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TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
MEDIDA DA PENA
MEIOS DE PROVA
PROIBIÇÃO DE PROVA
VALOR PROBATÓRIO
DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA
ORGÃO DE POLÍCIA CRIMINAL
Sumário
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I.
Pelo Tribunal Colectivo do 3º Juízo do Tribunal da Comarca da Maia foram julgados os arguidos
1.1- A, de 44 anos, divorciada, comerciante, nascida a 4.11.1956 na freguesia de Leça da Palmeira, em Matosinhos, filha de .... e ..., titular do B.I. nº ....., emitido a 5.2.1990, residente na Travessa Fonte da Muda, s/n, 4450 Leça da Palmeira, actualmente detida preventivamente à ordem dos presentes autos no E.P. Porto;
1.2- B, de 26 anos, casada, cabeleireira, nascida a 1.1.1975, na freguesia de Leça da Palmeira, em Matosinhos, filha de .. e ...., residente na Rua Dr. Manuel Sousa Dias Júnior, nº ..., Leça da Palmeira, Matosinhos, actualmente detida preventivamente à ordem dos presentes autos no E.P. Porto;
1.3- C, de 37 anos, solteira, comerciante, nascida a 17.8.1964, na freguesia de Campanhã, no Porto, filha de ... e ..., titular do B.I. nº ....., emitido a 2.11.1999 pelo A.I. de Lisboa, residente na Rua Maria Feliciano, nº ..., .., ...e, São Mamede de Infesta, Matosinhos,
1.4- D, de 42 anos, casado, sócio gerente, nascido a 16.1.1960, em Constantim, Vila real, filho de .... e ...., residente na Avenida Gago Coutinho, nº ..., Vila Nova da Telha, na Maia, actualmente detido preventivamente à ordem dos presentes autos no E.P.-Porto;
1.5- E, de 32 anos, solteiro, gerente comercial, nascido a 21.3.1969, em Canidelo-Vila Nova de Gaia, filho de ... e ...., residente na Travessa das Chieiras, nº ...., r/ch, Esq, em Vila Nova de Gaia,
1.6- F, de 31 anos, solteiro, desenhador de equipamentos, nascido a 7.5.1970, em Angola, filho de .... e ...., residente na Rua do Progresso, nº ..., Perafita, Matosinhos,
1.7- G , de 34 anos, solteira, empregada doméstica, nascida a 17.8.1967 na freguesia de Paranhos, no Porto, filha de ... e ..., residente no Bairro do Cerco do Porto, Bloco ..., Entrada ..., Casa ..., no Porto,
1.8-H, de 50 anos, viúva, promotora, nascida a 15.5.1951 na freguesia de Campanhã, no Porto, filha de ... e ..., residente na Praceta Pedro Escobar, nº ..., em Vila Nova de Gaia, B.I. nº ...... emitido a 4.9.2000, pelo A.I. do Porto,
acusados pelo Ministério Público da prática dos seguintes crimes:
a)D, em co-autoria material com a arguida A e com a arguida B , um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b), c) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
b)A, em co-autoria material com os arguidos D e B , um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b), c) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
c)B , em co-autoria material com os arguidos D e A, um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
d)C, em autoria material e co-autoria material com a arguida G, um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelos artºs 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b), c) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
e)G, em co-autoria material com a arguida C , um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
f)E , em autoria material, um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1 , com a agravação do artº 24º, alínea b), ambos do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
g)F , em autoria material, um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alínea b), ambos do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
h)H, em autoria material e como reincidente (cfr. artºs 26º, 75º e 76º do Código Penal), um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1 , com a agravação do artº 24º, alínea b), ambos do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela Lei nº 45/96 de 3 de Setembro.
Por douto acórdão daquele Tribunal foi decidido:
«..o Tribunal Colectivo decidiu julgar em parte procedente, por provada, e em parte improcedente, por não provada, a acusação do Ministério Público e, em consequência:
6.1.- Condena a arguida A (atrás identificada), pelo cometimento, como autora material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelos artºs. 21º., nº.1, e 24º., alíneas b) e c), do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 9 (nove) anos de prisão.
6.2.- Condena a arguida B (atrás identificada), pelo cometimento, como autora material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelo artº. 21º., nº.1, do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 7 (sete) anos de prisão.
6.3.- Condena a arguida C (atrás identificada), pelo cometimento, como autora material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelo artº. 21º., nº.1, do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
6.4.- Condena o arguido D (atrás identificado), pelo cometimento, como autor material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelos artºs. 21º., nº.1, e 24º., alínea c), do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 6 (seis) anos de prisão.
6.5.- Condena o arguido E (atrás identificado), pelo cometimento, como autor material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelos artºs. 21º., nº.1, do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
6.6.- Condena o arguido F (atrás identificado), pelo cometimento, como autor material, de um crime de «tráfico de estupefacientes», p. e p. pelos artºs. 21º., nº.1, do Decreto-Lei nº.15/93, de 22/1, na pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
6.7.- Absolve os seis acima referidos arguidos de tudo o mais que lhes vinha imputado.
6.8.- Absolve a arguida G , da prática, em co-autoria material com a arguida C, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b) e j) do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
6.9.- Absolve a arguida H, da prática, em autoria material, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº1, com a agravação do artº 24º, alíneas b), do Dec. Lei nº 15/93 de 22.1, com as alterações introduzidas pela lei nº 45/96 de 3 de Setembro;
6.10.(...)
6.11.- Declaram-se perdidos a favor do Estado os diversos estupefacientes, o "traço holandês" e demais produtos de mistura, os artefactos apreendidos à A, o BMW do E, os telemóveis da A, B e C, por utilizados no tráfico ou adquiridos com rendimentos dele; os 70.000$00 e as 7.000 pesetas apreendidas à A, e os 434.000$00 apreendidos à B e provenientes das respectivas actividades ilícitas - artsº. 35º a 38º., do Dec.-Lei 15/93.
O Ministério Público e os arguidos B, E, F, A e D recorreram desta decisão para o Tribunal da Relação do Porto que, por douto acórdão, decidiu:
«...Termos em que acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em não tomar conhecimento do recurso de A, negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos B, E, F e D, e em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo MºPº, e em consequência revogar o acórdão recorrido nos seguintes termos:
a) Condenar a arguida A, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21º, nº1 e 24º, als. b) e c) do DL nº 15/93, de 22JAN, na pena de 10 anos de prisão, o arguido D, como autor material, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21º, nº1 e 24º, al. c) do DL nº 15/93, de 22JAN, na pena de 9 anos de prisão, a arguida B , como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, do DL nº 15/93, de 22JAN, na pena de 8 anos de prisão, e a arguida C , como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, do DL nº 15/93, de 22JAN, na pena de 6 anos de prisão.
b) Declarar perdidos a favor do Estado o apartamento da arguida A, sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, nº ....., 1º Direito, em Leça da Palmeira, os veículos Audi, modelo A3, matrícula OE e Peugeot, modelo 206, matrícula OI, nos termos do art. 35º, nº1, do DL nº 15/93, de 22JAN, na redacção dada pela Lei nº 45/96, de 3SET, bem como as quantias monetárias apreendidas nos autos pertencentes á arguida A, nos montantes de 75 128$00, 300 000$00 e 348$00 (fls. 937 e 1025), e no montante de 69 310$00 á arguida C (fls. 1025), nos termos do art.38º, do DL nº 15/93, de 22JAN;
c) Mantém-se quanto ao mais o acórdão recorrido.»
Do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto recorreram os arguidos B , A e D, concluindo as suas motivações da forma seguinte:
A arguida A (fls. 4502 a 4505):
«1.ª - De harmonia com o disposto no art. 119.º, al. b), do CPP, constitui nulidade insanável, deve ser oficiosamente declarada, a ausência do Ministério Público relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência.
2.ª - Assim, o processado posterior à apresentação do requerimento de fls. 4021 a 4022, da arguida A em que invoca justo impedimento para o pagamento da multa a que alude o art. 145.º do CPP, fora do prazo legal, e consequentemente da interposição do recurso para além do prazo previsto na lei, é nulo, por violação do disposto no art. 107.º, n.º 2 do CPP.
3.ª - Assim sendo, a inquirição da testemunha arrolada pela arguida terá que ser repetida, a fim de se averiguar se se verifica ou não a situação de justo impedimento, nos termos dos arts. 107.º, n.º 2 e 122.º, n.ºs 1 e 2 do CPP, e se o recurso se mostra ou não tempestivamente interposto, com a notificação ao Ministério Público, bem como aos restantes sujeitos processuais da apresentação do aludido requerimento, e de todo o processado posterior.
4.ª - Procedendo assim, como procedeu a questão prévia suscitada pelo Ministério Público relativa à nulidade invocada, deveria ter sido determinada a anulação do processado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 a 4022.
5.ª - Houve claro desrespeito pelo disposto nos arts. 119.º, al. a), do CPP, bem como do disposto nos arts. 107.º, n.º 2, 122.º, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma.
Acresce que
6.ª - Face à factualidade dada como assente em 1.ª instância, nomeadamente o facto de a arguida estar arrependida; os vizinhos e amigos nada referirem em desabono do seu comportamento anterior aos factos; ter bom comportamento prisional; ter uma filha menor de 8 anos a cargo; colaborar no apuramento da verdade, ao invés de todos os demais co-arguidos, seria justo, não se conhecendo, como não se conheceu do mérito do recurso que interpôs e mesmo que se conhecesse e que derivasse na respectiva improcedência, que a pena aplicada em 1.ª instância não sofresse qualquer alteração.
7.ª - O douto acórdão de que ora se recorre olvidou tal realidade e ateve-se apenas na conduta criminosa da arguida propriamente dita e no tempo em que a mesma persistiu com tal conduta.
8.ª - Não foi convenientemente aplicado o disposto nos arts. 21.º e 24.º, als. b) e c) do DL n.º 15/93, de 22-01, nem correcta e adequadamente aplicado o disposto no art. 71.º do Código Penal, preceito este que define os critérios para a fixação da medida concreta da pena.
A recorrente é primária e está bem inserida social e familiarmente.
9.ª - Não é, pois, de aplicar à arguida pena superior a 9 anos de prisão.
10.ª - Não foi provado, em 1.ª instância e o acórdão então proferido até é claro, nesse aspecto, que as quantias em numerário, cujo perdimento foi ora declarado, tivessem qualquer relação com o tráfico levado a cabo pela recorrente.
11.ª - O douto acórdão proferido em 1.ª instância andou bem na parte em que decretou o não perdimento do apartamento a favor do Estado. E até é taxativo quando refere que não se provou "que a serventia do apartamento da A se confinasse aos actos de tráfico nem se alegou concretamente se foi adquirido com produto de tráfico ou através dele".
12.ª - Não há razão para alterar o decidido em 1.ª instância face à factualidade provada já que
13.ª - Houve, então, obediência às regras dos arts. 35.º a 38.º do DL 15/93, de 22-01 e não se percebe porque tal foi ora alterado no acórdão de que se recorre.
14.ª - O acórdão recorrido é que, ao decidir em sentido diverso viola frontalmente os aludidos comandos maxime os dos arts. 35.º, n.º 1 do cit. Dec-Lei.
XV - A decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que, em obediência a tais normativos, mantenha o decidido em 1.ª instância.
XVI - Revogando-se a decisão recorrida nos termos sobreditos far-se-á justiça.
A arguida B (fls. 4473 a 4475):
«1.ª - O douto acórdão concedeu parcial provimento ao recurso do M.P. e revogou o acórdão proferido em 1.ª instância, condenando a arguida na pena de 8 anos de prisão, como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22-01.
2.ª - Com relevância para a qualificação jurídica a operar ficou provado que a arguida recebeu 100.000$00 duma intermediação num negócio de estupefaciente e foram-lhe apreendidas 300 gramas de heroína em sua casa.
3.ª - Da análise dos factos provados, da fundamentação do acórdão recorrido e do contexto global do mesmo pode concluir-se com precisão que a arguida foi sempre uma passiva a agir por conta e no interesse da co-arguida A, I ou do marido J.
4.ª - Da factualidade provada não tem qualquer relevância jurídico-penal: a entrega à C de um saco cujo conteúdo e peso se desconhece totalmente, não podendo o julgador, por um juízo comum afirmar com certeza que era produto estupefaciente; os 200 gr. do quilo de heroína aprendido à A, porquanto tal transacção não chegou a concretizar-se; e, bem assim, o "traço holandês" que não é, sequer, um produto estupefaciente.
5.ª - Não ficou provado a habitualidade dado que a actuação ilícita da arguida se resume aos poucos actos referidos em 2.ª, que se concretizam também, num curto espaço de tempo (apenas alguns meses).
6.ª - Também não ficou provado a obtenção de lucros avultados; pelo contrário, da factualidade provada resulta que a arguida contraiu dívidas, em empréstimo bancário, não tem contas bancárias com saldos positivos nem movimentos significativos e não tem quaisquer bens ou sinais externos de riqueza.
7.ª - A arguida colaborou com as autoridades policiais e judiciárias desde o início do inquérito até à audiência de julgamento inclusive, onde, como resulta da matéria de factual provada, "confessou parcialmente os factos".
8.ª - Assim, a culpa da recorrente, no contexto global é diminuta e atentas as quantidades apreendidas, os poucos actos de transacção apurados e numa análise comparativa dos comportamentos dos restantes co-arguidos, implicarão, necessariamente, que a pena, em concreto, se aproxime mais do seu limite mínimo.
9.ª - Fazendo a média entre o limite mínimo e máximo da moldura penal do crime a pena ora aplicada pelo douto acórdão recorrido coincide com a média de 8 anos.
10.ª - Atendendo nos critérios fixados no art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01 e 71.º do CP, a pena da recorrente não deverá ultrapassar os 4 anos e 6 meses de prisão.
11.ª - O douto acórdão ora recorrido decidiu, ainda, declarar perdido a favor do Estado o veículo marca Audi, modelo A3, matrícula OE.
12.ª - Porém, o referido veículo pertence à sociedade "Sucristecto, Lda", que usou do incidente previsto no art. 36.º do DL 15/93, de 22-01, tendo sido indeferido.
13.ª - Curiosamente, da matéria factual provada resulta que a co-arguida A regra geral fazia-se transportar num veículo marca Renault Kangoo e só esporadicamente o fazia na companhia da nora e co-arguida B; sendo certo que tal viatura foi entregue ao seu proprietário.
14.ª - Não resultou provado que a aquisição do veículo apreendido à recorrente esteja relacionado com qualquer actividade ilícita.
15.ª - Também não logrou provar-se as condições em que a recorrente detinha tal veículo, nem tão-pouco que a utilização principal do citado veículo fosse a prática de actos ilícitos.
16.ª - Assim sendo, apenas porque resulta da matéria factual provada que a recorrente utilizou aquele veículo nas deslocações ao "Continente", Tuy e Leça (e não mais), não pode concluir-se que existe uma relação de causalidade significativa e jurídico-penalmente relevante entre a sua utilização e a prática de factos ilícitos; logo, o veículo deve ser entregue ao seu proprietário.
17.ª - Foram violados os arts. 71.º do CP, 21.º, n.º 1 e 35.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22-01.
Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso revogando-se o acórdão recorrido e condenando-se a arguida B em pena de prisão não superior a 4 anos e 6 meses de prisão e decidindo-se pela devolução do veículo marca Audi, modelo A3, matrícula OE à sua proprietária.»
O arguido D (fls. 4506 a 4554):
1.ª - O Tribunal alicerçou a sua convicção, entre outros, nos depoimentos das testemunhas Inspector L e Inspector M, contudo, na parte em que tais depoimentos se referem a expressões alegadamente proferidas pelo recorrente, e não reduzidas a auto, os mesmos são insusceptíveis de serem valorados, pois que não se afigura compatível com o princípio da legalidade, plasmado no artigo 125.º do C. P. Penal, a inquirição das testemunhas sobre o conteúdo de eventuais declarações do arguido, as quais, caso tivessem sido reduzidas a auto, não poderiam ser lidas na audiência de julgamento.
2.ª - Tal valoração importa uma clara violação dos arts. 129.º, 130.º, 356.º, n.º 7 do C. P. Penal.
3.ª - Acresce que inexiste qualquer correspondência lógica entre os factos dados como provados, a prova produzida e consequente decisão condenatória, sendo que o recorrente foi condenado com base em prova meramente indiciária.
4.ª - Ultrapassando o Tribunal os limites impostos pela Lei Penal na valoração da prova, em clara violação do disposto no art. 127.º do C. P. Penal.
5.ª - Sendo certo que a ausência de elementos factuais e probatórios importa, no mínimo, a existência de dúvida razoável quanto à prática pelo recorrente de um qualquer crime e, consequentemente a sua absolvição.
6.ª - Ao confirmar a condenação do recorrente, o acórdão viola o princípio in dubio pro reo e, bem assim, o art. 32.º, n.º 2 da Lei Fundamental.
7.ª - Acresce que, da análise do Acórdão de que ora se recorre, vislumbra o recorrente claro erro notório na apreciação da matéria probatória, erro esse que resulta do próprio texto da decisão ora recorrida e com base no qual foi aumentada a medida da pena de prisão, pois, o Tribunal entendeu, à revelia do princípio in dubio pro reo, que o recorrente além de ter praticado actos de tráfico (???) os havia praticado de forma agravada em virtude da expectativa de obter "avultada compensação monetária".
8.ª - Contudo o acórdão não indica qualquer facto concreto que importe a conclusão, judicialmente considerada e efectivamente valorada, de que o recorrente pretendia, sem margem para qualquer dúvida, obter "avultada compensação monetária".
9.ª - Menosprezou o Tribunal o que expressamente consignou no texto do acórdão, a saber, a inexistência de qualquer ligação do ora recorrente a uma eventual actividade ilícita e reiterada dos seus co-arguidos.
10.ª - Face ao aumento da medida da pena de 6 para 9 anos crê o recorrente, ponderados os fundamentos que alicerçam a convicção do Tribunal da Relação, que só por lapso, pois que a contradição é notória, é que ao ora recorrente foi aplicada, em recurso, uma pena de prisão de 9 anos, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, agravada pela injusta, desnecessária e desadequada aplicação in casu do art. 24.º daquele referido decreto lei.
11.ª - Inexistindo na decisão ora recorrida qualquer referência a quais os elementos concretos que determinaram que a medida concreta da pena adequada fosse, em recurso, aumentada.
12.ª Sendo certo que, o Acórdão de que ora se recorre procura, não raras vezes, incluir o ora recorrente numa qualquer actividade ilícita alegadamente praticada pelos seus co-arguidos, contudo, claramente o exclui dessa mesma prática quando, por exemplo, e a contrario do sucedido àqueles outros, não ordena e declara perdidos a favor do Estado os seus bens.
13.ª - Face a todo o supra exposto, o acórdão recorrido viola, não só o art. 125.º, 127.º, 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7 do C. P. Penal, como também o art. 21.º e 24.º do DL n.º 15/93, de 22-01, ao ter proferido decisão condenatória sem suporte probatório bastante que a sustentasse e, ainda, o art. 32.º, n.º 2 da Lei Fundamental.
14.ª - Ora, face à inexistência de elementos probatórios bastantes para dar como provada a prática de actos de tráfico, impunha-se a absolvição do ora recorrente. Ou, a entender que a condenação com base em elementos indiciários e à revelia do princípio in dubio pro reo é possível,
15.ª - Sempre seria inaplicável, in casu, a agravação prevista no art. 24.º do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, pois que a mesma teve por base um raciocínio eminentemente dedutivo e ausente qualquer facto concreto que o valide.
16.ª - A subsunção jurídica acima exposta, de acordo com todos os factos constantes dos autos e em respeito dos acima referidos artigos impunha-se ao Tribunal.
17.ª - Encontrando-se verificados, no caso concreto, os vícios previstos nas als. a), b) e c) do art. 410.º do C. P. Penal.
18.ª - Bem como, nulidade parcial do acórdão, nos termos acima expostos e que desde já se argui.
Termos em que V. Ex.as superiormente suprirão deverá o presente recurso merecer provimento, e em consequência ser revogada a decisão condenatória de que ora se recorre, determinando, assim, a absolvição do ora recorrente D da prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º e 24.º, al. c) do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Caso V. Ex.as assim não entendam, e sem prescindir do acima exposto,
Deverão determinar a inaplicabilidade da agravação p. e p. pela al. c) do art. 24.º do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, e em conformidade reduzir a pena de prisão efectiva de 9 anos, em que o ora recorrente foi condenado, em recurso, pelo Tribunal da Relação do Porto.
O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto defendeu na sua douta resposta a manutenção do acórdão desse Tribunal, concluindo (fls.4597 a 4605):
«1.ª - A arguida B entende que, atendendo nos critérios fixados no art. 21.º n.º 1 do DL 15/93 DL.22/1 e 71.º do C P. a pena da recorrente não deverá ultrapassar os 4 anos e 6 meses de prisão.
2.ª - E, ainda, que a douto acórdão ora recorrido merece censura por haver decidido declarar perdido a favor do estado o veículo marca Audi, modelo A3, matrícula OE.
3.ª - A arguida A entende que o processado posterior à apresentação do requerimento de fls. 4021 a 4022, em que esta invocava justo impedimento para o pagamento da multa a que alude a art. 145.º, do CPP, fora do prazo legal, e consequentemente da interposição do recurso para além do prazo previsto na lei, é nulo, por violação do disposto no art. 107.º, 2 do CPP.
4.ª - Procedendo assim, como procedeu a questão prévia suscitada pelo Ministério Público relativa à nulidade invocada, deveria ter sido determinada a anulação do processado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 e 4022.
5.ª - Entende, ainda, a recorrente, na fieira do colar das suas conclusões que:
Atenta a factualidade dada como assente, nomeadamente a considerada pela mesma como atenuativa, que a pena aplicada em 1.ª Instância não deveria sofrer qualquer alteração.
6.ª - O acórdão recorrido é que, ao decidir em sentida diverso violou frontalmente os aludidos comandos maxime os dos art. 35.º. n.º. 1 do cit. Dec-Lei, no que toca ao seu apartamento sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, ......, 1.º Dto, em Leça da Palmeira.
7.ª - E violou-o ao declarar perdidas em favor do Estado das quantias monetárias apreendidas às arguidas.
8.ª - A decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que, em obediência a tais normativos, mantenha o decidida em 1.ª Instância.
9.ª - O arguido V diz que o Tribunal alicerçou a sua convicção, entre outros, nos depoimentos das testemunhas Inspector L e Inspector M, contudo, no parte em que tais depoimentos se referem a expressões alegadarnente proferidas pelo recorrente, e não reduzidas a auto, os mesmos são insusceptíveis de serem valorados, pois que não se afigura compatível com a princípio da legalidade, plasmado no artigo 125. do C. P. Penal, a inquirição das testemunhas sobre o conteúdo de eventuais declarações do arguido, as quais, caso tivessem sido reduzidas a auto, não poderiam ser lidas na audiência de julgamento.
10.ª - Tal valoração importa uma clara violação dos art. 129.º, 130.º, 356.º, n.º 7 do C.P.Penal.
11.ª - Ultrapassando o Tribunal os limites impostos pelo Lei Penal na valoração da prova, em clara violação do disposto no art. 127.º do C. P. Penal.
12.ª - Ao confirmar a condenação do recorrente, o acórdão viola o princípio in dubio pro reo e, bem assim, o art.32., n.º 2 da Lei Fundamental.
13.ª - Face a todo a supra exposta, o acórdão recorrido violou, não só o art. 125.º, 127.º, 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7 do C.P.Penal, como também a art. 21.º e 24.º do DL n.º 15/93 de 22/01, ao ter proferido decisão condenatória sem suporte probatório bastante que a sustentasse e, ainda, o art. 32.º, n.º 2 da Lei Fundamental.
14.ª - Encontrando-se verificados, no caso concreto, os vícios previsto nas als. a), b) e c) do art .410.º do C.P.Penal.
Bem como, nulidade parcial do acórdão, nos termos acima expostos e que desde já se argui.
15.ª - Restringindo-se o recurso à matéria de direito,
Atentemos a matéria de facto fixada, neste Tribunal do Relação do Porto, e para não nos alongarmos em transcrições, temos, como se alcança do acórdão desta Relação, que os factos dados como provados no acórdão recorrido têm-se por assentes.
16.ª - "A dimensão normativa impugnada encontra a seu fundamento na particular perigosidade das condutas que justifica uma concepção ampla de tráfico, desligada da obtenção do resultado transacção. Porque se trata de condutas que concretizam de modo particularmente intenso o perigo inerente à actividade relacionada com o fornecimento de estupefacientes, o legislador antecipa a tutela penal relativamente ao momento da transacção. A não punição da tentativa tem por justificação o facto de este crime não ser um crime de dano nem de resultado efectivo. Assim, a não punição de tentativa é apenas consequência de não se pretender antecipar mais a tutela penal já suficientemente antecipada na descrição típica."
17.ª - No que tange ao recurso da arguida B, haverá que atentar à matéria de facto fixada pelas instâncias com competência para tal, que é, manifestamente mais densa e mais intensa do que aquela que constava das conclusões da recorrente B.
18.ª - O comportamento da B é subsumível ao tipo legal de crime p.p. pelo disposto no art.21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 23.01.
19.ª - Além do mais provou-se o dolo directo e intenso da arguida;
Que este crime, vinha sendo cometido ao longo de um grande período de tempo e que, por ela ser mãe, sobre ela impendia uma especial obrigação de o não cometer;
Provou-se ainda que a arguida B com toda a sua actividade só e apenas visava auferir lucros complementares ao seu modo de vida de comerciante, como se demonstra através da apreensão do dinheiro efectuada no decurso da busca domiciliária e sinais exteriores de riqueza, designadamente o automóvel ligeiro de passageiros, de marca Audi A3 com que habitualmente se fazia transportar e ainda do seu apartamento,
O seu grau de ilicitude é elevado, uma vez que revelou uma grande tenacidade em alcançar aquele objectivo ilícito, não obstante os problemas de ordem familiar que lhe estavam subjacentes, com a separação do seu marido e a guarda do seu filho menor, não demonstrando ter qualquer sensibilidade ao dever-ser jurídico penal que daí decorria,
A arguida não demonstrou qualquer arrependimento e a mesma só confessou parcialmente os factos notórios e evidentes, ocultando - sempre - às autoridades policias e judiciárias intervenientes nos processos, a descoberta do verdade material quanto aos seus directos interlocutores e demais co-arguidos;
No caso dos autos, são elevadas as exigências de prevenção geral quanto à prática do crime de tráfico de droga, que são uma realidade nefasta com repercussões ao nível da vida humana, saúde física e psíquica e da própria estabilidade social;
Por outro lado, razões de prevenção especial também se devem fazer sentir duma forma intensa, já que a punição deve estimular e garantir o definitivo afastamento da arguida da criminalidade e remover eventuais tentações de retrocesso;
20.ª - A pena aplicada a este crime, neste Tribunal da Relação do Porto, de 8 anos de prisão satisfaz as exigências da prevenção (geral e especial), protege, a nosso ver, devidamente os bens tutelados pelo tipo de crime e é adequada à culpa concreta da arguida;
21.ª - Não merece, pois censura, o acórdão recorrido no que toca à delimitação de matéria de facto apurada relativamente à arguida B, quer quanto à subsunção jurídico-penal efectuada e quanto à medida da pena.
22.ª - A perda do veículo AUDI, modelo A 3, matricula OE não pode deixar de ser declarado perdido a favor do Estado, já que se verifica a mencionada relação de causalidade adequada significativa e penalmente relevante, entre a utilização do mesmo e a prática do crime pelo qual a arguida B foi condenada.
23.ª - O facto de se encontrarem registados em nome de terceiro, não obsta á declaração de perdimento, uma vez que o terceiro de boa-fé sempre poderá fazer uso do incidente previsto no art. 36.º-A, do DL no 15/93, de 22JAN.
24.ª - No que toca ao recurso da arguida A, e quanto à questão da nulidade declarada por o Ministério Publico não ter sido ouvido aquando do incidente de justa impedimento (art. 119.º, al. b) do CPP.), que teve como consequência, por arrastamento, a anulação do processado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 a 4022 da arguida A, o que levou, por causa dessa nulidade e dos seus efeitos, que não se tomasse conhecimento do recurso interposto por esta arguida.
25.ª - Como deixamos referido supra ponto VI.B, o recurso da A, para este Tribunal da Relação do Porto, prendia-se com as seguintes questões:
deveria ter beneficiado da atenuação especial da pena, ao abrigo do disposto no art. 31.º, do DL n.º 15/93, de 22JAN, e ser-lhe aplicada pena de prisão não superior a quatro anos.
Subsidiariamente, invoca que o seu comportamento só poderia ter sido punido dentro do quadro punitivo dos arts. 21.º e 24.º, n.º 1 al. c), do DL n.º 15/93, de 22JAN, e se se arredar o art. 31º do comportamento delituoso da recorrente dentro daquele quadro punitivo, face à conduta processual da mesma, seria sempre de atenuar especialmente a pena, nos termos gerais e como impunha o disposto no art. 72.º, n.ºs 1 e 2, al. c) e 73.º do CP e punir a recorrente com pena não superior a cinco anos de prisão.
se se entender que o comportamento da recorrente preenche a tipo de crime pelo qual veio a ser condenado e nos precisos termos em que o foi pelos arts. 21.º e 24.º, als. b) e c), do DL 15/93 de 22JAN, a pena concretamente a aplicar não deveria ter sido superior nos mesmos cinco anos de prisão face a todo o circunstancialismo que milita em abono da recorrente, circunstancialismo que deve fazer desencadear o comando atenuativo ínsito nos arts. 72.º' e 73., do CP.
26.ª - Ora, no douto acórdão, ora objecto de recurso, escreve-se, com interesse, para o esclarecimento desta questão que o Tribunal da Relação do Porto, ao " ... /.... conhecer do recurso interposta pelo MP, apreciou a conduta da arguida A, como integrando a prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p., pelas arts. 21.º, n.º 1 e 24.º, als. b) e c) do DL no 15/93, de 22JAN, cuja moldura penal abstracta corresponde a 5 anos e 4 meses a 16 anos de prisão, bem corno a medida concreta da pena em que a arguida A foi condenada, tendo sido dado parcial provimento ao recurso do MP, quanto a este ponto, considerando-se justa, necessária e adequada à conduta da arguida A, a pena de 10 anos de prisão.
27.ª - "Neste sentido, o conhecimento do recurso da arguida A encontra-se prejudicado, pelo que não se conhece do mesmo."
28.ª - Como vemos a nulidade declarada por causa do incidente de justo impedimento, em nada, impediu que a A deixasse de ver, este Venerável Tribunal, a ponderar as razões por ela invocadas, só acontecendo que a censura que o MP fez ao acórdão recorrido merecesse deste Tribunal da Relação do Porto o entendimento de que a posição mesmo se coadunasse mais com o princípio da legalidade e da defesa da legalidade democrática, do que, aquilo que defendia a recorrente.
29.ª - Neste segmento, entendemos que a Tribunal "a quo" não é passível de censura.
30.ª - Os factos provados e fixados quanto à arguida A são os referidos no douto acórdão da 1.ª instância, a fls. 3412 a 3414, de 3414 a 3417, 3417, 3419 e 3420, de fls. 3420 a 3423, fls. 3426, fls. 3503 e fls. 3505, ponto 5.7.3 do douto acórdão da 1.ª instância. Neste Tribunal da Relação dão-se como provados os seguintes factos em relação à A. Os factos referidos e que, aqui para todos os efeitos se dão como reproduzidos, referidos de fls. 4319 a fls. 4322., fls.4322, fls.4324, de fls. 4325 a fls. 4328, fls. 4330, fls.4333, fls. 4338.
31.ª - Cometeu, a arguida A, com o seu comportamento, um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.p. no art. 21.º e 24.º, als. b) e c) do DL. n.º 15/93, de 22/1, o qual é punível com pena de prisão abstracta, de 5 anos e 4 meses a 16 anos.
32.ª - Afigura-se-nos não existirem razões atenuantes suficientes, adequadas e capazes para se fixar a pena concreta a esta arguida abaixo da média da previsão legal;
Na verdade, provou-se o dolo directo e intenso da arguida,
Que este crime vinha sendo cometido ao longo de um grande período de tempo e que, por ela ser mãe e avó, sobre ela impendia uma especial obrigação de o não cometer;
Provou-se ainda que a arguida A com toda a sua actividade só e apenas visava auferir grandes lucros, traduzidas numa actividade que sabia ser ilícita, como se demonstra através da análise das suas contas bancárias;
O seu grau de ilicitude é muito elevado, uma vez que revelou uma grande tenacidade em alcançar aquele objectivo, não demonstrando ter qualquer sensibilidade ao dever-ser jurídico penal;
Não obstante a arguida mostrar arrependimento - o qual curiosamente só veio a ser demonstrado em sede de julgamento - mas a mesma só confessou os factos notórios e evidentes, ocultando sempre às diversas autoridades policias e judiciárias intervenientes no processo, a descoberta da verdade material quanto aos seus directos interlocutores e demais co-arguidos;
No caso dos autos, são elevadas as exigências de prevenção geral quanto à prática do crime de tráfico de droga agravado, que é uma realidade nefasta com repercussões ao nível da vida humana, saúde física e psíquica e da própria estabilidade social;
33.ª - Por outro lado, as razões de prevenção especial também se fazem sentir duma forma intensa, já que a punição deve estimular e garantir o definitivo afastamento da arguida da criminalidade e remover quaisquer tentações de retrocesso;
A pena aplicada, a este crime de tráfico de estupefaciente agravado p. nos arts. 23.º, n.º 1 e 2 al. b) e e) ambos do DL. n.º 15/93, de 22/1, praticado pela arguida, de 10 anos de prisão, satisfaz as exigências da prevenção (gera e especial), protegendo devidamente os bens tutelados pelo tipo de crime agravado e é adequada à culpa concreta da arguida;
34.º - Quanto a perda do seu apartamento a favor do Estado e do dinheiro que lhe foi apreendido.
«A arguida, A, guardava o estupefaciente na sua habitação, sita na Travessa Fonte da Mudo, s/n, e num seu apartamento sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, n.º .....º, ambas em Leça da Palmeira.
Era no seu referido apartamento que a A procedia à pesagem, "corte" e embalagem da droga que depois vendia a diversos indivíduos, designadamente ao F e E.
Por outro lado, na noite de 25/26 de Maio de 2000, cerca das 00H15, no decurso de uma busca domiciliária realizada num apartamento da A, sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, n.º ..., em Leça da Palmeira, foram ali encontrados os seguintes artigos e produtos: a) quarenta carteiras contendo um produto em pó que submetido a exame laboratorial revelou ter como substância activa presente LISINA (derivado) - cfr. exame de fls. 662 que aqui se dá por integrado e reproduzido; b) uma faca de cozinha contendo resíduos de um produto que veio a ser laboratorialmente identificado como sendo HEROÍNA (cfr. exame de fls. 893 que aqui se dá por integrado e reproduzido); c) uma balança digital de marca "Soehnle" que continha resíduos de produtos que vieram a ser laboratorialmente identificados como HEROÍNA e COCAÍNA (cfr. exame de fls. 895 que aqui se dá por integrado e reproduzido); d) várias sacas plásticas, e) uma embalagem contendo um produto em pó com o peso bruto de 85,390 gramas que submetido a exame laboratorial revelou ser PARACETAMOL e CAFEÍNA (cfr. exame de fls. 899 que aqui se dá por integrado e reproduzido). Os artefactos e produtos apreendidos nesta residência eram destinados a manusear, dosear e preparar os estupefacientes que a A depois vendia. O produto descrito sob a alínea e) vulgarmente designado por "traço holandês", destinado a ser misturado com a heroína para "rentabilização" do produto final obtido, era parte dos 20 quilos acima referidos».
35.ª - Do exposto resulta que se verifica a relação de causalidade adequada significativa entre a utilização do apartamento da A, sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, n.º .....º Direito, em Leça da Palmeira, com a prática do crime em que foi condenada.
Com efeito, era no aludido apartamento que a A procedia ao depósito, à pesagem, "corte" e embalagem da droga que depois vendia a terceiros.
Assim sendo, face ao disposto no art. 35.º, n.º 1, do DL. N.º 15/93, de 22JAN, na redacção dada pela Lei n.º 45/96, de 3 SET, «São declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a sentir para a prática de uma infracção prevista no presente diploma ...», o referido apartamento terá de ser declarado perdido a favor do Estado.
Não é, a nosso ver, atenta a matéria de facto fixada pelas instâncias competentes para o fazerem, susceptível de censura quer a subsunção jurídico-penal efectuada, quer a determinação da medida da pena aplicada à arguida A, quer, ainda, a perda do apartamento e dinheiro apreendida à arguida a favor do Estado, nos termos em que o foi (cfr. Fls. 4444 e 4445).
A mesma relação de causalidade se encontra definida no dinheiro apreendido versus tráfico de droga, como lucro, e o seu perdimento tem suporte legal no art. 38.º do DL n.º 13/93, de 22 de Janeiro.
36.ª- A imediação respeita predominantemente à audiência de julgamento. As testemunhas são inquiridas na audiência e não lhes devem ser lidos os seus depoimentos anteriores, precisamente para garantir a recepção imediata e directa da prova pelo tribunal. Só excepcionalmente e quando impossível a recepção directa da prova pode ser admitida uma prova indirecta.
37.ª - O princípio da imediação decorre da ineficácia dos depoimentos indirectos, conforme o disposto nos arts. 129.º, 130.º, n.º 1, 138.º, n.º 1, do CPP, e traduz-se fundamentalmente no contacto pessoal entre o julgador e os diversos meios de prova, pela que, em regra, toda a prova que serve para formar a convicção do julgador deve ser produzida ou examinada na audiência, oralmente, e durante ela também deve ser discutida oralmente.
38.ª - Daí que o art. 355.º, do CPP, consagre expressamente, afloramentos do princípio da imediação, e também do princípio do contraditório, ao dispor no seu n.º 1, que «Não valem em julgamento, nomeadamente para efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência».
39.ª - O princípio do contraditório é um instrumento de uma política de garantia dos direitos fundamentais e da «igualdade de armas» no processo, entre a acusação e a defesa.
40.ª - O art. 348.º, do CPP que regula a produção da prova testemunhal na audiência de julgamento, remete para as disposições gerais sobre aquele meio de prova, em tudo o que não for contrariado pelo presente capítulo.
41.ª - Ora, no caso dos autos os depoimentos das testemunhas L e Inspector M, na parte em que se referem as expressões proferidas pelo arguido V, não se trata de testemunho indirecto, no sentido de que só serviu para indicar outra meio de prova, ou de testemunho baseado em reprodução de expressões que o arguido lhes tenha feito.
42.ª - Com efeito, foram as próprias testemunhas que procederam à busca domiciliária, que se encontra retractada em auto, e por isso mesmo presenciaram os factos objecto da mencionada busca quando a efectuaram.
43.ª - Conforme decidiu o Ac. do STJ de 25 SET97, in BMJ «O tribunal pode valorar o depoimento de um agente da Polícia Judiciária, não sobre declarações (por si recebidas) prestadas no decurso do processo pelo arguido ou testemunhas, mas acerca de factos de que tomou conhecimento directo, mercê da vigilância que procedeu no local do crime ou da investigação que fez a partir da denúncia de indivíduo cuja identidade não foi revelada, ou ainda do que observou aquando da busca efectuada» (no mesmo sentido vide, o Ac. do STJ de 11DEZ96, in BMJ .
44.ª - Por outro lado, de harmonia com o disposta no art. 345.º, n.º 3, do CPP, aplicável "ex vi", do art. 348.º, n.º 7, do CPP, o Tribunal pode mostrar à testemunha, documentos ou objectos relacionadas com o tema da prova, bem como peças anteriores do processo, sem prejuízo do disposto nos arts. 356.º e 357.º, do CPP.
45.ª - Do exposto resulta, pois, que os Inspectores da PJ L e M se limitaram a narrar a diligência de busca em que intervieram, não sendo aplicável aos seus depoimentos os arts. 129.º, 130.º, 356.º, n.º 7, do CPP.
46.ª - Neste sentido, não enferma o acórdão recorrido de nulidade da prova, por violação do disposto no art. 129.º do CPP.
47.ª - No ponto 6.º das suas conclusões, o recorrente V escreve, e citamos:
«Ao confirmar a condenação do recorrente, o acórdão viola o princípio in dubio pro reo e, bem, assim, o art. 32.º, n.º 2 da Lei fundamental.
Ora se é certo que só se teria imposto às instâncias o recurso ao in dubio pro reo» - corolário do princípio constitucional da presunção de inocência - se a prova produzida, depois de avaliada segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, tivesse conduzido - e o tribunal colectivo o tivesse proclamado expressamente - «à subsistência no espírito do tribunal de uma dúvida positiva e invencível». O in dubio pro reo, com efeito, «parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador».
48.ª - Como dissemos o princípio in dubio pro reo, é um principio de prova, que se identifica com o princípio da presunção de inocência do arguido, constitucionalmente consagrado, no art. 32.º, n.º 2, da CPP, e que impõe que o julgador valore sempre a favor do arguido um non liquet, na decisão de factos incertos, a dúvida favorece o réu, e ainda que em processo penal não seja admitida a inversão do ónus da prova.
A Jurisprudência do STJ tem vindo a entender que a violação do princípio in dubio pro reo pode e deve ser tratada como erro notório na apreciação da prova mas a sua existência só pode ser afirmada quando, do texto da decisão recorrida, decorrer, por forma mais do que evidente, que a tribunal, v. g., na dúvida, optou por decidir contra o arguido. Livre apreciação da prova não é livre arbítrio ou valoração puramente subjectiva, mas apreciação que, liberta do jugo de um rígido sistema de prova legal, se realiza, em geral, de acordo com critérios lógicos e objectivos e, dessa forma, determina uma convicção racional, logo, também ela, em geral, objectivável e motivável. Isso não significa, porém, uma convicção absolutamente objectiva. Com efeito, a convicção do juiz, ainda que tenha de ser capaz de, racionalmente se impor ou convencer o arguido e outros, não deixa de ser uma convicção pessoal, na qual desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v. g. a credibilidade que concede a um determinado meio de prova) e mesmo puramente emocionais (vide, v.g., o Ac. do STJ de 07JUL99, 3.ª Secção, cujo sumário se encontra publicado na página da Internet, Boletim n.º 33).
49.ª - In casu, porém, resulta da fundamentação da matéria de facto que o Tribunal a quo procedeu a uma cuidadosa e criteriosa apreciação da prova, fundamentando a decisão de facto, nos meios de prova apresentados, constando expressamente qual o raciocínio a que chegou o tribunal para formar a sua convicção.
De acordo com a regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127.º, do CPP, «... a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente», que não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, mas tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica (vide Ac. do 5TJ de 09MA196, in proc. n.º 486901 3.ª).
50.ª - No caso em apreço, nenhum erro transparece do texto da decisão recorrida, quer por si só, quer conjugada com as regras da experiência comum, nem se vislumbra o desrespeito por prova legalmente vinculativa ou tarifada que tivesse sido desprezada, ou não investigada pelo tribunal recorrido.
51.ª - O Tribunal recorrido, o Tribunal da Relação, como, aliás o Tribunal da 1.ª instância, fundamentou a sua decisão quanto à matéria de facto provada e não provada, de forma explícita, enumerando os elementos probatórios em que se baseou para formar a sua convicção, e a razão da credibilidade que mereceram ou não, os depoimentos em que se fundamentou para formar a sua convicção. Por um lado, dos elementos de prova carreados para os autos, e do texto da decisão recorrida, não resulta que a tribunal tenha dado como provados factos que como tal especificou, tendo dúvidas sobre a verificação de algum ou alguns deles, e, por outro do mesmo texto, conjugado com as regras da experiência comum, não ressalta que outra deveria ter sido a decisão sobre a matéria de facto.
52.ª - Do exposto resulta que não se mostra violado a princípio in dubio pro reo. Com efeito, uma coisa é a discordância da decisão de facto do julgador e outra aquela que teria sido a do próprio recorrente.
No fundo o recorrente põe em crise é a forma como o tribunal apreciou a prova produzida em audiência, impugnando dessa forma a convicção assim adquirida e pondo em causa a regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127.º, do CPP, no qual se diz que «a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente».
53.ª - Como se afirma no Ac. do STJ de 30JANO2, sumariado na pág. da Internet do STJ, Boletim Interno 2002, «A partir da indicação e exame dos provas que serviram para formar a convicção do tribunal, este enuncia as razões de ciência extraídas destas, o porquê da opção por uma e não outra dos versões apresentadas, as houver, os motivos da credibilidade em depoimentos, documentos ou exames que privilegiou na sua convicção, em ordem a que um leitor atento e minimamente experimentado fique ciente da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção».
54.ª - No caso dos autos, resulta com evidência que a decisão recorrida indica com precisão, o porquê e a relevância que deu aos meios de prova apresentados pela acusação e pela defesa, e resultantes da discussão da causa, seguindo um raciocínio lógico e coerente, de tal forma que, analisada a prova documentada e transcrita, não se pode concluir que teria de ser outra a decisão sobre a matéria de facto.
55.ª - Apreciando a matéria de facto fixada pelos Tribunais com competência para o fazerem temos que a actividade do arguido consubstancia a qualificativa a que alude a al. c) do art. 24.º do DL. n.º 15/93, de 22JAN. O comportamento do arguido consubstancia o crime de tráfico de droga agravado p.p. pelo art. 21.º e 24.º al. c) do referido DL n.º 15/93.
56.ª - O contacto do arguida com a realidade do tráfico de droga não é novo para si, pois que o mesmo já havia sido condenado e cumprido pena efectiva de prisão por prática do mesmo tipo de crime.
57.ª - Possuía este tipo de estupefaciente sem o menor escrúpulo, não obstante saber que aquela quantidade podia provocar a morte ou a doença física, psíquica, instabilidade familiar e social de centenas de consumidores que a ela tivessem acesso.
Quanto ao crime de tráfico de estupefacientes agravado p. no art. 21.º, n.º 1, 24.º al. c), este é, como vimos, punível com pena de prisão abstracta, de 5 anos e 4 meses a 16 anos.
Na verdade, provou-se o dolo directo e intenso do arguido, não obstante o enquadramento jurídico correcto do mesmo somente numa alínea da agravação do referido crime de tráfico de droga;
Mostrou-se elevado o grau de ilicitude dos factos que se prolongou por cerca de ano e meio.
Que este tipo de crime hediondo, pode afectar a saúde de milhares de pessoas que tiverem acesso a àquela quantidade de droga, o que não obstante a sua qualidade de pai, não o impediu de estar no negócio ilícito de drogas, apesar da obrigação que sobre ele impendia na sua qualidade especial de progenitor de o não cometer.
Provou-se ainda que o arguido V com a posse desta quantidade de droga só e apenas visava auferir grandes lucros, como se pode aferir pelo preço a que este tipo de droga é vendida no mercado (cerca de Esc. 10.000$00/grama ou a preços actuais €50.00).
Que revelou uma grande tenacidade em alcançar aquele objectivo.
Que não demonstrou ter qualquer sensibilidade ao dever-ser jurídico penal que sobre ele impendia.
O arguido não mostrou qualquer arrependimento, nem mesmo confessou os factos notários e evidentes, ocultando os mesmos e chegando ao ponto de tentar ludibriar as autoridades policias e judiciárias, sobre toda a descoberta da verdade material quanto a si e aos demais seus directos interlocutores e co-arguidos.
No caso dos autos, são elevadas ias exigências de prevenção geral quanto à prática do crime de tráfico de droga agravado, que são uma realidade com consequência ao nível da vida humana, saúde física e psíquica e da própria estabilidade social.
A pena aplicada a este crime, de 9 anos de prisão, satisfaz as exigências da prevenção, protege devidamente os bens tutelados pelo tipo e é, a nosso ver, adequada à culpa do arguido.
58.ª - Na determinação da medida das penas, a cada um dos arguidos, olhou-se a todo o circunstancialismo que acompanhou os factos e que depôs a favor e contra o/s arguido/s , partindo-se deste ponto para a determinação da pena concreta aplicável ao/s arguido/s.
59.ª - O bem jurídico violado no crime de tráfico de droga é o bem jurídico supremo, o valor a partir do qual tudo se conhece e frui - a vida, a saúde pública.
Tem assim tal bem jurídico um notório significado prospectivo, já que são fortes as expectativas da comunidade na manutenção e mesmo no reforço da vigência da norma infringida (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, §302).
60.ª - Todavia, a prevenção geral positiva ou prevenção geral de reintegração ou de ressocialização fornece-nos tão só a "moldura penal de prevenção" (Figueiredo Dias, op. cit., §306), cujo limite máximo nos é fornecido pela culpa do agente (Anabela Mirando Rodrigues, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, pg. 557).
Vertendo para o caso concreto, o que mais ressalta nos factos é que são indiciadores de dolo directo, e de uma forte mobilização da vontade para a prática do ilícito.
61.ª - Acresce a ausência de arrependimento que transparece da postura do/s arguido/s em julgamento, exceptuado o caso da A, como vimos supra, persistindo numa postura alheia à culpa ética, fria e indiferente ao Direito.
62.ª - As pena aplicadas no Tribunal da Relação do Porto, mostram-se adequadas à respectiva necessidade, proporcionalidade e adequação à culpa concreta, tendo em vista que qualquer pena a aplicar deve ter por norte orientador a defesa mínima da ordem jurídica, o princípio da culpa como limite máximo moderador das reacções penais e os princípios de proporcionalidade, de humanidade e de proibição do excesso das penas (art. 30.º da CRP).
Nestes termos, e salvo melhor parecer, entendemos que será feita Justiça, mantendo-se a decisão recorrida.»
Subidos os autos ao S.T.J., o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de nada obstar ao conhecimento do recurso.
Recebido este e após vistos, teve lugar audiência de julgamento, cumprindo agora apreciar e decidir.
II.
O douto acórdão da Relação, considerando improcedentes as impugnações deduzidas relativamente à decisão de facto da 1ª instância, considerou assente essa decisão, que é do seguinte teor:
«2.1. O acórdão recorrido deu como provados os seguintes factos:
Da Acusação do Mº. Pº.:
Actividade das arguidas B e C:
2.1.1. Em dia indeterminado do mês de Janeiro de 2000, a arguida C contactou a arguida B dizendo-lhe que pretendia adquirir um quilo de heroína para uma pessoa amiga, cujo contacto era da arguida G, esta residente no Bairro do Cerco do Porto.
2.1.2. A B comprometeu-se a arranjá-la, e, para o efeito, contactou I - pessoa visada no Inquérito 200/98.1 JAPRT, à ordem do qual esteve preso preventivamente.
2.1.3. Assim, no dia 21 de Janeiro de 2000, cerca das 20,30 horas, a B dirigiu-se ao Parque de Estacionamento do "Hipermercado Continente", em Matosinhos, fazendo-se transportar no veículo de marca Audi, modelo A3, matrícula OE, e levando, dentro deste, cerca de um quilo de heroína que, momentos antes, lhe havia sido entregue por aquele I.
2.1.4. Já aí se encontrava a arguida C, no veículo Peugeot, modelo 206, matrícula OI, no qual se fizera transportar, seguindo à frente de um BMW.
2.1.5. Aí compareceram, além da arguida G e outras pessoas, um outro indivíduo de nome R, condutor do BMW.
2.1.6. A B recebeu da C a quantia de Esc. 4.800.000$00 correspondente ao preço daquela droga, e, por intermédio de uma pessoa de sexo feminino não identificada que a recolheu do Audi e a guardou no BMW, entregou ao R o referido produto estupefaciente.
2.1.7. Tal quantia foi posteriormente entregue pela B ao I, do qual ela recebeu a quantia de Esc. 100.000$00 pela sua intervenção no negócio.
2.1.8. Na sequência de outros dois contactos entre a C e a B, esta, de uma vez, entregou àquela, na respectiva habitação, em S. Mamede de Infesta, no mês de Abril de 2000, um saco com produto estupefaciente, de espécie e quantidade não apuradas, trazendo de volta um saco, entregue por aquela, com o dinheiro correspondente ao preço; e, de outra vez, possuindo já consigo outro saco de conteúdo similar e para igual fim, não concretizou a entrega por, entretanto, se ter gerado uma discussão com o seu ex-marido J (filho da arguida A) - a mando do qual tais entregas obedeciam.
2.1.9. No dia 8 de Março de 2000, cerca das 22,30 horas, as arguidas C, G e H, dirigiram-se ao estabelecimento comercial, sito na Rua Hintze Ribeiro, nº. .....A, Leça da Palmeira, Matosinhos, explorado pela B, onde esta já as aguardava, aí se encontrando todas.
2.1.10. A arguida C auferiu proventos com aqueles e os adiante referidos negócios, uma vez que a única ocupação profissional que tinha apenas lhe rendeu esc. 700.000$00 (setecentos mil escudos) no período compreendido entre 1998 e 25 de Maio de 2000 .
2.1.11. Com efeito, e conforme resulta das informações das Finanças juntas aos autos, a C apresentou em 1998 um apuro liquido negativo de 126.758$00, e, em 1999, um apuro liquido negativo de 197.818$00.
2.1.12. No entanto, como se alcança pelo teor dos seus documentos bancários, registaram-se os seguintes movimentos efectuados nas contas a seguir identificadas, tituladas, ou co-tituladas, por esta arguida:
1) Conta nº ........ do B.C.P.: em 21.10.99, depósito da quantia de esc. 998.000$00 (novecentos e noventa e oito mil escudos), transferidos de uma outra conta por si titulada; entre Outubro de Dezembro de 1999, depósitos em numerário no montante global de esc. 713.000$00 (setecentos e treze mil escudos); entre Janeiro e Maio de 2000, depósitos em numerário no montante global de esc.1.160.000$00 (um milhão, cento e sessenta mil escudos);
2) conta nº ....... do B.C.P.: entre Janeiro e Novembro de 1999, depósitos em numerário no montante global de esc. 601.000$00 (seiscentos e um mil escudos);
3) Conta nº ...... do B.C.P.:entre Janeiro e Abril de 1999, depósitos no montante global de esc. 2.220.660$00 (dois milhões, duzentos e vinte mil, seiscentos e sessenta escudos);
4) Conta nº ...... do Banco Santander: entre Fevereiro e Maio de 2000, depósitos em numerário no montante global de esc. 415.000$00 (quatrocentos e quinze mil escudos);
5) Conta nº ....... do Banco Santander: em Fevereiro de 2000, depósito a prazo no montante de esc. 150.000$00 (cento e cinquenta mil escudos);
6) Conta nº ...... do Montepio Geral: em depósito a prazo de três meses o montante de esc. 600.000$00 (seiscentos mil escudos);
7) Conta nº ...... do Montepio Geral: entre Janeiro e Maio de 2000, depósitos em numerário no montante global de esc. 310.000$00 (trezentos e dez mil escudos);
2.1.13. Estas quantias perfazem um montante global de esc. 7.167.660$00 (sete milhões cento e sessenta e sete mil seiscentos e sessenta escudos), depositados pela arguida C entre Janeiro de 1999 e Maio de 2000.
2.1.14. Encontra-se apreendidas à ordem dos presentes autos, desde 7 de Setembro de 2000, a quantia de esc. 69.310$00 (sessenta e nove mil trezentos e dez escudos) que a arguida C ainda tinha depositada na Conta nº ....... do Banco Comercial Português (cfr. fls. 1025).
II - Actividade das arguidas A e B :
2.1.15. A arguida A desde, pelo menos, meados de 1999, vinha-se dedicando, conforme abaixo descrito, à comercialização de produtos estupefacientes, designadamente heroína e cocaína, constituindo a sua actividade fonte de rendimentos.
2.1.16. A arguida A obtinha os produtos estupefacientes, que comercializava, em Espanha, quer deslocando-se lá directamente, quer por interpostas pessoas.
2.1.17. Nas deslocações relacionadas com a compra e venda de estupefacientes, a A, fazia-se transportar, regra geral, no veículo marca Renault, modelo Kangoo, matrícula MZ, e, por vezes, no automóvel da arguida B, sua nora.
2.1.18. Porque necessitava de "produto de corte" para a preparação da heroína que comprava "em bruto" e para aumentar as respectivas quantidades e, assim, a rentabilizar antes de a colocar no mercado, a A solicitou à B que lhe obtivesse tal produto.
2.1.19. Assim, para o efeito, no início do ano 2000, a B arranjou e entregou-lhe 20 (vinte) quilos de "traço holandês" (mistura constituída por Paracetamol e Cafeína), pelos quais a A lhe pagou a quantia de Esc. 5.400.000$00.
2.1.20. Esteve projectado entre elas, mas não chegou a concretizar-se, um outro negócio igual.
2.1.21. A A, guardava o estupefaciente na sua habitação, sita na Travessa Fonte da Muda, s/n, e num seu apartamento sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, nº. ...º., ambas em Leça da Palmeira.
2.1.22. Era no seu referido apartamento que a A procedia à pesagem, "corte" e embalagem da droga que depois vendia a diversos indivíduos, designadamente ao F e E.
2.1.23. Desde, pelo menos, meados de 1999 até à data da sua detenção (25/5/2000), a A viveu predominantemente dos proventos que auferia com o negócio de compra e venda de estupefacientes.
2.1.24. Com efeito, a A, como actividade profissional licita, explorava um estabelecimento comercial tipo "Minimercado" ou "Mercearia", sito na Travessa do Centro Hípico, em Leça da Palmeira, o qual tomou de arrendamento em Março de 1999.
2.1.25. No entanto, este estabelecimento comercial era pequeno, com limitada diversidade de produtos, tendo uma "clientela de bairro" e abria com um horário incerto.
2.1.26. De facto, e como melhor resulta das informações das Finanças, juntas a fls.1295 a 1311 e 1411 a 1417, a A teve, em 1998, um apuro líquido negativo de - 240.547$00, e, em 1999, um apuro líquido negativo de - 1.893.025$00.
2.1.27. Todavia, a A obteve, naquele período de tempo (meados de 1999 até 25/5/2000), elevados proventos materiais com o seu outro "negócio" - a compra e venda de estupefacientes.
2.1.28. Assim, registam-se os seguintes movimentos efectuados nas contas a seguir identificadas, tituladas por esta arguida:
1) Conta do BCP com o número 197 187 712: Principais Movimentos: 12.500.000$00 (doze milhões e quinhentos mil escudos), depositados entre Janeiro de 1999 e Maio de 2000
2) Conta do Banco Santander com o número 200 030 976 Principais Movimentos: 5.731.500$00 (cinco milhões, setecentos e trinta e um mil, e quinhentos escudos) depositados em numerário entre Novembro de 1999 e Maio de 2000
3) Conta do Banco Santander com o número 620 012 372: Principais Movimentos: 300.000$00 (trezentos mil escudos) em depósito a prazo, efectuado em Fevereiro de 2000
4) Conta do BPI com o número 2152609: Principais Movimentos: 600.000$00 (seiscentos mil escudos) depositados em numerário em Agosto de 1999;
5) Conta do BES com o número 1072: Principais Movimentos: 95.000$00 (noventa e cinco mil escudos) depositados em numerário em Maio de 1999; 1.250.000$00 (um milhão e duzentos e cinquenta mil escudos) depositados em numerário em Março de 2000.
2.1.29. Resulta, assim, desta análise, que a A procedeu a depósitos bancários, entre Janeiro de 1999 e Maio de 2000, no montante global de Esc. 20.476.500$00 (vinte milhões, quatrocentos e setenta e seis mil e quinhentos escudos).
2.1.30. Encontram-se apreendidas, à ordem dos presentes autos, as seguintes quantias: esc. 75.128$00 (setenta e cinco mil, cento e vinte e oito escudos), que a arguida A tinha depositada na conta nº 248.200030976, do Banco Santander, em 25 de Agosto de 2000 (cfr. fls.937); esc. 300.000$00 (trezentos mil escudos), que a arguida A tinha depositada na conta nº 248.620012372 do Banco Santander, em 25 de Agosto de 2000 (cfr. fls. 937); esc. 348$00 (trezentos e quarenta e oito escudos), que a arguida A tinha depositada no Banco Comercial Português, em 7 de Setembro de 2000 (cfr. fls. 1025).
I I I - Actividade do arguido E :
2.1.31. Entre os clientes da A, até à data da sua detenção, encontrava-se o arguido E .
2.1.32. Por alturas de Novembro/Dezembro de 1999, esse E, amigo pessoal do D, combinou com a A - com a qual se encontrava na discoteca "Via Rápida" - que esta lhe fornecesse produtos estupefacientes, designadamente heroína.
2.1.33. Assim, a A passou a vender ao E, em regra uma vez por semana, entre 5 a 10 gramas ora de heroína ora de cocaína, durante os 4 ou 5 meses subsequentes àquela data.
2.1.34. Os encontros eram previamente combinados e ocorriam, geralmente, junto à Feira Popular, na Estrada Exterior da Circunvalação, na confluência Porto-Matosinhos.
2.1.35. Os pagamentos eram efectuados no momento das entregas.
2.1.36. A heroína e cocaína compradas pelo E destinavam-se a seu consumo pessoal e à cedência a amigos, não identificados, frequentadores de casas de diversão nocturnas, designadamente Bares e Discotecas, da área do Grande Porto, sendo certo que o arguido E era gerente de uma dessas casas denominada "VIA RÁPIDA".
2.1.37. Em Fevereiro ou Março de 2000, o E foi apresentado, por N, a O - o qual está a ser investigado no âmbito do inquérito nº 13.796/00.0 TDPRT-D - uma vez que este último pretendia adquirir Cannabis.
2.1.38. Assim, uma vez em Março, outra em Julho e uma terceira em Setembro de 2000, o arguido E , deslocou-se, simultaneamente com o O, cada um em seu automóvel, a local impreciso próximo do Aeroporto Sá-Carneiro.
2.1.39. Aí paravam e o O ficava a aguardar enquanto o E se ausentava por alguns minutos, levando consigo o preço da quantidade de Haxixe combinado e por aquele entregue, voltando, depois, trazendo a droga respectiva e entregando-a ao O.
2.1.40. Nessas três vezes, o E entregou ao O, no total, sete quilos de Cannabis (vulgo haxixe), dele recebendo, como pagamento, a quantia de esc. 1.540.000$00 (um milhão quinhentos e quarenta mil escudos).
2.1.41. No dia 18 de Dezembro de 2000, no decurso de uma diligência de busca domiciliária, realizada no âmbito do inquérito nº 13.796/00.0 TDPRT-D, na residência do arguido O sita na Rua Nova do Cruzeiro, nº ..., em Canelas, Vila Nova de Gaia, vieram ali a ser apreendidos, além de outros os seguintes produtos: dezasseis sabonetes de um produto vegetal prensado, com o peso líquido de 3423,780, gramas que, submetido a exame laboratorial, revelou ser CANNABIS (resina) - cfr. exame de fls. 2083 que aqui se dá por integrado e reproduzido; um saco de plástico contendo um produto vegetal prensado com o peso líquido de 61,070 gramas, que, submetido a exame laboratorial, revelou ser CANNABIS (resina) - cfr. exame de fls. 2079, que aqui se dá por integrado e reproduzido; cinco sabonetes de um produto vegetal prensado com o peso liquido de 980,000 gramas, que, submetido a exame laboratorial, revelou ser CANNABIS (resina) - cfr. exame de fls. 2081 que aqui se dá por integrado e reproduzido; uma caixa contendo um produto vegetal prensado com o peso liquido de 66,190 gramas, que ,submetido a exame laboratorial, revelou se CANNABIS (resina) - cfr. exame de fls. 2077 que aqui se dá por integrado e reproduzido.
2.1.42. Em todas as deslocações que efectuava relacionadas com a compra e venda dos estupefacientes, o E fazia-se transportar no veículo automóvel de marca "BMW", modelo 318 TDS, matrícula LB, que se encontra apreendido à ordem dos presentes autos.
2.1.43. No decurso de uma busca domiciliária realizada no dia 12 de Março de 2001 na residência do E sita na Travessa das Chieiras, nº ...º, em Lavadores Vila Nova de Gaia, no âmbito daquele inquérito nº 13.796/00.0 TDPRT-D, vieram ali a ser apreendidos os documentos juntos a fls.1709 a 1740.
IV - Actividade do arguido F:
2.1.44. Também o arguido F comprava estupefacientes à arguida A, designadamente heroína, que, em parte revendia depois a indivíduos não identificados.
2.1.45. Assim, em data não concretamente determinada mas que se situa nos fins de 1999/princípios de 2000, o F contactou a A no sentido de esta lhe passar a fornecer heroína, tendo combinado desde logo, que os encontros ocorreriam junto a um cemitério, em Matosinhos.
2.1.46. A partir de então, a A vendeu-lhe (ao F) da primeira vez 20 gramas de heroína e, depois, com uma periodicidade em regra semanal, quantidades não apuradas da mesma espécie de estupefaciente.
2.1.47. No dia 23 de Maio de 2000, a arguida A, na companhia da B, e de acordo com o previamente estipulado, encontrou-se com o F nas proximidades do referido cemitério de Matosinhos, tendo entregue a este último trezentos gramas de heroína.
2.1.48. No dia seguinte, e porque o F tivesse tido problemas na entrega do estupefaciente e a A pretendesse reavê-lo, aquele, combinou com esta a devolução do mesmo.
2.1.49. Assim, de acordo com o previamente combinado com a A, cerca das 21H50 do dia 24 de Maio de 2000, a A e a B, que se faziam então transportar no "Audi A3", matrícula OE, pararam junto de uns semáforos existentes na Avenida que parte dos Tanques da Petrogal, em Matosinhos, local onde foram abordadas pelo arguido F, que se fazia transportar numa moto com matrícula LA, o qual colocou no interior da viatura das arguidas, que tinha a janela aberta, uma saca contendo os trezentos gramas de heroína que no dia anterior lhe tinham sido entregues pela A.
2.1.50. A arguida B transportou, então, esta heroína para a sua residência onde a guardou. Tal droga destinava-se a satisfazer parte de uma encomenda de meio quilo de heroína feita pela B à A.
2.1.51. No dia 27 de Abril de 2001, data em que foi detido o arguido F, foram encontrados na sua posse um telemóvel de marca "Alcatel, a quantia de esc. 100.000$00 (cem mil escudos), em dinheiro do Banco de Portugal, e os documentos juntos a fls. 1958 a 1961.
2.1.52. Nesse mesmo dia 27 de Abril de 2001, foi ainda apreendida ao F a viatura de marca "Ford", modelo "Courrier", matrícula BF, melhor examinada a fls. 2134 a 2140, cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido.
V - Factos ocorridos no dia 25 de Maio de 2000:
2.1.53. No dia 25 de Maio de 2000, de manhã, as arguidas A e B deslocaram-se até Tuy-Espanha.
2.1.54. Aqui, a A comprou um quilo de heroína, tendo-lhe sido entregue uma pequena amostra de cocaína.
2.1.55. Nessa deslocação fizeram-se transportar no veículo de marca Audi, modelo A3, matrícula OE, da B.
2.1.56. Cerca das 15H30, à entrada de Viana do Castelo, foram interceptadas por Agentes da Policia Judiciária, os quais vieram a apreender no interior da carteira da A os seguintes produtos, objectos e artigos: uma embalagem de plástico contendo um produto com o peso bruto de 1070,00 gramas, que, submetido a exame laboratorial, revelou ser HEROÍNA (cfr. exame laboratorial de fls. 903 que aqui se dá por integrado e reproduzido); uma embalagem de plástico contendo um produto em pó, com o peso bruto de 26,950 gramas, que, submetido a exame laboratorial, revelou ser COCAÍNA (cfr. exame de fls. 903 que aqui se dá por integrado e reproduzido); um telemóvel de marca "Nokia", melhor examinado a fls. 450 cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido; os documentos juntos a fls. 209 a 217.
2.1.57. A heroína e a cocaína acima descritas haviam sido adquiridas pela arguida A, em Espanha, conforme acima se descreveu, e parte dela destinava-se a entregar à B para completar o resto da encomenda de meio quilo feita por esta e atrás referida.
2.1.58. O telemóvel apreendido era utilizado pela A em contactos relacionados com o "negócio" de compra e venda de estupefacientes.
2.1.59. Nessa mesma ocasião, e na posse da B , foi encontrado e apreendido um telemóvel de marca "Nokia", melhor examinado a fls. 450, por esta utilizado em contactos relativos a negócios de droga.
2.1.60. De igual modo, nessa altura, foi apreendido o veículo Audi A3, matrícula OE, melhor examinado a fls. 2109 a 2111, cujo teor aqui se dá por reproduzido e integrado.
2.1.61. Nesse mesmo dia, no decurso de uma busca domiciliária, realizada cerca das 19H00, na residência da arguida A, sita na Travessa da Fonte Muda, s/n, em Leça da Palmeira, Matosinhos, foram ali encontrados os seguintes produtos, objectos e quantias: esc. 70.000$00 (setenta mil escudos) em dinheiro do Banco de Portugal; 7.000 pesetas do Banco de Espanha; um telemóvel de marca "Mitsubishi", melhor examinado a fls. 450 cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido; um telemóvel de marca "Bosch", melhor examinado a fls. 450 cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido; uma saca contendo um produto em pó com o peso bruto de 78,940 gramas que examinado laboratorialmente revelou ser PIRACETAM ( cfr. exame de fls. 897 que aqui se dá por integrado e reproduzido).
2.1.62. O dinheiro apreendido nesta residência era proveniente das vendas de estupefacientes levadas a cabo pela A.
2.1.63. O telemóvel apreendido era utilizado pela A em contactos relacionados com o "negócio" de compra e venda de estupefacientes.
2.1.64. O Piracetam era destinado a "cortar" os estupefacientes tendo em vista a sua "rentabilização" e posterior venda.
2.1.65. Na noite de 25/26 de Maio de 2000, cerca das 00H15, no decurso de uma busca domiciliaria realizada num apartamento da A, sito na Travessa Francisco Sá Carneiro, nº ..., em Leça da Palmeira, foram ali encontrados os seguintes artigos e produtos: a) quarenta carteiras contendo um produto em pó que submetido a exame laboratorial revelou ter como substancia activa presente a LISINA (derivado) - cfr. exame de fls. 662 que aqui se dá por integrado e reproduzido; b) uma faca de cozinha contendo resíduos de um produto que veio a ser laboratorialmente identificado como sendo HEROÍNA (cfr. exame de fls. 893 que aqui se dá por integrado e reproduzido); c) uma balança digital de marca "Soehnle" que continha resíduos de produtos que vieram a ser laboratorialmente identificados como HEROÍNA e COCAÍNA (cfr. exame de fls. 895 que aqui se dá por integrado e reproduzido); d) várias sacas plásticas; e) uma embalagem contendo um produto em pó com o peso bruto de 85,390 gramas que submetido a exame laboratorial revelou ser PARACETAMOL e CAFEÍNA (cfr. exame de fls. 899 que aqui se dá por integrado e reproduzido).
2.1.66. Os artefactos e produtos apreendidos nesta residência eram destinados a manusear, dosear, e preparar os estupefacientes que a A depois vendia.
2.1.67. O produto descrito sob a alínea e) vulgarmente designado por "traço holandês", destinado a ser misturado com a heroína para "rentabilização" do produto final obtido, era parte dos 20 quilos acima referidos.
2.1.68. Ainda no dia 25 de Maio de 2000, cerca das 19H00, no decurso de uma busca domiciliária realizada na residência da arguida B, sita na Rua Manuel Dias Júnior, nº ..., em Vila Nova da Telha, na Maia, foram ali encontrados e apreendidos os seguintes produtos, quantias e artigos: a) uma embalagem contendo um produto em pó, com o peso bruto de 300,840 gramas, o qual submetido a exame laboratorial revelou ser HEROÍNA (cfr. exame de fls. 901 que aqui se dá por integrado e reproduzido); b) um saco contendo a quantia de esc. 434.000$00 (quatrocentos e trinta e quatro mil escudos) em dinheiro do banco de Portugal; c) os documentos juntos a fls. 334 a 343.
2.1.69. A heroína descrita na alínea a) era a que o F havia "devolvido", no dia anterior, da forma que acima melhor se descreveu.
2.1.70. O dinheiro apreendido nesta residência havia sido obtido com o negócio da compra e venda dos estupefacientes levada a cabo pela B.
2.1.71. Ainda no dia 25 de Maio de 2000, cerca das 19H00, no decurso de uma diligência de busca domiciliaria realizada na residência da arguida C, sita na Rua Maria Feliciana, nº ...., em São Mamede de Infesta, foram ali encontrados um telemóvel de marca "Ericsson", melhor examinado a fls. 450; um telemóvel de marca "Siemens", melhor examinado a fls. 450, também utilizados por esta arguida nos contactos que estabelecida relacionados com a compra e venda de estupefaciente e adquiridos com os proventos que auferia em tal actividade
2.1.72. Finalmente, no dia 25 de Maio de 2000, foi ainda apreendido o veículo automóvel de marca "Peugeot", modelo "206", matrícula OI, melhor examinado a fls. 2112 a 2118, que aqui se dá por integrado e reproduzido, o qual era sempre utilizado pela arguida C nas deslocações que efectuava relacionadas com a compra, transporte e venda dos estupefacientes.
VI - Quanto à actividade do V:
2.1.73. De Agosto de 1999 a Setembro 2000, o arguido D deslocou-se frequentemente, por vezes com intervalos semanais, a Espanha .
2.1.74. Nas suas deslocações, o D fazia-se transportar no veículo automóvel de marca "Audi", modelo A4, matrícula JX.- cfr. informações da Via Verde juntas a fls.1259 e 2160.
2.1.75. Em Julho de 2000, o arguido D, adquiriu um imóvel, sito na Urbanização dos Alporchinhos, na freguesia de Porches, no Algarve, pelo valor de Esc. 8.000.000$00 (oito milhões de escudos), que o pagou da seguinte forma: em Janeiro de 2000, esc. 3.000.000$00 (três milhões de escudos) em numerário; quatro cheques de esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos), entre Fevereiro e Julho de 2000; em Julho de 2000 mais esc. 3.000.000$00 (três milhões de escudos), em numerário.
2.1.76. No dia 12 de Março de 2001, cerca das 8H20, P, mulher do D, saiu da garagem da residência de ambos, sita na Avenida Gago Coutinho, nº ...., Vila Nova da Telha, na Maia, ao volante do veículo automóvel de marca "Volkswagen", modelo "Polo", matrícula LU, tendo regressado a este local cerca das 8H40.
2.1.77. Cerca das 9H15, o D saiu da garagem do referido imóvel ao volante da viatura "Audi", matrícula JX, momento em que foi abordado por elementos da Polícia Judiciária.
2.1.78. Seguidamente, e tendo em vista o cumprimento dos mandados de busca autorizados para a residência dos arguidos, os elementos da Polícia Judiciária solicitaram ao D que os acompanhasse ao interior da casa.
2.1.79. Nessa altura, o D tocou à campainha da sua residência informando de imediato a P de que se encontrava acompanhado por elementos da Policia Judiciária.
2.1.80. Perante esta situação, entretanto, a P pegou numa saca que se encontrava no interior da residência e lançou-a pela janela, vindo a mesma a cair no passeio exterior, sensivelmente por debaixo da janela da marquise da residência dos arguidos.
2.1.81. Esta saca continha o seguinte: a) um plástico contendo um produto em pó, com o peso bruto de 1060,000 gramas (um quilo e sessenta gramas), que submetido a exame laboratorial revelou ser HEROÍNA (cfr. exame de fls. 2182 que aqui se dá por integrado e reproduzido); b) quatro plásticos contendo um produto em pó com o peso bruto de 1709,720 gramas, que submetido a exame laboratorial revelou ser PARACETAMOL E CAFEÍNA (cfr. exame de fls. 2182 que aqui se dá por integrado e reproduzido).
2.1.82. A heroína descrita sob a alínea a), que o arguido D adquirira e guardava naquela sua habitação, era destinada pelo mesmo à venda a indivíduos que se não lograram identificar, sendo que o produto descrito sob a alínea b), vulgarmente designado por "traço holandês" era destinado a ser misturado com a heroína para, dessa forma, rentabilizar os lucros que pretendia auferir com a venda do produto final desta forma obtido.
2.1.83. Cerca das 9H30 foram cumpridos os mandados de busca domiciliária na residência do arguido D e mulher P, tendo ali sido encontrados e apreendidos os documentos constantes de fls. 1564 a 1585.
2.1.84. Nesse mesmo dia, foram apreendidos os veículos Audi A4, matrícula JX, melhor examinado a fls. 2091 a 2097, cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido e "Volkswagen Polo", matrícula LV, melhor examinado a fls. 2119 a 2126, cujo teor aqui se dá por integrado e reproduzido - este, entretanto já entregue -, pertencentes ao arguido V e mulher respectivamente.
2.1.85. Todos os arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, conhecendo as qualidades estupefacientes dos produtos com que actuaram, sabendo que a respectiva conduta e fins visados eram proibidos e penalmente puníveis.
2.1.86. A arguida A sabia que, atentas as quantidades comercializadas, estas iriam ter por destinatários um número muito elevado de pessoas e agiu com o propósito de obter avultada compensação remuneratória.
2.1.87. O arguido V agiu ainda com o propósito de obter, com a sua conduta, avultada compensação monetária.
2.1.88. Para além de outras condenações anteriormente sofridas, foi a arguida H condenada, por Acórdão proferido a 19.1.1994, numa pena de seis anos e seis meses de prisão pela prática, em 1993, de um crime de tráfico de estupefacientes.
2.1.89. A H cumpriu tal pena entre 28 de Outubro de 1993 e 13 de Julho de 1996, data em que foi restituída à liberdade, em situação de liberdade condicional.
Da contestação de A:
2.1.90. Está arrependida.
2.1.91. Os vizinhos e amigos nada referem em desabono do seu comportamento anterior aos factos.
2.1.92. Tem bom comportamento prisional.
2.1.93. Tem uma filha menor de 8 anos a seu cargo.
2.1.94. Colaborou no apuramento da verdade.
Da contestação de B:
2.1.95. A arguida confessou parcialmente a sua apurada conduta.
2.1.96. O produto apreendido na sua residência havia sido entregue à arguida pela A no dia anterior.
2.1.97. Teve empregos, nomeadamente como cabeleireira, e negócios.
2.1.98. Tinha algumas dívidas.
2.1.99. Contraiu empréstimo bancário.
2.1.100. A A ajudava-a economicamente.
2.1.101. À data dos factos estava separada de facto.
2.1.102. A propriedade do veículo Audi em que se fazia transportar diariamente, e apreendido nestes autos, estava registado em nome de Sociedade de que o pai é sócio-gerente.
2.1.103. É mãe de um rapaz com 3 anos, que lhe é afectivamente muito ligado, dado que o pai nunca lhe deu nem dá qualquer atenção.
2.1.104. Por isso, o afastamento forçado da mãe trouxe ao menor problemas psicológicos, necessitando de apoio médico constante.
Da contestação de C
Não foi admitida a sua contestação.
Da contestação de D
2.1.105. O arguido é sócio-gerente da Sociedade designada "Arco Novo - Sociedade de Mediação Imobiliária, Ldª.".
2.1.106. Tal Sociedade tem por objecto a mediação imobiliária.
2.1.107. Prometeu comprar os 6 apartamentos a que se referem os contratos juntos com a contestação, para posteriormente ceder a respectiva posição contratual a compradores.
2.1.108 Chegou mesmo a comprar imóveis em hasta pública para os revender posteriormente.
2.1.109. Comprou um imóvel na Urbanização dos Alporchinhos, em Porches, no Algarve, por 8.000.000$00, pagando-o prestações.
2.1.110. Antes de ser detido, anunciou querer vendê-lo por Esc. 14.000.000$00.
2.1.111. Tem apoio familiar da mulher com quem casou em 30/6/1996.
2.1.112. Dessa relação tem dois filhos, nascidos em 16/6/87 e 4/6/94, respectivamente.
2.1.113. A sua vida e morada são como acima se refere.
Da contestação de E:
2.1.114. O arguido foi consumidor de heroína e cocaína.
2.1.115. Abandonou o consumo na sequência de tratamento adequado.
2.1.116. O arguido é respeitado, respeitador e considerado no meio onde vive e nas suas relações laborais.
2.1.117. Até à data da sua detenção, sempre trabalhou como modelo profissional e como gerente do Bar "Via Rápida".
2.1.118. Tinha uma vida estável e confortável.
2.1.119. No seu meio profissional é considerado um excelente profissional e como tal muito respeitado e requisitado.
2.1.120. Auferia um rendimento mensal variável entre, Esc. 400.000$00 e 600.000$00.
2.1.121. Está integrado naquele meio e terá trabalho.
Da contestação de F
Não alegou factos.
Da contestação de G
2.1.122. É de modesta condição social, respeitada e estimada no meio social em que se encontra inserida, bem como no seu ambiente sócio-familiar.
2.1.123. Tem um bom comportamento anterior e posterior à prática dos factos.
Da contestação da arguida H:
2.1.124. É de condição sócio-económica modesta.
2.1.125. Vive em casa arrendada.
2.1.126. Toma conta da neta.
2.1.127. Tem um filho deficiente profundo que padece de Síndroma de Down e Trissomia 21, a seu cargo e completamente dependente dos seus cuidados.
2.1.128. À data dos factos, prestava alguns serviços como promotora de vendas para o Núcleo de Organização de Serviços, Ldª..
2.1.129. Recebia 52.500$00, mensais, do Centro Regional de Segurança Social do Norte.
Da audiência:
2.1.130. Encontram-se detidos em situação de prisão preventiva ininterrupta à ordem destes autos: - as arguidas A e B, desde 25 de Maio de 2000; a arguida C, desde 26 de Maio de 2000; os arguidos D e E, desde 12 de Março de 2001; e os arguidos F e G, desde 27 de Abril de 2001.
2.1.131. Dos certificados de registo criminal dos arguidos A, B, V, C, E e G, nada consta.
2.1.132. Do certificado de registo criminal do arguido F consta que, em 21/10/98, sofreu uma condenação em pena de multa, pelo então crime de consumo de estupefacientes.
2.1.133. Do certificado de registo criminal da H consta que no Proc. Comum 642/91, do 3º. Juízo, 6ª. Secção, de Matosinhos, por Acórdão de 13/2/92 e factos de 24/1/91, foi condenada na pena de 7 meses de prisão e em multa, por crime de tráfico de estupefacientes, pena que foi perdoada; e que no Proc. 321/94, da 5ª. Secção do Tribunal de Paredes, por Acórdão de 19/10/94, foi condenada, por crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão, tendo beneficiado do perdão de um ano e um mês.
2.1.134. Conforme informação de fls. 2276, do EP de Paços de Ferreira, o arguido V esteve ali preso desde 13/3/87 até 21/12/89, data em que saiu em liberdade condicional, em cumprimento da pena de prisão de 5 anos e 6 meses decidida em Acórdão de 24/5/89, do TR do Porto.
2.1.135. Do relatório do IRS de fls. 3091 a 3094, consta que a arguida A é de origem modesta, tem a 4ª. Classe, trabalhou na indústria e em hotelaria e na "Utilbanho", reside em zona conhecida por "Bairro dos Pobres", é divorciada, tem dois filhos (o referido J, e Q de 8 anos), no EP tem visitas familiares e frequenta curso de cabeleireira.
2.1.136. Do relatório do IRS de fls. 3087 a 3090, consta que a arguida B descende de família harmoniosa e economicamente estável, teve um percurso escolar regular tendo feito o ensino secundário, está separada do marido há cerca de um ano, tem um filho de 3 anos confiado aos avós maternos, tem salão de cabeleireiro, vivia com os pais, no EP tem visitas.
2.1.137. Do relatório do IRS de fls. 3107 a 3112, consta que o arguido V foi desportista até aos 26 anos, teve acidente, esteve ligado ao comércio, bar, fotocópias e imobiliária; divorciou-se do primeiro casamento, do qual tem um filho; casou em 1996 com P e em 1987 cumpriu pena de prisão efectiva; fez 9 anos de escolaridade; tem 2 filhos menores e apoio familiar; goza de razoável situação económica.
2.1.138. Do relatório social do IRS de fls. 3083 a 3086, consta que a arguida C descende de família numerosa e de condição sócio-económica humilde; fez o 4º. Ano de escolaridade; acompanhava familiares na venda de roupa; viveu maritalmente com um companheiro entretanto falecido; tem um filho menor, estudante; vive em casa própria, comprada com empréstimo cuja prestação mensal é de 50.000$00; no EP faz apenas trabalhos artesanais; é de condição económica razoável.
2.1.139. Do relatório social de fls. 3125 a 3128, consta que o arguido E é oriundo de família de mediana condição sócio-económica e cultural, tendo 4 irmãos; fez o 12º. Ano, foi manequim e fez passagens de modelos durante cerca de 10 anos; iniciou-se no consumo de drogas pelos 18 anos, fez tratamento ambulatório ao consumo de droga; era gerente do "Via Rápida" há cinco anos; tem apoio familiar; vivia em apartamento próprio, com boa situação económica e tem perspectivas boas de inserção familiar e laboral.
2.1.140. Do relatório social de fls. 3073 a 3078, consta que o arguido F provém de agregado familiar de modesta condição social e económica, sendo 3 irmãos; foi educado pelos avós depois dos 5 anos; fez o 12º. Ano e um curso técnico-profissional de "designer"; tem pequena empresa; consumia droga; teve um acidente; não parece consumir actualmente; tem acompanhamento familiar e da namorada; tem razoável situação económica; perspectiva ir viver para o apartamento que possui e com a namorada.
2.1.141. Do relatório social de fls. 3129 a 3133, consta que a arguida G é oriunda de agregado familiar de condição sócio-económica desfavorecida residente em bairro camarário problemático, tendo a mãe falecido há 24 anos, sendo o pai alcoólico; fez o 6º. Ano de escolaridade; as suas relações afectivas caracterizaram-se por instabilidade; tem dois filhos; cuidava de senhora idosa; vivia com um companheiro, envolvido em problemas com a Justiça e em liberdade condicional, no agregado de origem, sendo o pai doente de "Alzheimer"; frequenta curso de cabeleireira no EP, onde tem visitas de companheiro e filhos; tem perspectivas laborais e situação económica carenciada.
2.1.142. Do relatório social de fls. 3286 a 3292, consta que a arguida H provém de agregado de 5 irmãos, pai operário fabril, mãe doméstica; o marido, falecido em acidente, era taxista, toxicodependente e foi condenado em pena de prisão por tráfico; foi cortadeira em fábrica têxtil; vive com 2 filhos e uma neta, em apartamento arrendado pela filha por 60 contos/mês; está bem inserida, estável, ocupa-se da neta e de tarefas domésticas; tem razoável situação económica.
2.1.143. A arguida A confessou a sua apurada conduta.
2.1.144. A arguida B confessou parte da sua apurada conduta.
2.1.145. O arguido E confessou parcialmente e está arrependido.
2.2. No acórdão recorrido deram-se como não provados os seguintes factos:
2.2.1.Do teor da acusação pública nenhum outro facto se provou com interesse para boa decisão da causa, designadamente:
Que, quanto aos seis primeiros parágrafos conclusivos e introdutórios, algo mais - para além do que a cada um dos arguidos respeita e acima foi dado como assente no lugar apropriado - se tenha provado, maxime quanto ao período de tempo aí referido, demais actividades, sua forma e relacionamento ou outras ligações entre os arguidos aí referidos; que fosse o V a comprar normalmente a droga, nas circunstâncias e quantidades aí referidas, em Espanha; e ainda que, na posse desse produto, ele os guardasse conjuntamente com a A e B, além do mais na sua residência - isto sem prejuízo do que, a respeito dele, acima se deu como provado; que, quer o V quer a B, actuassem ou participassem da forma aí descrita, mormente na pesagem, corte e embalagem da droga, e que as vendas ocorressem como aí se refere, designadamente através da G;
Que, quanto ao capítulo I da acusação e a respeito da actividade das arguidas B, C, G e H, algum outro acto estas duas tenham praticado, para além da ida e presença de ambas na chamada "cena" da "casa dos 300", ou, daquela, na do "Continente"; que entre a B e a G outros "negócios" ou contactos tivessem ocorrido, designadamente no período aí indicado, segundo os motivos, circunstâncias (nomeadamente periodicidade e quantidades), nos termos ou com os objectivos e destino aí descritos; que a droga entregue pela B fosse da comprada pelo V em Espanha; que a droga entregue pela B na "cena" do "Continente" o tivesse sido à G e à C e, de imediato, por estas ao R e que a quantia por ela recebida fosse de 5.000.000$00; que a G fosse para aí no Peugeot da C; que a H tivesse feito o contacto com a C com o objectivo e fins alegados e tivesse participado em outros encontros, noutros locais, nos termos e circunstâncias em relação a ela referidos; que neles estivesse presente a G, em concerto com a C e obtendo proventos pela intermediação; que o encontro da "loja dos 300" fosse exemplo dos alegados e o mesmo tenha ocorrido de forma diversa da provada e aí tivesse sido entregue qualquer heroína destinada à H ou que esta se frustrasse pela razão apontada; que, nos períodos e circunstâncias alegados, tivessem sido feitos fornecimentos a S e este por si, ou através de sua mãe, tivesse pago as quantias referidas; que os proventos da C fossem quase exclusivamente dos negócios da droga; que os elementos e movimentos bancários sejam diversos dos descritos nos factos provados e mero exemplo da proporção dos alegados proventos.
Que, quanto ao capítulo II, relativo às actividades do V, A e B, algo de diferente do constante a esse propósito nos "factos provados" tenha resultado assente, designadamente que o estupefaciente fosse do obtido pelo V em Espanha, que este actuasse em concertação de esforços com a A; que no período referido o V tenha comprado a droga nas circunstâncias e quantidades alegadas; que ele e a A se revezassem nas idas a Espanha e esta fosse nelas acompanhada pela B e a compra fosse feita ao mesmo indivíduo; que a A utilizasse o veículo MZ em todas as suas deslocações relacionadas com a compra e venda de droga (algumas ocorreram no carro da B); que no carro da B se tenha deslocado outras vezes para além das provadas e que esta a auxiliasse nos transportes e vendas de maneira diversa da que resultou assente; que a aquisição do "produto de corte" tivesse ocorrido também pelo V, em circunstâncias diversas das provadas, noutras quantidades e ao I; que, em relação ao estabelecimento da A e da sua exploração, algo mais se provasse; que os movimentos bancários descritos sejam meros exemplos dos demais; que o V neste período tenha obtido e vivido dos proventos com negócios da droga; que a aquisição do apartamento de Alporchinhos seja disso exemplo; que o E e F fossem clientes do V.
Que, quanto ao capítulo III, relativo ao E, algo mais de diverso do acima referido tenha ficado provado, designadamente quanto às quantidades adquiridas à A, período em que tal ocorreu, forma de cedência; que as aquisições e revendas de Cannabis se tenham processado em número, quantidades, a pessoas, em circunstâncias, segundo a periodicidade, em locais e com recebimento de quantias em moldes diversos dos provados; que os produtos apreendidos na busca efectuada ao O fossem dos vendidos pelo E; que dos documentos apreendidos na busca à casa do E resulte claramente o seu envolvimento em actividade delituosa diversa da provada e as elevadas quantias em numerário que auferia com tal "negócio".
Que, quanto ao capítulo IV, relativo ao arguido F, a conduta deste fosse diversa da provada; que as quantidades que lhe foram vendidas pela A fossem diversas das provadas e incluíssem cocaína; que o dinheiro, telemóvel, e veículo apreendidos ao F tivessem a alegada relação com o negócio de estupefacientes.
Que, quanto ao capítulo V, relativo aos factos de 25/5/2000, algo mais do alegado se tenha provado, designadamente que a aquisição, por compra, do quilo de heroína tenha sido feita também pela B e quer esta quer a cocaína estivessem na posse dela; que a B tivesse alguma relação com os artefactos apreendidos no apartamento da A; que dos documentos apreendidos à B resultem mais do que duas viagens e qual o nível de vida de ambas as arguidas;
Que, quanto ao capítulo VI, relativo à actividade do D e factos de 12/3/2001, algo mais se tenha provado de diferente do acima constante, designadamente que ele a partir de 25/5/2000 tenha prosseguido a actividade descrita na acusação e nos termos alegados; que o lançamento da saca pela P através da janela tenha sido feito "de imediato", isto é, acto contínuo ao toque da campaínha - sem prejuízo de o ter sido, como se deu por assente, no "entretanto", o que é diferente face à prova produzida e como se explica no sítio próprio; que o veículo Audi tivesse sido por aquele utilizado em negócios de estupefacientes e adquirido com os proventos dessa actividade (uma vez que, apesar de tudo o que se disse, não resultaram provados tais negócios anteriores).
Que, quanto ao plano prévio, forma de comparticipação, actuação, intenções e resultados prosseguidos em relação a qualquer dos arguidos, algo de diverso tivesse resultado provado.
2.2.2. Do teor das contestações dos arguidos e para além do que em tais peças significa impugnação dos factos alegados na Acusação (simples, por invocação da sua falsidade ou da ocorrência do contrário); conclusão, comentário, crítica ou argumento; sem prejuízo do que consta já como provado ou não provado a propósito de tais peças, e abstraindo dos irrelevantes para a defesa dos arguidos, nada mais se provou, designadamente:
Quanto à contestação da A: nada mais se provou, maxime os graus de profundidade e sinceridade do arrependimento, o alcance do bom comportamento; que a sua colaboração tenha sido activa e profícua mais do que resulta dos factos provados.
Quanto à contestação da B: nada mais se provou maxime que nunca se tivesse dedicado a actividade ilícita e se dedicasse exclusivamente ao trabalho; que tivesse confessado algo de diverso; que não contactasse nem observasse o produto e desconhecesse do que tratava; que as 300 gramas estivessem só à sua guarda, que desconhecesse o conteúdo e pensasse que era ouro; que nunca desconfiasse de nada ilícito e seja avessa a drogas; que só vivesse dos seus rendimentos; qual o nível de recursos económicos e a sua situação económico-financeira e patrimonial (além do provado); qual o destino do empréstimo; quais as condições em que detinha o Audi; que a sua situação seja fruto do casamento.
Quanto à contestação do V: nada mais se provou, designadamente quanto à Sociedade, à sua actividade, deslocações por causa dela, benefícios, lucros, e que as viagens a Espanha a tal se devessem; que tivesse negócios na zona de Valença; que outros negócios existissem diversos dos provados.
Quanto à contestação do arguido E: nada mais se provou para além do acima referido, designadamente que tenha tido a condição de verdadeiro toxicodependente - sem prejuízo de ter sido consumidor - e que as suas ligações ao mundo da droga se circunscrevam a tal condição; que o exacto rendimento médio mensal fosse o alegado.
Quanto à contestação da H: que trabalhasse em moldes diversos dos alegados.
2.3. Na motivação probatória de decisão de facto consta o seguinte:
"Motivação de Facto"
«O Tribunal, tendo sempre presentes os princípios e regras legais sobre os meios de prova admissíveis em função do objecto do processo (arts. 124º. e 125º., CPP), modos da sua obtenção e força probatória legalmente conferida, formou a sua convicção de forma livre (1) e à luz das regras da experiência (art. 127º., do CPP), tendo em conta que tais regras (como é da Doutrina e Jurisprudência) não comportam apreciação arbitrária nem meras impressões subjectivas incontroláveis, antes têm, sempre, de se reconduzir, objectiva e fundadamente, às provas validamente produzidas e examinadas em audiência, isto sem esquecer, por um lado, e no entanto, que os critérios da experiência comum e a lógica do homem médio supostos pela ordem jurídica se bastam com a descoberta da verdade material, prático-jurídica, e não exigem a busca da verdade ontológica, transcendental, porventura inalcançável, nem uma livre e ilimitada especulação projectada para hipóteses fora do domínio da racionalidade prática e sem suporte nos concretos argumentos objectivos; e, por outro lado, as exigências algumas vezes já afirmadas, a propósito da matéria, pelo Tribunal constitucional, (2) maxime em termos de fundamentação.
Tudo isto, sem perder de vista o especial tipo de criminalidade envolvida, seus modos de desenvolvimento e manifestação ou ocultação e disfarce, e as conhecidas e consequentes dificuldades probatórias que lhe andam associadas em função dos valores, meios, papéis (por vezes bem difíceis de detectar e recortar) e treino das pessoas envolvidas, complicados estratagemas usados e labirínticos canais construídos para a circulação ou despiste dos produtos e correspondentes fluxos financeiros, hoje conhecidos, mas nunca completamente dominados, não só pelas pessoas ligadas à investigação ou ao julgamento como por comuns cidadãos.
Assim, examinaram-se, ponderaram-se, com minúcia, todos os documentos oferecidos, especialmente os bancários, os relativos aos contratos e facturação dos telefones e telemóveis (nestes casos servindo até de auxiliar de compreensão os "apanhados" de fls. 2147 a 2151 e 2156), os encontrados na posse dos arguidos, os autos de exame, designadamente laboratorial, e de busca e apreensão, documentos dos veículos, a vídeo-cassete, isto além da ponderação e conjugação dos depoimentos testemunhais oferecidos pela acusação e defesa e declarações prestadas por alguns dos arguidos (3).
Discriminando e salientando alguns:
Volume 1:
-fotografias de fls. 4 e 5 relativas ao Peugeot OI, da C; fotografias/fotogramas do Audi OE, conduzido pela B, Peugeot da C e "cena" do Continente relativa à entrega de um quilo de droga (salienta-se, além do adiante referido quanto à participação da G nesse acto, que, cotejada a imagem da pessoa que aí surge a transportar um saco, com as fotografias dela de fls. 1557 e 1953, e não obstante o perfil do queixo, talvez evidenciado pela incidência da luz (nesta última), o rosto magro e o cabelo curto, apontarem para alguma semelhança, mas tendo em conta as explicações dos agentes da PJ, filme exibido e explicações da G, ficou de todo arredada a hipótese de o Tribunal se convencer com certeza e segurança que é ela); ofício de fls. 25, de Interbanco, SA, informando que o Audi da B foi cedido em locação financeira à Sociedade "Sucristecto); doc. de fls. 21 - registo desse veículo, em 27/10/99, em nome de Interbanco; doc. de fls. 28 - registo do Peugeot da C em nome da Peugeot, SA, desde 15/11/99; fotografias, no salão de cabeleireiro "Romanos", pertencente à B, vendo-se esta, a A e a C (o que mostra as ligações e bom relacionamento entre elas); fotografias de fls.48 a 52 (idem, A e B, à porta de casa desta, em 16/2/2000, vendo-se um saco, mas cujo conteúdo se ignora); fotografias de fls. 56/57 (encontro entre I e B, em 17/2/2000, no restaurante "Assador Típico", o que mostra o seu relacionamento e condiz com o que demais se provou sobre os motivos disso); fls. 58/59 - além do mais, fotografia do Porche do I; fotografias de fls. 66 a 68 (A e P, esposa do D, num outro "caso" vigiado no "Continente" e aludido nos depoimentos de agentes da PJ, o que, pelo menos mostra esse relacionamento); fls. 71 - registo do veículo LU, da referida P; fls. 72 - ficha da prisão da mesma; fls. 73 e 76 - informação de Multirent de que o Audi JX conduzido pelo D foi cedido a este em "ALD" e assim registado; fls. 77 - ficha de recluso do D; fls. 79 - ficha de empresário em nome individual do mesmo, referente a Vila do Conde e reportada a 1992; fls. 95/98 - fotografias/fotogramas da B, C e H , alusiva à "cena" da "loja dos 300", em 8/3/2000, adiante mencionada; fotografias de fls. 105 a 107, do V, junto a sua casa, e seu Audi JX; informações bancárias de fls. 111- 139 e 145-151, relativas a contas de que a C é titular ou co-titular, algumas com filho Ivo e com um tal U (há diversos depósitos em numerário, cada um de várias dezenas de contos, movimentos de cheques e saldos na casa do milhar de contos); fls. 195 a 199 e 1259 a 1260 - informações da Brisa relativas à passagem do veículo JX, do D, no período de 1/7/99 até 9/11/2000, cuja compreensão é facilitada pelo quadro-resumo de fls. 2151 a 2155 onde se destacam as passagens na portagem Maia II (zona de residência e actividade do V) e na de Valença; além dos muitos casos em que só está registada uma viagem - só ida ou só regresso e em que, portanto, como é óbvio, a outra se realizou por estrada diferente - há um grande número de registos, em datas muito próximas, de viagens com ida-e-volta, no mesmo dia, e com intervalo de horas muito próximo: por exemplos: 18/8/99, 23/8/99, 15/9/99, 30/9/99, 8/10/99 (neste dia foram necessariamente realizadas duas viagens, entre as 11, 33 e as 19,15 h.!), 8/11/99, 30/11/99, 7/12/99, 9/12/99 (esta nem deu tempo para almoço!), 22/12/99, 16/1/2000, 29/1/2000, 1/2/2000, 27/2/2000, 19/3/2000, 2/4/2000, 4/5/2000, 29/6/2000, 7/9/2000, 22/9/2000. Como é sabido a auto-estrada e portagem de Valença dão acesso a Espanha, em grande parte por causa disso foram construídas e por ela passa grande número de pessoas que se deslocam à Galiza. Não se argumente (defesa do arguido V), pois, que Valença é em Portugal para se afastar a ideia de que tais viagens tinham por destino Espanha, nomeadamente a Galiza, local pública e notoriamente conhecido como de tráfico de droga, onde, aliás, a A confessadamente se ia abastecer. De facto, nenhuma justificação foi sequer tentada no sentido de que o destino era só a zona ou cidade de Valença, nem, perante tais circunstâncias, isso se vislumbra. De resto, é o próprio arguido que refere em contestação que se deslocava a Espanha (embora aduzindo outro pretexto) e oferece até um documento pretensamente disso demonstrativo e justificativo. Assim como apresentou testemunha que refere que ele tinha lá uns negócios. Não há, pois, lugar à menor dúvida de que tais viagens tinham por destino Espanha (questão diferente sendo a prova certa e segura do respectivo motivo). E mesmo que algo de verdade houvesse nuns alegados negócios referidos pela dita testemunha V em Caminha e Vila Nova de Cerveira, é, em geral, sabido que, normalmente, quem se dirige a estas localidades não usa a portagem de Valença, nem aliás os tempos de demora são compatíveis com a estadia e circulação por tais localidades. Convencem, pois, tais documentos que era a Espanha que o arguido V intensamente se deslocava no seu Audi JX. E mais ainda: por razões, com objectivos e em circunstâncias muito estranhas.
Volume 2:
-fls. 204 - detenção, em 25/5/2000, da A e B; fls. 206 - revista e apreensão, nesse dia, à A da heroína e cocaína; fls. 206-A e 266 - apreensão do Renault Kangoo MZ, da A; fls. 207/208 - testes rápidos; fls. 209 - fotocópia livrete e título desse veículo, de onde se vê a inscrição de reserva a favor de Autogarme; fls. 21o/217 - documentos apreendidos à A (notando-se, além do mais, a existência de um papel que referencia um tal X, igualmente mencionado na agenda de fls. 243, o que se compagina com o que a A declarou a propósito dessa pessoa em audiência e credibiliza tais declarações); fls. 219 - busca, em 25/5/2000, na casa da A sita à Travessa da Fonte da Muda, em Leça (destaca-se o contrato-promessa de cessão de quotas referente à Utilbanho, referido nas suas declarações, e com as quais se compagina); fls. 221 - teste rápido; fls. 222 a 250 - variados documentos (destacando-se o do arrendamento, em 1/3/99, do imóvel onde instalou o estabelecimento por vezes impropriamente (dadas as suas características apuradas) de "Supermercado"; um depósito de 1250 contos em numerário; e o contrato-promessa da aquisição a J.F. Dias, Ldª., por 17.120 contos, da fracção G, na Travessa Francisco Sá Carneiro, ......, ....º.Dtº.; fls. 252 - busca e apreensão no Supermercado; fls. 253 a 265 -documentos aí apreendidos; fls. 267 a 279 - documentos apreendidos na Renault Kangoo; fls. 291/292 - busca ao apartamento da A na Trav. Sá Carneiro; fls. 293 - teste rápido; fls. 294 - revista e apreensão à B;
-fls. 295 - auto de exame do seu telemóvel; fls. 297 - documentos, cartões e fotocópias da agenda apreendidos à B; fls. 321 - auto de busca e apreensão do Audi A3 OE da B; Fls. 322 a 327 - documentos apreendidos à B;
-Volume 3:
-fls. 332 - busca e apreensão na casa da B, em 25/5/2000 (notando-se que as 300 gramas de heroína foram encontradas no bolso de um casaco pendurado no roupeiro do seu quarto - o que atesta bem o cuidado na guarda desse embrulho significativo da consciência que tinha do respectivo conteúdo); e, ainda, a quantia de 434.000$00 , cuja posse em pessoa que alegadamente estava em dificuldades económicas, tinha dívidas, contraía empréstimos e precisava de ajuda é inexplicável, sendo certo ainda que a justificação de que tal dinheiro respeitava aos seus estabelecimentos e o guardava assim por não poder depositá-lo nas contas conjuntas com o ex-marido J, porque este lho desviava, não é crível, pois outros modos teria de tal evitar, pelo que é fatal e indubitável a conclusão de que tal dinheiro respeitava aos negócios de estupefacientes; de referir ainda os bilhetes da viagem a Londres, em que participaram a B, C, filho desta, A, filha desta, B e filha do V, bem significativa das ligações e relacionamento entre todos); fls. 333 - teste rápido; fls. 334 a 351 -documentos apreendidos à B; fls. 354 - busca no estabelecimento da B; fls. 361 - busca e apreensão, em 25/5/00, na casa da C; fls. 362 a 373 - documentos e cartões encontrados nesta busca; fls. 374 - busca e apreensão, em 25/5/2000, na viatura Peugeot da C; fls. 375 a 388 - documentos encontrados no carro; fls. 393/4 - exame a telemóvel; fls. 396 - fotografias dos produtos apreendidos à A e B; fls. 408 e 412 - detenção da C em 26/5/2000; fls. 429 a 431 - despacho a decretar a prisão preventiva quanto à A, B e C; fls. 450 - auto de exame de telemóveis; fls. 451 e 453, 459, 561 e 562 - depósito de dinheiro português e espanhol; fls. 454 - guia de objectos; fls. 459 a 461 - certificados de registo criminal; fls. 489 a 492 - informações da TMN; fls. 517 a 529 - informações da Optimus;
-Volume 4:
-fls. 569 a 570 - fotografias de V e sua carrinha Audi .....JX e estadia no Algarve; fls. 578 a 582 - guia e fotografias do Audi da B - OE; fls. 583 a 594 - guia, fotografias, etc., do Peugeot da C e Renault da A; fls. 606 e 607 - conta da B, a negativo; fls. 615 a 656 - conta da B (sem valores significativos); fls. 661 e 662 - exame no LPC.PJ (Lisina); fls. 676 a 677 -conta da B na CGD; fls. 697 a 699 - fotocópia documentos aquisição do carro da A; fls. 704 a 724 -documentos apreendidos na busca à casa da C (notando-se muitos depósitos em numerário, alguns de valor significativo); fls. 727 a 734 - documentos relativos à Sucristecto e carro Audi da B; fls. 744 a 847 - contas no BCP da A e C (algumas com co-titulares) - aqui se referindo, quanto à A, que particularmente no que concerne ao depósito de 12.500 contos não convenceu a sua tese, aliás negada pela B e uma vez que rendimentos se não conhecem ao filho que justifiquem pertencer-lhe a ela tal dinheiro; fls. 851 a 863 - documentos relativos ao Audi da B;
Volume 5:
fls. 883 a 890 - documentos relativos à compra pelo próprio V do apartamento no Algarve e à forma de pagamento; fls. 892 a 903 - exames à droga, balança, faca, "traço", plásticos apreendidos à A, elucidativos das formas da sua actividade; fls. 909 - documentos bancários relativos à C e A; fls. 936 a 938 - apreensões de saldos bancários; fls. 939 a 941 - informações fiscais; fls. 945 a 959 - informações bancárias; fls. 961/962 - informações de conta bancária da A, saldada; fls. 964 - guia de objectos;
-fls. 990 a 999 - documentos relativos à aquisição pela C do Peugeot (aí constam declarações fiscais relativas aos montantes declarados como rendimentos); fls. 1002 a 1009 - documentos relativos à aquisição do apartamento pela A (em 22/2/2000, por 17.120 contos tendo pedido empréstimo de 15.400, conforme aliás declarou - anotando-se que os empréstimos, aquisições em "leasing", em "ALD", arrendamentos, neste tipo de actividade, como é geralmente sabido, se destinam a não dar "nas vistas" e encobrir os rendimentos injustificados, razão que identicamente leva os delinquentes mais espertos e experientes a evitar depósitos bancários avultados ou mesmo a não os ter); fls. 1025 - apreensão bancária; fls. 1047 - registo do BMW LB, em nome do arguido E; fls. 1050 e 3167 - registo do motociclo LA, marca Yamaha, em nome de um terceiro que não o arguido F: nesta circunstância se baseava a defesa para pôr em dúvida que fosse tal arguido o condutor do motociclo que se abeirou do Audi da B, na "cena" de Leça, junto à Petrogal e entregou as 300 gramas de heroína; porém, apesar de os agentes da PJ o não terem, como disseram, reconhecido na altura, só tendo colhido a matrícula e de as testemunhas de defesa do arguido dizerem que nunca o viram a andar de moto, nem a tinha, e mesmo que alguma dúvida se pudesse levantar quanto à correcção da matrícula, o certo é que os registos na conservatória frequentemente não estão conformes à realidade e a arguida A relatou, de forma que não deixou margens para dúvidas, tal cena e asseverou que se tratava efectivamente do arguido F; fls. 1051 - registo da carrinha BF, em nome do F - salientando-se que nenhuma prova segura e convincente se colheu da participação nos factos deste veículo; fls. 1056 a 1058 e 1060 a 1061 e 1060 - fotografias do carro e casa do E, e dele próprio, obtidas pela PJ em vigilâncias, no "Via Rápida"; fls. 1067 - fotografia da arguida H;
Volume 6:
fls. 1075 a 1159 - listagem de chamadas na Telecel da C e B (o que mostra a sua intensa actividade); fls. 1162 a 1164 - conta da C no Banco Santander, vendo-se da ficha que o co-titular T é seu filho; fls. 1169 - inscrição como pessoa colectiva da Sociedade "Arco Novo-Imobiliária", aí figurando como data da constituição 25/1/2000; fls. 1173 a 1175 - fotografias do arguido D, com J, filho da A, no "Forno", em 10/10/2000 - tal J foi referido na audiência pela B como traficante e envolvido com o I; fls. 1176 - registo do veículo BS; fls. 1188 a 1207 - na parte demonstrativa da detenção dos ditos J e I, o que, por um lado, mostra a sua ligação, e, por outro, confere credibilidade às declarações da B, mormente quando alude a tal detenção que terá assustado o ex-marido; fls. 1210 a 1214 - fotografias do J e D, em 17/10/2000, nomeadamente junto ao Restaurante - para estes encontros não foi oferecida em audiência qualquer justificação normal, sendo certo que a vida e actividades do J referenciadas designadamente pela B fazem, obviamente, suspeitar dos motivos e fins desses encontros; fls. 1215 - registo da moto NF-Yamaha; fls. 1218 e 1219 e 1243 e 1244 e 1497 (volume 8) - fotografias da viatura XN, que é o carro do J, estacionado à porta de casa do D e este a telefonar de uma cabine pública, tendo-se apurado, por diligências feitas e documentadas nos autos junto da empresa de telefones e da Interpol que o número marcado pelo V, no dia 18/10/2000, às 17/01, era de um, telemóvel espanhol considerado secreto; fls. 1238 e 1239 - Registo na Conservatória da Sociedade Arco Novo, em 25/1/2000, tendo por objecto mediação imobiliária, com capital de 6000 contos, sendo sócios Z, V (indicado e ouvido como testemunha de defesa) e o arguido D; fls. 1258 a 1260 - já atrás referidas e cotejadas com fls. 195 a 199; fls. 1266/1269 - documentos relativos à situação do filho da B;
Volume 7:
fls. 1279 a 1282 e 1290 a 1292 - fotografias do D, com um tal A', junto a um Café, em 28/11/2000 e 4/12/2000; fls. 1295 a 1368, 1376 e seguintes, 1404 a 1432 : informações fiscais relativas à Arco Novo, ao J, A, C, E, F, B, de diversos anos, cujos elementos declarados ou inexistentes apontam para baixos rendimentos lícitos, sendo que a sociedade Arco Novo - constituída regularmente apenas em 25/1/2000 - apresentou declaração de prejuízo em 1999, o que retira credibilidade à tese do arguido sobre a sua actividade e fontes de rendimento e, bem assim, aos documentos de tal Sociedade juntos com a contestação;
Apenso A: facturação detalhada da Optimus.
Volume 8:
fls. 1497 - informação já atrás mencionada; fls. 1514 - informação fiscal relativa ao E, dos anos de 1998 e 1999, em que declara rendimentos anuais de 670 e 810 contos; fls. 1528 a 1551 - informações bancárias relativas à A; fls. 1557 - fotografia da arguida G; fls. 1562 - detenção do arguido V, em 12/3/2001, às 9,30 h.; fls. 1563 - busca à casa do arguido D, em Vila Nova da Telha, em 12/3/2001, entre as 9,40 e as 11,30 h., - salientam-se a arma, um revólver objecto de investigação em inquérito autónomo, fls. 1564 a 1585 - documentos apreendidos aí - salientando-se os movimentos de uma caderneta bancária, com entrega de valores avultados para cobrança, e levantamento de 3000 contos em numerário; e, bem assim, documentos relativos a contratos de fornecimento de água, gás e electricidade tendo por objecto o apartamento da arguida A na Trav. Sá Carneiro, .........., Dtº., mas que - sem que se conheça justificação ou explicação - se encontram em nome do arguido D, o que, no mínimo, demonstra a estreita ligação entre eles. fls. 1590/1591 -documentos relativos ao Kangoo da A; fls. 1594 e sgs. - auto de apreensão e exame de telemóvel; fls. 1598 e 1599 - autos de apreensão do Audi JX e VW Polo LU; fls. 1600 a 1699 - fotocópias dos documentos (agenda) apreendidos ao V, onde se encontram diversas anotações mencionando nomes que parecem ser os dos seus sócios na "Arco Novo" e, assim, uma forma de organização da escrita muito rudimentar; fls. 1699 - auto de apreensão das cinco embalagens de "traço" e droga;.fls. 1700 a 1704 - testes rápidos; fls. 1705-vº. - detenção do E, em 12/3/2001, às 11,50 h.; fls. 1706 - busca à casa do E, entre as 12 e as 12,45 h; fls. 1707 - auto de apreensão do BMW LB; fls. 1708 a 1741 - documentos apreendidos ao E; fls. 1742 a 1750 - auto de exame a telemóvel; fls. 1755 a 1759 - fotografias da arma, dos sacos apreendidos junto à casa do V (dele próprio e do E), vendo-se que são 4 sacos e 1 "tijolo"; fls. 1801 a 1803 - despacho de JIC a decretar prisão preventiva aos arguidos V e E;
Volume 9:
fls. 1835/1836 - guia de depósito de 1 telemóvel e outros objectos; fls. 1936/1939 - fotografias/fotogramas explicativas da queda dos sacos da janela do apartamento de D, aqui se notando - sem prejuízo do que resulta das explicações dos agentes da PJ e do cotejo com as fotografias de fls. 2990 a 2994, oferecidas em audiência - que, nas primeiras, é visível, em primeiro plano, um poste que tapa uma das janelas e, portanto, induz em erro e assim influencia a legendagem das janelas, que divergem de fls. 1937 para 1939; fls. 1949-vº. - detenção da G, em 27/4/2001; fls. 1950 - busca em casa da mesma (nada foi encontrado); fls. 1953 - fotografia dessa arguida (já atrás mencionada); fls. 1954-vº. - detenção do arguido F , em 27/4/2001; fls. 1957 - revista ao mesmo; fls. 1958 a 1962 -documentos apreendidos ao F; fls. 1963 a 1965 - auto de leitura do telemóvel; fls. 1966 - auto de apreensão da viatura BF; fls. 1967 a 1971 - documentos apreendidos na carrinha do F; fls. 1972 -fotografia do F; fls. 1982 a 1984 - despacho de JIC a aplicar prisão preventiva ao F e G; fls. 2002 - informação bancária relativa ao E; fls. 2011/2012 - documentos do carro VW Polo LU, de P; fls. 2051 a 2053 - informações Telecel; fls. 2063 - guia de depósito telemóvel; fls. 2069/2421 - guia depósito da quantia de 100.000$00, na CGD; Das certidões de fls. 1506, 1842 a 1849 e 2073 a 2085 e 2240, extraídas do Inquérito 13796 - valoraram-se, apenas, os elementos que o podiam ser (apreensões, exames, etc.);
Volume 10:
fls. 2092 a 2140 - autos, guias, fichas e fotografias relativas aos veículos apreendidos: Audi do Castanheira, BMW do E, Audi da B, Peugeot da C, VW Polo da P, Renault Kangoo da A, e Ford Courier do F; fls. 2167 a 2170, 2228, 2231 a 2234, 2337, 2375, 2377, 2395, 2475 - CRC’s dos arguidos; fls. 2181 e 2182 - Exame no LPC-PJ, dos produtos encontrados junto ao apartamento do V, registando-se aí 4 sacos plásticos com "traço" e 1 saco plástico com heroína; fls. 2225, 2750 e 2818 - certidão nascimento e casamentos do V; fls. 2257 a 2275 e 2341 a 2359 - certidão do Tribunal de Paredes, relativa à condenação da arguida H; fls. 2276 - informação prisional do EP de Paços de Ferreira relativa ao arguido D, enquanto lá recluso, de onde consta que esteve preso lá desde 13/3/87 a 21/12/89, inicialmente condenado, por Acórdão de 10/11/88, na pena de 8 anos alterada para 5 anos e 6 meses pelo Acórdão de 24/5/89 do TR Porto, tendo saído em liberdade condicional; fls. 2405 - entrega documentos Renault Kangoo.
Volume 11:
entrega de Renault Kangoo à Renault; fls. 2495 a 2502 - registos dos veículos a favor de terceiros; fls. 2542 a 2548 - guia de objectos; fls. 2637 a 2641 - documentos relativos a saldos bancários negativos em 2/6/00 da B ou pequenos; reclamação de uma dívida da B, em 30/1/2001, pela "Cetelem"; diagnóstico de síndrome depressivo do filho; fls. 2631 a 2632 - carta de 30/8/2001, relativa a cheques devolvidos sem provisão; declaração do BCP relativa à concessão de crédito pessoal de 1500 contos em 17/9/99; fls. 2666 - declaração médica subscrita pela Drª. B', que depôs em audiência.
Volume 12:
fls. 2695 a 2699 - contrato-promessa entre "C'.", e V, datado de 4/11/97, relativo à compra de um T2 por 14.500 contos; fls. 2700-2702 - cessão dessa posição contratual, em 14/10/98, por 18.000 contos; fls. 2703 a 2731 - aquisição de fracção AQ, por 12000 contos, no 4º. Juízo Cível de Matosinhos, pelo V; fls. 2732 a 2741 - promessa de venda e registo provisório dessa fracção por 17000 contos; fls. 2742 a 2767 -aquisição no Tribunal de Valongo de imóvel urbano, por 23000 contos, em 4/12/2000, pelo V; fls. 2768 a 2777 - promessa de venda, por 18000 contos, por "Pompeia Construções" ao V da fracção E, por aquela adquirida em venda no 2º. Juízo Cível do Porto, com rescisão consequente à anulação de tal venda, em 29/12/99; fls. 2778 a 2783 - contrato promessa de "Romaigil" ao V de fracção AG, por 14000 contos, com aditamento de trabalhos no valor de 4800 contos e cessão a terceiros por 19400 contos, em 11/5/99; fls. 2784 a 2786 - promessa de compra a "Tomaigil" e cessão a D', de uma fracção R, em Vila Nova da Telha, por 18750; fls. 2787 a 2790 e 2792 a 2796 - semelhantes (a fls. 2695-2699) cessões a terceiros de dois apartamentos em 22/10/98 e 15/11/98 - aqui se salienta o número limitado de negócios, sua dispersão no tempo, actuação individual, sendo que as testemunhas de defesa apresentadas pelo V - D' (uma das adquirentes) e V (seu sócio) - apenas a esses se referem como os mais concretos mas ainda assim de forma imprecisa e hesitante, claramente mostrando que a actividade do V, naquele campo, era dispersa, irregular, esporádica, desorganizada e não expressiva de carácter estável, permanente, e exclusivamente dedicado; quanto aos mapas de fls. 2797 e seguintes, relativos à "Arco Novo" pretensamente demonstrativos de volumes de vendas, não só os mesmos são meramente particulares, muito fáceis de elaborar, sem sustentáculo nos documentos que deviam titular os verdadeiros contratos, como não têm expressão em documentos contabilísticos ou fiscais credíveis; note-se ainda que tal actividade é dispersa por 3 sócios, tendo ficado a ideia, a partir do depoimento do sócio V e do desconhecimento de movimento real no escritório, que a Sociedade apenas se destinava a dar forma mais vantajosa e aparentemente legal às actividades individuais dos sócios; de resto, mesmo que tais mapas tenham correspondência com a realidade, vê-se que os negócios neles apontados se circunscrevem, em parte significativa, a algumas pessoas (mesmos vendedores ou compradores) - o que tudo levou o Tribunal a não lhes conceder credibilidade; planta de fls. 2811 - que é uma mera proposta, legendada em espanhol, relativa a pretensa urbanização aí indicada à face da EN 13, que o sócio V referiu, de forma tão pouco fundada, conhecedora e equívoca, que a torna absolutamente sem qualquer merecimento como tradutora da realidade; fls. 2812/2913 - sendo papel inválido como depoimento testemunhal, mas oferecido pelo próprio arguido, mostra apenas que, efectivamente, o mesmo fazia deslocações a Espanha e sublinha a crença de que estas, sem qualquer sustentáculo concreto, não têm justificação normal; fls. 2813 a 2817 - fotocópia de anúncio de venda e contrato de mediação do apartamento adquirido pelo V no Algarve; declaração médica relativa a filho doente e a cargo da H; fls. 2839 - rendimento mínimo da mesma; fls. 2840 a 2841 - rendimentos escassos da mesma, na empresa de serviços, como acto isolado, nada provando um dos documentos; fls. 2858/2864 - atestado autárquico relativo à C; fls. 2865 e 2866 - declarações do EP relativas à G e A; fls. 2899 - entrega à P do Polo que se encontrava apreendido; fls. 2911/2912 - certidões de nascimento dos filhos do V, em 16/6/87 e 4/6/94; fls. 2990 a 2994 - fotografias da casa do V; fls. 3073 a 3078, 3107 a 3112, 3125 a 3128, 3129 a 3133, 3083 a 3086, 3087 a 3090, 3091 a 3094 e 3286 a 3292 - Relatórios Sociais dos arguidos elaborados pelo IRS; fls. 3097 a 3103 - guia de objectos; fls. 3137, 3138, 3142, 3143, 3150, 3151, 3197 e sgs., e 3249 a 3250; Certificados de registo criminal dos arguidos; informação sobre registo automóvel do motociclo LA, já atrás referido;
Volume 14:
fls. 3336 - documento relativo ao filho da B; fls. 3337 e 3338 - documento relativo à B; fls. 3339 - proposta de compra do Audi A3, da B, por 5.237.119$00, em nome da Sociedade do pai "Sucristecto"; fls. 3740 -cheque de 100.000$00 da Sucristecto de sinal desse carro, em 15/9/99; fls. 3341 a 3343 - documentos alegadamente justificativos da viagem da B a Punta Cana de 15 a 22/10/99, de uma Sociedade, mas que não dizem para quem nem a que título se destinava tal viagem;
Não prestaram declarações os arguidos C, D, F, G - esta salvo uns esclarecimentos adiante destacados - e Mª. H .
Declarações da arguida A (início, durante e fim da audiência:
Começando por dizer não ter problemas em falar, referiu, quanto à acusação, que, infelizmente, é quase tudo verdade, mas não tudo.
Assim, no dia 25/5/2000, data da sua detenção em Viana do Castelo, provinha de Espanha onde tinha ido buscar um quilo de heroína; a arguida B, de quem é sogra, acompanhou-a e transportou-a no seu Audi porque estava doente e sem condições para conduzir; foi a primeira e única vez que a B lá foi; no dia anterior o arguido F tinha-lhe devolvido 300 gramas de heroína que antes lhe tinha entregue, pois, contra o costume, ele não veio trazer-lhe o dinheiro de tal produto, motivo por que lhe telefonou, tendo ele dito que a pessoa para quem aquilo era não estava de momento, embora acabando por dizer mais tarde que essa pessoa havia sido detida. O F veio-lhe entregar esse produto junto ao cemitério de Leça. Como a B a tinha procurado e lhe pediu para arranjar meio quilo de heroína para uma pessoa, respondeu-lhe que só tinha aquelas 300 gramas devolvidas pelo F. Entregou-as à B. São as apreendidas na sua casa. A B perguntou-lhe se podia ir arranjar o resto, ao que respondeu que não podia conduzir para ir a Espanha-Tuy, tendo-se ela prontificado a levá-la. Em Espanha, a B não viu nada, não a acompanhou, não sabe a quem a adquiriu, ficou no carro dela, para não se expor. Ela própria trouxe esse quilo de heroína na sua mala, embora a B a quisesse trazer no corpo dela. Assevera que essa droga era a B que a ia vender e entregar, não era para si, embora nunca a tenha induzido nisto, pelo contrário sempre lhe recomendou cuidado e disse para não se meter em tal. Refere que a B lhe deu 900 contos para levar para o Espanhol e entregou por conta desse quilo de heroína. Instada, disse ainda que de tal quilo ia tirar as 200 gramas para com as 300 devolvidas pelo F perfazer o meio quilo pedido pela B, mas acrescenta que aquela, na altura, disse que ia precisar de mais. Quando foi, a ideia era trazer só o meio quilo, mas como a B disse isto, resolveu trazer a dita quantidade, sendo o resto do preço "fiado". Explicou que as 26,9 gramas de cocaína foram-lhe dadas pelo Espanhol para trazer e testar a qualidade. Assume que vendeu droga, e, para o efeito, foi a Espanha outras vezes, mas na altura estava parada no negócio. Começara a partir de meados de 1999, embora, instada, diga que nem sabe e depois refira que foi a partir do segundo semestre daquele ano. Nega que tenha sido desde 1998. Começou - sem precisar claramente em que circunstâncias e com quem - por vender a um amigo do arguido E, que este lhe apresentou, que só conheceu por "Zé", não sabendo o resto do nome por ele o não dar. Ia à discoteca "Via Rápida" e aí conversava com o E, ao ponto de se tocar no assunto do mundo na droga. O E perguntou-lhe então se conhecia alguém que pudesse fornecer droga a um amigo, garantindo-lhe ele que não havia problemas. Foi então que começou a fornecer heroína e cocaína ao tal "Zé" - não ao E. Começou assim a trabalhar com esse rapaz. As entregas eram feitas junto à praia ou piscina de Leça, uma vez por semana, 50 a 100 gramas de cada vez, ora heroína ora cocaína. Adquiria tais produtos sempre no mesmo lugar, em Espanha, a um tal E', que tem uma oficina de automóveis em Tuy: a heroína era comprada a 4.170 contos/quilo, e a cocaína a 5.000 contos/quilo. Comprava às 100/150 gramas de cada vez, às vezes até podiam ser 200. Descobriu o tal E' por contacto com uma pessoa que não quer dizer, não pode divulgar, por sofrer ameaças de represálias se tal indicasse. Entretanto, havia um amigo do E', de nome F', que tem fábrica em Paços de Ferreira, que também lá ia abastecer-se. O E' falou com ele, perguntando-lhe se ele não se importava de ser ele a trazer para baixo o produto, para ela não ter tanto trabalho. Assim passou a acontecer: ia ter com ele à portagem de Santo Tirso, onde ele aparecia num Ford Mondeo e lhe entregava a droga, conforme as necessidades mas mais ou menos uma vez por semana ou de 15 em 15 dias. Por isso, poucas vezes foi a Espanha, foi mais no princípio. Refere que não pode prestar declarações à JIC porque foi ameaçada, corria um risco grande e tem filha de 8 anos. É verdade que misturava a droga. A princípio com "Noostan", porque não tinha "traço holandês". O seu lucro consistia nisso, pois cá os interessados diziam que tinham preços melhores do que aquele por que ela trazia. Só comprou uma vez 20 quilos de "traço holandês" através da B, mais ou menos em Maio de 2000 ou, corrigindo, 4 ou 5 meses antes de ser detida. Foi a B que o trouxe e lho vendeu, não sabe de onde ou de quem aquilo proveio. O Espanhol tinha dito ao F' se conhecia fornecedor de "traço" cá em Portugal. O F' falou com ela. Tendo contado isso à B, esta ofereceu-se para o arranjar e disse que ia falar com uma pessoa, desconhecendo quem, tendo-lhe depois trazido o tal "traço", que foi entregar ao F', em Santo Tirso, tendo-lhe este dado os 5.400 contos do preço que, passadas cerca de 2 horas, entregou à B. Tal se passou uns quatro meses antes da detenção. Desses 20 quilos tirou um bocado para si, de que já tinha gasto uma parte, tendo sido encontrada na sua casa outra parte. Era para ser feito outro negócio igual entre as mesmas pessoas, mas acabou por não ser concretizado. Quando o "Zé" deixou de aparecer, chegou a vender directamente ao E quantidades de 5 a 10 gramas ora de heroína ora de cocaína, por si adquiridas em Espanha sempre ao E'. Vendia-lhe a cocaína a 5.500$00 a grama, e heroína a 4.500$00 a grama. Tal sucedeu durante 4 ou 5 meses. Ele aparecia uma vez por semana, isto por alturas de Novembro/Dezembro de 1999, embora às vezes estivesse uma semana sem aparecer. O encontro ocorria junto à Feira Popular, em Matosinhos. Ela ia na sua Renault Kangoo e ele no seu BMW. Ele pagava-lhe em dinheiro. O E dizia que a droga era para ele e amigos, para umas festitas, embora não saiba se era assim ou não. Sabe que ele era "toxicodependente", pelo estado "degradado" em que às vezes ele se lhe apresentava. O E contactava-a por telemóvel, já lhe conhecia a voz. Pareceu-lhe, quando lhe apresentou o amigo, que ele nada tinha a ver com tráfico. Só conhecia o arguido F de vista, sendo certo que ele conhecia seu ex-marido. Uma vez encontrou-o junto ao Mercado de Matosinhos. Ele falou-lhe numa pessoa cujo nome não pode revelar porque vai dar àquela a que atrás se referiu. Disse-lhe então que se quisesse lhe arranjava heroína, como ele pretendia. Isto aconteceu nos fins de 1999. A primeira vez arranjou-lhe 20 gramas de heroína. Depois encontrava-se com ele junto ao cemitério de Sendim em Matosinhos, uma vez por semana, embora também tenha estado um mês sem pedir nada. Ele trazia o dinheiro. Sabe que a droga não era para ele, porque lhe ouviu fazer um telefonema para uma pessoa que tal lhe deu a aperceber, mas não tem a certeza. Acha que a este sempre vendeu heroína, não tem ideia de Cocaína. Quanto à arguida H, não a conhecia. Só a conheceu na Prisão onde ela ia visitar pessoa amiga. Nada sabe dos factos que lhe imputam. Quanto à G, também só a conheceu no EP, quando esta lá entrou, embora o seu nome fosse referido pela C, (com quem falava) como amiga desta. Quanto ao arguido D , é seu amigo, já o conhece há muitos anos, nada tem com ele, nunca teve negócios de droga com ele, nega qualquer ligação dele ou qualquer envolvimento, não sabendo nada dele, apenas que esteve detido duas vezes, não sabendo a razão. Sabe que ele ia a Espanha, mas não sabe o que ele ia lá fazer. Reitera que a droga era ela que a ia buscar, que a traçava, que a vendia, com ela o V nada tinha, se tinha com outras pessoas não sabe. Teve com ele uma sociedade num café em Vila do Conde, há muitos anos; conheceram-se quando seu ex-marido estava detido e à porta do EP travou conhecimento com a esposa P, de quem ficou muito amiga; depois de ele saír conheceu-o e continuou a frequentar a casa deles. O convívio entre este e a B era raro, pois "não se gostavam muito". Quanto à arguida C, conhece-a, através do ex-companheiro dela que, por sua vez, conhecia o seu ex-marido. Com ela nunca teve negócios de droga. Nega, quanto a si, que estivesse dedicada só ao negócio da droga, pois sempre trabalhou, nomeadamente na Sociedade "Utilbanho" de que foi sócia mas cuja quota vendeu, por 3.000 contos, recebidos em prestações, e no "Supermercado". Este dava para ela e filha viverem. Nele trabalhava ela, de tarde, e a cunhada, esta de manhã, à qual pagava 40.000$00/mês. Na zona não havia outro estabelecimento do género e o apuro bruto variava, durante os dias da semana, entre 30 a 35 contos/dia, e, à 6ª. e Sábado, entre 70 a 90 contos, sendo a margem de lucro 30%. Apesar dessa ocupação, reconhece que ia a Espanha, nos termos já referidos. Refere que tinha contabilidade organizada e as declarações fiscais fugiam ao Fisco. Não tinha outros rendimentos, tendo a cargo a filha menor. No que concerne a depósitos bancários, disse que fez vários, na ordem dos 600 contos, em diversos Bancos, na altura em que andava a ver qual deles lhe concedia um empréstimo. O de 12.500 contos, do BCP, pertence ao filho J, embora seja conta conjunta antiga, com a qual ele continuou, tendo sido ele quem o fez. Será dinheiro ganho quando trabalhou com o sogro (pai da B, com quem é casado), embora não saiba quanto ele ganhava. Ele também vendeu a casa dele por 21.000 contos. Justifica os depósitos em numerário pela circunstância de assim receber prestações da venda da quota, e mesmo as que recebia por cheque, procedia ao levantamento e posterior depósito do dinheiro. Recebeu 900 contos de indemnização de uma Seguradora. Todavia, reconhece não poder dizer que "com aquilo que andava a fazer não ganhava dinheiro" e que "algum é da droga", embora não saiba em que proporção ou percentagem. A carrinha Renault Kangoo era o seu meio de transporte que utilizava em tudo. Pagava de renda do imóvel onde tinha o estabelecimento 60.000$00/mês.
Pagava de renda da casa que habitava, na Trav. Fonte da Muda, 2.000$00/mês. Comprou, havia muito pouco tempo, o andar da Trav. Sá Carneiro, por 17.100 contos, tendo pedido empréstimo de 15.400 ao Banco, de que pagava prestação mensal de cerca de 60.000$0. Ninguém lá habitava, nem o tinha arrendado, embora isto tivesse sucedido depois da sua detenção a uma pessoa brasileira. Aí foram encontrados e apreendidos - em busca que autorizou - a balança, sacos, faca e demais objectos descritos no auto respectivo. Confirma ser verdade que era lá que preparava a droga, embora fizesse isso sozinho. Nunca a B em tal a acompanhou. Quando telefonava para alguém por causa da droga, fazia-o de cabines públicas. Nunca utilizou o seu telemóvel nisso. Diz estar arrependida, lamentar o sofrimento da filha e disposta a nunca mais se meter nisto. Explicitou que as ameaças a si e à filha, segundo pensa não provêm de nenhum destes arguidos. Reitera que foi e é amiga da B, apesar de esta estar separada do filho, querendo apenas ser fiel à verdade. Tanto assim que a B sabia de toda a sua vida, nomeadamente do seu envolvimento no tráfico, tal como sabia da vida da B, sabendo, nomeadamente, que ela estava envolvida também no tráfico, pois ela não tinha problema nenhum em lhe falar disso. Emprestou-lhe 400 contos para aquisição do seu Audi, já que este é da B e não do pai. Esta abriu o salão de cabeleireiro com 3000 contos dados pelo filho da casa que este vendeu. Contudo, a B "estava nisto" há muito pouco tempo, uns meses antes, não muitos, da detenção, até porque, antes, ela teve empregos. Só se apercebeu quando ela um dia lhe disse que se precisasse alguma coisa de droga que falasse com ela, no que até a advertiu para não se meter em tal. Só está magoada por na B não lhe deixar ver o neto. Como expressão da sua fidelidade disse "posso omitir, mentir nunca!".Quanto a uma viagem a Londres, confirma que a pagou e nela participou, com a filha, a B, a C e o filho desta, dado o óptimo relacionamento. Entretanto, já depois das declarações da B e E, quis acrescentar que já conhece este há 6 anos, de uma outra casa que o V tinha no Lidador, altura em que nada tinha com a droga. Na casa dele actual, nunca se lá encontraram. Acrescenta que a B um dia a transportou a Lisboa, ao encontro de um tal X, traficante, através do qual lá adquiriu e pagou meio quilo de heroína, isto em fins de Janeiro, princípios de Fevereiro de 2000. A B acompanhou-a, sabia de tudo. Deu-lhe 50.000$00 por isso. Não quis mais droga dessa fonte porque as pessoas que estavam habituadas ao "pó" que costumava trazer de Espanha disseram que aquele era fraco, que não o queriam. Depois a B é que ficou com o "contacto" do X. Tanto que um papel que para tal efeito o X lhe deixara, foi encontrado na mala da B, a quem ela (A) o dera. Um dia, estando a A, B, pai e mãe desta, X e esposa, e um irmão deste no Restaurante Mariazinha, apercebeu-se que o X vinha buscar o dinheiro de "material" entregue à B. Esta pediu-lhe (à A) que fosse a casa dos seus pais buscar um saco com dinheiro. Viu que era dinheiro e, pelo volume, seriam uns dois a três mil contos. Esse dinheiro era de droga que a B tinha comprado. Entregou ao X. Sabia que havia uma senhora que, a mando do X, vinha ao Porto entregar droga à B. Esta, certa vez, pensa que em Março de 2000, pediu-lhe que a acompanhasse aos Clérigos, junto da empresa de camionagem. Aí viu, então, a B trocar com a dita senhora um malote Beneton que levava com dinheiro por outro igual que esta trazia, com droga. Seria meio quilo. Refere isto, sem pretender enterrar a B nem querer prejudicá-la, mas só por ela dizer que nada tinha a ver com drogas. Reiterou que o quilo que trazia, quando foram detidas em Viana, era destinado à B.
Declarações da arguida B (no início e durante a audiência):
Começou por dizer, em relação à acusação, que é tudo, completamente, falso. Quanto à "cena do Continente": - aconteceu em Janeiro de 2000. A arguida C telefonou-lhe a perguntar pelo seu ex-marido J, querendo falar com ele. Disse-lhe que não sabia dele, que ia tentar localizá-lo. Depois a C foi ao seu salão de cabeleireira e aí lhe disse a razão de querer falar com ele e da pressa: era por causa de uma pessoa amiga, não disse quem, que queria adquirir estupefacientes, que queria um quilo de "castanha" ou de heroína ou cocaína (não se lembra bem do termo utilizado). Com efeito, o J tinha uma vida instável e a relação conjugal não corria bem. Ficou a par do que se passava com ele quando um dia ele lhe ligou, transtornado, a dizer que tinha sido detido pela PJ, com o I, numa rusga, e depois libertado e então lhe contou que tinha problemas com a droga. A C também sabia disso e que o N' andava com uma pessoa, um amigo, em conjunto - um tal I, no negócio de droga, em que actuavam como "sócios". Então, a B falou com este (I), que costumava ir ao seu salão fazer um tratamento capilar, na mesma semana, e perguntou-lhe se era possível arranjar aquela droga. Ele comprometeu-se a falar dar-lhe resposta mais tarde, o que fez dizendo-lhe que sim e que o valor era de 4.800 contos. Comunicou isso à C. Esta referiu o nome da G, que a B não conhecia e era o contacto daquela, e que iria contactá-la, ficando de marcar o local, vindo esta a indicar-lhe o dia, hora e o parque de Estacionamento do "Continente". Entretanto telefonou ao I e combinaram que ele lhe deixaria a droga dentro da mala do seu Audi estacionado à porta do salão. O I, conforme combinado, deixou aquela quantidade de droga na mala do Audi, para o efeito aberta, o que era norma. Cerca das 20,30 horas daquela dia, dirigiu-se ao volante do seu Audi, e levando neste a droga, para o referido Parque. Aí estacionou frente ao carro da C, que já se lá encontrava. Esta disse-lhe que as pessoas tinham ido dar uma volta ao interior do Hipermercado. Tais pessoas eram a arguida G e um tal R, já falecido. Quando eles regressaram, o R foi à mala do Audi onde tinha o saco com a droga e recolheu-o. Embora refira também ela ter ido à mala, ao mesmo tempo pegar no casaco, repetiu que foi ele quem pegou no saco. Dentro da mala, ficou a saca com os 4.800 contos, que havia lá sido colocada. Despediram-se e regressou a casa. Como combinado com o I, este apareceu e pegou na saca. E tirando do casaco 100 contos pô-los em cima da mesa, dizendo que era uma gratificação e foi-se embora. Não tem ideia de qual o papel da C neste caso, nem se algo ganhou com tal negócio, esta só disse que o conhecimento era da G. Instada, disse depois que quando entrou no carro já lá estava o saco com o dinheiro, ao lado do banco do condutor, não sabendo quem o lá colocou. Não sabe por que é que a G lá apareceu. Só a conheceu aí. Não se lembra com esta estava vestida. Depois voltou a vê-la na "loja dos 300". Resolveu fazer aquilo porque precisava de dinheiro, estava numa situação de desespero, o casamento com o M' corria mal, este não ajudava às despesas nem cuidava das necessidades do filho, embora não tivesse pedido nada em troca, nem sequer perguntado ao I quanto ia ganhar. A criança precisou de ser operada, o que aconteceu em Fevereiro de 2000, nisso tendo gasto 275.000$00, tendo sido a sogra (arguida A) que lhe pagou metade dessa despesa. Depois desse caso do "Continente", e acha que antes da operação do seu filho, a C telefonou-lhe dizendo-lhe que a pessoa que tinha levado aquilo, o R, queria falar-lhe, desejando saber o seu nome e morada, porque ele teria dito que fora enganado, sem explicar mais nada. Em face disso, perguntou ao I, o qual, rindo-se, disse que havia muitas maneiras fáceis de ganhar dinheiro sem ser prejudicado, o que é preciso é saber ganhá-lo. Ficou com medo por ela e pelo filho e suspeitou que aquilo não era droga. Soube, passado pouco tempo, alertada pela C, e através de notícia do Jornal, que o tal R se havia suicidado na prisão. Quanto ao caso ocorrido na sua "Casa dos 300", referiu que adquiriu tal loja depois do Natal 99/2000, a qual se chama "Mesura", é situada na Rua Hintze Ribeiro, em Matosinhos, e onde vende bens do lar, coisas de casa, atoalhados. O Vítor disse-lhe que marcou um encontro entre ela, B, e a C e que estivesse lá na loja por volta das 22 horas, que esta ia lá ter. o N' deu-lhe um saco para entregar à C, não sabendo o que continha. Chegou então a C, a G e a H (ambas também aqui arguidas), não conhecendo esta última. Entregou o dito saco à C. A H pediu para ir à casa de banho e a C foi com ela. Não viu o que lá fizeram, pois esteve sempre atrás do balcão e a G comprou até umas jarras. Entretanto, ouviu umas gargalhadas, tipo grito, da G e H, e, saindo a H e a C, aquela perguntou-lhe (à B) se tinha sido ela a trazer aquilo, tendo-lhe respondido que sim. Então a H disse: "você não percebe nada disto". A H e a C compraram também umas coisas da loja e foram embora. Regressou a casa com o saco e devolveu-o ao Vítor, não sabendo o que ele lhe fez depois. Não viu, mas calculou, por aquilo que o J fazia e porque a C sabia disso, que era droga, embora nada tivesse falado como J ou a C sobre isso. Isto passou-se cerca de um mês antes da sua detenção Agiu com medo do N'. Nada ganhou. Com efeito, casou com ele contra a vontade de seus pais, que por isso em nada a ajudaram. Desde o princípio ele maltratou-a e não lhe dava dinheiro. A sogra (A) é que adquiriu um apartamento na Rua Óscar da Silva, Matosinhos, para ambos. Mas a princípio não sabia nada da vida dele. Nega ter qualquer conhecimento, em absoluto, da compra, referida pela A, dos 20 quilos de "traço holandês", reiterando nada saber disso. É falso ir buscar droga ao I, tudo mentira. Foi só para o caso do "Continente". Nega que entregasse quilos de droga à C. Apenas foi sob ameaça do J levar, por duas vezes, uma saca, que ele lhe entregou, à C, à casa desta em S. Mamede, com produto que pensou, desconfiou, só poder ser droga, embora não saiba a quantidade, trazendo de volta o saco com dinheiro ao J, isto no mês de Abril. Essas são as duas únicas vezes que foi à C. Esclarece, depois que, da segunda vez, gerou-se uma discussão com o J e acabou por não concretizar a entrega. Quanto ao V e C, conheceu-os desde que casou com o J, filho da A. Eram amigos da família, tendo ele sido sócio com ela de uma café em Vila do Conde e quando o pai do J esteve detido foi o V quem o protegeu. Entre ela e V nunca foi bom o relacionamento. Sobre o V nada mais sabe, nunca teve nada com ele, é completamente falso qualquer relacionamento. Quanto às circunstâncias em que foi detida: aceitou transportar a A a Valença, no seu Audi, porque ela tinha sido operada e não podia conduzir, o que fez noutras ocasiões. Ela mostrara-lhe uns atoalhados comprados na Fortaleza, em Valença, e que vendia no Supermercado dela. Como tinha interesse para os vender na sua loja, ia com a ideia em adquirir desses artigos. Tudo o resto que, a propósito, consta da acusação e diz a A é falso, pois não tinha noção da vida da A, e lá nada viu ou se passou de anormal. Quanto ao caso ocorrido, no dia anterior à ida a Espanha, na Petrogal, confirma que foi a casa da A e esta pediu-lhe para pararem junto do cemitério de Leça. Aí, um homem não identificado, deu à A um saco, que esta segurou e guardou no porta-luvas. Foi a A, à noite, que lhe pediu para levar e guardar em casa tal saco, que no dia seguinte lho pediria. Não sabia do que se tratava, nem suspeitou, mas guardou-o no seu quarto. Eram as 300 gramas de heroína encontradas na busca. Quanto ao dinheiro que tinha guardado, explicou que era dos dois estabelecimentos e que o guardava para fazer face às respectivas despesas, pois nas contas conjuntas com o J não podia ter dinheiro, que ele levantava-o e gastava-o. Da renda de casa, do "salão", da loja dos "300", ordenados das empregadas, luz e colégio do filho tinha despesas que discriminou e somam à volta de 550 contos/mês. Suportava ainda prestações de "leasing", de empréstimos, o que podia elevar aquelas despesas para 800 contos/mês. Entretanto, deixou a casa arrendada e foi viver com os pais. Quanto à viagem a Londres, foi a A que a convidou e só foi porque era a única que sabia falar inglês. Nela participaram: A, filha da A, B, C, filha da C, filha do V. Foi a sogra que pagou tudo. Os papéis respectivos encontrados em sua casa destinavam-se a fazer posteriormente a divisão das despesas. Não conhece os arguidos F e E. Não está zangada com a sogra. O objectivo desta é "safar" o filho J, pois por ter falado sempre a verdade acerca deste sofreu pressões. Tudo o referido na acusação antes de Janeiro de 2000 é falso. Nega contactos com a C ou G em 1999. Nega compra de "traço" ao I. Nunca, antes daquela em que foi detida, fora a Espanha. A A dizia que ia à Fortaleza, não sabia que ela ia lá comprar droga. Colocada perante o auto de fls. 423 e 424, negou que o contacto com a C tivesse ocorrido no tempo aí referenciado. Nunca tinha visto antes da "loja dos 300" a arguida H. Não teve conhecimento de factos relativos ao tráfico pela A, negando que esta lhe emprestasse os 400 contos e a aconselhasse nos termos por ela referidos.
Refere que é mentira que o depósito dos 12.500 contos na conta da A e J seja da venda do apartamento dado pela mãe. Eram 6.000 contos apenas que foram para um Audi A4. É também mentira que o J lhe tivesse dado 3000 contos para o "salão".
No decurso do visionamento em audiência da cassete-vídeo, a B admitiu estar confundida quanto à ideia que tinha de ter sido o R a ir à mala do seu carro buscar o saco da droga. Confirmou que o conteúdo do saco era droga ("castanha"), embora mais tarde por uma alegada reclamação tivesse ficado com dúvidas. Prestou esclarecimentos sobre o vídeo, aí identificando a G pelo corte de cabelo e pelo casaco mais claro e localizando-a ao lado da C. Não sabe quem era a pessoa que foi ao carro e pegou no saco da droga.
Declarações do arguido E (no início e fim da audiência):
Dizendo querer contar a verdade e estar arrependido profundamente por ter a consciência de que cometeu erros, declarou que, no início de 1999, se iniciou no consumo de cocaína e alguns meses depois foi levado à heroína. Assim, as declarações da A são verdadeiras. Assume, no entanto, que apenas umas 4, 5 ou 6 vezes lhe comprou quantidades de 5 gramas de cocaína e heroína alternadamente, uma vez por semana. Tal se destinava unicamente a consumo próprio, uma vez que, dada a posição social, tinha dificuldades em ir aos "Bairros", pois, sendo aí que inicialmente se deslocava, muitas vezes foi roubado, devido à forma de vestir que não se enquadrava no meio. As compras à A ocorreram em 1, 2 ou 3 meses, foram meia dúzia de contactos esporádicos. Tal começou em fins de 1999, no local por ela referido. Crê que o preço era de 5.000$00/grama, mas não pode precisar, parecendo-lhe que a cocaína era ligeiramente mais cara, talvez 6 a 7 mil escudos a grama. Consumia em casa, só fumada. Não sabe, não pode precisar, as quantidades consumidas e com que intervalos. Depois a A, a certa altura, deixou de atender o telefone, teve de optar por outros sítios. Fez curso de manequins por volta dos 18 anos e foi modelo durante 12. Tinha, nos últimos quatro anos, as funções de gerente e relações públicas do "Via Rápida", onde trabalhava de 2ª. a 6ª. feira e nas noites de fim-de-semana. Deixou de ser "toxicodependente" em Setembro. Repete que adquiria só para seu consumo. Quanto ao haxixe, passou-se o seguinte: O amigo N, com quem consumiu haxixe de forma esporádica, a certa altura, perguntou-lhe se tinha pessoa que fornecesse "sabonetes" de haxixe, dizendo-lhe que tal se destinava a um amigo dele, O, que quereria 4 sabonetes, ou seja, um quilo. Respondeu-lhe que tinha uma pessoa e que ia perguntar. Com efeito, conhecia um tal "G'" (que depois disse ser conhecido por "P'"), que trabalhava para os lados do Aeroporto, ao qual já tinha adquirido para consumo próprio por duas ou três vezes. Este vendia "sabonetes" a cerca de 50.000$00. Como o "G'" respondeu afirmativamente, combinaram um encontro, próximo do Restaurante Malheiro, ao pé do Aeroporto, onde aquele trabalhava. O N veio então acompanhado do O, momento em que o conheceu. Foram para o local. Aqueles num veículo, ele no seu Audi. A intenção era só apresentá-los. O "G'" disse que não estava interessado em conhecer ninguém, era cauteloso, pois tinha dito que os podia trazer mas deixá-los a 50/100 metros, e que fosse ter com ele levando o dinheiro. OO queria ver o produto primeiro. Como o outro não aceitasse, mas fosse bom preço OO aceitou entregar-lhe o dinheiro, que levou ao "G'". Então, este deu-lhe o haxixe que trouxe e entregou ao O. Isto terá ocorrido cerca de Março de 2000. Passados uns 4 meses, repetiram tudo exactamente da mesma forma, segundo os mesmo motivos e objectivos, e entre as mesmas pessoas. Cerca de 2 meses após, pensa que na 3ª. semana de Setembro/2000, o N contactou-o dizendo que o O precisava mais ou menos da mesma quantidade e qualidade. Como aquele não podia estar presente, combinou telefonicamente com OO o encontro. E tudo se passou, de novo, exactamente da mesma maneira. Fez isto pelo N. Não tinha consciência do delito. Andava sob influência da droga, perdera a noção da realidade. Depois tratou-se numa clínica Psiquiátrica, na última semana de Setembro de 2000. Disse ao "G'" e ao O que nunca mais o ia voltar a contactar, queria mudar radicalmente e pôs fim voluntariamente. Conheceu a A em casa do D, há uns 4/5 anos atrás. Ela ia ao Via Rápida. Foi numa pequena conversa, lá, que tudo começou. É falso que ela lhe fornecesse diferentes quantidades e que tal sucedesse desde 1998, bem como que destinasse a droga a passar na discoteca. Era super-profissional, não consumia no local de trabalho, nunca lá esteve sob influência de droga, nem a exigência e rigor dos patrões lho permitiriam. Conhecia o D, pois há bastantes anos atrás tiveram um contabilista comum. Havia amizade, ligação. Nos últimos 3 ou 4 anos, os contactos eram esporádicos, só um telefonema ou outro. O V, 3 ou 4 meses antes, consultou-o para lhe mover uma influência acerca da aptidão construtiva de um terreno em Gondomar, dadas as ligações que os seus patrões do "Via Rápida" ali tinham. Desconhecia totalmente qualquer actividade de tráfico e ligações com outros arguidos. É falso que tivessem sido transaccionadas outras quantidades, nomeadamente as referidas na acusação, e que participasse ou houvesse revenda. Só se encontrou com o O aquelas 3 vezes. O preço do quilo do haxixe era cerca de 200.000$00. Tudo se passou sempre em locais fixos. Só foram transaccionados 12 "sabonetes", ou seja, 3 quilos. Assim, só recebeu 600 contos, embora não tivesse conferido o dinheiro e o saco da droga. O N dizia-lhe que o O era só consumidor. Nega, por falso, que, tivesse vendido os produtos apreendidos ao O. Nega que o folheto de "Ecstasy" encontrado em sua casa significasse qualquer negócio desse produto. Foi um amigo que lhe deu aulas de informática e consultava uns "sites" na Internet ligados à "noite" que encontrou aquela informação, achou piada e resolveu imprimir. Ainda quanto aos alegados tratamentos, referiu que foi sujeito a medicação para a "ressaca", dores e ansiedade e apoio psicológico, referindo que os tratamentos duravam oito dias, depois tinha recaídas, mas em Setembro/2000 abandonou definitivamente o consumo. Apesar da condição de "toxicodependente", sempre trabalhou normalmente. Ganhava o ordenado de 150.000$0/mês e 4% da facturação, o que atingia 400 a 600 contos/mês. Questionado, não situa exactamente o momento em que começou a consumir drogas e as fases por que passou. Refere que, apesar de tudo, conseguia conciliar isso com o trabalho, às vezes bebendo uns whisky’s. Quanto a benefícios do negócio do haxixe, diz que nada foi acordado. O O ofereceu-lhe, apenas, por iniciativa dele, um bocado, uns 10 a 15 mil escudos, uma "placa", isto só nas duas primeiras vezes. Quanto aos papéis apreendidos refuta a sua ligação ao tráfico de qualquer produto estupefaciente. Os depósitos bancários, nomeadamente em numerário, eram produto do seu trabalho, pois recebia sempre em dinheiro, e em momentos incertos, conforme calhava de fazer contas com o dono da discoteca, às vezes passavam-se 3 e 4 fins de semana - embora a seguir tenha dito, a outro propósito, que trabalhava diariamente com ele. Gastava por mês, no consumo de droga, à volta de 200.000$00. Os telefonemas para o V eram motivados por convites para as festas do "Via Rápida" e ultimamente por causa do terreno. Refere, de forma vaga e imprecisa, saber que o V tem uma imobiliária, desconhecendo pormenores, tal como não explica com precisão a sua pretendida intervenção na questão do terreno, não sabendo localizar bem no tempo os telefonemas respectivos. Esclarece que conheceu a A na casa do V, mas só soube que ela vendia droga mais tarde, disto nunca tendo dado conta ao V. Esclarece que nunca se injectou e só as pessoas mais chegadas é que sabiam do consumo. A cocaína provoca ansiedade, é stressante, ficava ansioso.
Declarações da arguida G:
Interveio apenas, já no decurso da prova testemunhal, alegadamente para esclarecer (a propósito do caso do "Continente") que, quando, como diz o Agente da PJ, L, entrou em S. Roque no carro do R, a saca que trazia era dela, tinha chinelos, bata, porta-moedas e outras coisas, não droga, pois vinha do trabalho. No "Continente" ficou parada ao pé da C, não efectuou qualquer movimento. Entretanto, a propósito da Vídeo-cassete exibida em audiência, esclareceu que uma pessoa de sexo feminino, de cabelo curto, arredondado e volumoso, visível a certa altura a ir ao carro do R buscar e vestir um casaco é sua filha Vânia, a qual também tinha vindo com ela naquele carro de S. Roque para o "Continente", enquanto que seu filho fora no carro da C. Identifica como sendo a mulher do R a pessoa que vai ao carro da B pegar no saco da droga e levá-lo para o BMW. Tal mulher é a que o agente da PJ identifica como sendo a G. Identifica-se a si própria como sendo a pessoa junto da C, tendo no braço a dita saca que já trazia. Nega que seja ela a pessoa que faz o aludido movimento de transporte da saca da droga.
Prova testemunhal:
Quanto à testemunha L :
Esteve na vigilância da "cena" do "Continente", a filmar e a uma distância de cerca de 20 metros. Viu a C chegar ao Parque, no Peugeot 206, à frente de outra viatura BMW, conduzido pelo R, trazendo pessoas que se tinham encontrado em S. Roque de onde provinham juntas ambas as viaturas. Passados momentos, uns 10 a 15 minutos, surgiu o Audi da B, contactando esta com a C. Aguardam o regresso do grupo que tinha ido para o interior do "Continente". Em determinada altura, a B - segundo diz - entregou à senhora de casaco vermelho (que na altura não sabia quem era e mais tarde foi identificada com sendo a G) um saco que tirou do carro, não sendo visível se este saiu da bagageira ou do habitáculo. Tal senhora leva o saco para o BMW para uma das portas laterais do habitáculo. Não viu o conteúdo do saco, porque não foi apreendido, mas, pelas circunstâncias, convenceu-se que era droga. A B leva uma saca onde era visível que transportava algo, mas não foi visível o saco das "notas" (pagamento da droga). Noutra situação, no parque interior do Norteshoping ou "Continente", observou um encontro entre a A e a C, tirando aquela algo da carteira que, rapidamente, entregou a esta. Disse que estava a cerca de 4 metros e viu um embrulho ou embalagem de plástico. Antes a A estava acompanhada de outra senhora a quem entregou umas chaves. Pela aparência, tipo de saco, gestos e pessoas, embora não visse o conteúdo do saco, ficou convencido que era droga. Participou na detenção da A e B em Viana. Foi a primeira vez que viu a A a ir a Espanha. Foi-lhe encontrada a droga, na carteira. A A visitava com regularidade a casa do V. Confirma o mais constante dos autos de detenção, apreensão, revista e busca. Fez vigilâncias ao estabelecimento da A, observando que tinha pouca clientela, até pelo lugar, e que estava muitas vezes fechado. Só lá trabalhava a cunhada Isabel, mas não a tempo inteiro. Nessas vigilâncias, viu que a A vestia bem, andava bastante em Restaurantes, tinha a casa onde vivia, o estabelecimento, outro apartamento e a Renault Kangoo. Verificou que a B tinha um salão de cabeleireiro e a "Loja dos 300", com empregados, sendo mais assídua nestes locais de trabalho. Quanto à "cena" da "Loja dos 300" viu lá a H, a C, G e B. Esta entregou um saco a uma delas, não se apercebeu qual. A H dirigiu-se para uma "zona reservada", fora do alcance visual. Depois voltou, sendo audíveis umas gargalhadas. Verificou que o I frequentava o salão da B e acompanhava com ela, havendo disso fotografias. Presenciou uma entrega da A à B de uma saca tirada da carrinha daquela e que esta leva para casa. Quanto ao caso de Leça da Palmeira (das 300 gramas de heroína), referiu que, nos últimos 15 dias antes da detenção da A e B, era comum estas andarem juntas, no carro desta. E descreveu essa cena. Quanto à C não se lembrou de outros factos, além dos referidos. Quanto ao V, sabia que ele tinha estado já preso por tráfico e, pelas vigilâncias, que tinha relação de amizade e contactos frequentes com a A. Fazia tipo de vida elevado, frequentando bons restaurantes e a vida nocturna mesmo em dias da semana, até 4/5 horas da madrugada, saindo tarde de casa no dia seguinte, tendo boa viatura, bom apartamento, e, pelos documentos entretanto obtidos nos autos, que fazia muitas deslocações a Espanha. Não se viam contactos no âmbito da sua actividade profissional. Apenas por vezes algumas deslocações, mais a terrenos do que a apartamentos. São visíveis ligações com um tal A', suspeito de tráfico noutro processo. Descreveu o ocorrido na casa do V da seguinte maneira: - montada a vigilância junto à residência, foi vista, a sair das garagens do prédio, até aí fechadas, cerca das 8,15 h., a esposa P, conduzindo um veículo Polo e levando dentro uma criança. No regresso meteu o carro na garagem. Uns 15 ou 20 minutos depois saiu o V. Interceptaram-no discretamente. Como ele levava uma filha para a escola, um outro colega da PJ foi levá-la no carro da Polícia. Trouxeram a viatura dele e entraram com ela para a zona da garagem, com a ideia de irem pelo acesso interior. Logo aí o V disse que não tinha chave de casa para entrar e não consegue subir pelo interior da garagem para o apartamento. Vieram então pelo exterior, pelo passeio que ladeia o prédio contíguo ao estabelecimento visível nas fotografias e situado num plano mais alto que o da Rua e quedaram-se junto à porta principal do prédio, situada na fachada cujo plano é perpendicular àquela onde se situa o acesso à garagem. O V accionou a campainha, de código. Ouviu-se, em resposta, pelo intercomunicador, uma voz feminina. Disse-lhe o V: "P, estou aqui com uns senhores da PJ para fazer uma busca". A porta manteve-se fechada bastante tempo, imenso tempo, mesmo muito, muito tempo, mais ou menos uns 5 minutos, deu tempo para que outros colegas que estavam junto da viatura a vistoriá-la entretanto chegassem à dita portaria e se lhes juntassem. Voltaram a tocar e então a porta abriu-se, accionada pelo comando do apartamento. Subiram, uns pelas escadas, outros pelo elevador. Quando chegaram à porta do apartamento já a porta estava aberta e a esposa à espera. E iniciou-se a busca distribuindo-se os agentes pelos diversos compartimentos, dando-se mais atenção ao V por já uma vez ter fugido de uma outra busca. Passado algum tempo, um colega, pensa que o chefe de brigada, disse: "há qualquer coisa". Ao que o V, de forma pronta e rápida, ripostou: "Se houver droga fora de casa não é nossa". O colega da PJ M foi à Rua e trouxe para o apartamento um saco lá encontrado, e que estaria na vertical da janela da cozinha. Nessa altura, o V e esposa voltaram a dizer aquela frase, acrescentando "não inventem". Entretanto, um outro colega verificara que, afinal, as chaves de casa estavam no carro do V. Houve um período em que não estava nenhum agente no exterior, por todos terem entrado e, entretanto, alguns terem ido para a busca à casa do E. Depois de apanharem o saco, indagaram pelos diversos apartamentos com aberturas para a fachada do lado de onde apareceu o saco caído se havia alguém. Ninguém respondeu ou abriu a porta. Quando começaram a busca, a P mostrou preocupação muito grande e vontade de sair alegadamente por causa da filha. Quem deu pelo saco, foi o M, que tinha ido logo para a cozinha. Quanto aos resultados da busca, referiu objectos apreendidos, como consta descrito no auto respectivo. Esclareceu que o saco continha estupefacientes e "traço holandês" (explicou que este produto também não é barato, destina-se a misturar com a heroína e como aditivo é dos melhores, sendo proveniente da Holanda, e constituído por Paracetamol e Cafeína). Alguns sacos estavam rebentados e havia pó espalhado. O saco plástico exterior, continha um outro saco, ambos do género de compras nos Supermercados. Este, por sua vez, continha diversos sacos com o "traço" em pó e o estupefaciente em "pedra". Viu isto já nas instalações da PJ. Questionado sobre fls. 1755, em que os sacos parecem intactos, reafirma que um deles pelo menos estava rebentado, apontando uma mancha mais escura visível na fotografia. Esclareceu que foi chamado perito para tentar recolher impressões digitais no saco, mas que este informou que não era possível. Confirma que ninguém viu atirar o saco de nenhuma das janelas da casa do V. Foi um colega que o descobriu, em momento em que o depoente estava no interior do apartamento acompanhado do V. No interior da casa nada de especial foi encontrado ligado ao tráfico. Quanto à fotografia de fls. 1937, esclareceu que foi ele (depoente) que fez a legendagem, em função das indicações fornecidas pelo colega que achou o saco. À pergunta sobre a razão por que acha que o produto foi lançado daquela janela, disse que isso resultou da conjugação de muitos factores, entre eles o de terem a indicação inicial de que o V estava ligado ao tráfico e que naquela ocasião - segundo fonte não identificada - iria estar na posse de boa quantidade de droga (o que justificou a decisão da realização da busca naquele momento), o de o colega ter verificado que o lugar onde o saco foi encontrado ficava naquela direcção, na vertical, e de estar junto ao passeio. Em face de fls. 1936 a 1939, admitiu que são janelas diferentes, mas do mesmo apartamento (do V). Admitiu, uma vez que fez a legendagem pelo que lhe disse o colega, que possa haver erro nessa operação, pois, como se constata pelas fotografias, a janela assinalada não fica na vertical do ponto onde assinalou o saco, e que, na fotografia/fotograma, é muito próximo da esquina do prédio. Explicou que não mencionaram no auto de busca o saco por este não ter sido encontrado no local buscado (o interior do apartamento). Explicou, ainda, as indicações dos documentos da "Via Verde", a partir dos quais elaborou o quadro de fls. 2151 a 2155, esclarecendo que em algumas viagens há só um trajecto porque no outro era utilizada a Estrada Nacional. Chegou a fazer uma vigilância às viagens pela auto-estrada. Quanto ao E, referiu a busca à casa dele e à do O e seus resultados. Disse que ele estava sempre no "Via Rápida", cumpria. Era-lhe conhecido o apartamento, a carrinha BMW, nada de transcendente. Embora soubessem que ele consumia, também tinha uma situação remuneratória compatível com o que mostrava. Segundo uma vigilância feita ao mesmo, o E, em Setembro de 2000, esteve uma semana em casa sem sair, tendo faltado ao trabalho. Quanto ao F, referiu-se à vigilância em que foi vista a devolução das 300 gramas de heroína à A, em Leça, e um outro contacto entre ele e a A junto ao cemitério. Esclareceu que o que aconteceu foi que quando o F ia entregar as 300 gramas, o destinatário respectivo foi detido. Quanto à G , só se referiu aos casos do "Continente" e da "Loja dos 300", e, quanto à H, sabendo que ela antes cumpriu pena de prisão, só tem conhecimento de ela ter surgido única e exclusivamente no encontro da "Loja dos 300". Questionado ainda sobre a cena do "Continente" mantém que era a G a pessoa que pegou no saco do carro da B e o foi colocar ao BMW. Esta tinha casaco vermelho e cabelo curto e ruivo ou avermelhado. Pronunciou-se e esclareceu, entre outras, fls. 4, 5, 14, 15, 18, 20 (identificando, como pessoa a quem a B abra a porta do seu carro e pega e trás o saco para o BMW do R, a G), 33, 48, 50, 51 a 52, 56 (identifica B e I), 66 (viatura da A, no Continente, enquanto a C e a esposa P estavam no interior do Centro Comercial), 95 (cena da "loja dos 300", não tendo conhecimento que lá existissem à venda atoalhados e lençóis - que, segundo Alega a B, teria intenção de ir comprar com a A a Valença), 96, 1937 e outras relativas ao prédio e apartamento do V. Esclareceu, ainda, ter conhecimento que a A só abria o estabelecimento por voltas das 17 horas e encerrava por volta das 19/20 horas, e que de manhã estava lá a cunhada. Tinha também conhecimento que a A, pouco tempo antes da detenção, tinha sido operada. Sobre um cartão de visita ao EP pertencente ao V e apreendido na casa deste esclareceu que não sabe quem o usava ou quem se destinava a visitar. Quanto à colaboração da A - alegada pela defesa desta - , disse que, a princípio, informalmente, ela abriu o jogo todo, contou tudo o que sabia, mas formalmente só quase tudo, pois omitiu o nome de quem era o responsável. Colaborou, nomeadamente autorizando a busca ao apartamento, fora de horas e facultando contabilidade do estabelecimento. Referiu, ainda, quanto ao caso do "Continente" que havia um casal (R e outra senhora), que o saco foi entregue à G, esta estava vestida com um casaco vermelho, o que facilitou a identificação. Quanto à "loja dos 300", a B já lá estava, à espera, havia uns 45 minutos, quando chegou o carro transportando as outras. Quanto aos contactos entre a B e I, admitiu que, além dos negócios de droga, também seriam motivados por uma relação amorosa. A C era amiga íntima da A e há mais tempo, sendo vistas no Café e fizeram viagem a Londres juntas.
Quanto à testemunha M:
Fez diversas vigilâncias. Numa delas, verificou, numa zona erma de Leça, de noite, o Audi da B, por esta conduzido, e levando a A, encostado, com o motor em funcionamento e luzes ligadas. Passou um indivíduo, de moto, na altura não identificado, que se abeirou carro. Quanto ao caso do "Continente" esclareceu que a C e G se encontraram previamente em S. Roque, estando no Peugeot. Surgiu um BMW, para o qual entrou a G. Foram sempre um atrás do outro até ao Continente. Aí, além de outros pormenores que descreveu, verificou que, a certa altura, a B tirou qualquer coisa da mala do seu carro, foi ao Peugeot, e deste voltou ao lugar do "pendura" do Audi, onde pousou qualquer coisa, embora não veja o quê. Refere como sendo a G quem foi, depois de todos chegarem do interior e ali se reunirem, ao lugar do pendura do Audi, pegar no saco e a ir colocá-lo no BMW, vendo-se, depois, regressar sem nada. Quanto à busca na casa do V, além dos pormenores prévios já descritos pelo colega Mascarenhas, descreve que o V saiu da garagem no seu Audi, com uma criança, um pouco à frente abordaram-no, discretamente, trouxeram-no, para realizar a busca, no carro, para o interior da garagem, por onde pretendiam entrar. O carro ficou aí estacionado. Mais ninguém - além da polícia - mexeu nele. Ele (V) dizia que a porta de acesso da garagem à casa estava fechada e que não tinha as chaves da porta da entrada do lado de fora. Então foram por fora, ele tocou à campainha, ouviu-se uma voz feminina, ele disse-lhe que estava ali com a PJ. Houve um interregno, a porta continuava fechada, por minutos largos, já se estava até a equacionar arrombá-la. Entretanto, subiram, uns pelo elevador outros pela escada. A senhora abriu a porta do apartamento. Entretanto, chegara o colega H', que fora levar a criança à escola no carro da PJ. Como ainda se encontravam, nessa altura, na entrada do prédio, ele resolveu ir à garagem. Regressou daí trazendo as chaves que estavam no Audi do V. Julga que, nesse momento, já ele os não encontrou à porta do prédio, mas não tem a certeza como foi aberta a porta: se com tal chave, se pelo comando do apartamento. Esteve quase sempre com o V na sala, pois havia indicações que ele já de outra vez tentara uma fuga, enquanto outros iniciaram a busca. O V disse que não tinha nada. A certa altura, ouviu o chefe, I', a dizer ao telefone, ao M', qualquer coisa como "traz para cima ou anda para cima". Nesse momento, o D ficou atrapalhado e disse logo que o que quer que fosse encontrado não era dele. Ninguém referira até aí do que se tratava. Quanto às buscas à A, refere que ela foi colaborante, tanto na busca como nas primeiras declarações informais. Quanto à detenção em Viana, busca à casa do E, vigilância à "casa dos 300", nada mais acrescentou, além do já referido pelo Colega. Numa vigilância, observou o D na companhia do M', junto de uma marisqueira em Matosinhos. Noutra, viu o V com um tal Freitas, junto ao Moranguinho, perto da residência do primeiro. Observou também o telefonema feito pelo V de uma cabine pública para um telefone que, mais tarde, foi apurado que era espanhol. Noutra vigilância, viu o V com o M' encontrar-se no "Supermercado" desta.
Testemunha H':
Participou em buscas e vigilâncias, nomeadamente nas que tiveram por alvo o arguido D. Este foi abordado mais ou menos a 150 metros da saída de sua casa. A pedido dele, o depoente foi, no carro da PJ, levar a filha, à escola, distante, mais ou menos, 2 Km dali. Demorou nesse trajecto entre 5 a 10 minutos. Quando voltou, ainda os colegas não tinham entrado no prédio, estando uns no acesso da garagem a tentar ir pelas escadas e outros na zona onde veio a ser encontrado o saco com a droga. Lembrou-se, entretanto, porque achava estranho o arguido ter saído de casa com a filha e não ter chaves, de ir ao carro do Castanheira ver se encontrava as chaves de casa dele, tendo-as aí encontrado num "molho" pousado na consola ou tablier. Antes alguém perguntara por elas, mas ele disse que não as tinha. Quando voltou com as chaves já a porta tinha sido aberta, sendo dos últimos a subir. Uma vez no interior da casa, o M, pouco tempo (embora não precise quanto, mas repita depois que foi muito pouco) depois de se iniciar a busca, reparou num pormenor: estava aberta a janela junto à cozinha. Ele disse qualquer coisa que motivou um comentário do I', não sabendo concretamente quais as palavras, tal como não tem conhecimento da reacção ao saco dos buscados, só de ouvir dizer aos colegas. Passados uns minutos, o M' voltou ao apartamento e trouxe nas mãos um saco, com cuidado. Preocuparam-se em arranjar outro, para meter aquele dentro, pois largava muito pó, pensando, por isso, que havia sacos rebentados. Recorda que para fazerem o teste aos produtos foi até necessário pôr uma toalha sobre a mesa. No fim da busca, à saída, no bolso de um roupão, foi encontrada a arma. Refere existirem uns camiões e contentores nas traseiras do prédio do V. Quanto à busca no apartamento da A, esta autorizou-a, disse logo o que lá havia, teve atitude inicialmente colaborante, mas que deixou de ter a partir de certa altura. Na do E, este mostrou-se muito surpreso, mas foi correcto, colaborante, franqueou a casa, recorda-se que o que suscitou curiosidade foi a documentação relativa ao "Kit" de "Ecstasy". Participou nas vigilâncias à "loja dos 300", tendo tirado os "fotogramas" juntos aos autos, no salão de cabeleireiro da B, no caso de Leça, e na "cena" do "Continente", mas dadas as suas funções, nada mais recorda de relevante, para além do descrito pelos colegas. Instado, esclareceu que tem a ideia de ter sido o último a subir, pois quando chegou à portaria do prédio alguns dos colegas iam nas escadas e não ficou mais ninguém na rua. Na revista sumária que fez ao carro do Castanheira, encontrou as chaves e uns papéis. No trajecto do carro para a portaria do prédio não passou pelo passeio onde veio a aparecer o saco com a droga, embora lá tivesse passado inicialmente quando chegou e se dirigiu à garagem. Reitera que os sacos apareceram pouco tempo depois, tempo curto. Questionado em face da fotografia de fls. 1755, referiu que os sacos aí visíveis não se vêm rebentados. Explicou, no entanto, que já estavam preparados para as fotografias, até porque normalmente nestas situações a PJ dá uma conferência de imprensa, admitindo que foram acondicionados dentro de outros. A preocupação era o pó, não se preocuparam com o recipiente. Recorda que, na PJ, para o manuseamento foi necessário usar máscara e luvas. Quando o M' apareceu, viu um só saco, já com pó, tanto que andaram à procura de outro para o meter dentro.
Quanto à testemunha J':
Além das vigilâncias, buscas e detenções em que participou e a que aludiu, descreveu o trajecto da C nos momentos que antecederam a "cena" do Continente. Assim, nas bombas de gasolina da SEPSA, da Marginal junto ao rio Douro, no Porto, esta parou e aguardou no seu Peugeot. Aí houve um contacto entre ela e uma senhora de casaco vermelho. Esta entrou para o BMW do R que entretanto aí chegara. Daí foram para o Continente, seguindo sempre a C à frente. Aí, além do que os outros colegas já descreveram, observou que, em certo momento, a B foi ao seu porta-bagagens, tirou um casaco, pô-lo no braço, dirigiu-se para junto do Peugeot da C, esta entregou-lhe qualquer coisa, voltou ao seu carro Audi, e aí colocou essa coisa no lugar do pendura . Depois, além do mais, após o regresso do grupo do interior do Continente, a B e a senhora de casaco vermelho dirigiram-se ao Audi e esta última recolheu qualquer coisa e foi colocá-la no BMW. Ficou com a impressão de que o que a C entregou à B seria o dinheiro e que o que o que a B entregou à de casaco vermelho (segundo pensa, a G), seria a droga. Esta última, arrancou depois com o R no BMW. Instado, explicitou, ainda, que, além da senhora de vermelho, havia outra senhora que estava com o R. Participou na vigilância à casa e movimentos do Castanheira e esposa deste no dia da detenção e busca, mas não interveio nesta porque dali partiu para a casa do E. Refere que na zona da casa do V não há grande movimento, o prédio dele é o único nas imediações, o resto são moradias à volta. No prédio há um estabelecimento. Confrontado com a fotografia de fls. 2990, confirma ver nela uns camiões estacionados do lado de trás do prédio do V, mas não sabe se era um parque ou de que tipo. Fez várias vigilâncias ao estabelecimento da A. Era um minimercado, coisa pequenina, clientela não deveria ser muita, via poucas pessoas. Quanto a outras intervenções, nomeadamente na casa do E e na "cena" de Leça, os aspectos que descreveu são coincidentes com os dos demais colegas, a não ser o pormenor de que os documentos relativos aos "Kits" encontrados na casa daquele se encontravam nas prateleiras da despensa, tendo esclarecido que não havia nenhum "Kit", só os documentos alusivos. Na casa e apartamento da A, notou, além do mais, que um saco com pó branco se encontrava por baixo do sofá e que ela indicou onde estavam as coisas, tendo autorizado a busca e disponibilizado a casa. Instado quanto ao que a B disse que recebeu da C, manteve a sua convicção e explicou que aquela ia com o casaco num dos braços, recebeu qualquer coisa da C que colocou entre o casaco e o corpo e dirigiu-se ao carro, onde se debruçou para dentro e presume que deixou essa coisa, pois quando se afasta do carro é que vestiu o casaco. Reitera a explicação de que a B fez o gesto de apertar qualquer coisa com o dito braço e contra o peito. Estava então a cerca de 25 metros e colocado do lado do pendura do Audi e, portanto, do lado da condutora do Peugeot (ou seja do lado contrário àquele em que se encontrava o L e que viu e filmou a "cena").
Quanto à testemunha M:
Participou na busca à casa de D. Alguém (dos colegas) se ocupou da abordagem ao D. O depoente ficou na zona de saída das garagens, no exterior (em rampa). Passado um bocado, uns 15/20 minutos, depois de o terem chamado e de a porta já estar aberta, indo pelo passeio circundante do prédio, juntou-se aos colegas e subiram, entrando pela porta principal, ao apartamento. Depois de entrarem neste, deu uma vista de olhos rápida pela casa, em 1 ou 2 minutos. Foi à cozinha e daí à marquise contígua, chamou-lhe a atenção estar uma janela aberta, em manhã de frio. Resolveu espreitar porque o compasso de espera cá em baixo fora muito longo. Olhou para fora e viu o saco cá em baixo. Disse ao I' que lhe parecia haver qualquer coisa em baixo, que ia ver, veio cá a baixo, daí lhe telefonou, pegou no saco, abriu-o, viu que se tratava com certeza de droga e levou-o para cima. Explicou as fotografias de fls. 1936 a 1938 e 2990 a 2995. Disse, em face delas, que a entrada da garagem se situa, do lado esquerdo, mais para trás, por debaixo (num plano inferior ao do referido passeio) enquanto que a entrada principal do prédio é do lado direito. Embora repetisse que, quando veio da rampa de acesso à garagem, onde inicialmente ficou, para junto dos colegas que se encontravam na entrada principal do prédio, circundou o passeio, instado a esclarecer isso, explicitou que não se referia ao passeio visível na fotografia de fls. 1938 (onde foi encontrado o saco), pois circundou mas por fora do jardim e pela estrada Com efeito, entre o prédio e esta há um espaço de jardim visível nas fotografias que apontou. Confrontado, pelas fotografias, com a existência de duas janelas (embora ambas do apartamento do D), não sabe qual delas era a que estava aberta. No interior do apartamento, só estava a esposa do V e mais ninguém. O saco era de plástico, fechado com um nó, abriu-o, tinha um saco interior transparente, via-se logo que tinha um produto acastanhado. Havia 2 tijolos e 2 ou mais sacos. Um deles estava rebentado, largava pó acastanhado. Entregou tudo ao Chefe. Confrontado com a fotografia de fls. 1755, admite estar enganado na descrição do número de sacos e de tijolos, pois não esteve ali a ver e a contar, viu, fechou, porque podia haver impressões digitais, e foi para cima. Não esteve a remexer. Tem a ideia de que deu conta de haver um com pó e um "tijolo". Não se recorda de ter ouvido comentários dos buscados V e esposa. Quanto aos fotogramas de folhas 1937 e seguintes, disse que foi o colega L que os fez, bem como o filme que os originou, segundo as indicações que lhe deu. Não foram ao local. Disse-lhe que foi do 3º. andar, qual era a janela de onde teria caído o saco e apontou-lhe, mais ou menos, o sítio onde este estava. Reconhece, por isso, que o "croquis" de fls. 1938 está errado, pois não foi lá (ao local) apontar ao Colega. Na fotografia nº.3 de fls. 2991, apontou entre as duas montras aí existentes o sítio onde ficou caído o saco. Foi assim que disse ao L. Este pôs mais ou menos a vermelho não como sítio exacto, mais como local do que com exactidão, só para dizer que foi nesse passeio. Quando desceu a pegar no saco, não havia mais ninguém. Não foi ele quem indagou nos restantes apartamentos se havia outros habitantes no momento. Instado ainda, disse - apesar do que antes disse e acima consta sobre o conteúdo dos sacos - que, na altura, o que lhe pareceu é que no mínimo havia dois tijolos. Durante os 15/20 minutos que esteve à porta da garagem, não viu nada das janelas, estava a olhar para a porta da garagem. Durante esse período, os colegas estiveram com o arguido D à porta do prédio, segundo eles disseram. Quando se deslocou por fora - como acima consta -, a distância do edifício ao passeio, correspondente ao jardim existente entre eles, será de 6 a 10 metros. Nessa trajectória era possível ver o passeio onde apareceu o saco, mas não estava a olhar para ele. À pergunta sobre se, ao passar, então já lá poderia estar o saco, respondeu, simplesmente: poderia ...!. Não sabe precisar se, quando entrou no prédio, já todos os colegas estavam dentro, nem sabe se o Castanheira e mulher tinham a percepção de que não havia mais ninguém em baixo. Refere ainda que julga ter sido feita tentativa de recolha de impressões digitais, mas não sabe o resultado.
Quanto à testemunha L':
Participou na detenção da B e A em Viana e nas buscas ao Castanheira e E. Quando os colegas chegaram com o V à porta da entrada do prédio, momento a partir do qual participou, ficou admirado e até se insurgiu com o arguido e colegas por terem permitido a comunicação. A primeira coisa que o V disse foi que estava ali a PJ. Aguardaram mais ou menos uns 5 minutos que a porta fosse aberta. O V justificava que a esposa se estava a vestir . Uma vez no apartamento, vigiou a esposa num dos quartos. Quando foi detectado o saco, ela ficou um bocado aflita e preocupada a dizer que aquilo não era dela, que não era deles, mas também dizia que não se queria prejudicar por causa do marido. Este estava com outros agentes noutro compartimento. Acha que ela estava vestida porque nada lhe chamou a atenção. Não vigiou as saídas deles, antes. Não viu o M' com o saco, mas quando os colegas começaram a comentar uns para os outros que havia algo, a esposa do V ficou agitada, transfigurou-se. E quando a confrontaram com a hipótese de ter sido ela a lançar o saco pela janela, começou a dizer que não tinha sido ela, ficou aflita, mas que também não estava para se prejudicar por causa do marido. Foi por sua (do depoente) iniciativa que foram bater à porta dos outros apartamentos para tentarem saber se estava alguém, mas ninguém abriu a porta. Quanto à busca na casa do E, nada mais de relevante acrescentou. Quanto à detenção da B e A em Viana: a princípio não acharam nada, depois começaram a procurar na carteira da A que traziam no carro da B e encontraram a droga. Só depois é que o Mascarenhas lhes disse, pelo rádio, que a droga estava nesse saco, porque ela já o tinha indicado. A B mostrou-se admirada, estupefacta. No início, aliás, ambas reagiram a dizer que não tinham nada, nada sabiam do que se passava. Ainda quanto à busca na casa do V, explicou que teve a ideia de ir aos outros apartamentos, porque achou isso importante para o tribunal e para se fazer prova, uma vez que ninguém viu atirar o produto da janela, reconhecendo que, porque não viu lançá-lo, teve dúvidas, pois se tivesse a certeza não fazia aquelas diligências.
Testemunha O:
Tendo sido objecto de investigação num outro processo, do qual foram extraídas peças probatórias aqui valoradas, e nele detido em Dezembro de 2000, declarou que só conhece o arguido E, por lhe ter sido apresentado por um amigo comum de nome N (testemunha seguinte), pelos motivos e circunstâncias a seguir relatados, pois antes não o conhecia de lado nenhum. Sendo consumidor (do que está afastado desde Dezembro de 2000), precisava de adquirir haxixe e aquele N disse-lhe que lho poderia conseguir, e que a pessoa indicada poderia ser o E. Foi por aquele levado e apresentado então ao E num encontro, perto do "Via Rápida", talvez em Fevereiro ou Março de 2000. Pouco ou nada falaram, porque ele (E) já sabia, pois o N tê-lo-ia informado, ao que ia. Deslocaram-se, cada um em seu carro, o E à frente, no seu BMW, não sabe precisar bem a que sítio, mas para Norte e aí a uns 10 Km ou nem tanto. Pararam num espaço, tipo parque ou jardim, com os carros lado a lado. Nem saíram. Nessa altura entregou, pela janela, o dinheiro ao E, pois já o levava certo por saber, através do N, quanto era. Só queria "sabonetes" de haxixe. Antes comprava cada "sabonete" (250 gramas) entre 80 a 100 contos. Comprou, dessa vez, 8 "sabonetes". Não se recorda quanto pagou ao certo, mas foi menos do que pagava antes, ficou mais em conta. O E arrancou com o dinheiro, regressou passados uns 15 a 20 minutos e entregou-lhe os 8 "sabonetes". Ficou satisfeito com a qualidade.
Tal "negócio" repetiu-se uma segunda vez, cerca de 3 meses depois da primeira, exactamente da mesma maneira, tendo nessa adquirido 12 "sabonetes". Nestas foi acompanhado pelo N. E repetiu-se, ainda, uma terceira vez, em Setembro de 2000, também nos mesmos moldes, nessa adquirindo 8 "sabonetes", na qual foi acompanhado pelo N' (testemunha a seguir). Desta vez, o contacto para combinar o "negócio" foi estabelecido directa e telefonicamente com o E. Tinha o número do telemóvel do E, mas já não se recorda como o arranjou. Não recorda de quem partiu a iniciativa deste contacto, mas tem como certo que, acerca dos negócios de droga, o E também chegou a ligar para ele. O E nunca referiu de onde vinha o produto. Instado quanto às quantidades, admitindo alguma dificuldade em se recordar, manteve-as, no entanto, admitindo apenas uma pequena margem de erro, e referindo que, quanto à primeira, a dúvida é entre 2 ou 3 quilos. O haxixe que lhe foi apreendido (em Dezembro de 2000) não era do adquirido ao E, provinha em parte de uma outra pessoa e outra parte fora-lhe conseguido pelo amigo O'. Deixou de adquirir ao E porque a qualidade deixou de lhe agradar. Não se apercebeu que depois da última vez o E tivesse continuado a vender. Não ficou com a impressão de que o E fosse o verdadeiro vendedor. Ainda quanto às quantidades, reitera que ficou com a ideia que o total adquirido era de 7 quilos.
Testemunha N:
Sendo grande amigo do E (este há muitos anos, por terem trabalhos juntos na área de espectáculos) e também muito amigo do O, relatou, de forma praticamente igual, o que contou o O. Ele, este e o E fumavam haxixe. OO queixou-se da qualidade. Falou então com o E, pois ao fumar com este, viu que o haxixe dele era bom, e perguntou-lhe a origem. Foi acertado o referido encontro. O E falou num "P'". A ideia inicial era encontrarem-se com este indivíduo no jardim, mas ele não estava lá, pois ele não queria aparecer, nem conhecer outras pessoas. Como a qualidade e preço eram bons, insistiram de modo a que o E fosse ter com o indivíduo, o que sucedeu conforme descrito pelo O. Quanto à quantidade, pensa que seriam 4 "sabonetes", num saco preto, mas não contou. Depois aconteceu a 2ª. vez, uns 3 a 5 meses depois, nas mesmas circunstâncias. Julga que seria a mesma quantidade, mas não viu nem a droga nem o dinheiro. Sabe que se encontraram uma terceira vez, também pelos mesmos motivos e fins, mas aí não participou. Julga que foi a última. Pediu ao E para dar o número de telefone ao O. Um deles (não sabe qual) ligou para acertarem esse encontro. Instado, refere que a intenção inicial era apresentar o O ao "P'", motivo por que nem foram no mesmo carro. Tem a certeza, por isso, que o E não é um traficante.
Testemunha N':
Só conhece a testemunha O. Um dia que estavam a almoçar, o O referiu que tinha de ir a um sítio, que não queria levar a esposa, era perigoso, alguma coisa podia correr mal. Ofereceu-se então para o acompanhar, o que fez. E foram ao encontro (que é o terceiro, referido pelo O). Não conheceu a pessoa do BMW, pois esta não saiu do carro. O encontro aconteceu, já na altura do Inverno, era escuro, seria por Outubro ou Novembro. Enquanto o condutor do BMW (E) foi buscar o saco com a droga, ficou ali outra pessoa, com eles, outro amigo, talvez por segurança. Quando aquele regressou, o "segurança" foi ao encontro do condutor do BMW (E) e trouxe o saco, volumoso, com algo dentro, que o O recolheu. Sabia que isso era haxixe, mas não sabe a quantidade, nem preços. Do dinheiro não ouviu falar, embora o O tenha entregue um envelope com ele, mas não se recorda se antes ou depois da entrega do saco. Quanto ao "segurança", referiu que seria "prova" de que o condutor do BMW ia e voltava, seria uma "referência".
Testemunha Q':
Seu marido é irmão da A. Trabalhou no "Supermercado" desta sua cunhada, em simultâneo com o exercício das funções de empregada doméstica em casa de pessoas. Desde que o estabelecimento foi aberto, parece-lhe que há 2 anos, em 98 ou 99, era a única empregada, mas só de manhã, pois à tarde era a A que ia para lá. Ganhava por isso 40 contos. O horário era das 7,30 às 13 horas e das 15,30 ou 16 às 19 ou 19,30 horas. Ali não havia outro do género. Tinha movimento. É zona de gente que trabalha. Vendia só produtos alimentares, carne, pão e outras coisas para o lar. Perguntada sobre se vendia roupas, respondeu que não. Nunca contou o apuro, seria de uns 20 contos, às vezes 30; havia quem pagasse ao mês, levando fiado. Saiu um mês depois de a A ter sido detida, ou em Setembro/2000. Perguntada se era tipo mercearia de bairro, respondeu que sim. Refere que a cunhada foi sócia da "Utilbanho", mas não sabe pormenores disso. Esta ultimamente, uns 2 meses antes de presa, fez uma operação à barriga, por isso andava em baixo. De resto, abona o seu comportamento, situação económica e carácter.
Testemunha R':
É dono do imóvel arrendado por si à A, mas que já lhe foi entregue há cerca de um ano e meio. A renda era de 60 contos/mês. O contrato durou uns 15 ou 17 meses. Quando ele próprio, em tempos, explorou o estabelecimento fazia um apuro mensal na ordem de 700 contos. Vendia alguns produtos alimentares, pão, detergentes, e a A continuou com os mesmos. A percentagem média de lucro rondava os 15%. Acha que a clientela se manteve a mesma. Como empregados, ela só tinha a cunhada (testemunha anterior) "que vinha lá de vez em quando e que tomou conta da loja após a detenção, a tempo inteiro". Esta, antes, só ia "ajudar".
Testemunha S':
É o pai da B e sócio-gerente da "Sucristecto", em nome da qual se encontra registado o Audi com que ela andava. Conhece a A e o D, este por, a convite do genro (J, ex-marido da B), ter jogado bilhar com ele e por lhe ter vendido o apartamento no Algarve. O V foi passar férias a esse apartamento, pois "alugava-o" todos os anos, e, depois, acabaram por negociar a venda por 8.000 contos. O V entregou-lhe 3000 contos em dinheiro, na assinatura do contrato-promessa. Recebeu as prestações em cheques. O resto do preço foi pago no momento da escritura, por cheque. Na escritura declararam valor diverso do real. Não conhecia qual era a actividade do V. A discussão do negócio foi em casa do depoente. Só soube depois da imobiliária, porque foi lá que a esposa foi buscar os cheques das prestações.
Testemunha T':
Foi vendedora de seguros e várias outras coisas. Actualmente não trabalha em lado nenhum. Conheceu o D, em Novembro de 2000, em Matosinhos, quando andava à procura de apartamento para arrendar, com uma amiga. Como ele trabalhava numa imobiliária, indicou-lho. Depois tiveram um envolvimento de carácter íntimo e pessoal. Tal apartamento era o da A, na Travessa Sá Carneiro, ......-1º., Dtº., em Leça. A renda inicial foi de 60 contos e pagava-a ao D. Depois de ele ter sido detido, passou a pagar à Isabel (cunhada da A, supra) 90 contos. Não conhece a A. A casa não estava mobiliada. Só tinha frigorífico, fogão e 2 camas. O V pôs mesa e cadeiras na sala.
Testemunha U':
É funileiro e mora no mesmo prédio do V, com a mesma entrada, sendo o seu apartamento o 2º, esquerdo, frente, por baixo do daquele. Explicou, face às fotografias de fls. 2990, que ambas as janelas em questão se situam na lavandaria ou marquise, atrás da qual se situa a cozinha. A janela mais estreita é "ripada" para arejamento do esquentador, mas também abre toda para trás, se necessário. Questionado, referiu não saber se a disposição interior da casa dos vizinhos é igual. No dia dos factos, já tinha saído, tal como a esposa, às 7,30 h., para o trabalho. No seu apartamento não se encontrava ninguém. Não se apercebeu de nada.
Testemunha V':
É agente da PSP, trabalha por turnos no Aeroporto. Mora no mesmo prédio do V, por baixo, mas no primeiro andar. Presume que a disposição interior é igual. Em 12 de Março de 2001 estava no turno da noite, saindo às 8 da manhã e vindo de imediato para casa dormir, de carro, entrando pela garagem e subindo pelo acesso interior desta. No trajecto demora escassos minutos. Nada de anormal notou nesse dia, nem aliás noutros. Em regra, quando chega toma o pequeno almoço, deita-se e adormece profundamente, tendo até a campainha regulada para som baixinho de modo a não o acordar. Nesse dia não ouviu qualquer toque. A esposa sai antes das 7 horas. Mais ninguém estava em casa. As varandas visíveis na empena do prédio em questão pertencem aos apartamentos das traseiras. Quanto a estabelecimentos e movimento, explicou, em face das fotografias, que, da esquerda para a direita do observador, e nas duas fachadas, há uma florista, mercearia, três lojas que sempre estiveram desocupadas, e depois o café. Este tem muito pouca afluência. A mercearia (ou mini-mercado) tem movimento mais ou menos. É uma zona residencial muito calma. A entrada situa-se entre a mercearia e o café, no meio dos dois pilares visíveis na fotografia.
Testemunha X' (de acusação, e de defesa da A, G e C):
A esposa do depoente é irmã do ex-marido da A, motivo por que a conhece, tendo sido também sua sócia na "Utilbanho". A B casou com seu sobrinho (filho da A) J. A C colaborou na "Utilbanho", como angariadora, por intermédio da A. Conhece o V, por intermédio da A, pois ele visitava-a no estabelecimento da "Utilbanho", onde ia conversar com ela, não sabe de quê. Assim, explicou o relacionamento derivado da Sociedade, sendo que os elementos relativos ao contrato e à cessão de quota são os documentados nos autos. Quem figurava como sócio era a esposa do depoente, sendo-o ele de facto, pois não podia sê-lo. A cedência da quota pela A deveu-se a desentendimentos familiares, que não quis especificar, desentendimentos entre mulheres, já que em termos profissionais nada havia a dizer. A Autor tinha as funções de recepcionista e atendimento a clientes de loja. Em 98 ela fez uma operação e deu algumas faltas, mas antes cumpria bem. Não se lembra quanto ela ganhava, talvez 200 a 250 contos/mês, em média, mas não fazendo ideia. Ela quando saiu tinha em vista um minimercado. Neste tinha como empregada, de manhã, a Q'. De tarde, era a A. Esta fazia um tipo de vida condizente. Julga que o minimercado era a única fonte de rendimento. Antes da Utilbanho, ela teve uns negócios de cafés. Asseverou o seu bom comportamento. Quanto à C, conhece-a há muitos anos. Nos últimos três anos, ela passou a colaborar na "Utilbanho", como angariadora de serviços. Arranjava negócios pequenos, em casas particulares, vivendas. O seu salário era de 200/150 contos por mês, em média. Tinha outros trabalhos de roupas, coisas pequenas. Questionado quanto a movimentos bancários dela, admite que ela podia receber de clientes, depositar na conta dela e depois acertar contas com a "Utilbanho", isso com clientes pequenos, talvez. A percentagem das comissões em clientes pequenos era de 5 a 7%, e, em clientes grandes, de 2 a 3%. O custo médio de uma cozinha anda pelos 800-1000 contos. Não sabe, não consegue dizer, quantas cozinhas, em média, ela conseguia vender. Quanto ao número de angariadores, tinha, por aí, uns três, eram pequenos, poucas pessoas. Quanto ao V, disse ter feito com ele dois, três ou quatro negócios de cozinhas. Sabia que ele tinha uma imobiliária. Facturava à imobiliária. Ele ia lá visitar a A e isso proporcionava aqueles negócios.
Testemunhas de defesa do arguido E:
Dos depoimentos de Z', AA, TT, BB, UU, VV, EE, FF, GG e Drª. B', tendo em conta as respectivas ligações (amigos, familiar e médica), o evidente desconhecimento, como é normal, dos factos relativos a tráfico, a patente preocupação em dar relevo à situação de consumidor de maneira a que fiquem justificadas as aquisições - nestas circunstâncias todos gostam de assumir e carregar com essa condição desgraçada em que normalmente só se admitem como metidos os miseráveis e socialmente desfavorecidos ! - sem comprometer a imagem do arguido perante todos e especialmente no meio profissional - que também, no caso, convém realçar ! - e ponderando a atitude dos depoentes e valor e credibilidade do respectivo testemunho, concluiu-se que efectivamente o arguido consumia droga, sem ser um dependente e sem dar nas "vistas" nem comprometer a sua imagem social e tudo o mais que, em relação a ele - quer quanto à acusação, quer quanto à contestação -, se deu como provado, designadamente quanto à sua imagem e perspectivas profissionais, não se convencendo o tribunal, de forma certa e segura, da restante matéria alegada e, por isso, considerada não provada.
Testemunha de defesa da arguida H:
Compaginado o depoimento de II (única), na medida da sua ligação, conhecimento e credibilidade, com os documentos oferecidos, elementos deles resultantes e valor a estes conferidos, deram-se como provados os factos alegados em contestação, salvo quanto ao âmbito da prestação de serviços, que não resulta deles como alegado.
Outras testemunhas de defesa da C:
Dos depoimentos de JJ e LL, resultaram os factos provados e não provados quanto à sua personalidade, condições de vida, familiares, económicas e laborais.
Testemunha de defesa da G (que também nessa qualidade indicou as de acusação):
Do depoimento de MM, extraíu-se, em conjugação com a demais prova, a convicção quanto aos factos que lhe respeitam.
Testemunhas de defesa da arguida A (que nessa qualidade também indicou algumas das de acusação):
Ponderaram-se os depoimentos de NN e de OO, na medida dos seus conhecimentos resultantes de serem vizinhas há muitos anos, conhecimentos, porém, como é evidente, limitados ao meio do Bairro onde vive e no qual se relaciona e a sua imagem se projecta.
Testemunhas de defesa do arguido D:
Do depoimento de V, seu sócio na "Arco Novo", cuja escritura, segundo informou, se realizou em Janeiro/2000, pela forma arrastada, hesitante, muito reflectida, pouco fundada, vaga e por vezes incoerente como depôs, pouco mais se valorou para além do que resultou dos documentos oferecidos pela contestação - conforme já acima dito - e a cujos negócios se referiu ao de leve, de forma pouco convicta e conhecedora, nada mais de concreto referindo em termos de alegados investimentos e outros negócios, sendo manifestamente incredíveis os hipotéticos negócios do empreendimento de Cerveira e em Espanha, de que não soube dar conta de forma clara e convincente. Referiu que, antes da constituição da "Arco Novo", trabalharam de forma irregular, em nome individual. Questionado sobre a razão por que só apresentaram a declaração Modelo 22 respeitante a 1999 (que é, aliás, anterior à constituição e registo da Sociedade), referiu que aguardavam a licença AMI, não explicando se entretanto esta já foi obtida. Quanto à aquisição de imóvel no Tribunal de Valongo, referiu que o mesmo foi vendido com bom lucro, mas não se encontra nos autos tal documentação. Quanto a reuniões e visitas por causa do "terreno de Cerveira", referiu ter havido inúmeras, nomeadamente com uma pessoa de Caminha, que identificou - estranhando-se que esta não tenha sido arrolada como testemunha. Questionado sobre tal projecto, deu respostas manifestamente significativas de que nada de concreto existiu ou é do seu conhecimento. A propósito disso, e apesar de localizar o terreno em Cerveira, refere que as deslocações para ver se estava tudo em ordem e tirar certidões eram feitas a Caminha e a Valença - não se percebendo a que propósito! Quanto à Sociedade, disse que está parada, não tem sede, admite que vai à falência, por causa de um outro sócio que se ausentou e "desta situação" - o que diz bem da vitalidade de tal empresa! Quanto a alegados negócios em Espanha, tentou localizá-los referindo uma localidade (Vilagarcia de Arosa), que manifestamente mostrou não saber sequer onde fica. Ainda quanto a reuniões por causa do projecto de Cerveira, disse que, às vezes, iam pela Via Rápida até Viana (o que nada tem a ver com a Auto-Estrada onde se registam tantas passagens do V). Essas reuniões demoravam uma, duas ou três horas, dependia. Quanto a Espanha, disse depois que não houve lá reuniões, só foram ver um terreno. O projecto para Cerveira contemplava edifícios em altura de rés-do-chão e mais cinco andares: como se fosse isso que resulta do documento e em tal terra esse tipo de construção seja possível! Refere que entrou para o capital social com 7000 contos, quando não é isso que resulta dos documentos. Não refere clientes e empreendimentos precisos. Enfim, um depoimento sem valor!
Quanto à testemunha D', residente no mesmo prédio do V (39º., 1º., esquerdo, traseiras) e amiga e visita de casa do V desde há 2 anos, refere que foi por intermédio dele que vendeu um seu anterior apartamento e comprou o actual. É possível que se trate do negócio referido a fls. 2784-2786 (se houve mudança do nome da Rua). Apesar de lhe terem indicado o V como sendo a pessoa que tratava da venda daquele apartamento, refere que contactou os sócios da "Arco Novo" Sr. Z e Sr. V', mais até este último, tendo-lhe tratado de tudo. Acha que tinham bastantes negócios, mas acrescenta logo não saber. Abona o seu comportamento, relacionamento com a família, sendo bom pai e bom marido - diria o mesmo se soubesse do depoimento da testemunha T'? - , zeloso. Ao seu apartamento pertence a varanda para o lado de trás, visível nas fotografias (confrontada com fls. 1936 e 2990). Confirma que as duas janelas em questão são do apartamento da frente. Nada sabe do dia dos factos ocorridos na casa do arguido V. Questionada, a instâncias da defesa do V, sobre se, na hipótese de ter um saco de lixo e o atirar da sua varanda, este podia caír no espaço do passeio entre as duas janelas, respondeu que sim. E questionada, da mesma forma, sobre se podia caír mais à frente, na "garrafeira", respondeu também que sim - argumento que se serve para especular sobre a hipótese, de todo irrazoável, diga-se, de o saco provir de algum dos andares traseiros, também serve, semelhantemente, para rejeitar o argumento da defesa de que, provindo ele de qualquer das janelas do arguido V, seria impossível vir caír no ponto exacto onde o fotograma da PJ - apesar de tudo incertamente - o assinala! Quanto à vida nocturna do arguido, a testemunha nada sabe.
Testemunhas de defesa do arguido F Renato:
As testemunhas XX e ZZ, amigo e companheira, respectivamente, além de abonarem o seu comportamento como pessoa e trabalhador, integração familiar e social e condição económica, referem que ele andava habitualmente na carrinha, não tinha moto, nem foi visto a andar nela - o que, conforme já atrás dito, não afasta a convicção de que era ele que, na verdade, contactou com a A no carro da B e lhe entregou as 300 gramas de heroína. A sua companheira refere que ele consumiu droga (heroína fumada), mas com ajuda e tratamentos caseiros deixou isso. De resto, referiram a sua ocupação profissional.
Testemunhas de defesa da arguida B:
Ponderaram-se os depoimentos de Dr. PP (amigo da arguida há 20 anos, e vizinhos na infância, referiu o seu estrato social médio, condições estáveis da família, era pessoa alegre, inteligente, estudava, trabalhava, bem inserida, nenhuma conotação lhe era feita com droga) YY (foi sua empregada no salão de cabeleireiro, desde Janeiro a Maio/2000; a B também lá trabalhava, salvo quando abriu a "loja dos 300", onde passou a ocupar mais tempo; nunca notou contactos com droga; o marido arranjava problemas quando aparecia no salão, gerando-se discussão; de resto, refere a boa imagem dela), QQ (sendo Tia, referiu bom comportamento, dedicação ao trabalho, inserção na família, ajuda desta apesar da discordância quanto ao casamento por causa das referências do J, rendimentos, espanto pela detenção), RR (sendo vizinha e amiga e também colaboradora do salão de cabeleireiro, referiu haver problemas com ex-marido M', salientou bom comportamento da arguida, inserção familiar, dedicação ao trabalho, problemas do filho, e disse que era a B quem pagava o carro - facto este que ou não é verdadeiro e inquina o depoimento ou é muito estranho, uma vez que o carro está em nome da "Sucristecto", do pai) e SS (disse nada haver a referir em relação à família da B, o mesmo não podendo dizer em relação à do ex-marido, sabendo que as possibilidades económicas dela eram pequenas pois também já a ajudou e conhecia a sua situação bancária por ter sido gerente da sua conta).
Do Vídeo exibido em audiência e esclarecimentos sobre ele prestados pela testemunha L e arguidas G e B e comparação das suas estaturas, conjugado com o que sobre isso também declararam os demais agentes vigilantes in loco (mormente a testemunha J', que, como acima consta, estava no lado contrário e, portanto, tinha a perspectiva inversa), e tendo em conta que o filme é a preto e branco e com passagens de fraca qualidade e, por isso, dificulta a compreensão de algumas passagens, o que implica a valorização complementar dos testemunhos visuais, resultou o seguinte:
Começa por ver-se, do lado esquerdo do observador, o Peugeot da C, estacionado com a frente voltada para a frente do Audi da B. A C encontra-se dentro do veículo, sentada ao volante, e a B fora, junto da respectiva janela, debruçada a conversar com a C (quanto à identidade destas pessoas não há a menor dúvida). Não há mais ninguém nesse momento fora e visível. A certa altura, a B sai de ao pé da C e encaminha-se para a traseira do Audi. Entre ela (e seu carro) e o observador há outro veículo paralelamente estacionado e no mesmo sentido, o que impede o visionamento do que se passa por trás deste. É, porém, nitidamente visível que a B levanta a tampa da mala, vendo-se esta levantada. Pelo gesto e movimento do corpo, vê-se que pega em qualquer coisa. Conclui-se, depois, que é um casaco. Pelos movimentos dos braços, parece estar a pô-lo pelas costas, do que desiste. Fecha a mala com a mão direita. Dirige-se, acto contínuo, pelo mesmo trajecto para junto da C. Leva, durante esse percurso, o casaco pendurado e dobrado no braço esquerdo, tendo o braço e mão direitos livres, sem nada - o que é perfeitamente visível à passagem no intervalo correspondente à distância entre as duas frentes dos veículos. Junto à janela do carro da C, pela rapidez com que chega e parte e movimento do corpo, parece pegar em qualquer objecto (pois nada mais se vê dizer ou fazer que explique aquele movimento). Retrocede de imediato para o seu carro, pelo mesmo trajecto. Pára junto da porta do pendura. Abre-a. Pelo gesto dos braços, movimento do corpo (ligeiramente inclinado para dentro, sem penetrar no habitáculo), e porque nada o explica, parece pousar ou largar (no chão ou assento) qualquer coisa que levava e deixou. Tudo se passa rapidamente. Retorna, de novo, percorrendo o mesmo trajecto, para junto da C, onde continua a conversar, junto à janela, como inicialmente. É então - só então! - que coloca o casaco pelas costas e que, mais tarde, acaba mesmo por vestir.
Sendo ponto assente que a B ali recebeu os 4.800 contos em dinheiro, correspondentes ao preço da droga que lá foi levar, quantia que, depois, levou e entregou ao I; não se vendo nenhum outro movimento, designadamente por parte do R ou da pessoa que pega no saco da droga, que possa ter qualquer similitude com o acto de entrega dessa quantia, designadamente qualquer aproximação entre pessoas ou ao Audi, que tal levem a pensar; sendo aquele movimento de vai-vem estranho e sem qualquer razão justificativa; destinando-se claramente o casaco, no início, a colocar no braço, de maneira a disfarçar qualquer coisa que não convinha dar nas vistas, tanto mais que só depois de executado aquele movimento é que ela o põe pelas costas - o que mostra que o frio (que se fazia sentir porque outra pessoa foi também vestir o casaco) não foi a causa imediata da procura desse agasalho; nada se vendo nas mãos da pessoa que vai pegar no saco da droga, nem gesto de entregar ou deixar algo (maxime na mala); tendo em conta todas as demais circunstâncias conhecidas, designadamente o papel da C, e as explicações dos agentes da PJ, designadamente a do agente que tem a perspectiva contrária e que refere o gesto de o braço que tem o casaco estar a apertar algo contra o peito - ficou o Tribunal convencido de que foi, de facto, o dinheiro aquilo que a B, naquele momento, recolheu das mãos da C e guardou no interior do seu carro. Não corresponde, pois à verdade, o que ela disse quanto a isso, como não corresponde quanto ao modo como foi entregue o saco, como, neste particular, reconheceu, em esclarecimentos prestado - o que perfeitamente se enquadra na sua estratégia inicial clara de se desvincular de todos os actos efectivamente ligados à transacção e de molde a fazer sobressair a sua versão segundo a qual se limitou exclusivamente a transportar droga e dinheiro sem tocar em nada.
Continuando. Entretanto chega o tal grupo que estava no interior do Continente. Sai a C do carro. São cinco pessoas. À frente vem um rapaz, de boné, que a G identifica como sendo o seu filho e que desaparece de cena. Segue-se um indivíduo mais alto e uma pessoa de sexo feminino, de cabelo curto, mas mais volumoso e arredondado, que a G identificou como sendo a sua filha Vânia e que, apesar de permanecer no grupo, vê-se distintamente que nada faz de suspeito. Mais atrás, vinham ainda duas mulheres. Uma delas aproxima-se da porta do condutor do carro do R e demora-se aí. A B aproxima-se com a C do homem mais alto, sem dúvidas reconhecido como o R. Cumprimenta-o. É, aliás, a pessoa a quem se vê fazer esse gesto. Isso compagina-se com a tese de que não o conhecia. E também com a necessidade de ser outra pessoa de confiança a entregar, previamente à entrega da droga, o dinheiro - o que também contribui para a convicção supra referida. Decorridos uns instantes, aproximam-se do grupo as tais duas mulheres que ficaram um pouco atrás, chegando uma à frente da outra. A da frente tem cabelo curto, é magra e leva carteira à tiracolo, provindo do lado esquerdo do BMW (era, portanto, a que, antes, se aproximou da porta do BMW e aí demorou), e veste um casaco comprido, que parece pele. Pelo outro lado, surge a outra, também de cabelo curto e trazendo um saco na mão. A filha da G, à aproximação dessa segunda mulher , faz, na direcção dela, uns gestos com os braços algo familiares (o que leva a pensar que se tratava, portanto, da G, sua mãe), e afasta-se para o lado do Audi, voltando depois novamente para junto do grupo a colocar um casaco pelas costas - sinal de que estava realmente frio. A conversa, em que são interlocutores mais activos o R e a B demora, alguns momentos. A segunda mulher a chegar, desloca-se para o lado esquerdo, para junto da C. Vê-se que o casaco que enverga é mais claro. A primeira das duas mulheres referidas, e que chegara mais à frente, continua mais no centro, de costas, junto do R e B. A certa altura, a B desloca-se para junto da porta do lugar do pendura do Audi. Abre-a. É seguida nessa trajectória pela primeira das duas mulheres. Esta pega em algo, ladeia o Audi, contorna-o pela frente. Nesta altura, estando voltada para o observador, é perfeitamente visível, na sua mão, pendurado pela asa, o saco, continuando com a carteira à tiracolo. Passa, depois, pela traseira do BMW e vai colocá-lo no lugar do pendura deste, regressando, de imediato, ao grupo sem nada nas mãos. Entretanto, a outra mulher, que chegou em segundo lugar, com um saco na mão, continua junto à C, com o dito saco, e nenhum gesto ou movimento se lhe vê. As feições e perfil desta e o corte de cabelo (mais curto que o da outra) assemelham-se às da G, da altura. É possível que haja um equívoco na identificação feita pelo Agente L Mascarenhas. Ele baseia-se na mulher de casaco vermelho e identifica como tal a primeira das duas últimas a chegar e que realmente é a que pega e transporta o saco da droga. Como o filme não é a cores, não pode discernir-se a cor do casaco. No entanto, é sintomático que o casaco desta é mais escuro que o da outra. A "familiaridade" desta com veículo do R (afinal o comprador) leva a admitir que a versão da G de que foi a mulher dele (R), de nome Sandra, a pegar e transportar o saco ganha assim credibilidade. Aliás, é sintomático que o agente L, depois de visionado e discutido o filme abandona a sua firmeza inicial, remete, depois, para a convicção com que ficou na altura e in loco e mostra-se, por último, mais hesitante. O seu convencimento possivelmente erróneo pode estar em ele identificar como sendo a G a primeira das duas mulheres, o que é duvidoso e esta refuta. Aliás, a propósito do vídeo, a B diz que, pelo corte de cabelo e pelo casaco mais claro, a pessoa que está ao lado da C é a G, ou seja, a que nada faz de suspeito. Enfim, é extremamente duvidoso que, como defendia a acusação, tenha sido a G a proceder, em tal "cena" à entrega do saco. Entretanto, colocada perante o filme, reconheceu a B que se confundiu quando disse que foi o R que foi à mala e pegou no saco. Cai, assim, por terra a sua tese inicial de que em nada mexeu (dizia primeiro que foi o I que colocou a droga no carro, o R levantou-a e o dinheiro apareceu lá, o que não é, como confessa agora, inteiramente verdade). E, também por isso, se encontra mais uma razão para crer que aquele movimento de vai-vem inicial dela foi o de recolha e guarda do dinheiro. De todo o modo, confirma que era heroína o que estava no saco, inserindo-se, manifestamente, na sua inocente e angelical, mas inteligente, estratégia não só a descrição por si feita de que em nada pegou, dinheiro e droga apareceram no carro, como o argumento de que, mais tarde, houve uma reclamação com origem no destinatário do produto e acerca deste, o que, mesmo que verdade tivesse sido e porventura tal significasse menor qualidade, não arreda a certeza de que - como se confessa também convicta - se tratava de heroína. A peregrina tese da "banhada" é, pois, daquelas hipóteses especulativamente exploradas pela defesa sem o menor sustentáculo razoável e concreto e que todas as demais circunstâncias conjugadas de todo afastam!
Em audiência, foi feita, ainda, a leitura das declarações prestadas perante JIC pela B, conforme requerido e despachado em acta (fls. 423 e 424 e 2974).
Foram ainda ponderados os Relatórios de todos os arguidos elaborados pelo IRS, tendo em vista a credibilidade do método e fontes neles utilizados e da realidade dos factos neles descritos em conjugação com toda a demais prova sobre eles produzida.
Assim, concluindo e resumindo:
No essencial, tomaram-se como credíveis as declarações prestadas pela arguida A, quer no que tange à sua conduta, quer no que respeita à dos demais co-arguidos sobre que falou (mormente quanto aos concretos actos relatados a respeito da B), não se descortinando, na sua expressão ou atitude observáveis, qualquer razão que delas faça duvidar, particularmente na medida em que incrimina os demais, a não ser alguns aspectos, designadamente quanto à origem dos depósitos em que tentou, sem sucesso, justificá-los, e, assim, atenuar a sua responsabilidade. Entende-se, aliás, que, mesmo em relação aos arguidos B, E e F, a descrição por ela feita, manifestamente de forma contida e sem intuito de gratuitamente os prejudicar, se peca é por defeito. Foi por certo a arguida A motivada pelas evidências que não podia negar e pela preocupação de colher benefícios da sua colaboração. É, porém, óbvio que os não trocou por qualquer preço - porque não quis ou porque não podia - e nessa medida é eloquente a sua frase "a mentir não estou, posso é estar a omitir !". E muitos factos provavelmente omitiu, em relação a si e em relação a outras pessoas. O que significa que o que disse é verdadeiro, ainda que não toda a verdade. O depoimento da B, espertamente habilidoso, visou, por um lado, traçar um quadro de distanciamento em relação aos factos, de inocente desconhecimento, e, por outro, justificar a actuação inevitavelmente confessada ou por outros meios provada, com um situação de pressão e necessidade que, claramente, não se coaduna com a sua pessoa e realidade, aliás atestadas pelas suas próprias testemunhas. A sua pretensa ingenuidade não convenceu (pelo contrário), como não convenceu a forma como procurou justificar ou contraditar as declarações da A, designadamente as que se prendem com os motivos da sua ida, a 25/5/2000, a Espanha, o caso dos "Clérigos" e da "Petrogal". De todo o modo, da intensa e ampla actividade e participação nos factos que lhe vinham imputadas, mais não ficou provado do que os concretos actos descritos e sobretudo resultantes do que a A e ela própria narraram. Refira-se que se em relação às entregas à C nenhuma dúvida existe, dado o pormenor com que as contou, embora sempre se distanciando da iniciativa pessoal, já quanto ao que aconteceu na "casa dos 300", apesar do que ela refere e admite, não se convenceu o Tribunal que ali tivesse ocorrido uma transacção de droga nem sobre quais os sujeitos dela, por serem muito vagos os depoimentos a esse propósito prestados pelos agentes da PJ. O arguido E, igualmente emparedado entre factos indesmentíveis, sobretudo os narrados pela A e pela testemunha O, e na procura de convencer sobre uma decente e peculiar toxicodependência que aqui lhe convinha, teve manifestas dificuldades (tal como as suas testemunhas de defesa) em assumir, explicar e justificar esta e os demais actos de transacção de droga em que participou. Beneficia, porém, de nenhumas outras provas, certas, seguras e convincentes, existiram, além daquelas, designadamente as resultantes das vigilâncias e busca relatadas, sendo que dos papéis encontrados não podem tirar-se as conclusões indubitáveis que a acusação pretendia. A arguida G, que nada mais quis aclarar a não ser a sua estadia na "cena" do "Continente", logrou - conjugadamente com as demais provas apreciadas sobre o caso - pôr em grande dúvida o Tribunal sobre se efectivamente foi ela ou a mulher do R quem recolheu o saco com a heroína do Audi da B e o transportou e colocou no BMW do R. De resto, tal como sucede em relação à H, da sua estadia na "loja dos 300", ou quanto a qualquer outra actuação ou ligação com os demais co-arguidos, nenhuma prova suficiente existe. Os factos relativos ao F resultam principalmente do que, quanto a ele, a A declarou, mormente quanto à forma como se conheceram, acertaram fornecimentos e os moldes em que estes se desenvolveram ao longo do tempo, sendo a "cena" da Petrogal também confirmada pelos agentes da PJ que relataram a respectiva vigilância e não havendo quaisquer dúvidas quanto à identidade da pessoa (que é a dele, como a A asseverou) que conduzia, em tais circunstâncias a moto, apesar do convergente depoimento das suas testemunhas de defesa no sentido de que ele não tinha nem conduzia moto. É que neste tipo de actividades, como é da experiência comum, há muita coisa da realidade que familiares, amigos e vizinhos ignoram! No que concerne à arguida C, vale, principalmente, o que já atrás se referiu e fundamentou quanto à "cena" do "Continente" e, ainda, o que a B sobre ela declarou, de forma que convenceu o Tribunal, tudo aliado à demais prova produzida e analisada, em que ressalta o seu modo de vida e a ténue ligação à "Utilbanho" cujo sócio-gerente teve sérias dificuldades para explicar o que ela lá fazia e que rendimentos auferia, caindo mesmo em fatais incongruências destrutivas dessa pretextada relação laboral.
Quanto ao arguido D - the last but not the least - , apesar da antiga, estreita e intensa relação de amizade, convívio e visitas, de negócios, e clara e ostensiva confiança com a A (veja-se, por exemplo, como ele lhe cuidava do apartamento) - o que leva a estranhar que ela não fale da vida dele; de idêntica relação existir com outros dos arguidos - mas que também nada sabem; e, bem assim, com outras pessoas de vida duvidosa (como é o caso do J, filho da A); das muito frequentes, suspeitas e injustificadas idas a Espanha; do seu modo de vida, dificilmente sustentável apenas com alguns esporádicos negócios ou com os réditos de uma Sociedade mais "de papel" do que assente num substracto empresarial verdadeiro e vivo; o certo é que, nem qualquer dos co-arguidos que prestou declarações, nem as testemunhas de acusação relataram, nem dos demais meio de prova resultam, actos concretos através dos quais, em conjugação com tudo o resto, se possa demonstrar a sua implicação ou ligação à actividade dos demais, no contexto ou segundo os termos preconizados pela acusação. É sintomático que a A apenas se lhe refira levemente, "ilibando-o", tenha o cuidado de dizer que as ameaças que sofreu e os receios que sente não provêm de quem quer que seja dos presentes na sala, mas, de forma tão espontânea quanto significativa, deixe escapar a acima citada expressão: "a mentir não estou, posso é estar a omitir !" E a A omitiu, pelo menos, as circunstâncias de tão intenso relacionamento, não explicou por que razão o V "meteu" no seu apartamento uma jovem com quem manteve relacionamento amoroso, porque mobilou ele parcialmente essa casa e tinha em seu nome os contratos de água, luz e gás. Tudo isso podia, até, nem ter nada de anormal, mas pressente-se claramente, perscrutando palavras e gestos, que não quis abeirar-se sequer de caminhos que podiam ir dar a destino indesejado! Quanto, pois, às actividades do V descritas pela acusação e que antecederam o dia 12 de Março de 2001, apesar de ele as não negar explícita e frontalmente na contestação, mas em face do seu legítimo silêncio, nada de concreto se pode concluir. E nem mesmo no que adiante se refere quanto ao verificado naquele dia se encontram elos objectivos ou subjectivos de ligação a tudo o mais.
Temos, assim, por último, a apreensão do saco, busca à sua casa e a sua detenção. Está fora de questão que, no passeio contíguo ao edifício onde se situa o apartamento do V e do lado da empena onde este possui duas janelas, por baixo destas, apareceu, foi encontrado e recolhido, pelo Agente M, da PJ, um saco que continha 1060 gramas de heroína e cerca de 1700 gramas de "traço holandês" (mistura constituída por paracetamol e cafeína".A quem pertencia e quem para ali lançou tal saco? Vejamos. Havia suspeitas de que o V detinha e traficava droga. Em razão delas, foi obtido mandado de busca. A estas não são, por certo, estranhas, o seu passado, ligações, modo de vida e, particularmente, as viagens a Espanha, conforme referido. Desde logo, por isso, é fatal que se aponte o seu nome em resposta à pergunta supra. Tal não basta, porém, para que disso o Tribunal se convença com o grau de razoabilidade e certeza exigíveis. Mas também não pode, à custa de meras especulações, hipóteses mirabolantes ou dúvidas transcendentes, e que teriam de forçosamente passar por actuação de terceiro, inviabilizar tal possibilidade. Com efeito, argumentou-se com a existência de outros vizinhos, estabelecimentos, movimento de pessoas, e até de camiões aparcados nas traseiras, como forma de induzir a ideia de que em qualquer dessas pessoas poderia estar a origem do acto. Mas, então, pergunta-se: - em face de tudo o que se conhece, é razoável admitir que tenha sido o vizinho polícia (dormindo)? O funileiro (ausente)? A vizinha D' (e amiga do arguido, que mora num dos apartamentos das traseiras e disse ser possível atirar dali um saco para debaixo da janela do V ou para junto da "garrafeira")? Algum outro vizinho? Alguém da florista, do mini-mercado ou do café (distante, e noutra empena)? Algum transeunte (ali não é lugar de circulação mas só de acesso)? Alguém dos camiões aparcados ? Ou foi a Polícia que inventou ou distorceu as coisas? E que estranha razão levaria ao abandono ali, por outras pessoas, de tão valioso espólio? Por lá ter sido pressentida a presença da Polícia ? Mas a intervenção foi discreta, sem alaridos, distante até da entrada, com a maior das calmas, pois até se aguardou (porventura estrategicamente mal, como reconhece um dos agentes) que a porta fosse aberta através do comando do apartamento! Não tem, pois, o menor sustentáculo real, e portanto, razoabilidade, tal hipótese. A experiência e personalidade do V, bem revelados até na circunstância de em nenhum outro acto concreto, apesar das muitas vigilâncias, ter sido surpreendido em flagrante - o que também indicia a forma cautelosa de se posicionar e auto-proteger - explicam, porém, o seu comportamento desde o início. Consciente daquilo que possuía e do risco que corria, havia que engendrar maneira de retardar a entrada dos agentes para a busca e alertar a esposa por forma a que esta - também experiente, ágil, expedita, e fatalmente ao corrente de tudo - tentasse resolver, in extremis, a situação. Começou, pois, por pretextar que não tinha chave e que, por isso, não era possível - como seria mais prático e discreto! - subir pelo interior. Para quem acabara de saír, e porventura até precisou delas para isso, logo esse anómalo "esquecimento" é estranho. Mas, logo se detectou a falsidade do pretexto. As chaves estavam num "molho" no tablier ou consola do seu carro. É, pois, patente a esperta premeditação. Depois, é significativa do seu estratagema o anúncio feito à esposa pelo intercomunicador. Quando os agentes queriam até discrição, ele logo dali anunciou que estava com a PJ e para fazerem uma busca. Estava, portanto, dado o sinal codificado. E até justificou, depois, a demora, dizendo que ela se estava a vestir - quando é certo que, pouco antes, tinha saído de casa com um filho! A esposa, JJ, demorou uns cinco minutos a carregar no botão do comando para abrir a porta, sem que tenha dado qualquer justificação para tal - o que é perfeitamente anómalo. Durante esse período, cogitou, certamente aflita, sobre o que fazer. Descoberta a solução, abriu finalmente a porta. E foi, necessariamente, não de imediato, mas neste entretanto (no período que mediou entre a reunião e entrada de todos os agentes para o prédio e a sua chegada ao apartamento, indo uns pelas escadas e outros pelo elevador) que lançou o saco pela janela. Ela e mais ninguém. Com efeito era a única pessoa que estava dentro do apartamento. E o V esteve sempre acompanhado pela PJ. As reacções havidas (face à descoberta e até espanto dos agentes) espontâneas e incontroladas, e as expressões proferidas e que se destacaram em cada depoimento dos agentes da Polícia - quando é certo que, em casa, a não ser o revólver, nada mais havia de significativamente comprometedor - são a demonstração da consciência do ocorrido: ele dizendo "Se houver droga fora de casa não é nossa", e ela que não se queria comprometer por causa do marido. Pois como pensou logo ele em droga e admitiu ser disso o saco que os agentes, sem nada mais especificarem, comentaram estar no passeio ? E por que razão haveria a JJ de, tão espontânea e prontamente, querer protestar o seu descomprometimento em relação a acto do marido ? É claro: só porque o V possuía o saco de droga no apartamento, ela sabia disso e quis ver-se livre dele, e o marido logo tal compreendeu. Assim o "puzzle" encaixa perfeitamente. E não se diga que nada se provou quanto a vendas feitas pelo arguido ou à participação em qualquer outro acto dos descritos na acusação. É que, não se tendo provado o contrário, resultaram, no entanto dos elementos de prova analisados, muitos elementos sérios que apontam no sentido da acusação, embora julgados insuficientes para sustentar um juízo de certeza. Apesar das dúvidas suscitadas quanto à legendagem da fotografia indicativa do lugar onde foi encontrado o saco, ficou esclarecido que o motivo e objectivo era indicar o passeio e não o sítio exacto (aliás, a área do círculo usado seria também desproporcionada se assim não fosse). O agente que a fez partiu apenas da indicação dada pelo Colega de que foi naquele passeio. E, com certeza, nem pensou na hipótese de isso vir a ser questionado. Colocado perante possível erro, se se considerar que era difícil o saco vir parar a cerca de 30 centímetros da esquina e portanto distante da vertical das janelas, admitiu-o perfeitamente e justificou-o, não persistiu, em atitude demonstrativa da boa-fé e honorabilidade com que depôs. O que garante a sua credibilidade. E repare-se que, como ele frisou, não foi ele quem viu o saco, pelo que também nada mais lhe era exigível. De resto, tendo, depois de questionado sobre isso, o agente M explicado como deu essas indicações e precisado melhor o sítio, entre as duas montras, arredado fica o motivo para tal objecção. Objecção que, porém, nem chega a sê-lo, pois, dado o peso do saco, altura da janela (3º. Andar) e pequena diferença entre a sua vertical e a esquina do mini-mercado, era fácil e perfeitamente possível que o saco viesse ali parar. Foi, aliás, mesmo partindo da hipótese de o atirar da sua varanda mais distante, o que admitiu, sem pressupostos ou preconceitos condicionantes, a própria testemunha de defesa do arguido D'. Mais ou menos na vertical, o certo é que o saco apareceu sensívelmente por baixo da janela do arguido, em posição perfeitamente compatível com o lançamento a partir daí. Nenhuma razão séria se vê para duvidar dos depoimentos dos agentes da PJ, sobretudo nos aspectos que aqui interessam. Ser testemunha não é fácil para qualquer um. A capacidade de percepção e de reprodução é muito variável em função de variados factores e circunstâncias. Nem sempre é tarefa acessível, para quem diariamente participa em múltiplos casos e tem que os recordar e reproduzir passado muito tempo, discernir entre a ideia, a imagem, a impressão, o convencimento que perdurou, e os concretos e detalhados pormenores fácticos que a sustentam e que se buscam até à exaustão às vezes prática e justificadamente impossível de atingir. E pode, na verdade, acontecer um convencimento erróneo condicionante da narração. Mas, para tudo isso controlar, é que é feita a discussão ampla e contraditória e o julgamento em Tribunal, socorrendo-se este de todos os elementos probatórios disponíveis, correlacionados e não dispersos, e valorando-os livremente e, portanto, em função dos múltiplos aspectos que confluem na formação da convicção. Porém, no caso, o Tribunal não duvida da seriedade dos depoimentos nem dos pormenores relevantes por estes trazidos, com fiabilidade e parcimónia. E nem o facto de uns não ouvirem e relatarem alguns aspectos referidos por outros perturba significativamente. As funções e actuação concretas evidentemente nem sempre o permitem. E depoimentos muito afinados, convergentes, certinhos, é que podem criar, como tantas vezes, a ideia de preparação desonesta ou ensaio fraudulento. Quantas vezes, as pequenas dissonâncias são o garante da fidelidade! É evidente que existindo duas janelas como susceptíveis (ambas são de abrir e dão para a marquise, como explicou o vizinho de baixo, nenhuma notícia havendo de diferença na divisão dos compartimentos) de, através delas, ser efectuado o lançamento e ninguém tendo observado este acto, ninguém sabe, nem pode saber (a não ser o respectivo autor), por qual delas o mesmo se efectuou. E, para mais, aparecendo na primeira fotografia um poste a tapar uma delas, é óbvio que a legendagem tinha grande probabilidade de divergir, tanto mais que o problema não é saber exactamente qual das janelas, mas mais se foi por alguma das duas. O gesto do lançamento e a distância ao peitoril da janela são ignorados. Mas não é difícil descortinar uma posição e movimento que impulsionasse o saco de forma a ele cair no passeio, mesmo mais para o lado da esquina da "garrafeira". E, ao fazê-lo, a P, previdentemente, olharia até para baixo, para a vêr se estava alguém que a observasse ou que pudesse até ser atingido! Não era, pois, preciso que efectuasse o lançamento do interior e de maneira a descrever uma trajectória que fizesse o saco ir parar mais longe. Quando o N' se aproximou, pelo passeio do lado de fora da rua, da entrada do prédio é muito possível que o passeio onde apareceu o saco ficasse no seu campo de visão e até o saco já lá estivesse, como ele próprio admite. Mas porque haveria ele, necessariamente, de olhar para o passeio e vê-lo ? E porque haveria de ter sido nesse preciso momento que o lançamento se deu de modo a que inevitavelmente este lhe chamasse a atenção? Ia a P atirar o saco se visse ali uma pessoa a passar? Temos por evidente que ou o saco já estava mas não reparou nele (hipótese que, para efeitos de raciocínio, admitiu, sem relutância), ou, o que é mais certo, ele foi atirado precisamente nos instantes que mediaram a abertura da porta, e, portanto, a entrada de todos os agentes, e a chegada à porta do apartamento no 3º. Andar. Quanto ao número de sacos, seu rebentamento, projecção de pó e seu acondicionamento, não nos parece que algumas dúvidas suscitadas relevem para duvidar do essencial. Algum pó foi largado, como é natural. Pelo menos do "traço", já que do "tijolo" era mais difícil. São pormenores com que o agente naturalmente não se preocupou (importava-lhe lá na ocasião que fosse dos sacos ou do tijolo!). Assim como em relação ao número de sacos. Estava, com certeza, surpreendido pela descoberta, preocupado em comunicá-la e em acondicionar os objectos - como é de lei, já que esta manda diligenciar pela preservação das provas, coisa que a não ser feita não se perdoaria a um polícia! Exploram-se, de forma enfática, algumas divergências de pormenores não decisivos nos depoimentos. Como acima se disse, eles são a garantia de espontaneidade, fiabilidade e credibilidade dos testemunhos. Seria muito fácil aos agentes evitarem tais discrepâncias se, de má fé, quisessem discutir e combinar entre si a descrição das ocorrências - coisa de todo inaceitável, até prova em contrário, dados os especiais deveres que sobre os agentes da autoridade, em especial de uma polícia especializada, recaem e cuja quebra não se admite. Foi também enfatizado o facto de o agente L' ter dito que foi por sua iniciativa que foram tocar às campainhas de outros apartamentos que dão para o mesmo lado. Não espanta que outros agentes não tenham participado ou presenciado nessa diligência. Não é crível que num acto como aquele que se desenrolava, assim se proceda, pois cada um tem suas funções e não podem evidentemente todos tratar ou sequer presenciar o mesmo. Como não se estranha a sua decisão. O caso, naturalmente, em princípio, e até reunidas todas as informações, suscitou perplexidade. Havia que esgotar as hipóteses explicativas. Tratando-se de um Inspector da Polícia Judiciária, com formação e preparação especializadas, experiente nas andanças dos Tribunais e conhecedor dos limites e das questões que a prova dos factos, às vezes aparentemente evidentes, desencadeiam em função de quem as discute e aprecia, como ele próprio explica, tratou de acautelar o que achou importante para o Tribunal e para a prova. Ele sabe, decerto, que o instinto policial não chega. A investigação e a prova têm de ser consistentes. As suas dúvidas são compreensíveis, saudáveis e, mais uma vez, ao expressá-las clara e frontalmente em audiência, sem qualquer reticência, só contribui para sedimentar a merecida credibilidade. Não havendo, pois, prova directa sobre a autoria do lançamento do saco e sua pertença, impõe-se a avaliação dos elementos de prova indiciária existentes à luz dos critérios legais e dos ensinamentos da Doutrina e da Jurisprudência. O artº. 127º., do CPP, dispõe que «Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente». A propósito desse princípio da livre apreciação da prova, refere o Prof. Figueiredo Dias que «o princípio não pode de modo algum querer apontar para uma apreciação imotivável e incontrolável - e portanto arbitrária - da prova produzida». E acrescenta que tal discricionariedade tem limites inultrapassáveis: «a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a chamada «verdade material» -, de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e de controlo». E continua: «a «livre» ou «íntima» convicção do juiz ... não poderá ser uma convicção puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável». Embora não se busque o conhecimento ou apreensão absolutos de um acontecimento, nem por isso o caminho há-de ser o da pura convicção subjectiva. E «Se a verdade que se procura é.uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença (maxime da penal) é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, a convicção do juiz há-de ser, é certo, uma convicção pessoal - até porque nela desempenham um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v. g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais - mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impôr-se aos outros». E conclui: «Uma tal convicção existirá quando e só quando ... o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável», isto é, «quando o tribunal ... tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudessem ser dadas razões, por pouco verosímil ou provável que ela se apresentasse» - Direito Proc. Penal, lº. Volume, pág. 203/205. Em Ac. do S.T.J, de 8-11-95 (BMJ 451/86) refere-se que «Um juízo de acertamento da matéria de facto pertinente para a decisão releva de um conjunto de meios de prova, que pode inclusivamente ser indiciária, contanto que os indícios sejam graves, precisos e concordantes» (sublinhado nosso). E acrescenta que as regras da experiência a que alude o artº. 127º., têm um importante papel na convicção do Tribunal, de modo que - parafraseando o dito aresto no presente caso - o que seria contrário às «regras da experiência» era concluir que o saco não pertencia e não provinha da casa do V, dados os indícios reunidos. Como se refere num outro Ac. do STJ, proferido em processo em que interviemos, viola-se o artº. 127º., do CPP e comete-se erro notório na apreciação da prova se «a conclusão do tribunal... surge como manifestamente irrazoável a qualquer observador comum, por contrariar abertamente não só a normalidade dos comportamentos humanos como também as regras da experiência comum». E no Ac. da R. de Coimbra, de 6/3/96, in C.J. XXI-II-44, sumaria-se que: «I-A prova pode ser directa ou indiciária; II-A prova indiciária assenta em dois elementos: a)-o indício que será todo o facto certo e provado com virtualidade para dar a conhecer outro facto que com ele estará relacionado; b)-a existência de presunção que é a inferência que, obtida do indício, permite demonstrar um facto distinto; III-Nada impede que, devidamente valorada a prova indiciária, a mesma por si, na conjugação dos indícios permita fundamentar uma condenação».
Ora há uma quantidade de indícios ou indicadores graves, isto é, sérios, importantes, fortes ou intensos; precisos, ou seja, certos e distintos ou exactos; e todos concordantes, quer dizer, coincidentes ou direccionados segundo resultado comum e consequente: o de que os factos se passaram como a acusação, nessa parte, os descrevia e, portanto, se deram como assentes. Eles são os elementos acima discriminados e resultantes dos depoimentos testemunhais e dos outros meios de prova, particularmente os pretextos invocadas, as expressões utilizadas e as reacções tidas; o modo e nível de vida, profissão e rendimentos; é a falta de qualquer outra justificação para a detenção do saco e produto em casa (ninguém ali é consumidor); é a quantidade, e respectivo valor venal, só ao alcance de alguém com boas possibilidades e colocação proeminente no negócio; é o risco consciente de tamanha quantidade só justificável por quem prossegue lucro avultado; é a existência do "traço", significativo do âmbito e fins do negócio e clara intenção de potenciar a rentabilização.
Enfim, o que seria, em nosso entendimento, contrário às regras da experiência era que as coisas se não tivessem passado como acima se referiu, pois só à luz desse seu plano elas são normal e razoavelmente inteligíveis e se compreende a lógica do seu encadeamento.
Esta é, pois - sem quebra de respeito por melhor entendimento - a convicção dos Juízes, que, assim, não pode deixar de ser afirmada sem qualquer hesitação.»
III.
Conforme entendimento pacífico, o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões, sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso.
As questões a apreciar no caso, tal como resultam das conclusões dos recursos interpostos, são as seguintes:
Referentes ao recurso interposto pelo recorrente D:
a) O Tribunal recorrido alicerçou a sua convicção, entre outros meios de prova, em pontos de depoimentos (das testemunhas L e M, Inspectores da P.J.,) insusceptíveis de serem valorados, por força do disposto nos arts. 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7, do C.P.P., que assim o acórdão violou, na medida em que aqueles depoimentos incidiram sobre declarações que o arguido D teria feito no decorrer de busca realizada por aqueles Inspectores à habitação desse arguido, declarações que nem sequer haviam sido consignadas no auto dessa diligência?
b) Face à inexistência de elementos probatórios bastantes para dar como provada a prática de actos de tráfico de estupefacientes pelo arguido D, impunha-se a sua absolvição, pelo menos por existência de dúvida razoável quanto à verificação dessa prática, resultando da confirmação pelo Tribunal da Relação da conclusão pelo Tribunal de 1ª instância da prática desses factos e da consequente condenação ofensa do princípio in dubio pro reo e violação do disposto no art. 32º, nº 2, da C.R.P.?
c) Mesmo que fosse porventura de considerar provado que o arguido D praticara actos de tráfico, o Tribunal recorrido, ao considerar suplementarmente que os cometera na expectativa de obter «avultada compensação monetária», cometeu erro notório na apreciação da prova, como resulta do próprio texto da decisão recorrida, também por violação do princípio in dubio pro reo, resultando a conclusão da existência desse factualismo, integrante da agravação prevista no art. 24º, al. c), do DL nº 15/93, de um «raciocínio eminentemente dedutivo, sem qualquer facto concreto que o valide»?
d) Existe contradição entre a decisão do Tribunal da Relação agravando de 6 para 9 anos de prisão a pena em que o arguido D fora condenado em 1ª instância e a respectiva fundamentação, despida de explicitação com base em elementos concretos e menosprezando o tribunal a inexistência, expressamente referida no texto do acórdão, de «qualquer ligação do ora recorrente a uma eventual actividade ilícita e reiterada dos seus co-arguidos» e a circunstância de, contrariamente ao determinado relativamente a estes, não ter sido declarada a perda a favor do Estado de quaisquer bens do recorrente?
e) O acórdão recorrido enferma dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do nº 2 do art. 410º do C.P.P.?
f) O Tribunal recorrido ultrapassou os limites impostos pela lei penal na valoração da prova, com clara violação do disposto no art. 127º do C.P.P., ao condenar com base em prova meramente indiciária, sem que exista qualquer correspondência lógica entre os factos dados como provados, a prova produzida e a consequente decisão condenatória do arguido?
g) Do acórdão recorrido não consta fundamentação da decisão de aumentar a pena de seis para nove anos de prisão, por falta de indicação de elementos concretos justificativos desse agravamento?
Questões respeitantes ao recurso interposto pela arguida B:
a) A pena de 8 anos de prisão em que foi condenada pelo acórdão recorrido é excessiva, não devendo, à luz da aplicação à factualidade apurada do disposto nos arts. 21º, nº 1, do DL nº 15/93 e 71º do C.P., ultrapassar a de 4 anos e 6 meses de prisão?
b) Deve ser revogada a decisão do Tribunal da Relação que decretou a perda a favor do Estado do veículo Audi, modelo A3, matrícula OC, porque violadora do disposto no art. 35º, nº 1, do citado DL nº 15/93, uma vez que não pode concluir-se do factualismo apurado «que existe no caso uma relação de causalidade significativa e jurídico penalmente relevante entre a utilização da referida viatura automóvel e a prática de factos ilícitos»?
Questões relativas ao recurso interposto pela arguida A:
a) Conforme questão prévia colocada pelo Ministério Público no seu recurso para o Tribunal da Relação, com base no disposto no art. 119º, al. c), do C.P.P., o processado deve ser anulado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 e 4022, no qual essa recorrente indicou testemunha para provar justo impedimento, invocado nos termos art. 107º, nº 2 do C.P.P., de apresentação do seu recurso para aquele Tribunal fora do prazo estabelecido na lei, uma vez que, após inquirição da testemunha, o justo impedimento foi considerado existente e, em conformidade, admitido o recurso, sem que tenham sido ouvidos, como aquela norma impõe, os outros sujeitos processuais, nomeadamente o Ministério Público, que não foi notificado da inquirição, em cujo acto não esteve presente, como o não foi igualmente da decisão que julgou verificado o justo impedimento, integrando a falta de participação do Ministério Público a nulidade insanável prevista no citado art. 119º, al. c), do C.P.P.?
b) À arguida A não devia ter sido aplicada pena superior à de nove anos de prisão em que fora condenada em 1ª instância, uma vez que o seu recurso não foi apreciado pelo Tribunal da Relação e considerando o factualismo provado à luz do disposto no art. 71º do C.P., atendendo nomeadamente às circunstâncias de ser primária, ter bom comportamento anterior, estar bem inserida social e familiarmente, ter uma filha de 8 anos de idade a seu cargo e haver colaborado no apuramento da verdade, ao contrário dos co-arguidos?
c) O acórdão do Tribunal da Relação, ao decretar, ao contrário da decisão de 1ª instância, a perda a favor do Estado de apartamento da arguida A e das quantias em dinheiro que lhe haviam sido apreendidas, violou o disposto nos arts. 35º a 38º do DL nº 15/93, de 22/01, devendo por isso revogar-se essa decisão?
IV.
Comecemos por apreciar as questões colocadas pelo arguido D, uma vez que põem em causa aspectos da decisão de facto.
IV.1 Relativamente à seguinte questão acima sintetizada sob a alínea a):
a) O Tribunal recorrido alicerçou a sua convicção, entre outros meios de prova, em pontos de depoimentos (das testemunhas L e M, Inspectores da P.J.,) insusceptíveis de serem valorados, por força do disposto nos arts. 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7, do C.P.P., que assim o acórdão violou, na medida em que aqueles depoimentos incidiram sobre declarações que o arguido D teria feito no decorrer de busca realizada por aqueles Inspectores à habitação desse arguido, declarações que nem sequer haviam sido consignadas no auto dessa diligência?
Resulta efectivamente:
Em síntese, o douto acórdão recorrido, confirmativo do acórdão de 1ª instância, considerou provado que o arguido D praticou os seguintes factos, integrantes do crime de tráfico de estupefacientes por que foi condenado: as 1060,000 gramas de heroína e as 1709,720 gramas de paracetamol e cafeína, produtos contidos numa saca encontrada caída junto à casa de habitação do D, haviam sido lançados à rua pela mulher deste, quando informada pelo D que se encontrava acompanhado de elementos da Polícia Judiciária que se dirigiam com ele à sua casa de habitação para execução de mandado judicial de busca; e tinham sido anteriormente adquiridas e guardadas nessa sua habitação pelo D que destinava a heroína à venda a indivíduos que não se lograram identificar, sendo que os produtos paracetamol e cafeína, vulgarmente designados por "traço holandês", era por ele destinado a ser misturado com a heroína para, desta forma, rentabilizar os lucros, traduzidos em elevada compensação monetária, que pretendia auferir com a venda do produto final desta forma obtido (cf. nºs 2.1.77. a 2.1.83, 2.1.85 e 2.1.87. do elenco dos factos considerados provados);
O Tribunal recorrido, ao indicar no acórdão os elementos fundantes da sua convicção sobre a verificação desses factos, incluiu (cf. fls. 4370) a referência que, em julgamento, aqueles elementos da Polícia Judiciária, que haviam procedido à busca, fizeram à seguinte declaração, não exarada no auto referente àquela diligência, que o D teria feito, no acto da busca, quando descoberto pelos agentes da Polícia Judiciária a referida saca contendo os mencionados produtos: «Se houver droga fora de casa, não é nossa». Declaração que o Tribunal, relacionando-a com a reacção, no mesmo momento, da mulher do D que teria declarado, segundo os mesmos elementos da P.J., que «não se queria comprometer por causa do marido», o acórdão considerou como «a demonstração da consciência do ocorrido» por parte do D e mulher.
O depoimento de cada um dos referidos elementos da Polícia Judiciária, na parte relativa à referida declaração do arguido D, não constitui um «depoimento indirecto» no sentido da proibição, como meio de prova, nos termos do art. 129º do C.P.P., de depoimento resultante do que «se ouviu dizer», uma vez que respeita a depoimento tendo como objecto directo a prova de declarações produzidas perante essas testemunhas.
Pelo que não procede a invocada violação desse artigo.
E esses depoimentos também não contêm a reprodução de vozes ou rumores públicos ou a manifestação de meras convicções sobre factos ou a sua interpretação, pelo que igualmente não se verifica a invocada violação do art. 130º do C.P.P.
Apresenta-se porém como ilegítima a consideração pelo douto acórdão recorrido, como fundamento da convicção da decisão de facto, dessa parte dos depoimentos referindo a citada declaração do arguido D.
Essencialmente pelas razões seguintes:
O princípio da legalidade do processo e o estatuto do arguido (cf., v.g., os arts. 2º, 56º e ss., 262º e ss., 275º, 355º a 357º, com especial destaque para o nº 7 do art. 356º e nº 2 do art. 357º), impedem que sejam consideradas como prova depoimentos de órgãos de polícia criminal, encarregados de actos de investigação, referindo declarações do arguido (ou de alguém que devesse ser constituído como tal - cf. arts. 58º e 59º do C.P.P.), mesmo que sob a forma de conversas informais, a esses órgãos de polícia criminal encarregados de actos de investigação, quando essas declarações não forem reduzidas a auto.
Entendimento contrário implicaria que pudessem ser tomadas em conta, para efeitos de prova, declarações do arguido que não o poderiam ser se constantes de auto cuja leitura não fosse permitida em audiência nos termos dos art. 357º, conjugado com os arts. 355º e 356º, nº 7. Constituiria manifesta ofensa do fim prosseguido pela lei com estas disposições, revelado pelo seu espírito, designadamente a salvaguarda dos princípios da oralidade, da imediação, da publicidade, do contraditório, da concentração (4).
Conclui-se assim pela invalidade do meio de prova constituído pela citada referência à mencionada declaração do arguido D, que, em conformidade, não pode ser tida em conta, não se revestindo portanto, contrariamente ao que foi considerado no douto acórdão, de qualquer relevância para fundamentar a decisão sobre a prova dos factos imputados ao ora recorrente.
Procede pois este fundamento do recurso.
IV.2.
Apreciemos agora os fundamentos correspondentes às restantes questões, acima sintetizadas da forma seguinte:
b) Face à inexistência de elementos probatórios bastantes para dar como provada a prática de actos de tráfico de estupefacientes pelo arguido D, impunha-se a sua absolvição, pelo menos por existência de dúvida razoável quanto à verificação dessa prática, importando a confirmação pelo Tribunal da Relação da conclusão pelo Tribunal de 1ª instância da prática desses factos e da consequente condenação ofensa do princípio in dubio pro reo e violação do disposto no art. 32º, nº 2, da C.R.P.?
c) Mesmo que fosse porventura de considerar provado que o arguido Castanheira praticara actos de tráfico, o Tribunal recorrido, ao considerar suplementarmente que os cometera na expectativa de obter «avultada compensação monetária», cometeu erro notório na apreciação da prova, como resulta do próprio texto da decisão recorrida, também por violação do princípio in dubio pro reo, resultando a conclusão da existência desse factualismo, integrante da agravação prevista no art. 24º, al. c), do DL nº 15/93, de um «raciocínio eminentemente dedutivo, sem qualquer facto concreto que o valide»?
d) Existe contradição entre a decisão do Tribunal da Relação agravando de 6 para 9 anos de prisão a pena em que o arguido D fora condenado em 1ª instância e a respectiva fundamentação, despida de explicitação com base em elementos concretos e menosprezando o tribunal a inexistência, expressamente referida no texto do acórdão, de «qualquer ligação do ora recorrente a uma eventual actividade ilícita e reiterada dos seus co-arguidos» e a circunstância de, contrariamente ao determinado relativamente a estes, não ter sido declarada a perda a favor do Estado de quaisquer bens do recorrente?
e) O acórdão recorrido enferma dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do nº 2 do art. 410º do C.P.P.?
f) O Tribunal recorrido ultrapassou os limites impostos pela lei penal na valoração da prova, com clara violação do disposto no art. 127º do C.P.P., ao condenar com base em prova meramente indiciária, sem que exista qualquer correspondência lógica entre os factos dados como provados, a prova produzida e a consequente decisão condenatória do arguido?
IV.2.1.
Como é conhecido, o princípio in dubio pro reo é uma expressão, em matéria de prova, do princípio da presunção de inocência, por sua vez decorrente do princípio do Estado de Direito Democrático.
Conforme entendimento amplamente dominante (5), a aplicabilidade desse princípio restringe-se à decisão da matéria de facto. Esta restrição - atendendo a que, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos no nº 2 do art. 410º e das nulidades referidas no nº 3 do mesmo artigo, o recurso para o S.T.J. visa exclusivamente o reexame da matéria de direito (art. 434º) - implica que o S.T.J. só possa reconhecer a violação do princípio in dubio pro reo quando da decisão recorrida resultar que, tendo o tribunal a quo chegado a uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos, decidiu em desfavor do arguido. Ou quando, não reconhecendo o tribunal recorrido essa dúvida, ela resultar evidente (por conhecimento oficioso) do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, ou seja, quando é verificável que a dúvida só não é reconhecida em virtude de um erro notório na apreciação da prova, nos termos da al. c) do citado nº 2 do art. 410º.
Nesta ponderação oficiosa sobre a verificação do erro notório na apreciação da prova, a partir do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, tem, obviamente, de ter-se em conta o sentido e os limites do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127º do C.P.P.
Conforme entendimento dominante na doutrina e na jurisprudência (6), este principio caracteriza-se essencialmente, em síntese, da forma seguinte:
A livre apreciação da prova a que o aludido artigo se refere, para além de, evidentemente, não poder traduzir-se numa apreciação arbitrária, não é reconduzível a um mero íntimo convencimento, não significa a possibilidade de apreciação puramente subjectiva, baseada em meras impressões ou conjecturas de impossível ou muito difícil objectivação, antes pressupõe uma cuidada valoração objectiva e crítica e em boa medida objectivamente motivável, em harmonia com as regras da lógica, da razão, das regras da experiência e dos conhecimentos científicos.
Pode porém levar à prova não só dos factos probandos apreensíveis por prova directa mas também dos factos que, por deduções e induções objectiváveis a partir de factos indiciários, tendo por base a mencionada valoração a partir das aludidas regras, conduzem à prova indirecta daqueles outros factos que constituem o tema da prova.
Tudo a partir de um processo lógico-racional que envolve porém, naturalmente, também elementos subjectivos, mesmo emocionais, inevitáveis no agir e pensar humano - que importa reconhecer com honestidade e maturidade para melhor impedir que possam ser fonte de arbitrariedade e permitir actuem, pelo contrário, como instrumento de perspicácia e prudência na busca da verdade processualmente possível.
Esses elementos (ligados, por exemplo, às razões de maior ou menor credibilidade que se concede a um determinado meio de prova), por não inseridos no aspecto puramente cognitivo do complexo processo interior que conduziu à convicção do julgador tornam porém por vexes difícil ou impossível a motivação objectivada de todos os passos desse processo conducente à convicção.
Tendo presentes os referidos significados dos princípios da livre apreciação da prova e do princípio in dubio pro reo, apreciemos a questão concreta enunciada.
O douto acórdão do Tribunal da Relação, apreciando a fundamentação da decisão de facto constante do douto acórdão de 1ª instância em relação ao recorrente D, considerou improcedente a impugnação por este deduzida relativamente àquela decisão, concluindo que «resulta com evidência que a decisão recorrida indica com precisão o porquê e a relevância que deu aos meios de prova apresentados pela acusação e pela defesa, e resultantes da discussão da causa, seguindo um raciocínio lógico e coerente, de tal forma que, analisada a prova documentada e transcrita, não se pode concluir que teria de ser outra a decisão sobre a matéria de facto».
Recordemos o seguinte resumo da fundamentação da convicção do Tribunal de 1ª instância sobre a existência dos factos dados como provados relativamente ao recorrente D, fundamentação que o douto acórdão recorrido considerou como bastante e convincente, razão que determinou a confirmação da correspondente decisão de facto:
«Quanto ao arguido D - the last but not the least - , apesar da antiga, estreita e intensa relação de amizade, convívio e visitas, de negócios, e clara e ostensiva confiança com a A (veja-se, por exemplo, como ele lhe cuidava do apartamento) - o que leva a estranhar que ela não fale da vida dele; de idêntica relação existir com outros dos arguidos - mas que também nada sabem; e, bem assim, com outras pessoas de vida duvidosa (como é o caso do J, filho da A); das muito frequentes, suspeitas e injustificadas idas a Espanha; do seu modo de vida, dificilmente sustentável apenas com alguns esporádicos negócios ou com os réditos de uma Sociedade mais "de papel" do que assente num substracto empresarial verdadeiro e vivo; o certo é que, nem qualquer dos co-arguidos que prestou declarações, nem as testemunhas de acusação relataram, nem dos demais meio de prova resultam, actos concretos através dos quais, em conjugação com tudo o resto, se possa demonstrar a sua implicação ou ligação à actividade dos demais, no contexto ou segundo os termos preconizados pela acusação. É sintomático que a A apenas se lhe refira levemente, "ilibando-o", tenha o cuidado de dizer que as ameaças que sofreu e os receios que sente não provêm de quem quer que seja dos presentes na sala, mas, de forma tão espontânea quanto significativa, deixe escapar a acima citada expressão: "a mentir não estou, posso é estar a omitir !" E a A omitiu, pelo menos, as circunstâncias de tão intenso relacionamento, não explicou por que razão o V "meteu" no seu apartamento uma jovem com quem manteve relacionamento amoroso, porque mobilou ele parcialmente essa casa e tinha em seu nome os contratos de água, luz e gás. Tudo isso podia, até, nem ter nada de anormal, mas pressente-se claramente, perscrutando palavras e gestos, que não quis abeirar-se sequer de caminhos que podiam ir dar a destino indesejado! Quanto, pois, às actividades do V descritas pela acusação e que antecederam o dia 12 de Março de 2001, apesar de ele as não negar explícita e frontalmente na contestação, mas em face do seu legítimo silêncio, nada de concreto se pode concluir. E nem mesmo no que adiante se refere quanto ao verificado naquele dia se encontram elos objectivos ou subjectivos de ligação a tudo o mais.
Temos, assim, por último, a apreensão do saco, busca à sua casa e a sua detenção. Está fora de questão que, no passeio contíguo ao edifício onde se situa o apartamento do V e do lado da empena onde este possui duas janelas, por baixo destas, apareceu, foi encontrado e recolhido, pelo Agente M, da PJ, um saco que continha 1060 gramas de heroína e cerca de 1700 gramas de "traço holandês" (mistura constituída por paracetamol e "cafeína". A quem pertencia e quem para ali lançou tal saco? Vejamos. Havia suspeitas de que o V detinha e traficava droga. Em razão delas, foi obtido mandado de busca. A estas não são, por certo, estranhas, o seu passado, ligações, modo de vida e, particularmente, as viagens a Espanha, conforme referido. Desde logo, por isso, é fatal que se aponte o seu nome em resposta à pergunta supra. Tal não basta, porém, para que disso o Tribunal se convença com o grau de razoabilidade e certeza exigíveis. Mas também não pode, à custa de meras especulações, hipóteses mirabolantes ou dúvidas transcendentes, e que teriam de forçosamente passar por actuação de terceiro, inviabilizar tal possibilidade. Com efeito, argumentou-se com a existência de outros vizinhos, estabelecimentos, movimento de pessoas, e até de camiões aparcados nas traseiras, como forma de induzir a ideia de que em qualquer dessas pessoas poderia estar a origem do acto. Mas, então, pergunta-se: - em face de tudo o que se conhece, é razoável admitir que tenha sido o vizinho polícia (dormindo)? O funileiro (ausente)? A vizinha D' (e amiga do arguido, que mora num dos apartamentos das traseiras e disse ser possível atirar dali um saco para debaixo da janela do V ou para junto da "garrafeira")? Algum outro vizinho? Alguém da florista, do mini-mercado ou do café (distante, e noutra empena)? Algum transeunte (ali não é lugar de circulação mas só de acesso)? Alguém dos camiões aparcados? Ou foi a Polícia que inventou ou distorceu as coisas? E que estranha razão levaria ao abandono ali, por outras pessoas, de tão valioso espólio? Por lá ter sido pressentida a presença da Polícia ? Mas a intervenção foi discreta, sem alaridos, distante até da entrada, com a maior das calmas, pois até se aguardou (porventura estrategicamente mal, como reconhece um dos agentes) que a porta fosse aberta através do comando do apartamento! Não tem, pois, o menor sustentáculo real, e portanto, razoabilidade, tal hipótese. A experiência e personalidade do V, bem revelados até na circunstância de em nenhum outro acto concreto, apesar das muitas vigilâncias, ter sido surpreendido em flagrante - o que também indicia a forma cautelosa de se posicionar e auto-proteger - explicam, porém, o seu comportamento desde o início. Consciente daquilo que possuía e do risco que corria, havia que engendrar maneira de retardar a entrada dos agentes para a busca e alertar a esposa por forma a que esta - também experiente, ágil, expedita, e fatalmente ao corrente de tudo - tentasse resolver, in extremis, a situação. Começou, pois, por pretextar que não tinha chave e que, por isso, não era possível - como seria mais prático e discreto! - subir pelo interior. Para quem acabara de sair, e porventura até precisou delas para isso, logo esse anómalo "esquecimento" é estranho. Mas, logo se detectou a falsidade do pretexto. As chaves estavam num "molho" no tablier ou consola do seu carro. É, pois, patente a esperta premeditação. Depois, é significativa do seu estratagema o anúncio feito à esposa pelo intercomunicador. Quando os agentes queriam até discrição, ele logo dali anunciou que estava com a PJ e para fazerem uma busca. Estava, portanto, dado o sinal codificado. E até justificou, depois, a demora, dizendo que ela se estava a vestir - quando é certo que, pouco antes, tinha saído de casa com um filho! A esposa, P, demorou uns cinco minutos a carregar no botão do comando para abrir a porta, sem que tenha dado qualquer justificação para tal - o que é perfeitamente anómalo. Durante esse período, cogitou, certamente aflita, sobre o que fazer. Descoberta a solução, abriu finalmente a porta. E foi, necessariamente, não de imediato, mas neste entretanto (no período que mediou entre a reunião e entrada de todos os agentes para o prédio e a sua chegada ao apartamento, indo uns pelas escadas e outros pelo elevador) que lançou o saco pela janela. Ela e mais ninguém. Com efeito era a única pessoa que estava dentro do apartamento. E o V esteve sempre acompanhado pela PJ. As reacções havidas (face à descoberta e até espanto dos agentes) espontâneas e incontroladas, e as expressões proferidas e que se destacaram em cada depoimento dos agentes da Polícia - quando é certo que, em casa, a não ser o revólver, nada mais havia de significativamente comprometedor - são a demonstração da consciência do ocorrido: ele dizendo "Se houver droga fora de casa não é nossa", e ela que não se queria comprometer por causa do marido. Pois como pensou logo ele em droga e admitiu ser disso o saco que os agentes, sem nada mais especificarem, comentaram estar no passeio? E por que razão haveria a P de, tão espontânea e prontamente, querer protestar o seu descomprometimento em relação a acto do marido? É claro: só porque o V possuía o saco de droga no apartamento, ela sabia disso e quis ver-se livre dele, e o marido logo tal compreendeu. Assim o "puzzle" encaixa perfeitamente. E não se diga que nada se provou quanto a vendas feitas pelo arguido ou à participação em qualquer outro acto dos descritos na acusação. É que, não se tendo provado o contrário, resultaram, no entanto dos elementos de prova analisados, muitos elementos sérios que apontam no sentido da acusação, embora julgados insuficientes para sustentar um juízo de certeza. Apesar das dúvidas suscitadas quanto à legendagem da fotografia indicativa do lugar onde foi encontrado o saco, ficou esclarecido que o motivo e objectivo era indicar o passeio e não o sítio exacto (aliás, a área do círculo usado seria também desproporcionada se assim não fosse). O agente que a fez partiu apenas da indicação dada pelo Colega de que foi naquele passeio. E, com certeza, nem pensou na hipótese de isso vir a ser questionado. Colocado perante possível erro, se se considerar que era difícil o saco vir parar a cerca de 30 centímetros da esquina e portanto distante da vertical das janelas, admitiu-o perfeitamente e justificou-o, não persistiu, em atitude demonstrativa da boa-fé e honorabilidade com que depôs. O que garante a sua credibilidade. E repare-se que, como ele frisou, não foi ele quem viu o saco, pelo que também nada mais lhe era exigível. De resto, tendo, depois de questionado sobre isso, o agente M explicado como deu essas indicações e precisado melhor o sítio, entre as duas montras, arredado fica o motivo para tal objecção. Objecção que, porém, nem chega a sê-lo, pois, dado o peso do saco, altura da janela (3º. Andar) e pequena diferença entre a sua vertical e a esquina do mini-mercado, era fácil e perfeitamente possível que o saco viesse ali parar. Foi, aliás, mesmo partindo da hipótese de o atirar da sua varanda mais distante, o que admitiu, sem pressupostos ou preconceitos condicionantes, a própria testemunha de defesa do arguido D'. Mais ou menos na vertical, o certo é que o saco apareceu sensivelmente por baixo da janela do arguido, em posição perfeitamente compatível com o lançamento a partir daí. Nenhuma razão séria se vê para duvidar dos depoimentos dos agentes da PJ, sobretudo nos aspectos que aqui interessam. Ser testemunha não é fácil para qualquer um. A capacidade de percepção e de reprodução é muito variável em função de variados factores e circunstâncias. Nem sempre é tarefa acessível, para quem diariamente participa em múltiplos casos e tem que os recordar e reproduzir passado muito tempo, discernir entre a ideia, a imagem, a impressão, o convencimento que perdurou, e os concretos e detalhados pormenores fácticos que a sustentam e que se buscam até à exaustão às vezes prática e justificadamente impossível de atingir. E pode, na verdade, acontecer um convencimento erróneo condicionante da narração. Mas, para tudo isso controlar, é que é feita a discussão ampla e contraditória e o julgamento em Tribunal, socorrendo-se este de todos os elementos probatórios disponíveis, correlacionados e não dispersos, e valorando-os livremente e, portanto, em função dos múltiplos aspectos que confluem na formação da convicção. Porém, no caso, o Tribunal não duvida da seriedade dos depoimentos nem dos pormenores relevantes por estes trazidos, com fiabilidade e parcimónia. E nem o facto de uns não ouvirem e relatarem alguns aspectos referidos por outros perturba significativamente. As funções e actuação concretas evidentemente nem sempre o permitem. E depoimentos muito afinados, convergentes, certinhos, é que podem criar, como tantas vezes, a ideia de preparação desonesta ou ensaio fraudulento. Quantas vezes, as pequenas dissonâncias são o garante da fidelidade! É evidente que existindo duas janelas como susceptíveis (ambas são de abrir e dão para a marquise, como explicou o vizinho de baixo, nenhuma notícia havendo de diferença na divisão dos compartimentos) de, através delas, ser efectuado o lançamento e ninguém tendo observado este acto, ninguém sabe, nem pode saber (a não ser o respectivo autor), por qual delas o mesmo se efectuou. E, para mais, aparecendo na primeira fotografia um poste a tapar uma delas, é óbvio que a legendagem tinha grande probabilidade de divergir, tanto mais que o problema não é saber exactamente qual das janelas, mas mais se foi por alguma das duas. O gesto do lançamento e a distância ao peitoril da janela são ignorados. Mas não é difícil descortinar uma posição e movimento que impulsionasse o saco de forma a ele cair no passeio, mesmo mais para o lado da esquina da "garrafeira". E, ao fazê-lo, a P, previdentemente, olharia até para baixo, para a vêr se estava alguém que a observasse ou que pudesse até ser atingido! Não era, pois, preciso que efectuasse o lançamento do interior e de maneira a descrever uma trajectória que fizesse o saco ir parar mais longe. Quando o M' se aproximou, pelo passeio do lado de fora da rua, da entrada do prédio é muito possível que o passeio onde apareceu o saco ficasse no seu campo de visão e até o saco já lá estivesse, como ele próprio admite. Mas porque haveria ele, necessariamente, de olhar para o passeio e vê-lo ? E porque haveria de ter sido nesse preciso momento que o lançamento se deu de modo a que inevitavelmente este lhe chamasse a atenção? Ia a P atirar o saco se visse ali uma pessoa a passar? Temos por evidente que ou o saco já estava mas não reparou nele (hipótese que, para efeitos de raciocínio, admitiu, sem relutância), ou, o que é mais certo, ele foi atirado precisamente nos instantes que mediaram a abertura da porta, e, portanto, a entrada de todos os agentes, e a chegada à porta do apartamento no 3º. Andar. Quanto ao número de sacos, seu rebentamento, projecção de pó e seu acondicionamento, não nos parece que algumas dúvidas suscitadas relevem para duvidar do essencial. Algum pó foi largado, como é natural. Pelo menos do "traço", já que do "tijolo" era mais difícil. São pormenores com que o agente naturalmente não se preocupou (importava-lhe lá na ocasião que fosse dos sacos ou do tijolo!). Assim como em relação ao número de sacos. Estava, com certeza, surpreendido pela descoberta, preocupado em comunicá-la e em acondicionar os objectos - como é de lei, já que esta manda diligenciar pela preservação das provas, coisa que a não ser feita não se perdoaria a um polícia! Exploram-se, de forma enfática, algumas divergências de pormenores não decisivos nos depoimentos. Como acima se disse, eles são a garantia de espontaneidade, fiabilidade e credibilidade dos testemunhos. Seria muito fácil aos agentes evitarem tais discrepâncias se, de má fé, quisessem discutir e combinar entre si a descrição das ocorrências - coisa de todo inaceitável, até prova em contrário, dados os especiais deveres que sobre os agentes da autoridade, em especial de uma polícia especializada, recaem e cuja quebra não se admite. Foi também enfatizado o facto de o agente L' ter dito que foi por sua iniciativa que foram tocar às campainhas de outros apartamentos que dão para o mesmo lado. Não espanta que outros agentes não tenham participado ou presenciado nessa diligência. Não é crível que num acto como aquele que se desenrolava, assim se proceda, pois cada um tem suas funções e não podem evidentemente todos tratar ou sequer presenciar o mesmo. Como não se estranha a sua decisão. O caso, naturalmente, em princípio, e até reunidas todas as informações, suscitou perplexidade. Havia que esgotar as hipóteses explicativas. Tratando-se de um Inspector da Polícia Judiciária, com formação e preparação especializadas, experiente nas andanças dos Tribunais e conhecedor dos limites e das questões que a prova dos factos, às vezes aparentemente evidentes, desencadeiam em função de quem as discute e aprecia, como ele próprio explica, tratou de acautelar o que achou importante para o Tribunal e para a prova. Ele sabe, decerto, que o instinto policial não chega. A investigação e a prova têm de ser consistentes. As suas dúvidas são compreensíveis, saudáveis e, mais uma vez, ao expressá-las clara e frontalmente em audiência, sem qualquer reticência, só contribui para sedimentar a merecida credibilidade. Não havendo, pois, prova directa sobre a autoria do lançamento do saco e sua pertença, impõe-se a avaliação dos elementos de prova indiciária existentes à luz dos critérios legais e dos ensinamentos da Doutrina e da Jurisprudência. O artº. 127º., do CPP, dispõe que «Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente». A propósito desse princípio da livre apreciação da prova, refere o Prof. Figueiredo Dias que «o princípio não pode de modo algum querer apontar para uma apreciação imotivável e incontrolável - e portanto arbitrária - da prova produzida». E acrescenta que tal discricionariedade tem limites inultrapassáveis: «a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a chamada «verdade material» -, de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e de controlo». E continua: «a «livre» ou «íntima» convicção do juiz ... não poderá ser uma convicção puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável». Embora não se busque o conhecimento ou apreensão absolutos de um acontecimento, nem por isso o caminho há-de ser o da pura convicção subjectiva. E «Se a verdade que se procura é uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença (maxime da penal) é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, a convicção do juiz há-de ser, é certo, uma convicção pessoal - até porque nela desempenham um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v. g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais - mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impôr-se aos outros». E conclui: «Uma tal convicção existirá quando e só quando ... o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável», isto é, «quando o tribunal ... tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudessem ser dadas razões, por pouco verosímil ou provável que ela se apresentasse» - Direito Proc. Penal, lº. Volume, pág. 203/205. Em Ac. do S.T.J, de 8-11-95 (BMJ 451/86) refere-se que «Um juízo de acertamento da matéria de facto pertinente para a decisão releva de um conjunto de meios de prova, que pode inclusivamente ser indiciária, contanto que os indícios sejam graves, precisos e concordantes» (sublinhado nosso). E acrescenta que as regras da experiência a que alude o artº. 127º., têm um importante papel na convicção do Tribunal, de modo que - parafraseando o dito aresto no presente caso - o que seria contrário às «regras da experiência» era concluir que o saco não pertencia e não provinha da casa do V, dados os indícios reunidos. Como se refere num outro Ac. do STJ, proferido em processo em que interviemos, viola-se o artº. 127º., do CPP e comete-se erro notório na apreciação da prova se «a conclusão do tribunal... surge como manifestamente irrazoável a qualquer observador comum, por contrariar abertamente não só a normalidade dos comportamentos humanos como também as regras da experiência comum». E no Ac. da R. de Coimbra, de 6/3/96, in C.J. XXI-II-44, sumaria-se que: «I-A prova pode ser directa ou indiciária; II-A prova indiciária assenta em dois elementos: a)-o indício que será todo o facto certo e provado com virtualidade para dar a conhecer outro facto que com ele estará relacionado; b)-a existência de presunção que é a inferência que, obtida do indício, permite demonstrar um facto distinto; III-Nada impede que, devidamente valorada a prova indiciária, a mesma por si, na conjugação dos indícios permita fundamentar uma condenação».
Ora há uma quantidade de indícios ou indicadores graves, isto é, sérios, importantes, fortes ou intensos; precisos, ou seja, certos e distintos ou exactos; e todos concordantes, quer dizer, coincidentes ou direccionados segundo resultado comum e consequente: o de que os factos se passaram como a acusação, nessa parte, os descrevia e, portanto, se deram como assentes. Eles são os elementos acima discriminados e resultantes dos depoimentos testemunhais e dos outros meios de prova, particularmente os pretextos invocadas, as expressões utilizadas e as reacções tidas; o modo e nível de vida, profissão e rendimentos; é a falta de qualquer outra justificação para a detenção do saco e produto em casa (ninguém ali é consumidor); é a quantidade, e respectivo valor venal, só ao alcance de alguém com boas possibilidades e colocação proeminente no negócio; é o risco consciente de tamanha quantidade só justificável por quem prossegue lucro avultado; é a existência do "traço", significativo do âmbito e fins do negócio e clara intenção de potenciar a rentabilização.
Enfim, o que seria, em nosso entendimento, contrário às regras da experiência era que as coisas se não tivessem passado como acima se referiu, pois só à luz desse seu plano elas são normal e razoavelmente inteligíveis e se compreende a lógica do seu encadeamento.
Esta é, pois - sem quebra de respeito por melhor entendimento - a convicção dos Juízes, que, assim, não pode deixar de ser afirmada sem qualquer hesitação.»
Resulta claramente que, apesar das suspeitas referidas relativamente a actividades de tráfico do arguido Castanheira anteriormente à data da busca (12/03/01), ficou claramente consignado e sublinhado que, por falta de factos concretos suficientemente reveladores da efectiva prática de factos dessa natureza, nomeadamente em ligação à actividade dos demais arguidos, não podiam ser tidos como provados.
No que respeita aos factos constantes dos nºs 2.1.76 a 2.1.83, 2.1.85 e 2.1.87 do elenco dos factos provados -- referentes ao saco encontrado no dia (12/03/01) da efectivação da busca à habitação do arguido, contendo 1060,000 gramas de heroína e 1.709,720 gramas de paracetamol e cafeína (produto conhecido por «traço holandês», utilizada para mistura com aquele estupefaciente), que o acórdão considerou como adquiridos pelo arguido D e por este guardados em sua casa com vista a, depois de misturar a heroína com o referido «traço holandês», vender o produto a indivíduos que não foi possível identificar, assim pretendendo obter lucros traduzidos na obtenção de avultada compensação remuneratória --- foram indicados vários elementos como fundantes da convicção sobre a verificação desses factos.
Alguns desses elementos não podiam funcionar validamente como fundamentos dessa convicção.
São eles, como acima já se concluiu, os constituídos pelas declarações informais do arguido quando da busca. E ainda, mesmo que só como mera coadjuvante, as suspeitas não objectivamente confirmadas de as deslocações do arguido a Espanha se relacionarem com o tráfico de droga. Suspeitas essas justificativas da busca ordenada e efectuada.
Restam porém os elementos objectivos, pormenorizadamente descritos, relacionados e apreciados, da informação do arguido à mulher, ao tocar para ela abrir a porta da casa, de que estava acompanhado por elementos da Polícia Judiciária, o tempo («uns cinco minutos») que a mulher levou, sem justificação razoavelmente credível nas circunstâncias, para accionar o botão de abertura da porta, o encontro do produto no chão do passeio junto à habitação do arguido, em situação relacionável com essa habitação em termos de ter sido atirado de janela dessa casa (7); as diligências de elemento da Polícia Judiciária no sentido de averiguar no momento da possibilidade razoável, afinal não verificada, de o saco ter sido atirado de outra habitação.
Estes elementos, quando interpretados à luz das regras da experiência comum, no quadro da imediação face à prova, constituem fundamentos objectivos de um processo de formação de convicção no sentido da detenção pelo arguido do referido produto estupefaciente (ainda que a partir de prova indirecta, porém objectiva e fundamentada) que, manifestamente, não podem ser considerados notoriamente (no sentido de não escapar à observação não só do comum dos observadores mas também de um juiz com os conhecimentos e experiência do exigidos pelo exercício da função) insuficientes para justificar a convicção do Tribunal, formada no exercício do seu aludido poder/dever de livre apreciação da prova, no sentido dessa detenção. Ou seja não é de concluir que houve erro manifesto na apreciação da prova e que só por via desse erro notório (no aludido sentido) o Tribunal não concluiu pela dúvida sobre esse facto da detenção do estupefaciente, dúvida de que o arguido deveria beneficiar.
Improcede assim nesta parte o fundamento do recurso.
IV.2.2.
Já não se deve porém perfilhar o mesmo entendimento relativamente aos factos considerados provados de que o arguido pretendia vender o estupefaciente detido, depois de misturado com «o traço holandês», para obter lucros traduzidos em avultada «compensação monetária».
É certo que a quantidade de heroína detida era acentuadamente elevada e que, quando misturada com o referido produto, constituído por paracetamol e cafeína, resultaria na disponiblização de um número de «doses» individuais muito elevadas, das quais, quando vendidas aos preços revelados pela experiência comum, se traduziriam em lucros muito avultados.
E dúvidas não restam das fortes suspeitas que ficam de que a situação concreta envolveria a intenção dessa venda com o referido resultado.
Contudo, não foram referidos como provados um número de factos objectivos concretos suficientemente fundantes da convicção sobre a verificação daqueles factos. Nomeadamente, não ficou provado se o arguido actuava sozinho ou integrado numa rede de tráfico e, nesta hipótese, qual o tipo de tarefa do arguido e que grau de remuneração lhe correspondia.
Por isso, em conformidade com os elementos constantes do texto da decisão, em si mesmo e ainda que na sua correlação com as regras da experiência comum, é de concluir --- perante a referida falta da prova de factos concretos constituindo suficiente suporte objectivo e motivado da convicção sobre a intenção de vender o estupefaciente e o fazer com a intenção de obter elevados lucros traduzidos em avultada compensação monetária -- que não estava excluída a dúvida razoável sobre a realidade desses factos, dúvida só não reconhecida por erro notório na apreciação da prova, ainda que só na parte relativa a esses factos.
E essa dúvida tem como efeito necessário não se terem como provados tais factos, em consequência do aludido princípio in dubio pro reo, que decorre do princípio da presunção de inocência, consagrado no art. 32º, nº 2, da C.R.P.
Procede assim nesta parte o fundamento do recurso do arguido D.
IV.2.3.
Do texto do douto acórdão recorrido, em confronto com a factualidade descrita na acusação, na contestação ou decorrente da audiência, e tendo em vista as possíveis disposições legais aplicáveis, não resulta a falta de apuramento de factos necessários à decisão, pelo que se não se verifica vício previsto na al. a) do nº 2 do art. 410º do C.P.P.
Igualmente não se constata contradição que possa ter-se por integrante de vício previsto na al. c) do n2 do esmo artigo.
IV.2.4.
Considera-se assim fixada a factualidade constante da decisão de facto do acórdão recorrido, com excepção da excluída por força do que acima se conclui sob o nº IV.2.2.
IV.2.5.
Da alteração referida sob o nº IV.2.2., resulta de iure, que os factos provados relativamente ao arguido D integram crime de tráfico ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do DL nº 15793, de 22/01, sem a agravação qualificada do art. 24º, al. c), do mesmo diploma.
O que implica necessariamente a revisão da medida concreta da pena, face à alteração da moldura abstracta a ter em conta, que passa de 5 anos e 4 meses a 16 anos de prisão para a de 4 a 12 anos.
O grau de ilicitude é elevado, ainda que só ao nível provado da detenção, considerando que se provou ser de heroína, estupefaciente dos mais potencialmente danosos para valores muitíssimo relevantes, sintetizados no bem da saúde pública, e em quantidade manifestamente elevada, constituindo acentuado perigo abstracto de afectação de um muito considerável número de pessoas, potenciais consumidores, com os conhecidos efeitos muito nefastos a nível individual e societário.
Foi intenso o dolo directo com que agiu.
Já teve experiência prisional anterior, condenado que foi, embora já no ano recuado de 1987, em pena de 5 anos e 6 meses de prisão (cf. fls. 2276).
A sua situação familiar caracteriza-se por viver com sua mulher e ter dois filhos, um de anterior casamento.
É razoável a sua situação económica.
Assim, considerando, à luz dos critérios e factores constantes dos arts. 40º e 71º do C.P., a globalidade do factualismo considerado provado, apresenta-se como ajustada a pena de cinco anos de prisão porque não excede o máximo da medida correspondente ao grau da culpa, satisfaz as exigências concretas de prevenção geral positiva ou de integração, apesar de reconhecidamente elevadas, e, dentro da conhecida «moldura da prevenção geral», a situar razoavelmente, atendendo ao único circunstancialismo fáctico que é possível considerar provado, entre os quatro anos e seis meses e os seis anos de prisão, corresponde às necessidades concretas de prevenção especial de socialização, sem dúvida marcantes, atento o alto desvalor do acto.
V.
Apreciemos agora as questões suscitadas pela recorrente B.
V.1.
Relativamente à questão da medida da pena, assim sintetizada:
a) A pena de 8 anos de prisão em que foi condenada pelo acórdão recorrido é excessiva, não devendo, à luz da aplicação à factualidade apurada do disposto nos arts. 21º, nº 1, do DL nº 15/93 e 71º do C.P., ultrapassar a de 4 anos e 6 meses de prisão?
A arguida, tal como já propugnara no recurso interposto para o Tribunal da Relação impugnando a medida de 7 anos da pena de prisão aplicada em 1ª instância, defende uma pena de prisão não superior a 4 anos e 6 meses, ao mesmo tempo que rebate o agravamento da pena para 8 anos de prisão decidido no acórdão daquele Tribunal.
Invoca essencialmente a sua incriminação pelo art. 21º do DL nº 15/93 sem a agravação do art. 24º do mesmo diploma (contrariamente ao sucedido com alguns dos co-arguidos), a reduzida retribuição obtida, o carácter acentuadamente passivo da sua intervenção, actuando por conta e no interesse da co-arguida A, o grau diminuto da sua culpa considerado o contexto global da actuação de todos os arguidos.
Atentando na globalidade da actuação da arguida B tal como consta do elenco dos factos provados (cf. pontos 2.1.1. a 2.1.8., relativos à colaboração que prestou à co-arguida C, agindo como intermediária de um tal I, arguido de tráfico noutros autos,) 2.1.18. a 2.1.20., 2.1.15. a 2.1.17., 2.1.47, 2.1.49, 2.1.55. a 2.1.57., 2.1.59., estes correspondentes aos nºs referentes às actuações de tráfico da co-arguida A, sogra da B, em que esta colaborou, e ainda os factos descritos 2.1.95. a 2.1.104, referentes à suas condições sócio-familiares e económicas), resulta fundamentalmente:
A actividade da arguida traduziu-se essencialmente na cooperação com o referido I e a arguida A na intermediação de venda ou no transporte de quantidades assinaláveis de heroína, conforme a seguinte síntese, que se perfilha, constante de fls. 3505 do douto acórdão de 1ª instância:
-«em Janeiro de 2000, na sequência de contacto da C, comprometeu-se a arranjar a heroína por aquela pretendida;
-para o efeito, contactou o I, que lha entregou;
-transportou dentro do seu veículo Audi para o "Continente" cerca de um quilo de heroína;
-recebeu da C os 4.800.000$00 do preço do quilo de heroína;
-entregou tal droga ao R;
-foi levar aquele dinheiro ao I;
-deste recebeu 100.000$00 em compensação;
-em Abril de 2000, entregou à C, depois de um contacto, um saco com produto estupefaciente e levou de volta o saco com o dinheiro do preço;
-possuiu outro saco de conteúdo similar e para igual fim, cuja entrega à C não concretizou, por razões alheias à sua vontade;
-transportava no seu veículo a A em negócios de droga;
-arranjou e entregou à A 20 quilos de "traço holandês", dela recebendo o preço de 5.400.000$00;
-projectou com a A negócio igual, não concretizado;
-em 23 e 24 de Maio de 2000, conduziu no seu Audi a A a entregar e a receber as 300 gramas de heroína relativas ao F;
-transportou essas 300 gramas de heroína e guardou-as na sua residência, onde lhe foram apreendidos, sendo parte de uma encomenda de meio quilo que lhe fizera;
-no dia 25 de Maio de 2000 deslocou-se a Tuy, com a A, no seu Audi, ocasião em que aquela comprou cerca de um quilo de heroína e recebeu uma amostra de cerca de 27 gramas de cocaína;
-parte desta heroína destinava-se a completar a encomenda de meio quilo que fizera à A.»
Relativamente às suas condições sócio-familiares e económicas, resultou essencialmente provado: «a arguida B descende de família harmoniosa e economicamente estável, teve um percurso escolar regular tendo feito o ensino secundário, está separada do marido há cerca de um ano, tem um filho de 3 anos confiado aos avós maternos, tem salão de cabeleireiro, vivia com os pais, no EP tem visitas; o produto apreendido na sua residência havia sido entregue à arguida pela A no dia anterior; teve empregos, nomeadamente como cabeleireira, e negócios, tinha algumas dívidas, contraiu empréstimo bancário, a A ajudava-a economicamente; à data dos factos estava separada de facto; é mãe de um rapaz com 3 anos, que lhe é afectivamente muito ligado, dado que o pai nunca lhe deu nem dá qualquer atenção, por isso, o afastamento forçado da mãe trouxe ao menor problemas psicológicos, necessitando de apoio médico constante.»
Não tem antecedentes criminais e confessou parcialmente os factos.
Está a ser tratada de tuberculose pulmonar no estabelecimento prisional.
Da globalidade do factualismo apurado não resulta efectivamente que a arguida B tenha agido obtendo ou procurando obter compensações económicas que possam considerar-se integrantes do elemento jurídico constitutivo da agravante qualificativa da al. c) do art. 24º do DL nº 15/93, sendo correcta a sua incriminação apenas pelo art. 21º, nº 1, deste diploma.
Considerando a pena abstracta de 4 a 12 anos de prisão, cominada nesta norma, e apreciando os factos provados à luz dos critérios e factores constantes dos arts. 40º e 71º do C:P, avaliemos da justeza da impugnação da medida da pena aplicada.
A ilicitude da conduta da arguida B é elevada, já que, embora se revele actuação sua em benefício essencialmente da A e do I, intervindo como intermediária ou no transporte ou guarda de heroína, sem que se provem ganhos assinaláveis da sua parte, a sua intervenção, pela quantidade de produtos estupefacientes intermediados, ajudados a transportar no seu próprio veículo ou guardados, importa a colaboração significativa em actividades de tráfico já de assinalável vulto, envolvendo acentuado perigo para a saúde pública, bem jurídico visado proteger com a referida incriminação.
A intensidade do dolo corresponde claramente à de dolo directo persistindo ao longo da sua actividade de colaboração com a A e o I.
As suas indiciadas dificuldades financeiras e familiares, estas aliadas à situação de separação do marido, filho da A, de quem tem um filho de três anos sofrendo com a falta de qualquer atenção do pai, e o apoio que a A lhe dava enquadram em alguma medida o circunstancialismo da sua actuação.
A ausência de antecedentes criminais e a confissão parcial dos factos militam a seu favor.
Considerada a globalidade complexiva de todo o circunstancialismo apurado, a pena de seis anos e seis meses de prisão apresenta-se como razoavelmente adequada aos critérios legais. Respeita o limite máximo da medida correspondente ao grau de culpa; satisfaz equilibradamente as necessidades concretas de prevenção geral positiva ou de integração, ainda que elevadas atento o justificado sentimento comunitário de reprovação e insegurança face ao grave desvalor, consagrado na lei, das frequentes condutas de tráfico de estupefacientes; e dentro da «moldura de prevenção geral», a fixar razoavelmente entre os cinco anos e seis meses e os oito anos e seis meses de prisão, corresponde satisfatoriamente às exigências concretas de prevenção especial de socialização que, embora sem dúvida muito significativas, não se mostram de grau acentuadamente muito elevado, tendo em conta a ausência de antecedentes criminais, a confissão parcial dos factos e uma ligação maternal positiva a um filho pequeno dela muito carente, constituindo com boa probabilidade, espera-se, mais um estímulo a um juízo de severa auto-crítica relativamente à elevada gravidade da sua muito reprovável conduta e a um processo de real arrependimento e de efectiva reinserção conducente a uma posterior vida em liberdade sem prática de quaisquer crimes, como é seu dever, e com equilibrada realização pessoal, familiar e societária, como é seu interesse.
Procede assim, apenas parcialmente, este fundamento do recurso da arguida B.
V.2
Apreciando agora a segunda questão que a) arguida B colocou no seu recurso, assim sintetizada:
b) Deve ser revogada a decisão do Tribunal da Relação que decretou a perda a favor do Estado do veículo Audi, modelo A3, matrícula OC, porque violadora do disposto no art. 35º, nº 1, do citado DL nº 15/93, uma vez que não pode concluir-se do factualismo apurado «que existe no caso uma relação de causalidade significativa e jurídico penalmente relevante entre a utilização da referida viatura automóvel e a prática de factos ilícitos»?
A questão tem de ser resolvida apreciando, à luz da disposição dos arts. 35º e 36ºdo referido DL nº 15/93 (que por especiais afastam, quanto à previsão coincidente, as normas gerais dos arts. 109º e 110º do C.P.), os factos provados relativamente à utilização do aludido veículo.
Conforme temos entendido e é jurisprudência dominante (8), em matéria de infracções previstas no citado diploma a declaração de perda de objectos a favor do Estado deverá ocorrer sempre que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de alguma dessas infracções ou que por esta tiverem sido produzidos, considerando-se indispensável, mas também bastante, para a integração da primeira previsão (relativa aos objectos servindo ou destinados a servir para a prática da infracção) que a relação do objecto com a prática do crime se mostre significativamente marcante, numa perspectiva de causalidade adequada, para que a infracção se verifique em si mesma ou na forma de que se revestiu.
É essa relação que resulta dos factos provados relativamente à utilização do veículo em causa na prática de factos fundamentalmente integrantes do crime por que é condenado.
Verifica-se efectivamente do factualismo apurado (cf. nºs 2.1.3., 2.1.6. 2.1.49., 2.1.53., 2.1.55.) que a arguida utilizou o automóvel por mais do que uma vez para transportar quantidades elevadas de heroína traficada, na sua actividade de colaboração com o I, a C e a A, revelando-se essa utilização não acidental e com clara efeito na facilitação significativa da actividade de tráfico, conforme bem entendeu o douto acórdão recorrido.
E, conforme decidiu esse acórdão, o facto de o veículo se encontrar registado em nome de terceiro não obsta à declaração de perda a favor do Estado, ainda que sem prejuízo do que porventura viesse a ser decidido em incidente deduzido nos termos do art. 36º do DL nº 15/93.
Improcede assim este fundamento do recurso.
VI.
Apreciemos agora a primeira questão colocada pela recorrente A, acima sintetizada da forma seguinte:
a) Conforme questão prévia colocada pelo Ministério Público no seu recurso para o Tribunal da Relação, com base no disposto no art. 119º, al. c), do C.P.P., o processado deve ser anulado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 e 4022, no qual essa recorrente indicou testemunha para provar justo impedimento, invocado nos termos art. 107º, nº 2 do C.P.P., de apresentação do seu recurso para aquele Tribunal fora do prazo estabelecido na lei, uma vez que, após inquirição da testemunha, o justo impedimento foi considerado existente e, em conformidade, admitido o recurso, sem que tenham sido ouvidos, como aquela norma impõe, os outros sujeitos processuais, nomeadamente o Ministério Público, que não foi notificado da inquirição, em cujo acto não esteve presente, como o não foi igualmente da decisão que julgou verificado o justo impedimento, integrando a falta de participação do Ministério Público a nulidade insanável prevista no citado art. 119º, al. c), do C.P.P.?
O evento processual a que a questão respeita caracteriza-se, em síntese, do seguinte modo:
A arguida A invocou justo impedimento de pagamento, em prazo, de multa necessária, nos termos do art. 145º do C.P.C., ex vi do art. 107º do C.P.P., à admissão do recurso por si interposto do douto acórdão de 1ª instância para o Tribunal da Relação do Porto.
Inquirida a testemunha indicada, foi, por despacho judicial de 26/03/02, considerado existente o invocado impedimento e autorizado o pagamento (fls. 4027), após o qual foi admitido o recurso (fls. 4044).
O Exmo. Magistrado do Ministério Público não fora porém notificado da designação da data para inquirição da testemunha, não estivera presente na inquirição e não fora notificado do despacho reconhecendo o impedimento.
Foi depois defendido pelo Ministério Público e reconhecido no douto acórdão do Tribunal da Relação estar-se face a uma nulidade insanável, prevista no art. 119º, al. b), do C.P.P., decorrente de o Ministério Público estar ausente do referido acto de inquirição, concluindo-se que, perante a consequente invalidade desse acto e dos actos posteriores relacionados com a admissão do recurso (cf. art. 122º, nº 1, do C.P.P.), haveria que repetir o acto de inquirição para se averiguar da existência do invocado impedimento.
O douto acórdão recorrido decidiu porém não determinar essa repetição, por entender que, mesmo que viesse a ser entendido como tempestivo o recurso, o conhecimento deste estava prejudicado, em virtude da procedência do recurso do Ministério Público, a propósito do qual haviam sido apreciadas as questões pretendidas suscitar pela recorrente A no recurso por si interposto.
Apreciando:
Salvo o devido respeito, entendemos não se verificar a referida nulidade insanável, pois que da letra e do espírito do art. 119º, al. a), do C.P.P., também iluminado pelo sentido restritivo do sistema de nulidades do actual C.P.P., com a consequente exigência de cominação expressa (cf. art. 118º do C.P.P), resulta que essa norma, ao referir-se à ausência do Ministério Público a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência, abrange nessa previsão de causa de nulidade insanável apenas os casos de falta da presença do Ministério Publico em actos relativamente aos quais seja de depreender que a lei exige essa presença, por referência expressa, ou, pelo menos, por decorrência evidente da natureza e importância do acto. O que manifestamente não se verifica na situação em causa.
Estamos pois face a uma irregularidade (art. 118º, nº 2, do C.P.P.).
Irregularidade porém sanada decorridos que foram três dias após a posterior intervenção nos autos, em 02/04/03, do Ministério Público promovendo a renovação da 1ª parte de despacho de cuja segunda parte constava até a designação de dia para inquirição da testemunha indicada para prova do invocado impedimento (cf. fls. 4031 e 4018), sem que tenha sido arguida a irregularidade (cf. art. 123º, nº 1, do C.P.P.).
O despacho judicial de 1ª instância que admitiu o recurso é pois válido, o mesmo sucedendo com despacho de sua admissão pelo Tribunal da Relação.
Nada impedia pois o conhecimento directo do recurso, não podendo, salvo o devido respeito, considerar-se prejudicado esse conhecimento por força da procedência do recurso do Ministério Público. O direito ao recurso, consignado no art. 32º, nº 1, da C.R.P. implica o pleno exercício dos poderes correspondentes e a pronúncia directa sobre as questões colocadas nas conclusões da respectiva motivação, com a decisão de cada uma delas e a sua fundamentação com referência à argumentação do recorrente.
Deve pois ser conhecido pelo Tribunal da Relação o recurso interposto pela arguida A para esse douto Tribunal.
Fica assim prejudicado o conhecimento das restantes questões que resultam das conclusões da motivação do recurso interposto por essa arguida do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto.
VII.
Em conformidade, revoga-se parcialmente o aliás douto acórdão recorrido, decidindo-se:
a) Declara-se inválido o meio de prova constituído pela referência em julgamento, pelos Elementos da Polícia Judiciária que haviam procedido a busca na habitação do arguido D, de declaração, como sendo feita por este no acto da busca e não transcrita no respectivo auto, de que «Se houver droga fora de casa, não é nossa». Meio de prova que, em conformidade, não pode ser tido em conta, não se revestindo portanto, contrariamente ao que foi considerado no douto acórdão recorrido, de qualquer relevância para fundamentar a decisão sobre a prova dos factos imputados ao ora recorrente;
b) Considera-se não provado que o arguido D destinasse a heroína, que foi apreendida e se provou deter, a ser vendida, depois de misturada com os produtos também apreendidos (parecetamol e cafeína), a um número muito elevado de pessoas, com o propósito de obter lucros traduzidos em avultada compensação monetária;
c) Considera-se que os actos provados relativamente ao arguido D integram crime de tráfico ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do DL nº 15703, de 22/01/, pelo qual vai condenado na pena de cinco anos de prisão.
d) Fixa-se em seis anos e seis meses de prisão a pena aplicada à arguida B Maria Garcia Guedes da Silva pela prática, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do DL nº 15/03, de 22/01;
e) Determina-se o conhecimento pelo Tribunal da Relação do Porto do recurso interposto para esse Tribunal pela arguida A do douto acórdão de 1ª instância.
Confirma-se no mais o douto acórdão recorrido.
Sem custas relativamente ao recurso da arguida A .
São devidas custas pelos recorrentes D e B, fixando-se a taxa de justiça respectivamente em I.
Conforme entendimento pacífico, o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões, sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso.
As questões a apreciar no caso, tal como resultam das conclusões dos recursos interpostos, são as seguintes:
Referentes ao recurso interposto pelo recorrente D:
a) O Tribunal recorrido alicerçou a sua convicção, entre outros meios de prova, em pontos de depoimentos (das testemunhas L e M, Inspectores da P.J.,) insusceptíveis de serem valorados, por força do disposto nos arts. 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7, do C.P.P., que assim o acórdão violou, na medida em que aqueles depoimentos incidiram sobre declarações que o arguido D teria feito no decorrer de busca realizada por aqueles Inspectores à habitação desse arguido, declarações que nem sequer haviam sido consignadas no auto dessa diligência?
b) Face à inexistência de elementos probatórios bastantes para dar como provada a prática de actos de tráfico de estupefacientes pelo arguido D, impunha-se a sua absolvição, pelo menos por existência de dúvida razoável quanto à verificação dessa prática, resultando da confirmação pelo Tribunal da Relação da conclusão pelo Tribunal de 1ª instância da prática desses factos e da consequente condenação ofensa do princípio in dubio pro reo e violação do disposto no art. 32º, nº 2, da C.R.P.?
c) Mesmo que fosse porventura de considerar provado que o arguido Castanheira praticara actos de tráfico, o Tribunal recorrido, ao considerar suplementarmente que os cometera na expectativa de obter «avultada compensação monetária», cometeu erro notório na apreciação da prova, como resulta do próprio texto da decisão recorrida, também por violação do princípio in dubio pro reo, resultando a conclusão da existência desse factualismo, integrante da agravação prevista no art. 24º, al. c), do DL nº 15/93, de um «raciocínio eminentemente dedutivo, sem qualquer facto concreto que o valide»?
d) Existe contradição entre a decisão do Tribunal da Relação agravando de 6 para 9 anos de prisão a pena em que o arguido D fora condenado em 1ª instância e a respectiva fundamentação, despida de explicitação com base em elementos concretos e menosprezando o tribunal a inexistência, expressamente referida no texto do acórdão, de «qualquer ligação do ora recorrente a uma eventual actividade ilícita e reiterada dos seus co-arguidos» e a circunstância de, contrariamente ao determinado relativamente a estes, não ter sido declarada a perda a favor do Estado de quaisquer bens do recorrente?
e) O acórdão recorrido enferma dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do nº 2 do art. 410º do C.P.P.?
f) O Tribunal recorrido ultrapassou os limites impostos pela lei penal na valoração da prova, com clara violação do disposto no art. 127º do C.P.P., ao condenar com base em prova meramente indiciária, sem que exista qualquer correspondência lógica entre os factos dados como provados, a prova produzida e a consequente decisão condenatória do arguido?
g) Do acórdão recorrido não consta fundamentação da decisão de aumentar a pena de seis para nove anos de prisão, por falta de indicação de elementos concretos justificativos desse agravamento?
Questões respeitantes ao recurso interposto pela arguida B :
a) A pena de 8 anos de prisão em que foi condenada pelo acórdão recorrido é excessiva, não devendo, à luz da aplicação à factualidade apurada do disposto nos arts. 21º, nº 1, do DL nº 15/93 e 71º do C.P., ultrapassar a de 4 anos e 6 meses de prisão?
b) Deve ser revogada a decisão do Tribunal da Relação que decretou a perda a favor do Estado do veículo Audi, modelo A3, matrícula OC, porque violadora do disposto no art. 35º, nº 1, do citado DL nº 15/93, uma vez que não pode concluir-se do factualismo apurado «que existe no caso uma relação de causalidade significativa e jurídico penalmente relevante entre a utilização da referida viatura automóvel e a prática de factos ilícitos»?
Questões relativas ao recurso interposto pela arguida A:
a) Conforme questão prévia colocada pelo Ministério Público no seu recurso para o Tribunal da Relação, com base no disposto no art. 119º, al. c), do C.P.P., o processado deve ser anulado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 e 4022, no qual essa recorrente indicou testemunha para provar justo impedimento, invocado nos termos art. 107º, nº 2 do C.P.P., de apresentação do seu recurso para aquele Tribunal fora do prazo estabelecido na lei, uma vez que, após inquirição da testemunha, o justo impedimento foi considerado existente e, em conformidade, admitido o recurso, sem que tenham sido ouvidos, como aquela norma impõe, os outros sujeitos processuais, nomeadamente o Ministério Público, que não foi notificado da inquirição, em cujo acto não esteve presente, como o não foi igualmente da decisão que julgou verificado o justo impedimento, integrando a falta de participação do Ministério Público a nulidade insanável prevista no citado art. 119º, al. c), do C.P.P.?
b) À arguida A não devia ter sido aplicada pena superior à de nove anos de prisão em que fora condenada em 1ª instância, uma vez que o seu recurso não foi apreciado pelo Tribunal da Relação e considerando o factualismo provado à luz do disposto no art. 71º do C.P., atendendo nomeadamente às circunstâncias de ser primária, ter bom comportamento anterior, estar bem inserida social e familiarmente, ter uma filha de 8 anos de idade a seu cargo e haver colaborado no apuramento da verdade, ao contrário dos co-arguidos?
c) O acórdão do Tribunal da Relação, ao decretar, ao contrário da decisão de 1ª instância, a perda a favor do Estado de apartamento da arguida A e das quantias em dinheiro que lhe haviam sido apreendidas, violou o disposto nos arts. 35º a 38º do DL nº 15/93, de 22/01, devendo por isso revogar-se essa decisão?
IV.
Comecemos por apreciar as questões colocadas pelo arguido D, uma vez que põem em causa aspectos da decisão de facto.
IV.1 Relativamente à seguinte questão acima sintetizada sob a alínea a) :
a) O Tribunal recorrido alicerçou a sua convicção, entre outros meios de prova, em pontos de depoimentos (das testemunhas L e M, Inspectores da P.J.,) insusceptíveis de serem valorados, por força do disposto nos arts. 129.º, 130.º e 356.º, n.º 7, do C.P.P., que assim o acórdão violou, na medida em que aqueles depoimentos incidiram sobre declarações que o arguido D teria feito no decorrer de busca realizada por aqueles Inspectores à habitação desse arguido, declarações que nem sequer haviam sido consignadas no auto dessa diligência?
Resulta efectivamente:
Em síntese, o douto acórdão recorrido, confirmativo do acórdão de 1ª instância, considerou provado que o arguido D praticou os seguintes factos, integrantes do crime de tráfico de estupefacientes por que foi condenado: as 1060,000 gramas de heroína e as 1709,720 gramas de paracetamol e cafeína, produtos contidos numa saca encontrada caída junto à casa de habitação do D, haviam sido lançados à rua pela mulher deste, quando informada pelo D que se encontrava acompanhado de elementos da Polícia Judiciária que se dirigiam com ele à sua casa de habitação para execução de mandado judicial de busca; e tinham sido anteriormente adquiridas e guardadas nessa sua habitação pelo D que destinava a heroína à venda a indivíduos que não se lograram identificar, sendo que os produtos paracetamol e cafeína, vulgarmente designados por "traço holandês", era por ele destinado a ser misturado com a heroína para, desta forma, rentabilizar os lucros, traduzidos em elevada compensação monetária, que pretendia auferir com a venda do produto final desta forma obtido (cf. nºs 2.1.77. a 2.1.83, 2.1.85 e 2.1.87. do elenco dos factos considerados provados);
O Tribunal recorrido, ao indicar no acórdão os elementos fundantes da sua convicção sobre a verificação desses factos, incluiu (cf. fls. 4370) a referência que, em julgamento, aqueles elementos da Polícia Judiciária, que haviam procedido à busca, fizeram à seguinte declaração, não exarada no auto referente àquela diligência, que o D teria feito, no acto da busca, quando descoberto pelos agentes da Polícia Judiciária a referida saca contendo os mencionados produtos: «Se houver droga fora de casa, não é nossa». Declaração que o Tribunal, relacionando-a com a reacção, no mesmo momento, da mulher do D que teria declarado, segundo os mesmos elementos da P.J., que «não se queria comprometer por causa do marido», o acórdão considerou como «a demonstração da consciência do ocorrido» por parte do D e mulher.
O depoimento de cada um dos referidos elementos da Polícia Judiciária, na parte relativa à referida declaração do arguido D, não constitui um «depoimento indirecto» no sentido da proibição, como meio de prova, nos termos do art. 129º do C.P.P., de depoimento resultante do que «se ouviu dizer», uma vez que respeita a depoimento tendo como objecto directo a prova de declarações produzidas perante essas testemunhas.
Pelo que não procede a invocada violação desse artigo.
E esses depoimentos também não contêm a reprodução de vozes ou rumores públicos ou a manifestação de meras convicções sobre factos ou a sua interpretação, pelo que igualmente não se verifica a invocada violação do art. 130º do C.P.P.
Apresenta-se porém como ilegítima a consideração pelo douto acórdão recorrido, como fundamento da convicção da decisão de facto, dessa parte dos depoimentos referindo a citada declaração do arguido D.
Essencialmente pelas razões seguintes:
O princípio da legalidade do processo e o estatuto do arguido (cf., v.g., os arts. 2º, 56º e ss., 262º e ss., 275º, 355º a 357º, com especial destaque para o nº 7 do art. 356º e nº 2 do art. 357º), impedem que sejam consideradas como prova depoimentos de órgãos de polícia criminal, encarregados de actos de investigação, referindo declarações do arguido (ou de alguém que devesse ser constituído como tal - cf. arts. 58º e 59º do C.P.P.), mesmo que sob a forma de conversas informais, a esses órgãos de polícia criminal encarregados de actos de investigação, quando essas declarações não forem reduzidas a auto.
Entendimento contrário implicaria que pudessem ser tomadas em conta, para efeitos de prova, declarações do arguido que não o poderiam ser se constantes de auto cuja leitura não fosse permitida em audiência nos termos dos art. 357º, conjugado com os arts. 355º e 356º, nº 7. Constituiria manifesta ofensa do fim prosseguido pela lei com estas disposições, revelado pelo seu espírito, designadamente a salvaguarda dos princípios da oralidade, da imediação, da publicidade, do contraditório, da concentração Neste sentido, (4).
Conclui-se assim pela invalidade do meio de prova constituído pela citada referência à mencionada declaração do arguido D, que, em conformidade, não pode ser tida em conta, não se revestindo portanto, contrariamente ao que foi considerado no douto acórdão, de qualquer relevância para fundamentar a decisão sobre a prova dos factos imputados ao ora recorrente.
Procede pois este fundamento do recurso.
IV.2.
Apreciemos agora os fundamentos correspondentes às restantes questões, acima sintetizadas da forma seguinte:
b) Face à inexistência de elementos probatórios bastantes para dar como provada a prática de actos de tráfico de estupefacientes pelo arguido D, impunha-se a sua absolvição, pelo menos por existência de dúvida razoável quanto à verificação dessa prática, importando a confirmação pelo Tribunal da Relação da conclusão pelo Tribunal de 1ª instância da prática desses factos e da consequente condenação ofensa do princípio in dubio pro reo e violação do disposto no art. 32º, nº 2, da C.R.P.?
c) Mesmo que fosse porventura de considerar provado que o arguido D praticara actos de tráfico, o Tribunal recorrido, ao considerar suplementarmente que os cometera na expectativa de obter «avultada compensação monetária», cometeu erro notório na apreciação da prova, como resulta do próprio texto da decisão recorrida, também por violação do princípio in dubio pro reo, resultando a conclusão da existência desse factualismo, integrante da agravação prevista no art. 24º, al. c), do DL nº 15/93, de um «raciocínio eminentemente dedutivo, sem qualquer facto concreto que o valide»?
d) Existe contradição entre a decisão do Tribunal da Relação agravando de 6 para 9 anos de prisão a pena em que o arguido D fora condenado em 1ª instância e a respectiva fundamentação, despida de explicitação com base em elementos concretos e menosprezando o tribunal a inexistência, expressamente referida no texto do acórdão, de «qualquer ligação do ora recorrente a uma eventual actividade ilícita e reiterada dos seus co-arguidos» e a circunstância de, contrariamente ao determinado relativamente a estes, não ter sido declarada a perda a favor do Estado de quaisquer bens do recorrente?
e) O acórdão recorrido enferma dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do nº 2 do art. 410º do C.P.P.?
f) O Tribunal recorrido ultrapassou os limites impostos pela lei penal na valoração da prova, com clara violação do disposto no art. 127º do C.P.P., ao condenar com base em prova meramente indiciária, sem que exista qualquer correspondência lógica entre os factos dados como provados, a prova produzida e a consequente decisão condenatória do arguido?
Como é conhecido, o princípio in dubio pro reo é uma expressão, em matéria de prova, do princípio da presunção de inocência, por sua vez decorrente do princípio do Estado de Direito Democrático.
Conforme entendimento amplamente dominante (5), a aplicabilidade desse princípio restringe-se à decisão da matéria de facto. Esta restrição - atendendo a que, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos no nº 2 do art. 410º e das nulidades referidas no nº 3 do mesmo artigo, o recurso para o S.T.J. visa exclusivamente o reexame da matéria de direito (art. 434º) - implica que o S.T.J. só possa reconhecer a violação do princípio in dubio pro reo quando da decisão recorrida resultar que, tendo o tribunal a quo chegado a uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos, decidiu em desfavor do arguido. Ou quando, não reconhecendo o tribunal recorrido essa dúvida, ela resultar evidente (por conhecimento oficioso) do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, ou seja, quando é verificável que a dúvida só não é reconhecida em virtude de um erro notório na apreciação da prova, nos termos da al. c) do citado nº 2 do art. 410º.
Ora nenhuma destas hipóteses se verifica no caso dos autos. É evidente que o douto acórdão recorrido não reconhece qualquer dúvida sobre os factos integradores do crime de tráfico de estupefacientes imputado ao arguido Castanheira; e que não se manifesta erro notório na apreciação da prova susceptível de poder levar à verificação da segunda hipótese.
Efectivamente, a invalidade do meio de prova reconhecida sob o nº IV.1 não acarreta a conclusão, quando tidos em consideração os demais elementos de prova carreados, de que a decisão de considerar provados os mencionados factos (descritos sob os nºs 2.1.77. a 2.1.83, 2185 e 2187. do elenco dos factos considerados provados) de detenção e guarda pelo arguido D da heroína e produtos para mistura com esse estupefaciente que o D destinava à venda para obter lucros, traduzidos em elevada compensação monetária, resultou de erro na apreciação da prova, perceptível como evidente a um juiz com os conhecimentos e experiência normalmente exigíveis ao exercício da função, a partir do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência.
Pelo contrário, a análise crítica que o acórdão faz, de forma relacionada, dos restantes provas não consideradas inválidas --- nomeadamente as referentes às descritas circunstâncias relativas à descoberta da saca com o estupefaciente, às atitudes do arguido ao referir aos elementos da Polícia Judiciária que não tinha chaves da sua casa, encontradas logo depois no automóvel de onde acabara de sair, e ao referir à mulher, logo que tocou à campainha da porta da casa, onde se ia iniciar a busca, que estava acompanhado daqueles elementos, o tempo injustificado que a mulher demorou a abrir a porta, a consideração, segundo dados irrefutáveis da experiência comum, do muito elevado número de «doses» resultantes da mistura dos produtos detidos pelo arguido, dos preços habitualmente praticados e dos avultados lucros inerentes à venda de tão avultada quantidade de heroína misturada nos termos referidos --- é de molde a ter como suficientemente fundamentado o processo lógico-racional que esteve na base da convicção do Tribunal da prática pelo arguido D dos factos considerados como fundamentos da decisão condenatória.
Incluindo o facto provado -- a partir da prova concreta da apreensão dos produtos, integrada na consideração da globalidade complexiva do factualismo provado e interpretada a partir de seguras regras de experiência comum, passadas pelo crivo da imediação do Tribunal de 1ª instância e expressas coerentemente na fundamentação --- da intenção de venda para obter elevada compensação monetária, expressão que, embora próxima dos termos da previsão do art. 24º, al. c), do DL nº 15/93, não deixa, no circunstancialismo global do elenco dos factos provados e da respectiva fundamentação, acima transcritos, de expressar uma situação fáctica de entendimento comum, integrante da previsão constante dessa norma.
O texto da decisão é efectivamente expressivo de que a convicção do Tribunal se formou não de maneira arbitrária, por baseada em meras impressões ou conjecturas de difícil ou impossível objectivação, mas antes fundamentada na consideração cuidada e exaustiva da globalidade complexiva das provas produzidas e exteriorizada por forma reveladora de ponderação e recurso equilibrado a regras de experiência comum dando sentido ao conjunto dos elementos obtidos, no uso proporcionado, ajustado e motivado da liberdade de apreciação da prova que constitui princípio fundamental dessa apreciação, tal como resulta do disposto no art. 127º do C.P.P.
Assim, ao contrário do que o recorrente invoca, além de não se revelar o vício do erro notório na apreciação da prova, previsto na al. c) do nº 2 do art. 410º do C.P.P., não se mostram ultrapassados os limites do exercício desse princípio de livre apreciação.
Consequentemente, é manifesto que não mostra violado o princípio da presunção de inocência, estabelecido no invocado art. 32º, nº 2, da C.R.P.
Também não colhe a invocação do vício da insuficiência da decisão de facto para a decisão, previsto no art. 410º, nº 2, al. a), do C.P.P., pois que, observados, oficiosamente, os termos da acusação e da contestação e o elenco da factualidade considerada na decisão, não se perfilam outros factos a apurar, mesmo que oficiosamente, por necessários à decisão relativa aos crimes imputados ao arguido D.
E da consideração oficiosa do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, não resulta verificado vício previsto na alínea b) do citado nº 2 do art. 410º, pois não se constata contradição na fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, não se revestindo, manifestamente, de significado relevante de contradição insanável as invocadas circunstâncias de não se terem provado ligações do arguido D aos restantes arguidos na prática de tráfico de estupefacientes e de não ter sido declarado perdido a favor do Estado qualquer bem desse arguido.
Improcedem assim os fundamentos do recurso correspondentes às questões sintetizadas sob as als. b) a f).
Em conformidade, mau grado a invalidade de meio de prova, declarada sob o nº IV.1., considera-se assente a matéria de facto considerada provada no douto acórdão relativamente ao arguido D.
IV.3.
Apreciemos agora a questão, sintetizada sob a alínea g), referente à invocada falta de fundamentação no acórdão recorrido do agravamento da pena de seis para nove anos de prisão, por não indicação de elementos concretos justificativos desse agravamento.
Há que reconhecer que o douto acórdão recorrido, ao fundamentar a procedência parcial do recurso do Ministério Público, que tinha como um dos objectos o agravamento respectivamente para 11, 8 e 10 anos de prisão das penas aplicadas aos arguidos A , B e D, não referiu expressa e especificamente as razões de cada agravação decidida (respectivamente para 10, 8 e 9 anos de prisão).
Resulta porém claramente da globalidade da fundamentação, nomeadamente em relação ao recorrente D, que a agravação foi decidida por se entender ser a pena de nove anos de prisão a que está de acordo com os critérios constantes dos arts. 40º, nºs 1 e 2, e 71º, nº 2, do C.P., considerando a gravidade do ilícito (atenta, nomeadamente, a elevada quantidade de estupefaciente e a forma elaborada de actuação), a intensidade do dolo, atingindo a modalidade mais elevada de dolo directo, a anterior condenação do arguido, em 1987, em pena de 5 anos e 6 meses de prisão (cf. fls. 2276), a sua situação familiar, com mulher e dois filhos, um deles de anterior casamento, e a sua razoável situação económica, e tendo em atenção o carácter elevado da culpa, de nível não ofendido pela referida medida da pena, e as muito acentuadas exigências concretas de prevenção geral e especial. É assim de concluir por suficiente fundamentação da fixação em nove anos de prisão da medida da pena aplicada ao arguido D.
Medida cuja impugnação foi aliás feita só em função da defesa (acima considerada improcedente) da não integração das previsões dos arts 21º. e 24º, al. c), do DL nº 15/93. E relativamente à qual não se justifica alteração oficiosa, por não se revelarem violações dos referidos critérios e factores estabelecidos na lei para serem observados na determinação da pena concreta, dentro da moldura abstracta, no caso fixada, conforme o a douto acórdão frisou, entre 5 anos e 4 meses e 16 anos de prisão.
Pelo exposto, considera-se inexistente a nulidade do acórdão, implicitamente invocada, prevista no art. art. 379º, nº 1, al. a), referido ao art. 374º, nº 2, ambos do C.P.P., sendo de manter a decisão.
Improcede assim este fundamento do recurso.
V.
Apreciemos agora as questões suscitadas pela recorrente B .
V.1.
Relativamente à questão da medida da pena, assim sintetizada:
a) A pena de 8 anos de prisão em que foi condenada pelo acórdão recorrido é excessiva, não devendo, à luz da aplicação à factualidade apurada do disposto nos arts. 21º, nº 1, do DL nº 15/93 e 71º do C.P., ultrapassar a de 4 anos e 6 meses de prisão?
A arguida, tal como já propugnara no recurso interposto para o Tribunal da Relação impugnando a medida de 7 anos da pena de prisão aplicada em 1ª instância, defende uma pena de prisão não superior a 4 anos e 6 meses, ao mesmo tempo que rebate o agravamento da pena para 8 anos de prisão decidido no acórdão daquele Tribunal.
Invoca essencialmente a sua incriminação pelo art. 21º do DL nº 15/93 sem a agravação do art. 24º do mesmo diploma (contrariamente ao sucedido com alguns dos co-arguidos), a reduzida retribuição obtida, o carácter acentuadamente passivo da sua intervenção, actuando por conta e no interesse da co-arguida A, o grau diminuto da sua culpa considerado o contexto global da actuação de todos os arguidos.
Atentando na globalidade da actuação da arguida B tal como consta do elenco dos factos provados (cf. pontos 2.1.1. a 2.1.8., relativos à colaboração que prestou à co-arguida C, agindo como intermediária de um tal I, arguido de tráfico noutros autos,) 2.1.18. a 2.1.20., 2.1.15. a 2.1.17., 2.1.47, 2.1.49, 2.1.55. a 2.1.57., 2.1.59., estes correspondentes aos nºs referentes às actuações de tráfico da co-arguida A, sogra da B, em que esta colaborou, e ainda os factos descritos 2.1.95. a 2.1.104, referentes à suas condições sócio-familiares e económicas), resulta fundamentalmente:
A actividade da arguida traduziu-se essencialmente na cooperação com o referido I e a arguida A na intermediação de venda ou no transporte de quantidades assinaláveis de heroína, conforme a seguinte síntese, que se perfilha, constante de fls. 3505 do douto acórdão de 1ª instância:
-«em Janeiro de 2000, na sequência de contacto da C, comprometeu-se a arranjar a heroína por aquela pretendida;
-para o efeito, contactou o I, que lha entregou;
-transportou dentro do seu veículo Audi para o "Continente" cerca de um quilo de heroína;
-recebeu da C os 4.800.000$00 do preço do quilo de heroína;
-entregou tal droga ao R;
-foi levar aquele dinheiro ao I;
-deste recebeu 100.000$00 em compensação;
-em Abril de 2000, entregou à C, depois de um contacto, um saco com produto estupefaciente e levou de volta o saco com o dinheiro do preço;
-possuiu outro saco de conteúdo similar e para igual fim, cuja entrega à C não concretizou, por razões alheias à sua vontade;
-transportava no seu veículo a A em negócios de droga;
-arranjou e entregou à A 20 quilos de "traço holandês", dela recebendo o preço de 5.400.000$00;
-projectou com a A negócio igual, não concretizado;
-em 23 e 24 de Maio de 2000, conduziu no seu Audi a A a entregar e a receber as 300 gramas de heroína relativas ao F;
-transportou essas 300 gramas de heroína e guardou-as na sua residência, onde lhe foram apreendidos, sendo parte de uma encomenda de meio quilo que lhe fizera;
-no dia 25 de Maio de 2000 deslocou-se a Tuy, com a A, no seu Audi, ocasião em que aquela comprou cerca de um quilo de heroína e recebeu uma amostra de cerca de 27 gramas de cocaína;
-parte desta heroína destinava-se a completar a encomenda de meio quilo que fizera à A.»
Relativamente às suas condições sócio-familiares e económicas, resultou essencialmente provado: «a arguida B descende de família harmoniosa e economicamente estável, teve um percurso escolar regular tendo feito o ensino secundário, está separada do marido há cerca de um ano, tem um filho de 3 anos confiado aos avós maternos, tem salão de cabeleireiro, vivia com os pais, no EP tem visitas; o produto apreendido na sua residência havia sido entregue à arguida pela A no dia anterior; teve empregos, nomeadamente como cabeleireira, e negócios, tinha algumas dívidas, contraiu empréstimo bancário, a A ajudava-a economicamente; à data dos factos estava separada de facto; é mãe de um rapaz com 3 anos, que lhe é afectivamente muito ligado, dado que o pai nunca lhe deu nem dá qualquer atenção, por isso, o afastamento forçado da mãe trouxe ao menor problemas psicológicos, necessitando de apoio médico constante.»
Não tem antecedentes criminais e confessou parcialmente os factos.
Está a ser tratada de tuberculose pulmonar no estabelecimento prisional.
Da globalidade do factualismo apurado não resulta efectivamente que a arguida B tenha agido obtendo ou procurando obter compensações económicas que possam considerar-se integrantes do elemento jurídico constitutivo da agravante qualificativa da al. c) do art. 24º do DL nº 15/93, sendo correcta a sua incriminação apenas pelo art. 21º, nº 1, deste diploma.
Considerando a pena abstracta de 4 a 12 anos de prisão, cominada nesta norma, e apreciando os factos provados à luz dos critérios e factores constantes dos arts. 40º e 71º do C:P, avaliemos da justeza da impugnação da medida da pena aplicada.
A ilicitude da conduta da arguida B é elevada, já que, embora se revele actuação sua em benefício essencialmente da A e do I, intervindo como intermediária ou no transporte ou guarda de heroína, sem que se provem ganhos assinaláveis da sua parte, a sua intervenção, pela quantidade de produtos estupefacientes intermediados, ajudados a transportar no seu próprio veículo ou guardados, importa a colaboração significativa em actividades de tráfico já de assinalável vulto, envolvendo acentuado perigo para a saúde pública, bem jurídico visado proteger com a referida incriminação.
A intensidade do dolo corresponde claramente à de dolo directo persistindo ao longo da sua actividade de colaboração com a A e o I.
As suas indiciadas dificuldades financeiras e familiares, estas aliadas à situação de separação do marido, filho da A, de quem tem um filho de três anos sofrendo com a falta de qualquer atenção do pai, e o apoio que a A lhe dava enquadram em alguma medida o circunstancialismo da sua actuação.
A ausência de antecedentes criminais e a confissão parcial dos factos militam a seu favor.
Considerada a globalidade complexiva de todo o circunstancialismo apurado, a pena de seis anos e seis meses de prisão apresenta-se como razoavelmente adequada aos critérios legais. Respeita o limite máximo da medida correspondente ao grau de culpa; satisfaz equilibradamente as necessidades concretas de prevenção geral positiva ou de integração, ainda que elevadas atento o justificado sentimento comunitário de reprovação e insegurança face ao grave desvalor, consagrado na lei, das frequentes condutas de tráfico de estupefacientes; e dentro da «moldura de prevenção geral», a fixar razoavelmente entre os cinco anos e seis meses e os oito anos e seis meses de prisão, corresponde satisfatoriamente às exigências concretas de prevenção especial de socialização que, embora sem dúvida muito significativas, não se mostram de grau acentuadamente muito elevado, tendo em conta a ausência de antecedentes criminais, a confissão parcial dos factos e uma ligação maternal positiva a um filho pequeno dela muito carente, constituindo com boa probabilidade, espera-se, mais um estímulo a um juízo de severa auto-crítica relativamente à elevada gravidade da sua muito reprovável conduta e a um processo de real arrependimento e de efectiva reinserção conducente a uma posterior vida em liberdade sem prática de quaisquer crimes, como é seu dever, e com equilibrada realização pessoal, familiar e societária, como é seu interesse.
Procede assim, apenas parcialmente, este fundamento do recurso da arguida B.
V.2
Apreciando agora a segunda questão que a arguida B colocou no seu recurso, assim sintetizada:
b) Deve ser revogada a decisão do Tribunal da Relação que decretou a perda a favor do Estado do veículo Audi, modelo A3, matrícula OC, porque violadora do disposto no art. 35º, nº 1, do citado DL nº 15/93, uma vez que não pode concluir-se do factualismo apurado «que existe no caso uma relação de causalidade significativa e jurídico penalmente relevante entre a utilização da referida viatura automóvel e a prática de factos ilícitos»?
A questão tem de ser resolvida apreciando, à luz da disposição dos arts. 35º e 36ºdo referido DL nº 15/93 (que por especiais afastam, quanto à previsão coincidente, as normas gerais dos arts. 109º e 110º do C.P.), os factos provados relativamente à utilização do aludido veículo.
Conforme temos entendido e é jurisprudência dominante (8), em matéria de infracções previstas no citado diploma a declaração de perda de objectos a favor do Estado deverá ocorrer sempre que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de alguma dessas infracções ou que por esta tiverem sido produzidos, considerando-se indispensável, mas também bastante, para a integração da primeira previsão (relativa aos objectos servindo ou destinados a servir para a prática da infracção) que a relação do objecto com a prática do crime se mostre significativamente marcante, numa perspectiva de causalidade adequada, para que a infracção se verifique em si mesma ou na forma de que se revestiu.
É essa relação que resulta dos factos provados relativamente à utilização do veículo em causa na prática de factos fundamentalmente integrantes do crime por que é condenado.
Verifica-se efectivamente do factualismo apurado (cf. nºs 2.1.3., 2.1.6. 2.1.49., 2.1.53., 2.1.55.) que a arguida utilizou o automóvel por mais do que uma vez para transportar quantidades elevadas de heroína traficada, na sua actividade de colaboração com o I, a C e a A, revelando-se essa utilização não acidental e com clara efeito na facilitação significativa da actividade de tráfico, conforme bem entendeu o douto acórdão recorrido.
E, conforme decidiu esse acórdão, o facto de o veículo se encontrar registado em nome de terceiro não obsta à declaração de perda a favor do Estado, ainda que sem prejuízo do que porventura viesse a ser decidido em incidente deduzido nos termos do art. 36º do DL nº 15/93.
Improcede assim este fundamento do recurso.
VI.
Apreciemos agora a primeira questão colocada pela recorrente A, acima sintetizada da forma seguinte:
a) Conforme questão prévia colocada pelo Ministério Público no seu recurso para o Tribunal da Relação, com base no disposto no art. 119º, al. c), do C.P.P., o processado deve ser anulado a partir da entrada em juízo do requerimento de fls. 4021 e 4022, no qual essa recorrente indicou testemunha para provar justo impedimento, invocado nos termos art. 107º, nº 2 do C.P.P., de apresentação do seu recurso para aquele Tribunal fora do prazo estabelecido na lei, uma vez que, após inquirição da testemunha, o justo impedimento foi considerado existente e, em conformidade, admitido o recurso, sem que tenham sido ouvidos, como aquela norma impõe, os outros sujeitos processuais, nomeadamente o Ministério Público, que não foi notificado da inquirição, em cujo acto não esteve presente, como o não foi igualmente da decisão que julgou verificado o justo impedimento, integrando a falta de participação do Ministério Público a nulidade insanável prevista no citado art. 119º, al. c), do C.P.P.?
O evento processual a que a questão respeita caracteriza-se, em síntese, do seguinte modo:
A arguida A invocou justo impedimento de pagamento, em prazo, de multa necessária, nos termos do art. 145º do C.P.C., ex vi do art. 107º do C.P.P., à admissão do recurso por si interposto do douto acórdão de 1ª instância para o Tribunal da Relação do Porto.
Inquirida a testemunha indicada, foi, por despacho judicial de 26/03/02, considerado existente o invocado impedimento e autorizado o pagamento (fls. 4027), após o qual foi admitido o recurso (fls. 4044).
O Exmo. Magistrado do Ministério Público não fora porém notificado da designação da data para inquirição da testemunha, não estivera presente na inquirição e não fora notificado do despacho reconhecendo o impedimento.
Foi depois defendido pelo Ministério Público e reconhecido no douto acórdão do Tribunal da Relação estar-se face a uma nulidade insanável, prevista no art. 119º, al. b), do C.P.P., decorrente de o Ministério Público estar ausente do referido acto de inquirição, concluindo-se que, perante a consequente invalidade desse acto e dos consequentes actos relacionados com a admissão do recurso (cf. art. 122º, nº 1, do C.P.P.), haveria que repetir o acto de inquirição para se averiguar da existência do invocado impedimento.
O douto acórdão recorrido decidiu porém não determinar essa repetição, por entender que, mesmo que viesses a ser entendido como tempestivo o recurso, o conhecimento deste estava prejudicado, em virtude da procedência do recurso do Ministério Público, a propósito do qual haviam sido apreciadas as questões pretendidas suscitar pela recorrente A no recurso por si interposto.
Apreciando:
Salvo o devido respeito, entendemos não se verificar a referida nulidade insanável, pois que da letra e do espírito do art. 119º, al. a), do C.P.P., também iluminado pelo sentido restritivo do sistema de nulidades do actual C.P.P., com a consequente exigência de cominação expressa (cf. art. 118º do C.P.P), resulta que essa norma, ao referir-se à ausência do Ministério Público a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência, abrange nessa previsão de causa de nulidade insanável apenas os casos de falta da presença do Ministério Publico em actos relativamente aos quais seja de depreender que a lei exige essa presença, por referência expressa, ou, pelo memos, por decorrência evidente da natureza e importância do acto. O que manifestamente não se verifica na situação em causa.
Estamos pois face a uma irregularidade (art. 118º, nº 2, do C.P.P.).
Irregularidade porém sanada decorridos que foram três dias após a posterior intervenção nos autos, em 02/04/03, do Ministério Público promovendo a renovação da 1ª parte de despacho de cuja segunda parte constava até a designação de dia para inquirição da testemunha indicada para prova do invocado impedimento (cf. fls. 4031 e 4018), sem que tenha sido arguida a irregularidade (cf. art. 123º, nº 1, do C.P.P.).
O despacho judicial de 1ª instância que admitiu o recurso é pois válido, o mesmo sucedendo com despacho de sua admissão pelo Tribunal da Relação.
Nada impedia pois o conhecimento directo do recurso, não podendo, salvo o devido respeito, considerar-se prejudicado esse conhecimento por força da procedência do recurso do Ministério Público. O direito ao recurso, consignado no art. 32º, nº 1, da C.R.P. implica o pleno exercício dos poderes correspondentes e a pronúncia directa sobre as questões colocadas nas conclusões da respectiva motivação, com a decisão de cada uma delas e a sua fundamentação com referência à argumentação do recorrente.
Deve pois ser conhecido pelo Tribunal da Relação o recurso interposto pela arguida A para esse douto Tribunal.
Fica assim prejudicado o conhecimento das restantes questões que resultam das conclusões da motivação do recurso interposto por essa arguida do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto.
VII.
Em conformidade, revoga-se parcialmente o aliás douto acórdão recorrido, decidindo-se:
a) Declara-se inválido o meio de prova constituído pela referência em julgamento, pelos Elementos da Polícia Judiciária que haviam procedido a busca na habitação do arguido D, de declaração, como sendo feita por este no acto da busca e não transcrita no respectivo auto, de que «Se houver droga fora de casa, não é nossa». Meio de prova que, em conformidade, não pode ser tido em conta, não se revestindo portanto, contrariamente ao que foi considerado no douto acórdão recorrido, de qualquer relevância para fundamentar a decisão sobre a prova dos factos imputados ao ora recorrente.
b) Considera-se não provado que o arguido D destinasse a heroína, que foi apreendida e se provou deter, a ser vendida, depois de misturada com os produtos também apreendidos (paracetamol e cafeína), com o propósito de obter lucros traduzidos em avultada compensação monetária;
c) Considera-se que os actos provados relativamente ao arguido D integram crime de tráfico ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, n.º 1, do DL n.º 15703, de 22/01, pelo qual vai condenado na pena de cinco anos de prisão.
d) Fixa-se em seis anos e seis meses de prisão a pena aplicada à arguida B pela prática, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, n.º 1, do DL n.º 15/03, de 22/01;
e) Determina-se o conhecimento pelo Tribunal da Relação do Porto do recurso interposto para esse Tribunal pela arguida A do douto acórdão de 1.ª instância.
Confirma-se no mais o douto acórdão recorrido.
Sem custas relativamente ao recurso da arguida A .
São devidas custas pelos recorrentes D e B, fixando-se a taxa de justiça respectivamente em 10 e 9 Uc.
Fixam-se em 100 Euros os honorários à Exma. Defensora Oficiosa, a quem devem ser pagas as despesas seguidas a fls. 410 v.
Elaborado pela relator e revisto.
Lisboa, 9 de Julho de 2003
Armando Leandro
Virgílio Oliveira
Soreto de Barros
Flores Ribeiro
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(1) Tal liberdade, cujo grau de vinculação radica na permanente tensão entre as regras fundamentais de um Estado-de-Direito democrático, particularmente as vertidas nos compêndios constitucional e processual penal, e as da busca da verdade material como condição de realização concreta da Justiça e da sua própria subsistência, se tem de ser exercida com exigência e rigor, não pode, contudo, à custa de extremos e exageros, porventura até de adesão mais cómoda, deixar-se entorpecer pela busca de juízos matematicamente infalíveis ou por engenhosos e oportunos argumentos especulativos, transcendentes, sob pena de essencialmente deixar de o ser e de o julgamento passar à margem da verdadeira, fundamental e íntima convicção dos Juízes, com o risco indesejável de, assim, o Tribunal abdicar da sua soberana função de julgar em nome da comunidade. Sobre a livre convicção, cfr. Ac. STJ, de 15/6/2000, in CJ (S), Ano VIII, Tomo II, pág.228 e 229.
(2) Sobre o princípio da livre apreciação da prova e artº. 127º., CPP, cfr., ainda,: Prof. Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, 1º. Volume, pág. 203 e 205; sobre prova directa, prova indiciária e regras da experiência, cfr. Ac. STJ, de 8/11/95 (BMJ 451/86), Ac. STJ, de 25/2/99 (BMJ 484/288), Ac. STJ, de 3/3/99 (BMJ 485/248); Ac. R. Coimbra, de 6/3/96, in CJ-XXI-II-44; e de 9/2/2000, in CJ-XXV-I-51.
(3) Prestaram declarações apenas 4 dos arguidos, tendo sido ouvidas (indicadas pela acusação e defesa) 41 testemunhas, parte das quais comuns, cujos depoimentos se encontram gravados em 22 cassetes com cerca de 32 horas de duração, e exibido e explicado um filme.
(4) Neste sentido, cf., v.g., Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 1999, pp. 157 e 158, Acs. do S.T.J. de 29/01/92, CJ, Ano XVII, 1992, I, p. 22, de 10/01/01, proc. nº 2539/00, de 07/02/01, proc. nº 4/00-3ª, de 11/07/01, proc. nº 1796-01-3ª, de 30/10/01, proc. nº 2730-01-3ª, de 03/10/02, proc. nº 2804-02-5ª.
(5) Cf., v.g., a proficiente fundamentação do Ac. do S.T.J. para fixação de jurisprudência, de 11/2/98, proc. nº 281/98, relatado pelo Ex.mo Juiz Conselheiro Leonardo Dias, Acs. do S.T.J. de 18/02/98, proc. nº 1086/97, de 18/03/98, proc. nº 151/98, de 30/10/01, proc. nº. 2630-01-3ª, de 02/07/02, proc. nº. 611/02-3ª.
(6) Cf., v. g., M de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Primeiro Volume, pp. 198 e ss., Germano Marques da Silva, Acs. do S.T.J de 03/03/99, Proc. nº 29/99-3ª, de 07/07/99, proc. nº 348/99-3ª, de 27/10/99, proc. nº 98/99-3ª, de 14/10/99, proc. nº 715/99-5ª, de 16/01/02, proc. nº3649/01-3ª.
(7) Repare-se que o saco foi avistado, por um elemento da Polícia Judiciária que procedia à busca, de uma janela que se encontrava aberta, «em manhã de frio», da casa de habitação do arguido, que o saco, contendo outros sacos, foi encontrado na direcção da janela, na vertical, junto ao passeio, e que os sacos se apresentavam «rebentados», largando «pó» (cf. resumo dos depoimentos, referidos como fundamentos da convicção, dos elementos da Polícia Judiciária L, M' e H').
(8)Cf., v. g., Acs. do S.T.J. de 15/12/99, proc. nº 807/99-3ª, de 21/02/01, proc. nº 2814/00- 3ª, de 04/02/02, proc. nº 32-02-3ª, de 14/02/02, proc. nº 3217-02-5ª, de 13/11/02, proc. nº 2796-02-3ª, de 18/12/02- 3ª.