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INCAPACIDADE PERMANENTE PARCIAL
INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARCIAL
PENSÃO POR INCAPACIDADE
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
RETRIBUIÇÃO
Sumário
I - A retribuição diária a considerar para efeito do cálculo da indemnização por incapacidade temporária absoluta ou parcial, bem como a retribuição anual ilíquida a atender para efeito do cálculo da pensão por incapacidade permanente, resultantes de acidente de trabalho, poderá ser fixada a partir do valor hora quando tenha sido essa a modalidade de retribuição ajustada entre as partes (cfr. artigo 26°, n.°s 1 e 2, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro);
II - Assim, tendo-se provado que o sinistrado trabalhava 9 horas por dia e auferia € 5,50 por hora, desempenhando a sua actividade em 22 dias úteis por mês com aquele horário de trabalho, é possível fixar, para os aludidos efeitos, quer a retribuição diária, que corresponde ao produto de 9 vezes a retribuição horária, quer a retribuição anual ilíquida, que corresponde a 12 vezes a retribuição mensal, sendo esta a resultante do produto de 22 vezes a retribuição diária;
III - A norma do artigo 26°, n.° 2, da Lei n.º 100/97, ao reportar-se à retribuição anual ilíquida, não pretende significar que a pensão é calculada com base nas remunerações efectivamente auferidas durante um ano, e visa antes fornecer um critério para calcular a retribuição normalmente auferida pelo trabalhador tomando por base o período temporal de um ano;
IV - À luz da anterior proposição, a circunstância de o trabalhador ainda não ter completado um ano ao serviço do réu não impede que se calcule, com base nos elementos que se apuraram no processo, qual o montante anual que o trabalhador normalmente auferiria se prosseguisse a sua actividade.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
"AA", com os sinais dos autos, intentou a presente acção emergente de acidente de trabalho contra BB, pedindo a condenação do réu no pagamento do capital de remição de uma pensão anual vitalícia de € 1.750,65, desde 11 de Outubro de 2003, correspondente à incapacidade permanente absoluta, e de uma indemnização de € 7.515,32 por incapacidade permanente temporária, para além de outros encargos, em resultado do acidente de trabalho que sofreu quando se encontrava ao serviço do réu.
Em primeira instância, foi a acção julgada parcialmente procedente e o réu condenado a pagar ao autor o capital de remição de uma pensão anual vitalícia no valor de € 1.688,13, a indemnização por incapacidade permanente de € 9.691,61, e ainda a quantia de € 14,80 por despesas de transportes, em qualquer dos casos acrescida de juros de mora.
Para efeito do cálculo das pensões e indemnizações devidas, o tribunal tomou por base a retribuição anual ilíquida normalmente recebida pelo sinistrado (entendendo como tal o produto de 12 vezes a retribuição mensal, segundo a definição constante do artigo 26°, n.°s 2 e 4, da Lei 100/97, de 13 de Setembro), tendo chegado ao valor anual de € 13.068,00 por ter tomado em consideração que o sinistrado auferia € 5,50 por hora e trabalhava, pelo menos, 9 horas por dia em 5 dias por semana.
Em apelação, o réu suscitou, entre outras, a questão do montante da retribuição atendível para efeito do cálculo da pensão e da indemnização devidas pelo acidente, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa mantido o entendimento sufragado pela sentença recorrida.
É contra esta decisão que o réu de novo se insurge, circunscrevendo a sua discordância relativamente à aludida questão, e formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões:
1 ° - Na esteira do que já se pronunciou anteriormente, o ora recorrente não concorda com os termos ou fórmula de cálculo da retribuição utilizados pelo Tribunal, para efeitos de processamento da indemnização ao sinistrado.
2° - Não se tendo concluído pela existência de contrato de trabalho entre o recorrido (A.) e o recorrente (R.), foi no entanto considerado que o recorrido (A.) tem direito à reparação prevista para os acidentes de trabalho, face ao preceituado no n° 2, parte final do artigo 2° e no 1 do artigo 6°, ambos da Lei 100/1997, de 13 de Setembro e ainda face ao disposto no artigo 12°, n.° 3, do Decreto-Lei n° 143/99, de 30 de Abril.
3º - Não tendo efectivamente o recorrido (A.) provado que se encontrava vinculado por contrato de trabalho, na verdade, a retribuição a considerar para efeitos de cálculo da pensão a que tem direito, corresponderá ao produto de 12 vezes a retribuição mensal.
4º - Atendendo a que não foi provado quantos ou quais os dias da semana, como também não foi provado a retribuição mensal ilíquida do recorrido (A.), assim como não foi provado a retribuição diária (quando esta represente retribuição normalmente recebida), não pode o Tribunal para cálculo da retribuição que por sua vez vai servir de suporte para o cálculo da pensão anual vitalícia a atribuir ao recorrido (A.) utilizar a alegação por aquele efectuada na sua petição inicial que trabalhava de 2ª a 6ª, das 8:OOH às 13:0011 e das 14:OOH às 18:00H.
5° - Assim sendo, continua a entender o recorrente (R.,) que o critério mais razoável, dada a factualidade provada, para o cálculo da pensão será o critério da retribuição correspondente ao salário mínimo nacional que à data era no montante de € 348,01 mensais. Nessa medida:
12 X € 348,01 = € 4.176,12 - Retribuição Anual
€ 4.176,12 X 0,184543 X 0,70 = € 539,47 - Capital de remissão de uma Pensão anual e vitalícia.
6° - O que atrás foi dito relativamente à IPP, também vale agora para o cálculo das incapacidades temporárias, absoluta e parcial.
7° - Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, nesta parte, o acórdão recorrido, por ser de inteira justiça normas jurídicas violadas:
- artigos 17°; 26°; 31 ° todos da Lei n° 100/97, de 13 de Setembro.
O autor contra-alegou, defendendo a manutenção do julgado.
Colhidos os vistos dos Exmos juízes-adjuntos, cumpre apreciar e decidir.
2. Matéria de facto.
As instâncias deram como assente a seguinte factualidade:
1 - Em data não apurada do Verão de 2002, o A. foi admitido ao serviço do R. para exercer, por conta daquele, a actividade de pedreiro.
2 - O A. pegava ao trabalho às 8h e largava às 18h, fazendo pausa para almoço.
3 - No dia 13 de Novembro de 2002 o A. encontrava-se ao serviço do R., em Peniche, e em cima de um andaime.
4 - O A. possuía ferramentas de trabalho.
5 - O R. pagava ao A. € 5,50 por hora.
6 - No dia 13 de Novembro de 2002, encontrando-se o A. em cima de um andaime, o mesmo foi abalroado por um veículo automóvel, desequilibrando o A. e deitando-o ao chão.
7 - Em consequência o A. sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento, hematoma orbitário à direita, fractura incompleta da escama da omoplata direita, fractura dos 6° e 7° arcos costais esquerdos a nível posterior e luxação acrómio clavicular direita.
8 - O A. apresenta limitação conjugada da mobilidade do conjunto das articulações do ombro e cotovelo direitos (lado activo), grau II (a elevação do braço forma com o tronco um ângulo de 90°), com limitação da rotação interna e externa, impedindo-o de levar a mão à nuca, ao ombro oposto e à região lombar, luxação externa da clavícula direita (lado activo) e síndroma pós-traumático.
9 - As lesões determinaram-lhe ITA entre 13 de Novembro de 2002 e 8 de Agosto de 2003, ITP de 0,30 entre 9 de Agosto de 2003 e 3 de Setembro de 2003 e ITP de 0,20 entre 4 de Setembro de 2003 e 10 de Outubro de 2003.
10 - A alta ocorreu em 10 de Outubro de 2003, atribuindo-se-lhe IPP de 0,184543.
11 - O A. despendeu € 14,80 em transportes obrigatórios a Tribunal.
12 - O A. nasceu em 1 de Maio de 1943.
13 - No dia 13 de Novembro de 2002, pelas 8h15m, na Rua 1° de Dezembro, em Peniche, o automóvel matrícula Nº-0, marca MITSUBISHI, propriedade de Empresa-A, ao proceder à manobra de marcha atrás, veio a embater no andaime ali existente, em cima do qual estava o A., abalroando-o.
14 - A Empresa-B. assumiu a responsabilidade pelo acidente, dado o teor da apólice n.° 199049075.
15 - O A. celebrou com Empresa-B. acordo com vista a ser indemnizado pela quantia de € 16.903,15 relativa a danos patrimoniais - rendimentos, € 6.820,00, danos emergentes, € 83,00 e danos por IPP de 5%, € 5.000,00 - e danos não patrimoniais - € 5.000,00.
3. Fundamentação de direito
Entende o recorrente que, não se tendo provado quantos e quais os dias da semana em que o autor prestava a sua actividade, nem qual era a sua remuneração diária ou mensal, não era possível recorrer ao alegado pelo autor quanto aos tempos de trabalho, havendo de efectuar-se o cálculo da pensão e indemnização por referência ao salário mínimo nacional.
E esta a única questão que cabe dilucidar.
Dispõe o artigo 26° da Lei n° 100/97, de 13 de Setembro:
1 - As indemnizações por incapacidade temporária absoluta ou parcial serão calculadas com base na retribuição diária, ou na 30ª parte da retribuição mensal ilíquida auferida à data do acidente, quando esta represente a retribuição normalmente recebida pelo sinistrado.
2 - As pensões por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, serão calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente recebida pelo sinistrado.
3 - Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
4 - Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras remunerações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
5- Se a retribuição do dia do acidente não representar a retribuição normal, será esta calculada pela média tomada com base nos dias de trabalho e correspondente a retribuições auferidas pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente. Na falta deste elementos, o cálculo far-se-á segundo o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção da natureza dos serviços prestados, a categoria profissional do sinistrado e os usos.
(..)."
No caso dos autos, entendeu-se que o autor não estava ligado ao réu por um contrato de trabalho, mas que, apesar disso, mantinha o direito à reparação pelo acidente de trabalho por dever considerar-se como um trabalhador por conta de outrem, nos termos previstos no artigo 2°, n.° 2, da Lei n.° 100/97, visto que se encontrava na dependência económica do réu, ao prestar a sua actividade profissional a favor deste.
Provou-se, por outro lado, que o autor trabalhava entre as 8h e as 18h, com uma pausa para almoço, e que auferia € 5,50 por hora (n.°s 2 e 5 da matéria de facto).
Importa ainda reter que o autor foi admitido ao serviço do réu no Verão de 2002 e o acidente ocorreu em 13 de Novembro desse ano (n.°s 1 e 3 da matéria de facto).
Face a esta factualidade, as instâncias consideraram que o autor, durante o período em que se manteve ao serviço do réu, trabalhava 9 horas por dia ao valor de € 5,50 por hora, e trabalhou 22 dias úteis com aquele horário de trabalho, sendo que esta é uma ilação de facto que o Supremo, enquanto tribunal de revista, não pode agora sindicar.
Não auferindo o trabalhador uma retribuição mensal, mas uma retribuição à hora, o valor a considerar para o cálculo da indemnização por incapacidade temporária parcial terá ser a retribuição diária, conforme resulta da citada disposição do artigo 26°, n.° 1, e esta retribuição não pode deixar de ser a que resulta do produto de 9 (horas) x € 5,50, que corresponde a € 49,50.
No que concerne ao cálculo da pensão por incapacidade permanente absoluta, a lei manda considerar a retribuição anual ilíquida normalmente recebida pelo sinistrado, entendendo-se como tal o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras remunerações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
A circunstância de o trabalhador ainda não ter completado um ano ao serviço do réu não impede que se calcule, com base nos elementos que se apuraram nos autos, qual o montante anual que o trabalhador normalmente auferiria se prosseguisse a sua actividade.
A norma do artigo 26°, n.° 2, ao reportar-se à retribuição anual ilíquida, não pretende significar que a pensão é calculada com base nas remunerações efectivamente auferidas durante um ano. Antes pretende fornecer um método para calcular a retribuição normalmente auferida pelo trabalhador tomando por base o período temporal de um ano.
Por isso mesmo é que a apontada norma do artigo 26°, n.° 4, não toma como ponto de referência a retribuição concreta, mas antes um valor abstracto que resulta da multiplicação da retribuição mensal por doze.
Nestes termos, nada obsta, tal como fizeram as instâncias, que se calcule a retribuição anual por referência aos montantes que o autor recebeu durante o período em que se manteve ao serviço do réu, tomando por base, para esse efeito, a retribuição horária, que era efectivamente praticada, e o tempo de serviço diário prestado. E, do mesmo modo, a retribuição diária, para efeito de ser calculada a indemnização devida por incapacidade temporária, poderá ser fixada, de acordo com o disposto no artigo 26º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, a partir dessa mesma retribuição horária.
É certo que o n.° 5 do artigo 26° prevê um diferente critério de cálculo da retribuição, que tem por base a média dos dias de trabalho e das remunerações auferidas pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente, remetendo, na falta destes elementos, para o prudente arbítrio do juiz. No entanto, esta disposição aplica-se apenas às situações em que a retribuição do dia do acidente não representa a retribuição normal, e parece, por isso, abranger apenas os casos em que o trabalhador não tem uma retribuição fixa, ou porque não trabalha todos os dias úteis, ou porque efectua trabalho de diferente natureza que é remunerado de forma variável.
Não é este o caso dos autos já que se provou que o sinistrado auferia uma remuneração determinada, embora referente ao período horário, sendo por isso possível calcular a retribuição mensal e a retribuição anual através da projecção do valor hora.
Os fundamentos do recurso mostram-se, pois, improcedentes.
4. Decisão
Nestes termos, acordam em negar a revista e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 13 de Julho de 2006
Fernandes Cadilha
Mário Pereira
Maria Laura Leonardo