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CONTRATO-PROMESSA
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
MORA DO DEVEDOR
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
PERDA DE INTERESSE DO CREDOR
RESTITUIÇÃO DO SINAL
ACTUALIZAÇÃO
OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA
Sumário
I - A simples mora do devedor não confere ao credor o direito de resolver o contrato, para se considerar desvinculado da promessa. II - Só com o incumprimento definitivo há lugar à resolução do contrato. III - A mora dos réus pode converter-se em incumprimento definitivo pela perda objectiva do interesse do credor na prestação. IV - No caso concreto, as circunstância apuradas evidenciam um manifesto desinteresse na execução do contrato promessa, sendo comum a ambas as partes essa perda objectiva do interesse contratual. V- No pedido de restituição do sinal em dobro, está implícito o pedido de resolução do contrato promessa. VI - O facto do não cumprimento ser imputável, em igual medida, a ambas as partes, não deve precludir o direito de resolução de uma delas nos contratos com contraprestações correspectivas. VII - Se as culpas dos dois contraentes forem iguais, apenas deve ser restituído o sinal em singelo. VIII - A obrigação de restituição do sinal não pode qualificar-se como dívida de valor. IX - A obrigação de restituição do sinal ou do seu pagamento em dobro constitui dívida pecuniária, sujeita ao princípio nominalista constante do art. 550 do C.C. e à aplicação do regime do seu art. 806, no caso de mora.
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
Em 7-5-93, A, B e C instauraram a presente acção ordinária contra os réus D e E, pedindo a condenação solidária destes no pagamento da quantia de 24.000.000$00, correspondente ao dobro do sinal que prestaram no contrato promessa de cessão de quotas entre eles celebrado, que constitui documento de fls 7 e segs, por não terem sido notificados pelos réus para a realização da escritura, a quem cabia a sua marcação".
Os "réus" contestaram, "por" excepção e por impugnação.
Em reconvenção, pediram a condenação dos autores a pagar-lhes a quantia de 2.635.277$00, pelos danos causados com a gestão da exploração do estabelecimento Café F, no período compreendido entre 11-10-90 e 20-8-92, acrescida do que se vier a liquidar em execução de sentença.
Houve réplica.
Foi admitida a intervenção principal de G, como associado dos autores.
Realizado o julgamento e apurados os factos, foi proferida sentença que julgou improcedentes a acção e a reconvenção.
Em recursos autónomos, apelaram o autor C, por um lado, e os demais autores, por outro, tudo na parte referente ao pedido accional.
A Relação de Lisboa, concedendo parcial provimento aos recursos, julgou a acção parcialmente procedente e condenou os réus a restituir aos autores a quantia de 12.000.000$00, que fora entregue a título de sinal, absolvendo os réus do demais pedido.
Em recursos autónomos, pedem revista:
- o autor C;
- os autores A e B;
- os réus D e E.
O autor C conclui:
1 - Não tendo os réus notificado os autores, nem dentro nem após o prazo de 90 dias estipulado, ter-se-á de considerar o incumprimento definitivo do contrato por parte dos réus.
2 - Como se está perante uma obrigação com prazo certo, não era necessário qualquer interpelação por parte dos autores, a fixar novo prazo para cumprimento da obrigação.
3 - Por outro lado, como um dos sócios dos réus entregou aos autores as chaves do estabelecimento em questão, sempre se teria operado a revogação do contrato promessa por parte dos réus.
4 - Deve ser imputado aos réus o incumprimento definitivo do ajuizado contrato promessa, condenando-se os réus em conformidade com o pedido formulado na petição inicial.
5 - Os réus também devem ser condenados no pagamento de juros desde a data da mora, ou seja, a partir de 90 dias após a celebração do contrato promessa e até integral pagamento.
6 - Foram violados os arts 442, nº2, 805 nº1, al. a), 806 e 808, todos do Cód. Civil.
Os autores A e B concluem:
1 - Não se questiona a condenação dos réus na restituição da quantia de 12.000.000$00.
2 - Mas os réus também devem ser condenados no pagamento de juros de mora, à taxa legal supletiva decorrente do art. 102, parágrafo 3º, do Cód. Comercial, desde a data da citação até efectivo pagamento,
3 - Para a hipótese de assim não ser entendido, deve proceder-se à actualização do valor da quantia a restituir pelos recorridos, por confronto entre o momento em que a quantia lhes foi entregue e o tempo decorrido até à presente data, mercê da desvalorização da moeda entretanto ocorrida e de acordo com os índices anuais da inflação publicados pelo INE.
4 - Ao não considerar os efeitos do tempo decorrido e do fenómeno inflacionário sobre esta obrigação, o tribunal penaliza, inadmissivelmente, a posição dos autores, enquanto credores, fazendo recair sobre estes as consequências de uma justiça quer acaba por ser quase puramente formal, porque demasiado atrasada no tempo.
5 - A desvalorização da moeda é um facto notório, não carecendo de alegação nem de prova - art. 514, nº1, do C.C.
6 - A dívida aqui em causa encontra-se subtraída ao princípio nominalista constante do art. 550 do C.C., sendo passível de correcção ao abrigo do disposto no art. 551 do mesmo diploma.
Os réus concluem:
1 - A Relação não podia alterar a resposta ao quesito 1º, considerando-o provado, atenta a manifesta carência de prova.
2 - Os réus foram condenados a restituir a dita importância de 12.000.000$00, por ter sido considerado que nem os autores nem os réus tinham incumprido o contrato promessa, mas que houve uma caducidade atípica, havendo que restituir o sinal em singelo, com base nas regras do enriquecimento sem causa.
3 - Todavia, não houve qualquer enriquecimento sem causa por parte dos réus, já que os autores tiveram a posse efectiva do estabelecimento e os réus nada receberam indevidamente.
4 - O que aconteceu foi que os autores, na posse do estabelecimento, deixaram de se interessar quanto à sua gestão e ao seu futuro, e revelaram ter perdido o interesse no cumprimento do contrato promessa.
5 - Se houve enriquecimento sem causa, foi por parte dos autores, que desde Outubro de 1990 até Agosto de 1992 geriram e fizeram uso daquele estabelecimento, tendo certamente auferido rendimento de montante superior ao que entregaram, a título de sinal.
6 - O Acórdão recorrido deve ser revogado e ter-se em consideração que, nos termos do art. 475 do C.C., não há lugar à restituição se, ao efectuar a prestação, o autor sabia que o efeito com ela previsto era impossível, ou se agindo contra a boa fé impediu a sua verificação.
Só os réus contra-alegaram no recurso dos autores.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
Remete-se para todos os factos que foram considerados provados pela Relação, constantes do Acórdão recorrido e que aqui se dão por reproduzidos, ao abrigo dos arts. 713, nº6 e 726 do C.P.C.
Dentre eles, destacam-se os seguintes:
1 - Em 11 de Outubro de 1990, foi celebrado entre os autores e o interveniente Ruela, como promitentes cessionários, e os réus, como promitentes cedentes, o contrato escrito de fls 7 e 8, intitulado de "Contrato promessa de cessão quotas e recibo de quitação".
2 - Tal contrato ficou subordinado às seguintes cláusulas (na parte com interesse para a decisão dos recursos):
a) - Os ora réus, ao abrigo do contrato promessa de cessão de quotas celebrado com os actuais e únicos donos da sociedade "Café F", são cessionários das quotas representativas da totalidade do capital social da referida sociedade;
b) - Pelo aludido contrato promessa de 11-10-90, os ora réus cedem a sua posição contratual de cessionários aos ora autores e interveniente, obrigando-se a obter, dos únicos e actuais sócios da dita sociedade "Café F", a celebração da respectiva escritura;
c) - O preço global da referida cessão é de 35.000.000$00, que os ora autores e interveniente pagarão aos ora réus, pela seguinte forma:
- na data da assinatura do contrato promessa, a quantia de 14.000.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento, montante de que os ora réus deram quitação;
- A quantia de 12.000.000$00, em oito prestações trimestrais, iguais e sucessivas de 1.500.000$00, tituladas por cheques emitidos na data da escritura, vencendo-se a primeira em 11-1-91 e a última em 1-10-92;
- Em 11 de Janeiro de 1993, a quantia de 9.000.000$00, titulada por cheque, com datada escritura.
d) - Os ora autores, promitentes cessionários, entram na posse e exploração do estabelecimento da sociedade, no dia seguinte ao da assinatura do contrato promessa, sendo da sua responsabilidade todos os actos de gestão por eles praticados.
e) - A escritura pública será celebrada no prazo máximo de 90 dias, em dia, hora e Cartório Notarial a indicar, por qualquer meio, pelos ora réus.
3 - Com a assinatura do contrato, os ora autores pagaram aos ora réus a quantia de 14.000.000$00.
4 - Da referida quantia, cada um dos ora autores pagou aos ora réus a importância de 4.000.000$00 e o interveniente Ruela 2.000.000$00.
5 - No dia seguinte ao da outorga do contrato promessa, os ora autores entraram na posse e exploração do estabelecimento comercial da sociedade.
6 - Os autores e o interveniente mantiveram-se à frente do Café F, gerindo-o, até Agosto de 1992.
7 - Em Agosto de 1992, o interveniente G entregou as chaves do Café F ao ora réu, D.
8 - A sociedade "Café F", tem por sócios J e D.
9 - Por sua vez, em 1-7-91, foi outorgado entre os aqui autores e o interveniente, como promitentes cedentes, e H e mulher I, como promitentes cessionários, o contrato titulado pelo escrito de fls 48 e 50, intitulado "Contrato promessa de cessão de quotas e recibo de sinal", donde constam, entre outras, as cláusulas seguintes:
- Os ora autores e interveniente, ao abrigo do contrato promessa de cessão de posição contratual, celebrado com os actuais e promitentes cessionários da sociedade Café F, prometem ceder a sua posição contratual de cessionários das quotas representativas da totalidade do capital social da mesma sociedade aos indicados H e mulher, obrigando-se a obter dos únicos e actuais sócios da dita sociedade a celebração da escritura pública respectiva;
- O preço global da referida cessão é de 42.000.000$00;
- Os promitentes cessionários deste contrato entram na posse do estabelecimento da sociedade no dia 2 de Julho de 1991;
- A escritura será celebrada logo que toda a documentação se encontre devidamente em ordem, devendo ser assinada até 30-7-91, podendo este prazo ser prorrogado por acordo dos outorgantes e devendo a escritura ser marcada pelos promitentes cessionários H e mulher.
As questões a decidir nas diversas revistas, pela sua ordem lógica, são as seguintes:
1 - A Relação não podia considerar provada a resposta ao quesito 1º, por inexistência de prova nesse sentido.
2 - Os réus devem ser condenados a restituir o dobro do sinal, nos termos solicitados na petição, com base no incumprimento definitivo do contrato promessa, imputável aos mesmos réus:
- por não terem notificado os autores para a outorga da escritura, no prazo fixado;
- por terem operado a revogação do mesmo contrato, por via da entrega das chaves do estabelecimento que um dos réus fez aos autores.
3 - A restituição do sinal em singelo não pode fundar-se no enriquecimento sem causa, por não ter havido qualquer enriquecimento dos réus.
4 - Os réus devem ser condenados no pagamento de juros, desde a data da mora, sobre o montante a restituir.
5 - Em caso negativo, deve proceder-se à actualização do valor da quantia a restituir, mercê da desvalorização da moeda entretanto ocorrida e de acordo com os índices da inflação.
Desde já se pode adiantar que todos os recorrentes carecem de razão.
1.
Resposta ao quesito 1º:
Aos factos fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, nos termos do art. 729, nºs 1 e 2 do C.P.C.
O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova - art. 722, nº2, do C.P.C.
Ora, não ocorre aqui nenhum dos casos especiais previstos na última parte, do nº2, do citado art. 722.
Por isso, a decisão da Relação, quanto à resposta ao quesito 1º, não pode ser alterada.
2.
Restituição do sinal:
A Relação julgou que não ocorreu incumprimento definitivo do contrato imputável aos réus, por falta de marcação da escritura, mas simples mora e que se verificou uma perda objectiva do interesse contratual, comum a ambas as partes, determinante da extinção da relação contratual, pelo que determinou a restituição do sinal em singelo, no valor de 12.000.000$00, por aplicação dos princípios do enriquecimento sem causa.
Que dizer?
Abre-se aqui um parêntesis para salientar que, embora resultasse provado que o sinal foi de 14.000.000$00, os autores só pediram, na petição inicial, a restituição de 24.000.000$00, que indicaram como correspondente ao dobro do sinal, sendo certo que nas alegações e nas conclusões das respectivas revistas não impugnam a quantia de 12.000.000$00, como correspondente ao sinal em singelo.
Pois bem.
O direito de resolução do contrato previsto nos arts 432 e segs do Cód. Civil é um direito potestativo extintivo dependente de um fundamento, que é o facto do incumprimento ou a situação de inadimplência.
A simples mora do devedor não confere ao credor o direito de resolver o contrato, para se considerar desvinculado da promessa.
Só com o incumprimento definitivo há lugar à resolução do contrato e à possibilidade de restituição do sinal em dobro, nos termos do art. 442, nº2, do C.C. (Ac. S.T.J. de 2-12-92, Bol. 422-435; Ac. S.T.J. de 25-2-93, Bol. 424-654;
Ac. S.T.J. de 24-10-95, Col. Ac. S.T.J., III, 3º, 78; Ac. S.T.J. de 19-3-96, Bol. 455-488; Ac. S.T.J. de 27-11-97, Bol. 471-388; Ac. S.T.J. de 10-12-97, Col. Ac. S.T.J., V, 3º, 164, Ac. S.T.J. 21-5-98, Bol. 477-460; Ac. S.T.J. de 26-5-98, Col. Ac. S.T.J, VI, 2º, 100; Ac. S.T.J. de 8-2-00, Col. Ac. S.T.J., VIII, 1º, 72).
No caso concreto, foi fixado o prazo de 90 dias para a realização da escritura, a contar da celebração da promessa, cabendo o ónus da respectiva marcação aos réus.
Todavia, decorreu esse prazo sem que a escritura do contrato prometido tivesse sido realizada.
Os réus (promitentes cedentes) não provaram que tivessem procedido á marcação da escritura, mas também não resultou provado que os autores (promitentes cessionários) alguma vez tivessem interpelado os réus para tal fim ou que, eles próprios, procedessem à marcação daquela escritura.
Como dos termos do contrato promessa não advém que o prazo estabelecido para a outorga da escritura possa ser interpretado como sendo um prazo limite, absoluto e essencial, o contrato não caducou, decorrido o prazo fixado no contrato promessa.
Há apenas uma situação de mora, nos termos do art. 804, nº2, do C.C., motivada pelo retardamento na outorga da escritura, pois a prestação ainda é possível.
Qualquer das partes podia sair dessa situação mediante a competente interpelação ou marcação da escritura.
Essa mora dos réus poderá converter-se em incumprimento definitivo por qualquer das duas vias previstas no art. 808, nº1, do C.C.:
- perda objectiva do interesse do credor na prestação;
- interpelação com a fixação de um prazo certo e suplementar, com a advertência de que o não cumprimento do mesmo importa a perda de interesse na celebração do contrato.
Já vimos que não houve fixação de novo prazo, nem interpelação admonitória.
Mas as circunstâncias do caso evidenciam um manifesto desinteresse na execução do contrato, sendo comum a ambas as partes essa perda objectiva do interesse contratual, como já se deixou evidenciado no Acórdão recorrido.
Com efeito, não tendo os réus procedido à marcação da escritura no prazo inicialmente previsto, os autores também nunca a marcaram, nem interpelaram os réus para a sua outorga.
Todos se desinteressaram do negócio: os autores deixaram de explorar o café e um dos réus aceitou receber as respectivas chaves, que lhe foram entregues pelo interveniente Ruela, embora em circunstâncias que não ficaram totalmente definidas.
Daí a possibilidade de resolução do contrato, por perda do interesse na sua execução, objectivamente apreciada, comum a ambos os contraentes.
No pedido de restituição do sinal em dobro está implícito o pedido de resolução do contrato promessa.
O facto do não cumprimento ser imputável, em igual medida, a ambas as partes, não deve precludir o direito de resolução de uma delas nos contratos com prestações correspectivas (Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, pág. 292/294).
No caso de incumprimento imputável em igual medida a ambos os contraentes, o facto ou a situação que fundamenta o direito de resolução existe.
Esse facto ou essa situação é o inadimplemento ou a situação de inadimplência, objectivamente apreciados.
Consequentemente, para existir o direito de resolução, basta a verificação do incumprimento, desde que objectivamente valorado, se apresente suficientemente relevante, segundo os princípios da boa fé.
A culpa não é pressuposto essencial do direito de resolução.
Se o incumprimento é imputável à parte que prestou o sinal, a sanção indemnizatória é a perda deste; se o incumprimento é imputável à parte que recebeu o sinal, a sanção indemnizatória é a restituição em dobro ou o aumento do valor da coisa verificado entre a celebração e o não cumprimento, no caso de promessa de compra e venda com traditio rei - art. 442, nº2, do C.C.
Se as culpas dos dois contraentes forem iguais, "a indemnização deve ser excluída, devendo o accipiens, porém restituir o sinal em singelo, pois não se vê a que título possa retê-lo legitimamente.
É que tal restituição não reveste natureza indemnizatória, sendo antes mera consequência da resolução - equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou à anulabilidade (arts 433 e 434) - que tem eficácia retroactiva, pelo deve ser restituído tudo o que tiver sido prestado (art. 289 e 433)" - Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, pág. 292).
É o caso.
Não há, pois, que trazer à colação as regras do enriquecimento sem causa, quanto à decretada restituição do sinal em singelo.
3.
Juros de mora:
Os autores pretendem que os réus também sejam condenados no pagamento de juros de mora sobre o montante do sinal de 12.000.000$00, que estes estão obrigados a restituir.
Entende o recorrente C que os juros devem ser contados desde a data da mora dos réus, ou seja, a partir do decurso de 90 dias após a celebração do contrato promessa.
Pugnam os recorrentes A e B pela condenação em juros de mora desde a data da citação.
Mas não pode ser.
Isto pela simples, mas decisiva razão, de que os autores não formularam, oportunamente, o competente pedido de condenação dos réus no pagamento de juros de mora.
A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir - art. 661, nº1, do C.P.C.
Enquanto o art. 660 se refere ao âmbito do poder de cognição do tribunal, o referido art. 661, nº1, traça os limites da condenação a proferir, de modo que, por respeito ao princípio dispositivo, a decisão se contenha, em substância e quantidade, dentro do pedido formulado.
O pedido de juros podia ter sido deduzido na petição inicial ou, posteriormente, mediante ampliação do pedido inicial, na réplica ou até ao encerramento da discussão em primeira instância - art. 273, nº2, do C.P.C.
Os autores não o fizeram.
Não podem agora fazê-lo nas alegações da revista, por ser inadmissível.
4.
Correcção monetária:
Os recorrentes A e B pretendem que se proceda à actualização da quantia do sinal que os recorridos foram condenados a restituir, referente a todo o período decorrido desde o momento em que tal montante lhes foi entregue e até ao presente, mercê da desvalorização da moeda entretanto ocorrida e de acordo com os índices da inflação.
Para tanto, alegam que a desvalorização da moeda é um facto notório, que não carece de alegação nem de prova, e que a dívida em questão se encontra subtraída ao princípio nominalista do art. 550 do C.C., sendo passível de correcção ao abrigo do disposto no art. 551 do mesmo diploma.
Mas sem razão.
A obrigação de restituição do sinal ou do seu pagamento em dobro constitui dívida pecuniária, sujeita ao princípio nominalista constante do art. 550 do C.C. e à aplicação do regime do seu art. 806, no caso de mora.
Como escreve Calvão da Silva (Sinal e Contrato-Promessa), 8ª ed. , pág. 96 /97), "o montante da prestação é uma soma de dinheiro fixada ab origine (leia-se desde a resolução do contrato) e não em momento posterior (à constituição da obrigação), próximo do cumprimento.
Pelo que não chega a verificar-se o fenómeno da substituição ou sub-rogação do primitivo objecto - uma utilidade diversa do dinheiro, como acontece na indemnização com a reparação do dano - por quantidade monetária que represente o equivalente no momento da liquidação.
Logo, se a prestação in solutione e in obligatione é (nominalmente) a mesma, a obrigação de restituição do sinal ou o seu pagamento em dobro não pode qualificar-se como dívida de valor.
Diferentemente do comum da obrigação de indemnização - dívida de valor convertida em obrigação pecuniária por ulterior fixação (convencional ou judicial) do seu montante em dinheiro - , a restituição do sinal ou seu pagamento em dobro tem por objecto directo e primitivo uma soma de dinheiro, determinado com base em critério certo, seguro e cómodo, o critério do quantum recebido a título de sinal e da sua multiplicação por dois ".
Neste sentido também tem decidido a jurisprudência (Ac. S.T.J. de 6-7-89, Bol. 389-556; Ac. S.T.J. de 9-12-93, I, 3º, 170; Ac. S.T.J. 9-1-97, Bol. 463-544; Ac. S.T.J. de 20-2-97, proferido no rec. 538/96, da 2ª Secção; Ac. S.T.J. de 30-6-98, Col. Ac. S.T.J, VI, 2º, 145).
Improcedem, pois, as conclusões de cada um dos três recursos interpostos.
Termos em que negam as revistas dos autores e dos réus.
Custas de cada um dos recursos pelos respectivos recorrentes.
Lisboa, 12 de Outubro de 2004
Azevedo Ramos
Silva Salazar
Ponce Leão