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CONTRATO DE TRABALHO
CRÉDITO LABORAL
PRESTAÇÃO DE TRABALHO
PRESTAÇÃO SALARIAL
FACTO CONSTITUTIVO
ÓNUS DA ALEGAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
FACTO EXTINTIVO
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Sumário
I - Em acção em que o A. pretende ver reconhecidos créditos salariais, compete-lhe alegar e provar os factos constitutivos de um direito - a celebração e vigência do contrato de trabalho e a prestação de trabalho no período em que alega terem-lhe sido pagas remunerações em quantia inferior ao devido, conforme o acordado ou o estabelecido no IRC aplicável. II - Alegando a Ré que pagou ao A. mais do que este refere ter recebido, a ela incumbe a prova desse pagamento por, nessa medida, constituir facto extintivo do direito do A.. III - Se não foram quesitados os montantes remuneratórios que a Ré alega ter pago ao A., é de ordenar a ampliação da decisão de facto, nos termos do nº3, do art. 729º, do CPC.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
"AA" intentou, em 11.4.97, no Tribunal de Trabalho de Braga, acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra a Empresa - A, pedindo a condenação da Ré a ver reconhecida a ilicitude do seu despedimento e a pagar-lhe a quantia de 5.998.567$00, com juros moratórios incidindo sobre todas as importâncias em que vier a ser condenada, à taxa legal e desde a data da citação até integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese que:
- Foi admitido ao serviço da Ré em 2.1.91;
- Durante o tempo em que prestou serviço para a Ré, a contra-prestação mensal que lhe foi paga foi inferior ao valor mínimo contratualmente fixado para a categoria profissional que lhe assistia;
- Por imposição e no interesse da Ré prestava, diariamente, de segunda a sexta, três horas de serviço para além do período normal de trabalho;
- Por imposição e no interesse da Ré nunca beneficiou de um único dia de descanso semanal ao domingo, sempre tendo trabalhado nos dias considerados feriados, sem que tal trabalho tivesse sido retribuído de forma legal.
- Nunca lhe foi concedido um dia de descanso semanal compensatório, porque trabalhava em jornada semanal ininterrupta;
- A Ré recusou pagar-lhe o subsídio de refeição, prestação que agora pede; e
- despediu-o sem justa causa.
Citada a Ré, contestou pugnando por ver a acção julgada não provada e improcedente, como tal devendo ser absolvida do pedido.
A que o A. respondeu, alegando ter-se a Ré defendido por excepção, devendo essas excepções improceder.
Sanada a causa e elaborada especificação e questionário, em audiência de julgamento foi determinado, pelo despacho a fls. 340, nos termos do art.1º, nº2, do CPT e do art. 545º, nº 2, do CPC, a realização do referido exame à letra do A.
Junto o exame realizado e tendo a Ré referido que fossem recolhidos novos autógrafos do A. para realização de novo exame, tal requerimento foi indeferido - despacho de fls. 488 - ten do a Ré aprovado, recurso recebido para subir com o primeiro que, depois dele, haja de subir imediatamente.
Julgada a causa e dadas as irreclamadas respostas aos quesitos, foi proferida a sentença de fls. 558 a 566 que, julgando parcialmente, procedente, por parcialmente provada, condenou a Ré a apagar ao A.:
"1.1 A quantia de 607.54 Euros (121.80000) de diferenças salariais relativas ao período de Outubro de 1995 a Outubro de 1996, inclusive;
1.2. A quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, relativa às diferenças salariais relativas ao período que vai do início do contrato até Setembro de 1995, inclusive, e de Novembro de 1996 até 23/10/96.
1.3. A quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, correspondente ao trabalho suplementar prestado entre 1992 e 23/10/96.
1.4. A quantia que se vier a liquidar em execução de sentença correspondente aos dias de descanso semanal compensatório que o Autor deixou de gozar.
1.5. A quantia de 1.845,55 Euros (370.000$00) de férias e subsídio de férias relativos aos anos de 1991, 1992, 1993, e 1994.
1.6. A quantia de 181,53 Euros (36.393$00) de remuneração do mês de Outubro de 1996;
1.7. A quantia de 828,78 Euros (166.155$00) de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal do ano de 1996.
2. Declara-se ilícito o despedimento de que o Autor foi alvo e, consequentemente, condena-se a Ré a pagar-lhe:
2.1. as importâncias correspondentes ao valor das retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da data da propositura da acção - 11/04/97 - até hoje, deduzido o montante das importâncias relativas a rendimentos do trabalho auferidos em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento;
2.2 a quantia de 2.036,59 Euros (408.300$00) de indemnização por antiguidade.
3. Sobre as quantias referidas em 1.1, 1.5, 1.6, 1.7 e 2.2. incidem juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação.".
Inconformada, a Ré apelou para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo Acórdão de fls. 752 a 756, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.
Anteriormente, pelo despacho de fls. 750, o Exmo. Juiz Desembargador Relator decidiu julgar deserto o recurso de agravo anteriormente interposto pela Ré, e consequentemente, não tomar conhecimento do mesmo.
Continuando inconformado com o decidido no Acórdão supra identificado, a Ré recorre de revista, nas alegações concluindo:
1.- em virtude de a prova produzida em audiência de discussão e julgamento se encontrar gravada, a recorrente no recurso para o Tribunal da Relação do Porto, pediu a alteração das respostas dadas aos quesitos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 9º, 21º e 22º, pedido - irrecorrível - que foi rejeitado por aquele Tribunal;
2.- porém, decidiu - ilegalmente na perspectiva da recorrente - aquele Tribunal, oficiosamente, com base na alínea b) do nº1 do artigo 712º do Código de Processo Civil, alterar as respostas dadas aos quesitos 7º e 8º, com fundamento em que as mesmas não eram correctas, dando como provadas as retribuições mensais do recorrido entre a data da sua admissão -1991- e Outubro de 1995, por si alegadas, mas que não logrou provar, como lhe competia, na audiência de discussão e julgamento;
3.- cabe nos poderes deste Alto Tribunal censurar o uso que aquele Tribunal fez do disposto naquele normativo legal, pois entende-se, que tal uso foi ilegal e incorrecto, porque extravasou os limites fixados, com todas as consequências legais, nomeadamente manutenção dos factos dados como provados na 1ª instância;
4.- a responsabilidade do ónus da prova da retribuição mensal do trabalhador - que no presente caso, alegou, mas não faz prova da retribuição - cabe a este, nos termos do nº1 do artigo 342º do Código Civil e não à entidade patronal - que no caso presente alegou uma determinada retribuição mensal, superior à alegada pelo trabalhador, sem contudo lograr efectuar essa prova -, como decidiu o Acórdão recorrido, com base no disposto no nº 2 deste artigo e esta questão é uma questão de direito;
5.- em virtude de o Tribunal da Relação ter feito um uso ilegal e incorrecto do disposto naquela faculdade legal, deve a resposta dada aos quesitos 7º e 8º, ser revogada e alterada, mantendo-se o decidido na 1ª instância, mas apenas no que toca aos factos provados, que não às suas implicações jurídicas, as quais não foram correctamente determinadas e aplicadas;
6.- mantendo-se, como deve, a resposta dada na 1ª instância aos quesitos 7º e 8º, ou seja, a não prova da retribuição mensal auferida pelo recorrido entre a data da sua admissão -1991- e Outubro de 1995, tal implica, necessariamente, que os pedidos formulados pelo recorrido, a título de diferenças salariais, trabalho suplementar e descanso semanal compensatório remunerado, ser julgados não provados e improcedentes, com todas as consequências legais e a recorrente absolvida dos mesmos;
7.- no que respeita ao descanso semanal compensatório remunerado, provou-se que o recorrido trabalhou quase todos os domingos e feriados, não se tendo provado, contudo, quantos, questão que a sentença da 1ª instância remeteu - sem fundamento legal bastante, no entender da recorrente - para ser liquidada em execução de sentença, decisão que deve ser revogada e substituída por outra que declare tal pedido não provado e improcedente;
8.- para a condenação da demandada nos pedidos formulados a título de diferenças salariais, trabalho suplementar e descanso semanal compensatório remunerado, era e é essencial, conhecer o salário mensal do recorrido naqueles anos, e não se conhecendo, não podia a recorrente ser condenada, seja em que termos for;
9.- condenar a recorrida a pagar a título de diferenças salariais, trabalho suplementar e descanso semanal compensatório - sem se ter provado sequer quantos domingos e feriados foram trabalhados pelo recorrido -, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, seria dar ao recorrido uma segunda oportunidade de fazer ou tentar fazer ou de suprir ou tentar suprir na acção executiva a prova do salário que não logrou fazer ou em que fracassou na presente acção declarativa, nova prova que está legalmente vedada, nomeadamente pelos artigos 342º, nº1 do Código Civil e artigos 471º, nº1 e 661º, nº2 do Código de Processo Civil;
10.- decidindo no sentido em que foi descrito, o douto Acórdão recorrido violou, pelo menos o disposto no artigo 342º do Código Civil e artigos 471º, nº1, 661º, nº2 e alínea b) do nº 1º do artigo 712º do Código de Processo Civil, pelo que deve ser revogado e substituído por outro, que, no que toca à matéria de facto dos quesitos 7º e 8º, mantenha, com todas as consequências legais, a decisão proferida quanto aos mesmos em 1ª instância, e revogando o Acórdão, que negou provimento ao recurso no que toca à questão de a sentença da 1ª instância ter relegado para a execução de sentença, a liquidação das quantias a pagar pela recorrente, a título de diferenças salariais, trabalho suplementar e descanso semanal compensatório remunerado, substituindo-o por outro que julgue provido e procedente os pedidos do recorrente no presente recurso.
PELO EXPOSTO
- requer-se a V. Exas. Exmos. Senhores Juízes Conselheiros, se dignem julgar provido e procedente o presente recurso e consequentemente revogar-se integralmente o douto Acórdão recorrido, substituindo-o por outro que declare e reconheça, com todas as consequências legais:
1.- que no âmbito de um contrato de trabalho, o ónus da prova da retribuição mensal do recorrido/trabalhador, é da responsabilidade deste e não da recorrente/entidade patronal, questão que é uma questão de direito;
2.- que o Tribunal da Relação do Porto, ao alterar oficiosamente, a resposta dada aos quesitos 7º e 8º, dando-os como provados, não respeitou os limites impostos pela alínea b) do nº1 do artigo 712º do Código de Processo Civil, e consequentemente pede-se a V. Exas. se dignem decidir que esta faculdade não foi usada com respeito pela lei e com correcção e daí que deva ser revogada, com todas as consequências legais, mantendo-se a resposta dada em 1ª instância, que considerou não provada a matéria constante do quesito 7º;
3.- que a manutenção da decisão da 1ª instância no que toca à decisão da matéria de facto dada como provada nos artigos 7º e 8º, não permite, por tal ser ilegal, que seja relegada para liquidar em execução de sentença o apuramento do salário mensal que o recorrido auferiu entre a data da admissão -1991- e Outubro de 1995, para efeitos de cálculo de eventuais diferenças salariais, trabalhado suplementar e descanso semanal compensatório remunerado, cujos pedidos por este formulados, devem ser definitivamente julgados não provados e improcedentes, com todas as consequências legais;
4.- que julgue não provado e improcedente, com todas as consequências legais, o pedido formulado a título de descanso semanal compensatório e remunerado, e cujo montante em causa o Juiz do julgamento, relegou para liquidar em execução de sentença "quantos domingos e feriados" o recorrido-trabalhou".
Assim decidindo, V.Exas. farão, como é costume, JUSTIÇA no caso concreto.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto Parecer de fls. 786 a 792, aí concluindo:
" Termos em que, ao abrigo do disposto no art. 729º, nº 3, do CPC, somos de parecer que será de determinar a ampliação da matéria de facto, nos termos atrás referidos.
Ainda que, de acordo com o estabelecido no art. 730º nº1, do mesmo Código seja de declarar que não assiste razão à Ré na impugnação que deduziu a propósito da repartição do ónus da prova e no que respeita à condenação que sempre lhe deverá ser imposta de pagar ao A. as quantias que se liquidarem em execução de sentença quando não fique demonstrada, na acção a extensão do direito reivindicando (art. 661º, nº 2, do CPC".
Foram colhidos os vistos.
Vejamos a matéria de facto que vem provada.
Na 1ª Instância foram dados como provados os seguintes factos:
1 - A Ré é dona de um estabelecimento de fabrico e venda ao público de pão, produtos afins e seus derivados, sito no lugar da Igreja, freguesia de Pedralva e doutros com a mesma natureza, localizado na Rua, .. Braga al. A) da especificação.
2 - O A. foi admitido ao serviço da Ré em 1991, verbalmente e por tempo indeterminado, para trabalhar no sector de fabrico do estabelecimento sito na Rua de santo André, sob as suas ordens, direcção e fiscalização - al. B) da especificação.
3 - O A. ingressou na Ré com a categoria profissional de aprendiz do 1º ano - al.c) da especificação.
4 - Desde a data em que foi admitido, o A. passou a trabalhar para a Ré num estabelecimento sito na Rua de Santo André, de 2ª a 6ª feira, das 9 às 12 horas e das 13 às 20 horas, ao sábado das 05 às 13 horas e quase todos os Domingos e Feriados das 05 às 13 horas - resposta aos quesitos 2º e 10º.
5 - Em data que não foi possível determinar, o A. passou a trabalhar no estabelecimento da Ré, sito no lugar da Igreja, freguesia de Pedralva, de 2ª a sábado, das 00 às 7 horas e, quase todos os Domingos e Feriados, das 00 às 08 horas - resposta ao quesito 3º.
6 - Em data que não foi possível fixar, o A. passou novamente a trabalhar no estabelecimento e horário referidos na resposta ao quesito 2º - resposta ao quesito 4º:
7 - Posteriormente, em data que não foi possível determinar, voltou a ser transferido para o estabelecimento referido na resposta ao quesito 3º, com o horário aí também referido e, mais tarde, voltou para o estabelecimento e horários referidos na resposta ao quesito 2º - resposta ao quesito 5:
8 - A partir de Janeiro de 1993, após a saída do colega BB, no período das 13 às 20 horas, o A, passou a ser o único trabalhador ao serviço executando, sempre que necessário e sem o auxílio de quem quer que fosse, todas as tarefas de amassar a farinha a panificar, sendo responsável pelo bom fabrico do pão, alimentação, regulação e funcionamento dos fornos destinados a cozer pão, enfornamento, boa cozedura e desenfornamento - resposta ao quesito 6º.
9 - Entre Outubro de 1995 e Outubro de 1996 o A. auferia a contrapartida mensal ilíquida de 58.000$00 - resposta aos quesitos 7º e 8º.
10 - O horário de trabalho praticado pelo A. era lhe imposto pela Ré - resposta ao quesito 9º.
11 - Sempre que trabalhava aos domingos e feriados o A. fazia-o com o conhecimento e consentimento da Ré e no interesse de ambos - resposta ao quesito 11º.
12 - Pelo trabalho prestado pelo A. aos domingos e feriados, a Ré pagava-lhe importância cujo montante se desconhece - resposta ao quesito 12º.
13. A Ré nunca concedeu ao A. um dia de descanso semanal compensatório e remunerado - resposta aos quesitos 13º e 27º.
14 - O A. não gozou qualquer período de férias nos anos de 1991, 1992, 1993 e 1994 nem recebeu da Ré o respectivo subsídio - respostas aos quesitos 14º e 16º.
15 - A Ré não pagou ao A. a remuneração correspondente a 16 dias de trabalho prestado no mês de Outubro de 1996 - resposta ao quesito 17º.
16 - No dia 17/10/96 o A. não pareceu ao trabalho - resposta ao quesito 18º.
17. A Ré enviou ao A. a carta de fls. 30, que este recebeu em 22/10/96 - alínea E) da especificação e respostas aos quesitos 20º e 29º.
18 - Em 23/10/96 o A. compareceu nas instalações da Ré, na freguesia de Pedralva, cerca das 16 horas, perante o gerente Sr. CC a fim de receber ordens para reiniciar o trabalho naquele mesmo dia - resposta ao quesito 21º.
19 - Aquele gerente disse ao A. que ali já não trabalhava mais e se fosse embora, por não haver mais trabalho para ele - resposta ao quesito 22º.
20 - A Ré não pagou ao A. a remuneração correspondente aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, referentes ao trabalho prestado no ano de 1996 - resposta ao quesito 23º.
21 - A Ré nunca pagou ao A. qualquer quantia a título de subsídio de alimentação - al. D) da especificação.
22 - Todos os dias, o pequeno almoço, o almoço e o lanche eram proporcionados ao A. pela Ré, nos seus estabelecimentos, não despendendo o A. qualquer quantia com tais refeições - resposta ao quesito 24º.
23 - A Ré levava o A. para casa, assim como o trazia em seus próprios veículos - resposta ao quesito 25º.
24 - Os factos referidos nos quesitos 24º e 25º faziam parte do acordado contratualmente entre A. e Ré - resposta ao quesito 26º.
A Ré, na apelação impugnou as respostas dadas aos quesitos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 9º, 21º e 22º - houve gravação de prova em audiência de julgamento - não tendo obtido provimento.
Mas, do Acórdão recorrido, consta:
"Apesar disso, a decisão proferida sobre a matéria de facto não pode ser integralmente mantida, por não podermos aceitar a resposta que foi dada aos quesitos 7º e 8º. Vejamos porquê.
Na petição inicial o Autor alegou que foi admitido ao serviço da ré em 2.1.91 e que como contrapartida do seu trabalho auferiu 20.000$00 líquidos a partir daquela data, 25.000$00 líquidos a partir de 1.7.91, 35.000$00 líquidos a partir de 1.1.93, 40.000$00 a partir de 1.1.94, 52.000$00 líquidos a partir de 1.7.95 e 58.000$00 de Setembro. 95 em diante, excepto em Julho.96 mês em que só auferiu 44.467$00 (vide artigos 2º, 8º e 11º da petição inicial).
A Ré impugnou a data de admissão e as retribuições referidas, alegando que o autor só foi admitido em 1.9.92 e que lhe pagou a retribuição base mensal de 33.000$00 de Setembro.92 até Março.93 inclusive, 37.100$00 desde Abril. 93 até Abril.94 inclusive, 51.400$00 desde Maio.94 até Agosto.95 inclusive e 58.000$00 de Setembro.95 até à data da cessação do contrato (artigos 2º e 7º da contestação).
Os quesitos 1º,7º e 8º foram elaborados com base em factos alegados pelo autor e a sua redacção era a seguinte:
"1º O A. foi admitido ao serviço da Ré em 2.1.91?
7º - O A. auferiu da Ré as seguintes retribuições mensais: de 2.1.91 a 1.7.91, 20.000$00 líquidos: de 1.7.91. a 1.1.93, 25.000$00; de 1.1.93 a 1.1.94, 35.000$00; de 1.1.94 a 1.7.95, 40.000$00 líquidos e desde 1.7.95, 52.000$00 líquidos?
8º - A partir de 1.9.95 e até Setembro de 1996, o A. auferiu da Ré a retribuição mensal de 58.000$00, com excepção de Julho de 1996, em que auferiu 44.467$00?"
Àqueles quesitos, o tribunal deus as seguintes respostas:
"Quesito 1º - Provado que o autor foi admitido ao serviço da ré em 1991.
Quesitos 7º e 8º - Provado apenas que entre Outubro de 1995 e Outubro de 1996, o autor auferiu a contrapartida mensal ilíquida de 58.000$00."
Das respostas referidas, resulta que os factos contidos no quesito 7º não foram considerados provados e que os contidos no quesito 8º só parcialmente foram considerados como tal, mas, salvo o devido respeito, tais respostas não estão correctas. Com efeito, recaindo sobre a entidade empregadora o ónus da prova do pagamento de retribuição (art. 342º, nº2, do C.C.) e não tendo a ré provado que pagou as retribuições que alegou ter pago, temos de dar como provado que o autor auferiu, pelo menos, as retribuições que confessou ter recebido da ré.
Deste modo e considerando a resposta que foi dada ao quesito 1º, decide-se alterar, ao abrigo do disposto no art. 712º, nº1, b) do CPC, a resposta dada aos quesitos 7º e 8º e, consequentemente, alterar o ponto 9 da matéria de facto supra cuja redacção passa a ser a seguinte:
Provado que o autor auferiu da ré as seguintes retribuições mensais líquidas: 25.000$00 desde a data de admissão até 1.1.93; 35.000$00 de 1.1.93 a 1.1.94; 40.000$00 de 1.1.94 a 1.7.95 e 52.000$00 ilíquidos desde 1.7.95 até 1.9.95, 58.000$00 desde 1.9.95 até Setembro.96 excepto no mês de Julho de 1996 no qual auferiu apenas 44.467$00 - respostas aos quesitos 7º e 8º".
Comecemos por ver da matéria de facto, no concernente à resposta dada aos quesitos 7º e 8º no Acórdão recorrido.
Na petição inicial (arts. 2º, 8º e 11º) o A alegou que foi admitido ao serviço da Ré em 2.1.91 e que, como contrapartida do seu trabalho, auferiu, líquidos:
- 20.000$00 a partir daquela data,
- 25.000$00 a partir de 1.7.91,
- 35.000$00 a partir de 1.1.93,
- 40.000$00 a partir de 1.1.94,
- 52.000$00 a partir de 1.7.95, e
- 58.000$00 de Setembro de 95 em adiante, excepto em Julho de 96, mês em que auferiu 44.467$00.
A Ré impugnou as retribuições auferidas e alegou - art. 7º da contestação - que o A. só foi admitido em 1.9.92 e que lhe pagou a retribuição base mensal de:
- 33.000$00 de Setembro de 92 até Março de 93, inclusive,
- 37.100$00 desde Abril de 93 até Abril de 94, inclusive,
- 51.400$00 desde Maio de 94 até Agosto de 95, inclusive, e
- de 58.000$00 de Setembro de 95 até à data da cessação do contrato.
Numa acção em que se pretende ver reconhecidos créditos salariais, compete ao A. alegar e provar os factos constitutivos do seu direito (art.341º, nº1 do C. Civil), ou seja, a celebração e vigência do contrato de trabalho e a prestação de trabalho no período em que invoca terem-lhe sido pagos salários em quantia inferior ao devido, conforme o acordado ou o instrumento de regulamentação colectiva aplicável. Devendo, ainda, alegar os salários que efectivamente auferiu, nesse período, por forma a poder quantificar-se as diferenças que lhe são devidas, se existentes.
Demonstrada a vigência do contrato de trabalho e que o A. realizou a prestação a que se obrigou pelo mesmo, é de concluir que nasceu na sua esfera jurídica o direito à contra prestação que se consubstancia na obrigação retributiva que recai sobre a entidade patronal (arts.1º e 82º ambos da LCT).
Assim, o cumprimento desta obrigação (pagamento do salário) traduz-se num facto extintivo dos direitos do A., que este pretende fazer valer (art. 762º, do C.Civil), incumbindo-lhe o respectivo ónus probatório. Neste sentido, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 132, Pereira Coelho, Obrigação pág. 215 e o Acórdão do STJ de 30.1.02. Rev. 1433/01.
Uma vez alegada e provada a vigência do contrato de trabalho e a prestação de trabalho pelo trabalhador, é de considerar que os salários relativos ao período em causa são devidos por provados os factos constitutivos do direito a eles.
Quanto ao pagamento dos salários, deve desde logo, considerar-se que o A. recebeu, nesse período, pelo menos, os salários mensais por si alegados como recebidos, na petição inicial e, na medida em que alega ter auferido tais montantes, o A. faz uma declaração confessória que implica que se considere estrita a obrigação retributiva de uma entidade patronal nessa medida - cfr. art. 352º e 2s do C.Civil.
No caso concreto, constata-se que, para além da alegação do A., a Ré alegou na contestação ter-lhe pago salários de valor superior ao constante da petição inicial.
Esta alegação da Ré tem inequívoco relevo para a decisão da causa porque constitui a alegação de um facto extintivo - no todo ou em parte - da obrigação que sobre ela recai, na medida do que alegou quanto ao pagamento.
Ora, vendo o questionário - a fls. 54 e 55 - verifica-se do mesmo não consta qualquer quesito - nem, posteriormente, foi aditado, em audiência de julgamento, qualquer quesito - em que se fizeram constar os pagamentos alegados pela Ré, não tendo sido dado à Ré oportunidade de provar ter procedido aos pagamentos que alega.
Com efeito, nos quesitos 7º e 8º apenas se pergunta o alegado pelo A., em lado algum se perguntando o alegado pela Ré.
E, do antecedente, resulta que a matéria constante destes dois quesitos devia, antes, ter sido levada à especificação, de forma a considerar-se escrita que o A. recebeu "pelo menos" esses montantes.
E, no douto Acórdão recorrido, também se entende não se ter agido correctamente, quanto a esta matéria.
Com efeito, perante a resposta dada a estes quesitos na 1ª Instância - "Provado apenas que entre Outubro de 1995 e Outubro de 1996, o autor auferiu a contrapartida mensal ilíquida de 58.000$00" - O Acórdão recorrido alterou-a fazendo de resposta a eles constar os factos que o A. confessou a respeito da retribuição auferida. Ao assim decidir, o Acórdão recorrido actuou em desconformidade com o estatuído no art. 646º, nº 4, do CPC, segundo o qual se têm por não escritas as respostas do colectivo dadas sobre factos provados por confissão das Partes e foi precisamente a confissão do A. que o Acórdão em crise usou para alterar a resposta aos quesitos 7º e 8º.
Tais montantes alegados pelo A. são, como referido de ter em conta e, como bem se diz no Acórdão em apreço, recai sobre a entidade empregadora o ónus de prova do pagamento de retribuição - art.342º, nº2, do C.Civil - já não se podendo concordar com a afirmação, dele constante, de que a Ré não provou "que pagou as retribuições que alegou ter pago", porque não teve possibilidade de o fazer, dado não ter sido submetida a provar a alegação que a este propósito, fez.
Assim, em conclusão, entende-se que a Ré articulou factos controvertidos e não quesitados que são relevantes para a decisão a proferir.
Há, assim, que, nos termos do art. 729º, nº3, do C. Civil, ampliar a matéria de facto.
Desde já se referindo que, nos termos do art. 730º, nº1, do mesmo Código, no julgamento de causa ter-se-ão em consideração as regras de repartição do ónus de prova, constantes do art. 342º, do C.Civil, na interpretação supra enunciada, que não coincide com o entendimento expresso pela Ré nas alegações de revista, devendo quantificar-se as diferenças salariais devidas atendendo à prova que for feita quanto aos montantes efectivamente pagos e aos que a sentença de 1ª Instância considerou serem devidos ao A. por força do instrumento de regulamentação colectiva aplicável.
Vejamos, agora, da condenação da Ré, no que se apurar, em liquidação em execução de decisão, quanto à fixação do montante de trabalho suplementar prestado a partir de 1992, por não ter sido possível determinar os períodos em que o A. concretamente trabalhou e à fixação do montante em débito a título de descanso semanal compensatório e remunerado, por se desconhecer quantos domingos e feriados o A. trabalhou.
Com efeito, se é certo que para o apuramento das diferenças salariais apenas há que apurar quais as remunerações mensais efectivamente pagas ao A. - e sobre esta matéria a Ré irá, agora, ter a possibilidade de provar os pagamentos que alegou - e compaginá-las com o salário convencionalmente devido, quanto ao trabalho suplementar e ao descanso compensatório, a questão não se apresenta de modo tão simples, nem ficará resolvida com a ampliação fáctica que irá ter lugar, ou não, consoante a prova a produzir.
Quanto a estes dois aspectos, entendemos que não se pode afirmar, como considerou o Acórdão recorrido, que, uma vez apuradas as retribuições efectivamente recebidas pelo A., deixa de subsistir o fundamento invocado pela Recorrente.
É certo que a Ré/Recorrente invocou, perante o Tribunal da Relação que tais pedidos deviam ter sido julgados improcedentes, pelo facto do A./Recorrido não ter logrado provar os salários que recebeu, alegando que "relegar para liquidação em execução de sentença os montantes em causa seria conferir ao demandante uma segunda oportunidade, uma via de suprir, na acção executiva, aquela falha ou fracasso na prova na presente acção declarativa e tal prova, já não é legalmente possível, ao abrigo do disposto no artigo 342º, nº 1, do Código Civil e nos artigos 471º, nº1 e 661º, nº2, do Código de Processo Civil".
E também é certo que vem agora invocar que a manutenção da decisão da 1ª Instância, no que toca à decisão da matéria de facto provada nos quesitos 7º e 8º, não permite a relegação para liquidação em execução de sentença o apuramento do salário mensal que o A. auferiu entre 1991 e 1995 para efeitos de cálculo de eventuais diferenças salariais, trabalho suplementar e descanso semanal compensatório remunerado, por isso entendendo que estes pedidos devem definitivamente ser julgados improcedentes (conc. 3ª das alegações de revista).
E, com efeito, se quanto ao apuramento em execução de sentença das retribuições efectivamente pagas, a questão deixará de se colocar pela ampliação da matéria de facto, o certo é que ela insiste quanto ao trabalho suplementar e ao descanso compensatório.
Recordamos o que, com interesse para esta questão, está provado:
- Desde a data em que foi admitido, o A. passou a trabalhar para a Ré num estabelecimento sito na Rua de Santo André, de 2ª a 6ª feira, das 9 às 12h e das 13 às 20h, ao sábado das 5 às 13h e quase todos os domingos e feriados das 5 às 13h (respostas aos quesitos 2º e 10º);
- Em data que não foi possível determinar, o A. passou a trabalhar no estabelecimento da Ré sito no lugar da Igreja, freguesia de Pedralva, de 2ª a sábado, das 00h às 7h e quase todos os Domingos e Feriados das 00h às 8h. (resposta ao quesito 3º);
- Em data que não foi possível fixar, o A. passou novamente a trabalhar no estabelecimento e horário referidos na resposta ao quesito 28º (resposta ao quesito 4º);
- Posteriormente, em data que não foi possível determinar, voltou a ser transferido para o estabelecimento referido na resposta ao quesito 3º, com o horário aí também referido e, mais tarde, voltou para o estabelecimento e horários referidos na resposta ao quesito 2º (resposta ao quesito 5º); e
- A Ré nunca concedeu ao A. um dia de descanso semanal compensatório renumerado (resposta aos quesitos 13º e 27º)
Perante esta factualidade (vejam-se os pontos 4 a 7 e 13 da matéria de facto provada) é possível afirmar que existe uma obrigação a cargo da Ré/Recorrente de pagamento ao A. de trabalho suplementar prestado a partir de 1992 (atento o disposto no art. 38º, do LCT) e até 23.10.96 (data do despedimento do A.) e do valor relativo ao descanso semanal compensatório que o A. deixou de gozar (cf. os arts. 7º e 9º do DL 421/83, de 2.12. e as cláusulas 20ª e 29ª do CCT publicado no BTE, 1ªs. nº7 de 22.2.82 e P.E. no BTE, 1ªs, nº 23, de 22.6.82, pág 1309).
Porém, é impossível quantificar esta obrigação por se não ter determinado os períodos em que o A. concretamente trabalhou no estabelecimento da Ré sito na Rua de S. Vicente e em quantos domingos e feriados o A prestou trabalho (mas certo que está provado que trabalhou "quase todos").
Assim, face ao constante do art. 661º, do CPT, aplicável "ex vi" do art. 1º nº 2, al. a), do CPT, não constando dos autos os elementos indispensáveis para fixar o quantitativo da obrigação a cargo da Ré, é correcto negar para execução de sentença a fixação do "quantum" de obrigação.
Tudo visto e decidido, anula-se a decisão recorrida e determina-se a ampliação de matéria de facto nos termos supra indicados, sem prejuízo de o poder ser noutros pontos em que se já necessário e possível face à prova a produzir, para que se determina a baixa dos autos ao Tribunal da Relação do Porto.
Custas a final.
Lisboa, 18 de Junho de 2003
Azambuja da Fonseca,
Vítor Mesquita ,
Ferreira Neto.