ter o autor mostrado indisponibilidade para prestar uma ajuda solicitada, conforme doc. 1 junto com a contestação.
54) O autor trabalha numa secção que funciona em regime de "open space".
55) Não foi retirado o telefone ao autor. Os telefones foram redistribuídos na secção, de modo a estarem o mais próximo possível de todos os trabalhadores que prestavam serviço na secção.
56) A situação do autor no que respeita ao telefone era igual à dos restantes colegas que trabalhavam na secção. O autor partilhava o telefone com um outro colega, passando com a redistribuirão os telefones a servirem dois ou três colegas.
57) O serviço efectuado pelo autor apresentava erros em maior quantidade que os restantes colegas que exerciam idênticas funções, sobretudo no que respeitava à "realização de desenhos à escala".
58) O autor não sabia desenhar peças em necanicaldesktop.
59) O trabalhador CC tinha e tem mais conhecimentos e aptidões que o autor, tendo uma qualificação académica superior à deste.
60) Possui um curso CAD-CAM.
61) O ref. trabalhador está habilitado a executar trabalhos bem mais complexos do que aqueles que o autor estava apto a executar.
62) O trabalhador CC só a partir de 1/99 passou a auferir a remuneração de 150.000$00 mensais, e como compensação para a aptidão para a realização de tarefas complexas, que executava com perfeição. Tarefas essas próprias da categoria de desenhador.
63) A qualidade de trabalho do autor era inferior à do CC.
64) Os cursos de formação profissional que o autor foi frequentando eram indispensáveis para este poder trabalhar com os "softwares" cada vez mais modernos que foram aparecendo no mercado. Caso não os frequentassem, os trabalhadores não poderiam exercer as suas funções com os novos "softwares".
65) Tratavam-se de actualizações que se traduziam numa valorização profissional dos trabalhadores, já que permitiam a aquisição de novos conhecimentos e a reciclagem dos já possuídos.
66) Nunca a empresa pagou a qualquer trabalhador o período de formação como tempo de trabalho.
67) Nenhum trabalhador da empresa jamais reclamou esse pagamento.
68) Na altura do divórcio do primeiro casamento, o autor atravessou um período de grande instabilidade psicológica e emocional.
69) Nessa altura o autor teve necessidade de apoio médico, tendo sido a empresa que pagou essas consultas.
70) Apesar de formalmente quem as pagou ter sido o então superior hierárquico do autor, Eng.HH.
71) A gerência da ré ocultou propositadamente ao autor tal facto, para este não se sentir diminuído.

O âmbito da revista é delimitado pelo A., nas suas alegações, ao dizer a fls. 259:
" 3. A questão que se suscita no presente recurso é a da existência ou não se justa causa para a rescisão contratual promovida pelo apelante (sic), motivada pela demora da tramitação do processo disciplinar promovido pela apelada (sic) "Empresa-A, Lda".
4. O entendimento adoptado em primeira instância e mantido pela Relação do Porto foi no sentido de que estava justificado nos autos a razão da demora na tramitação do processo disciplinar, e que dessa demora não resultava qualquer intenção, por parte da recorrida, de prejudicar o autor com atrasos propositados.
5. Salvo o devido respeito, que é muito, o recorrente discorda desse entendimento, por entender que o mesmo não dispõe de suporte nos autos.".
Daqui resulta entender o Recorrente merecer provimento a revista com base no constante da al. g) da carta que em 31.8.2000 enviou à Ré rescindindo o seu contrato de trabalho, com invocação de justa causa. Carta a que se refere o ponto 40 da matéria de facto provada e que se encontra a fls. 41 dos autos.
Dela, no que importa, consta:

"Em obediência ao disposto no nº 2 art. 34º do referido diploma legal [D.L. 64-A/89, de 27.2], passo a indicar os factos que justificam a presente rescisão:
[...]
g) O facto de o processo disciplinar referido na alínea anterior [ o instaurado no mês de Março de 2000] nesta data [31.8.2000] não se encontrar ainda concluído, não tendo sequer, diz-se, não tendo sido sequer promovida a inquirição da testemunha de defesa, não obstante várias solicitações nesse sentido, circunstâncias estas que têm resultado num crescente stress psicológico, nervosismo, que degeneraram em instabilidade psicológica e emocional por força da pendência desse processo disciplinar, e da incerteza, a todos os níveis, que o mesmo provocada. (sic). "
Relativamente a este fundamento, consta doutamente, da sentença, a fls. 177:
" Quanto à al. "g", provou-se que a ré remeteu ao autor nota de culpa por carta datada de 10/3/00.
A que o autor respondeu a 22/3/00. À data da rescisão o processo não se encontrava concluído. O autor alega que tal atraso e a não inquirição da sua testemunha lhe provocaram danos de natureza psicológica.
Provou-se que a demora causou ao autor alguma perturbação emocional. Ora, nem tal facto é por si suficiente para fundar uma rescisão (todos os visados com um processo sofrerão por esse simples facto alguma perturbação), importando verificar se tal demora foi propositada e visava afectar de algum modo o autor ou levá-lo a rescindir. Dos facto provados não pode concernir-se que tenha ocorrido por parte da ré uma atitude propositada de atraso no processo. Após a resposta do autor (22/3) a 20/4 foi enviada carta à testemunha apresentada pelo autor, conforme fls. 23 e 24 do PD.. A 3/7 foi solicitado um parecer ao CRSS, conforme fls. 27 do P.D..
Conforme se provou. Nem a Drª DD nem o CRSS responderam. Mais se provou que a ré insistiu com o CRSS para responder.
Apesar do tempo recorrido, e de o processo não se ter desenvolvido com a prontidão normal, não resulta dos factos que tenha ocorrido qualquer intenção de prejudicar o autor com atrasos propositados. O processo (necessário ou não o solicitado parecer), esteve à espera da resposta do CRSS. Assim concluímos que o autor não tinha motivo para rescindir o contrato. ".
Concorda-se com este entendimento, que também mereceu a concordância do Acórdão recorrido. E trata-se de matéria de facto e de ilações dela tiradas, da competência das Instâncias, não se divisando, nem o A. indicando, que nessa matéria de facto tenha ocorrido, na sua fixação, violação da lei que, nos termos dos art.s 722º, nº 2 e 729º, nº 2, ambos do CPC, possibilite e justifique a sua alteração pelo STJ.
E diz a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, doutamente, no seu Parecer, a fls. 290 a 292:
"Perante esta factualidade afigura-se-nos que, tal como se decidiu na sentença da 1ª instância para cuja fundamentação o acórdão recorrido remeteu, o comportamento da Ré não integra justa causa de rescisão do contrato de trabalho.
Se é certo que, como afirma o Recorrente, o processo disciplinar deve ser célere, o que implica que as medidas disciplinares devem ser tomadas com rapidez, a verdade é que a lei não impõe à entidade patronal um prazo peremptório para a ultimação do processo disciplinar.
Com efeito, o prazo de 30 dias estabelecido no nº 8 do artigo 10º do RJCCT, aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89, tem intenção meramente aceleratória e daí que o seu incumprimento não tenha quaisquer consequências preclusivas, podendo apenas ter reflexos na apreciação da justa causa invocada pela entidade patronal para o despedimento do trabalhador.
E sendo assim, consideramos que a falta de diligência da entidade patronal na condução e ultimação do processo disciplinar, só por si, não integra violação das garantias legais e convencionais do trabalhador.

No caso concreto, verifica-se que a Ré instaurou ao Autor um processo disciplinar tendo-lhe remetido a respectiva nota de culpa em 10.03.2000, sendo que esse processo disciplinar ainda se não encontrava findo em 31.08.2000, data em que o Autor remeteu à Ré a carta em que lhe comunicou a rescisão do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa. Verifica-se também, que uma das diligências instrutórias a que a Ré procedeu no âmbito do referido processo disciplinar, foi o pedido de parecer ao Centro Regional de Segurança Social sobre a legalidade da justificação apresentada pelo Autor para as faltas que deu ao serviço da Ré, tendo este parecer sido remetido à Ré apenas em 31.08.2000.
Ora, esse pedido de parecer, na medida em que versava sobre os factos imputados ao autor na nota de culpa, não pode deixar de se considerar como uma diligência necessária à descoberta da verdade a que se propõe o processo disciplinar, pelo que bem se compreende que a Ré tivesse ficado a aguardar a remessa do referido parecer para, com base nela, ponderar a decisão a proferir no referido processo disciplinar.
E sendo assim, há que concluir que a demora na ultimação do processo disciplinar instaurado ao autor se ficou a dever a razões de índole processual e não a quaisquer outras razões pelo que, tal demora, tem de haver-se como justificada.

Por outro lado, consideramos que, face à matéria de facto provada, não se verificou a violação, por parte da Ré, das garantias de defesa do Autor.
É que a Ré diligenciou para que a testemunha indicada pelo Autor na resposta à nota de culpa fosse inquirida, tendo, para o efeito, enviado uma carta a essa testemunha, solicitando-lhe que prestasse as declarações que entendesse sobre o objecto da acusação e da resposta à nota de culpa, cuja fotocópia a Ré também remeteu (cfr.fls. 23, do processo disciplinar apenso).
A falta de resposta a essa carta só pode ser imputada à referida testemunha, uma vez que não ficou provado que essa carta não tivesse sido recebida pelo seu destinatário.
Constata-se, assim, que a Ré, procedeu à diligência probatória requerida pelo Autor na resposta à nota de culpa e daí que não possa ser imputado à Ré a violação do direito de defesa do Autor.
Por isso, consideramos que, no caso concreto, não se verifica a justa causa invocada pelo Recorrente para a rescisão do seu contrato de trabalho e, consequentemente, não tem direito à indemnização prevista no art. 36º do RJCCT.".
Entendimento com que se concorda inteiramente, por ser uma lúcida e perfeita análise da matéria de facto provada, sendo apenas de referir que era ao A., como facto constitutivo do seu direito - art. 342º, nº 1, do C. Civil - que incumbia provar o alegado na al. g) da carta de comunicação da rescisão do contrato de trabalho. O que não logrou fazer.
Termos em que não pode proceder a revista.
Assim, decidindo, nega-se provimento à revista e, consequentemente, confirma-se o Acórdão recorrido.

Custas pelo A., sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

Lisboa, 4 de Dezembro de 2002

Azambuja Fonseca (Relator)
Mário Torres
Vítor Mesquita (dispensa de visto).