TRAFICANTE-CONSUMIDOR
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Sumário

I - O enquadramento legal da figura do traficante-consumidor pressupõe que os actos de tráfico previstos no art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, tenham sido praticados com exclusiva finalidade de consumir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal.
II - Resultando da matéria de facto provada que:
- os arguidos, concertadamente, dedicaram-se ao tráfico de heroína e cocaína, adquirindo e distribuindo estes produtos, desde data indeterminada, mas pelo menos desde o início de 2002, até Setembro de 2003, servindo-se de uma viatura, registada em nome alheio;
- no dia 16-07-2003, o arguido vendeu, a um consumidor, 0,273 g e, a outro, 0,218 g de heroína;
- os arguidos vendiam, em média, a “quarta” de heroína à razão de € 25;
- no dia em que foi efectuada uma busca à residência do casal o arguido era detentor de € 560, produto da venda de estupefacientes a que o casal se dedicava; verifica-se o preenchimento, por ambos os arguidos, da previsão do art. 25.º do DL 15/93, de 22-01.
III - Com efeito, a afirmação de que pelo menos desde inícios de 2002 e até Setembro de 2003 os arguidos venderam, de comum acordo, reiteradamente, heroína e cocaína, sem concretizar a quem, quais os estupefacientes e que quantidades, não é absolutamente - bem pelo contrário - indiferente para a definição da culpa e da pena, cuja formação não repousa num operação abstracta, incontrolada e incontrolável, arbitrária, num Estado de Direito, antes integrante em nome da dúvida, que influencia, excluindo-o, o princípio da culpa e, posteriormente, o doseamento da pena em concreto.
IV - Donde se não dever extrair outra conclusão e nem lidar com outra materialidade fáctica que não seja a de que no dia 6-07-2003, o arguido vendeu, a um consumidor, 0,273 g e, a outro, 0,218 g de heroína, recebendo por cada “quarta” de heroína, em média, € 25 e que, em busca à sua residência, o arguido detinha € 560, produto de venda de estupefacientes a que se dedicava com a arguida, cuja imagem global (quantidade de produto não significativa; não recurso a meios sofisticados de tráfico; inexistência de sinais exteriores de riqueza) nos remete para o tráfico de menor gravidade.
V - Perante a enunciada factualidade e considerando, ainda, a primodelinquência dos arguidos, afigura-se adequado fixar as penas concretas em 3 anos de prisão, quanto ao arguido, e 2
anos e 6 meses de prisão, quanto à arguida, suspendendo-se a execução das penas por 4 anos, mas condicionada a vigilância do IRS.

Texto Integral

Acordam em audiência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça :

Em P.º comum, sob o n.º .../03 .5 PAVFX , do ....º Juízo Criminal de Vila Franca de Xira , com intervenção do tribunal colectivo , foram submetidos a julgamento AA e BB , vindo , a final , a ser condenados , cada um , como autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes , p . e p . pelo art.º 21.º n.º 1 , do Dec.º -Lei n.º 15/93 , de 22/1 , na pena de 4 anos e 6 meses de prisão .

O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, em recurso, esta decisão , da qual , agora , recorrem para este STJ , apresentando na motivação as seguintes conclusões :

Dos elementos recolhidos em audiência de julgamento apenas se pode concluir que os arguidos eram consumidores de estupefacientes, concretamente de heroína e que, para conseguirem este estupefaciente, faziam “ vaquinhas “ com outros consumidores , embora fosse o marido quem se deslocava ao Casal Ventoso para aqui comprar droga, entregando aos outros consumidores parte da droga que lhes pediam para trazer .

Face a uma errónea fixação da matéria de facto, os arguidos não deviam ter sido condenados como o foram , mas antes como traficantes consumidores nos termos do art.º 26.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1.

Deve ser diferenciada da do arguido a conduta da arguida mulher por se limitar a consumir, sendo a sua actuação muito apagada .

Deverão ser ainda tomadas em conta as circunstância de serem delinquentes primários, estarem a fazer tratamento, não serem detentores de bens ou dinheiro, demonstrativos de riqueza e , sobretudo , terem um filho de 6 anos , na escola , sendo traumatizante para ele saber que tem os pais na prisão .

Mas se não for de aplicar o art.º 26.º citado deve ser ao caso aplicável o art.º 25.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1, atenuando-se-lhes a pena, sobremodo à arguida .

De todo modo deve considerar-se que é a primeira vez que respondem por este ou outros crimes.

Mostra-se provado que são consumidores de longa data e que, de acordo com as regras da experiência , o tráfico que faziam estava ligado ao consumo .

Apenas traficavam pequenas quantidades pois não há nos autos uma qualquer referência a tráfico de grande quantidades de droga.

Utilizavam meios rudimentares de que nem sequer faziam parte balanças como é normal entre traficantes que compram em quantidade para depois dividirem em pequenos lotes .

Nos contactos com os compradores apenas utilizavam telemóvel, sendo este um meio normal de comunicação.

O único veículo que o marido usava nas deslocações nem sequer lhe pertencia.

Não lhes foram objectos ou valores de onde se pudesse concluir que exerciam essa actividade de forma lucrativa .

Andaram em tratamento o que demonstra a vontade deixarem a droga.

Tem andado a frequentar cursos o que demonstra a vontade de fazerem a sua vida normal e abandonarem a vida que levaram.

E assim deve ser aplicada aos arguidos a norma do art.º 26.º, do Dec.º-Lei n.º 15/93, de 22/1 , atenta a sua condição de traficantes –consumidores.

A não ser assim deve a sua conduta ser considerada como preenchendo o disposto no art.º 21.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1 .

Sempre e sem conceder a pena a aplicar-lhes não deve ser superior ao mínimo legal.

Mostram-se violados os preceitos dos art.ºs 410.º, do CPP, 21 .º , 25.º e 26.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 .

Da contramotivação do Exm.º Magistrado do M.º P.º junto do Tribunal da Relação respiga-se o segmento conclusivo em que acentua que o recurso deve proceder em parte , sendo de aceitar a subsunção dos factos ao art.º 25.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1 , condenando-se os arguidos em 3 anos e 3 meses de prisão , impossibilitando a suspensão da sua execução.

Colhidos os legais vistos, cumpre decidir, considerando que se deram como provados os factos seguintes:

Os arguidos são casados entre si, vivendo em economia comum, na casa sita na Rua..., Lote 6, 3.º Dt.º . Vila Franca de Xira.

Durante período de tempo não concretamente apurado, mas pelo menos desde o início de 2002 até Setembro de 2003, que os arguidos, de comum acordo e em comunhão de esforços, vinham a dedicar-se , de forma reiterada , à venda de heroína e cocaína .

Faziam essa venda directamente aos consumidores desses produtos, quer na sua residência quer em locais previamente combinados com toxicodependentes que para o efeito os contactavam .

Para aquisição do produto estupefaciente e posterior distribuição os arguidos faziam-se transportar no veículo automóvel de marca FIAT PUNTO, com matrícula ... , registado a favor de CC .

No dia 16 de Junho de 2003 , junto ao Banco ..., em Castanheira do Ribatejo , o arguido AA que se fazia transportar no veículo ..., entregou , mediante contrapartida em dinheiro , a DD e a EE , respectivamente , 0, 273 g .e 0, 218 g. , de heroína .

Na sequência de uma busca realizada a casa dos arguidos foram encontrados e apreendidos os seguintes objectos :

1 televisão da marca “ P... “ ;

1 vídeo da marca “ W...” ;

1 máquina fotográfica digital e 1 aparelhagem com duas colunas da marca “ S...” ;

1 máquina fotográfica “ P...” ;

1 telemóvel “ S...”;

1 leitor de “cds” e dois telemóveis , todos da marca “ P...” ;

1 aparelhagem, 1 auto-rádio e um vídeo gravador , todos da marca “ S...” e um par de binóculos “B... “ .

9 carregadores de telemóvel de marcas diversas e uma máquina rebarbadora .

Na posse do arguido AA foi –lhe encontrada a quantia de euros 560,00 produto da venda dos estupefacientes .

Os arguidos adquiriram o produto cujas características e propriedades bem conheciam, destinando-o à venda para terceiros que para tanto os procurassem, vendendo, em média, uma “quarta “ de heroína por 25 euros.

Os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei .

Os arguidos, à data dos factos, eram consumidores de estupefacientes, frequentando há cerca de um ano a esta parte um tratamento no CAT de Alverca .

Têm um filho com 6 anos de idade .

Estão desempregados.

Vivem em casa própria adquirida através de empréstimo bancário.

Não têm antecedentes criminais.

A pretensa requalificação jurídico-penal dos factos como integrantes da figura criminal do traficante- consumidor não deixa qualquer dúvida sobre a sua não ocorrência , na medida em que pressupõe , à face da lei , que os actos de tráfico previstos no art.º 21º n.º 1 , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1 , tenham sido praticados com exclusiva finalidade de consumir plantas , substâncias ou preparações para uso pessoal .

Mostra-se ausente a comprovação de que os actos de aquisição de estupefacientes pelos arguidos e sua posterior transacção obedecessem àquele restrito objectivo, de exclusivo consumo pessoal, sancionado menos severamente do que o tráfico simples e até do de menor gravidade , porque dissociado do propósito de difusão ilimitado , antes condicionado à satisfação e sua medida do vício do traficante , gerador de menor perigo de lesão de interesses .

Os factos provados, embora se dê como provado que são consumidores de estupefacientes, dão conta do intuito de prossecução de um objectivo de venda de estupefacientes pelos arguidos , extrapolando do seu núcleo de satisfação da toxicodependência .

A dúvida só se suscita quanto ao eventual enquadramento jurídico-penal no tipo legal de crime de tráfico simples, p . e p . pelo art.º 21.º , do Dec.º –Lei n.º 15/93 , de 22/1 ou , no tipo legal de crime de tráfico simples , p. e p . no art.º 25.º daquele diploma ,erigido sobre aquele a partir da adição de elementos especializadores , suposto que a ilicitude do facto se apresente consideravelmente reduzida , pela consideração , entre outros , de factos- índice daquela reveladores, entre os quais os meios utilizados e a modalidade da acção , a natureza , qualidade e quantidade das plantas , substâncias ou preparações .

Em via de regra os sistemas jurídico-penais punem como crime o tráfico de menor gravidade, que , sem deixar de responder a prementes necessidades de perseguição penal numa área em que se exige uma intervenção penal de rigor , é reclamado como a forma que o legislador, por razões de justiça material , em nome da proibição de excesso e da proporcionalidade , encontrou para acudir aos casos em que o desvalor da acção se mostra digno de menor censura e reprovação penal , à luz do sentimento de justiça reinante na comunidade.

De um ponto de vista de vista de protecção da multiplicidade de interesses em ofensa , o tipo em causa repousa , ainda , na ideia de através dele se atingir o traficante de maior gravidade dado que o traficante sedeado no escalão intermédio ou mesmo ocupante do topo da pirâmide do tráfico se não arrisca à sua prática , servindo-se de intermediários .

Servindo-se de uma fórmula, com algum acolhimento , preenchida por factos genéricos , de conteúdo indeterminado , tanto quanto ao tempo de prática de actos de tráfico , como de qualidade e quantidades de produtos vendidos, o acórdão recorrido reputa provado que os arguidos, concertadamente , se dedicaram ao tráfico de heroína e cocaína , desde tempo indeterminado , mas pelo menos desde o início de 2002 e até Setembro de 2003 , servindo-se de uma viatura , registada em nome alheio , quer na aquisição dos produtos quer na sua distribuição .

Mais se provou, com interesse neste domínio, que , no dia 16 de Julho de 2003 , o arguido vendeu a um consumidor 0, 273 grs. e a outro 0, 218 grs , de heroína ; os arguidos vendiam, em média, a “ quarta “ de heroína à razão de 25 € , e mais que no dia em que foi efectuada uma busca à residência do casal o arguido era detentor de 560 € , produto de venda de estupefacientes .

Se é princípio estruturante do direito penal não poder conceber-se pena sem culpa , também esta não pode abdicar de factos concretos , especificando-os como integrantes do tipo ( princípio da legalidade) e exigindo a sua comprovação , não relevando afirmações genéricas ou indeterminadas , que não permitem o exercício pleno do contraditório , concebido como o direito de o arguido se pronunciar sobre todos os testemunhos , depoimentos ou outros meios de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo ( cfr. Constituição Anotada , Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira , ed. Coimbra Ed. , 1993 , 206 ) , o cabal exercício do direito de defesa , assegurado no art.º 32.º , da CRP , e nem o correcto funcionamento do princípio da culpa.

A afirmação de que pelo menos desde inícios de 2002 e até Setembro de 2003 os arguidos venderam, de comum acordo, reiteradamente, heroína e cocaína, sem concretizar a quem, quais os estupefacientes e que quantidades, não é absolutamente – bem pelo contrário - indiferente para a definição da culpa e da pena , cuja formação não repousa num operação abstracta , incontrolada e incontrolável , arbitrária , num Estado de direito , antes integrante em nome da dúvida , que influencia , excluindo-o , o princípio da culpa e , posterior mente , o doseamento da pena em concreto.

Donde se não dever extrair outra conclusão e nem lidar com outra materialidade fáctica , em obediência àquele indeterminismo, no aspecto do tráfico , que não seja a de que o arguido vendeu , em 16 de Julho de 2003 , 0, 273 grs. a uma pessoa e 0, 218 grs. a outra , recebendo por cada “ quarta “ , em média, 25 € e que , em busca à sua residência , detinha 560 € , produto apurado da venda .

Nem a quantidade do produto é significativa , muito pelo contrário , reduzida , nem o dinheiro encontrado é atinente a uma indiciada actividade de tráfico em larga ou média escala , compatível com a venda de 5, 6 gramas , suposto que o foram de heroína ( no acórdão de 1.ª instância alude-se a “ estupefacientes “ ) .

A imagem do facto , na sua valoração global , considerando aquela diminuta quantidade , que nem sequer é o elemento mais relevante , referida , é certo , ao mais pernicioso dos estupefacientes , não se denotando , no entanto , o recurso a qualquer método sofisticado de tráfico , sequer sinais exteriores de riqueza , manifestação de um tráfico de sentido expressivo , cai-se num tráfico de menor gravidade , como proposto pelo Digno Magistrado do M.º P.º ., alterando-se a qualificação jurídico –penal adoptada em 1 :ª instância .

E assim é de localizar a medida concreta da pena já noutra sede de maior benefício da pena para os arguidos , mais concretamente no art.º 25.º , do Dec.º_lei n.º 15/93 , de 22/1 , em que o limite máximo da moldura penal atinge 5 anos de prisão .

De diferenciar ainda a conduta dos arguidos , marido e mulher , ambos envolvidos no tráfico de estupefacientes , pais de um filho de 6 anos , que se não gostariam que vissem enclausurados na prisão os seus pais , como o seu advogado escreve na motivação , então deveriam atentar no mal que causam aos filhos dos outros a quem vendem estupefacientes.

Na verdade o marido tem na co-autoria estabelecida um papel mais preponderante , quer porque adquire , quer porque transporta , quer porque vende .

Seja como for o dolo de acção comum a ambos os arguidos é intenso , na forma de dolo directo , e a protecção de bens jurídicos que se pede à pena , polimorficamente sempre presente no crime de tráfico de estupefacientes , enquanto flagelo social , crime contra a humanidade , doente , afrontando a saúde individual e pública , a liberdade individual do viciado , a sua estabilidade da sua família , destroçada , a segurança colectiva afectada , potenciador como é o crime dos mais graves delitos , contra o património , a integridade física , a liberdade sexual , a vida em sociedade e até a economia , criando uma economia paralela , fazem do traficante um ser de espaço social reduzido .

E assim é pela importância daqueles bens jurídicos que afecta , pela reiteração da sua prática , modo de execução como se apresenta , mediante recurso a meios sofisticados de execução , formas constantemente mutáveis de comunicação , uso de linguagem cifrada , geradores de dificuldades de investigação acrescida e , na colectividade de cidadãos , forte sentimento de intranquilidade e de censura , reclamando , em nome da prevenção de futuro cometimento desses crimes e dissuasão de potenciais delinquentes forte intervenção do direito penal .

E junto do agente , em particular , demanda , para emenda sua , para transformação em homem de bem , capaz de voltar a não ser inimigo da comunidade , de o ressocializar , um empenho do julgador , conferindo à prevenção especial , considerando a personalidade , a idade do agente , as suas condições pessoais , o apoio da família , o grau de interiorização do crime e seus malefícios , a dimensão normativa destes , a confissão e arrependimento e reparação do dano , uma palavra importante na definição do “ quantum “ exacto de pena .

O modelo de pena tal como se acha estruturado nos art.ºs 40.º , 70.º e 71.º n.ºs 1 e 2 , do CP , confere à prevenção geral um papel que sobreleva a prevenção especial , para defesa da sociedade , que absorve , em larga medida a dimensão retributiva , de castigo em função da gravidade da culpa e do facto , fazendo intervir um critério ético , reservado à função cabida à culpa .

Esta , em abstracto , fornece uma moldura de topo , inultrapassável , quaisquer que sejam as necessidades de prevenção , no interior da qual interagem as submolduras de prevenção geral e especial e as circunstâncias que não fazendo parte do tipo , atenuam ou agravam a responsabilidade do arguido –n.ºs 1 e 2 , do art.º citado 71.º , do CP .

Há um limite de protecção óptima , ideal , dos bens jurídicos , mas é possível , ainda , erigir um outro abaixo do qual são ainda tuteláveis as expectativas contrafácticas da comunidade , sem ferir , inapelavelmente o seu sentimento de crença na força , eficácia e validade da lei , face ao facto contrário à lei .

No caso concreto :

Considerar-se-à o envolvimento dos arguidos no tráfico de estupefacientes , de contornos , maioritariamente , para não dizer na quase totalidade , imprecisos , respeitantemente a um estupefaciente –a heroína - cujo tráfico se mantém estável , entre nós –ao invés subiram os atinentes ao haxixe e à cocaína - , de muito reduzida expressão quantitativa e , portanto , de efeito maléfico da mesma natureza , sem recurso a meios de execução sofisticados , que emprestam ao desvalor da acção , à sua ilicitude , um alcance mediano .

Os arguidos são marido e mulher , delinquentes primários , achavam-se desempregados e, à data dos factos , eram consumidores de estupefacientes , frequentando há cerca de um ano ( sobre a data dos factos ) o CAT de Alverca .

Já no Tribunal da Relação, a cuja análise escapou , juntaram dois documentos , a fls . 890 e 891 , que são recibos de vencimentos , dando nota de se acharem empregados em Agosto de 2005 e a arguida , em 31 de Outubro de 2005 , a frequentar um curso técnico de Contabilidade de Gestão , recebendo 187,35 € -cfr. Fls . 902 , mostrando o propósito de se reinserirem socialmente .

Acolhe-se na fundamentação decisória – o lugar tecnicamente correcto , mas sem observância genérica , na prática , seria no elenco dos factos provados - que os arguido confessaram o envolvimento no tráfico embora na vertente de traficantes-consumidors, com o que sempre se tem de haver como a atenuante da confissão parcial dos factos .

Têm um filho com 6 anos de idade .

Por isso , como co-autores de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade , p . e p . pelo art.º 25.º , do Dec.º-Lei n.º 15/93 , de 22/1 , se condena o arguido em 3 anos de prisão e a arguida em 2 anos e meio de prisão .

Os arguidos oferecem alguma capacidade de ressocialização , em que este STJ , prudencialmente aposta , considerando a sua primodelinquência , o esforço em conseguirem ocupação profissional , que previne a reincidência , e o facto de serem pais de uma filho de pouca idade , em nome do qual e do desenvolvimento da sua personalidade , bem como do seu crescimento tanto quanto possível harmónico e acompanhado , pela sua presença junto ele , se devem empenhar , sendo a sua reclusão da maior prejudicialidade para o menor, suspendendo a execução da pena pelo período de 4 (quatro ) anos .

Os arguidos submeter-se-ão à vigilância , durante aquele período , do IRS , ao plano de recuperação que trace , cumulativamente com apresentações periódicas de ambos na GNR do Posto de Alverca , de 3 em 3 meses , incumbindo a esta entidade informar o tribunal de Vila Franca de Xira sobre a sua comparência , bem como o IRS remeter relatório sobre a evolução dos arguidos .

Este STJ tem manifestado alguma relutância na adopção da suspensão da execução da pena ; adopta-se , no entanto , esta pena de substituição por se mostrar a mais adequada , satisfazendo , ainda , a pragmática inerente os fins das penas .

Revoga-se , face ao exposto , a decisão recorrida , provendo-se ao recurso .

Sem tributação .

Comunique-se , oportunamente , ao IRS e GNR de Alverca .

Remeta boletins ao CICC .

Supremo Tribunal de Justiça, 13 de Setembro de 2006

Armindo Monteiro (Relator)

Sousa Fonte

Oliveira Mendes