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DANO CAUSADO POR EDIFÍCIOS OU OUTRAS OBRAS
OBRAS
INDEMNIZAÇÃO
RECONSTITUIÇÃO NATURAL
Sumário

Se por acção do R. uma mina de água deixou de "dar água" a conclusão a tirar é que ficou destruída na sua totalidade e de modo irremediável: a parte afectada podia mui bem ser um metro, um centímetro apenas, e o resultado seria precisamente o mesmo.
Não mais é possível a reconstituição da mina (coisa imóvel e, portanto, não fungível): com a sua destruição aos seus donos é apenas possível a reparação através do pagamento de uma indemnização em dinheiro.
Há, pois, que tudo fazer para os AA. sejam colocados numa situação (hipotética) à que tinham quando usufruíam da mina (art. 562º do CC).
A obrigação de indemnizar a perda de tal bem passa, assim, pela atribuição aos AA. de uma importância que lhes permita construir algo que seja equivalente ao que foi destruído pelo R..
A fixação do quantum indemnizatório resulta da aplicação da chamada teoria da diferença, tal como está consagrada na nossa lei, isto é, o montante a atribuir aos AA. deve ser encontrado tendo em conta a diferença entre a sua situação real e a situação hipotética em que eles se encontrariam se não fosse a lesão (nº 2 do art. 566º).

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I -

"AA" e BB e esposa CC intentaram, no Tribunal Judicial de Viana do Castelo, acção ordinária contra Empresa-A, pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização global de 62.500.00 € e juros, a título de danos sofridos por virtude da destruição da uma mina de água, de que eram proprietários, consumada por esta durante a execução de uma estrada, pedido este que foi ampliado, em sede de julgamento, para 76.191,00 €.

O R., mui embora não tenha contestado a obrigação de indemnizar os AA., concluiu que os danos por estes sofridos não deverão ser contabilizados em mais que 3.800.000$00.

A acção seguiu para julgamento e o R. foi condenado no pagamento do pedido inicialmente formulado.

Mediante apelante do R., esta decisão foi parcialmente revogada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, que fixou em 21.500 € a indemnização devida por aquele aos AA..

Mas esta decisão não agradou a ambas as partes e daí que tenham vindo, junto deste Supremo Tribunal, pedir a sua revista.
Para o efeito, apresentaram as respectivas alegações, que fecharam com as devidas conclusões delimitadoras dos objectos dos recursos.
Assim, os AA. concluíram do seguinte modo:
- Ficou provado que o Recorrido destruiu uma nascente que debitava cerca de 50 m3 de água por dia, bem como 30 metros de uma mina/conduta de água, ficando inutilizados totalmente outros 170 metros desta mina propriedade dos Recorrentes, adquirida por sucessão hereditária.

- Apurou-se nas instâncias que a reconstituição natural quer da nascente de água quer da mina era impossível.

- Apurou-se que o valor para reconstituir uma mina idêntica à parcialmente destruída e completamente inutilizada era de € 50.000,00.

- Na 1ª Instância, o Mº Sr. Dr. Juiz aplicou os arts. 562º e 566 n° l e 2 do C.C. para apuramento do valor da mina destruída e inutilizada, sendo que essa aplicação resulta do princípio da impossibilidade de reconstituição natural, e, por isso, a indemnização é fixada em dinheiro, pelo valor da reconstituição hipotética actual.

- Não o entenderam assim os Exmos. Srs. Drs. Juízes Desembargadores pois que entenderam que só deveriam ter em conta o custo dos 30 metros da mina destruída e, então, entenderam que ao caso sub iudice deveriam aplicar o art. 566 nº 3 do C.C., arbitrando uma indemnização por equidade, quanto ao apuramento do valor da mina.

- Porém, tendo ficado apurado o valor da mina, € 50.000,00, não haveria lugar à aplicação dessa norma, mas aos nºs l e 2 do art. 566 do CC.

- Donde, os Exmos. Srs. Drs. Desembargadores terem violado, por erro de aplicação, os arts. 562º e 566º, nºs 1 e 2 do CC., quanto à fixação da mina.

Por sua vez, o R. encerrou a sua minuta da seguinte forma:
- Se é possível reconstruir o aproveitamento da água para os AA., conforme mencionado pelo acórdão recorrido, já não se mostra necessário indemnizar a parte destruída da mina.
- Para a reconstituição da situação existente antes da construção da estrada, ou seja, a manutenção do fornecimento da água necessária para a rega dos terrenos, basta a construção de um furo que possa ser transformado em captação.
- O valor necessário para a realização desta captação, adicionado do custo da energia, resulta no montante de 11.725 €.
- A reposição do fornecimento do caudal de água é possível, repararia integralmente os danos, não sendo demasiado onerosa para o R..
- Não se compreendendo qual o fundamento dos 12.500 € fixados no acórdão recorrido.
- Nem se compreendendo a atribuição de um montante indemnizatório complementar de 9.000 € atinentes à obra destruída.
- Valor esse que, sem conceder, nunca poderia ser superior a 7.500 € de acordo com a proporcionalidade invocada pelos Senhores.
- Assim, a justa indemnização deve corresponder apenas ao custo da realização do furo + custo da energia necessária, ressarcindo-se deste modo todos os danos (11.725 €).
- Por mero dever de patrocínio, para o caso de o entendimento de V.Ex.as divergir do enunciado, o valor da obra destruída nunca poderia exceder o montante de 7.500 €, ficando neste caso a indemnização em 19.225 € e não nos 21.500 € fixados pelo acórdão em crise.

II -

As instâncias deram como provados os seguintes factos:

- O prédio de habitação de rés-do-chão e dois andares e logradouro, com a área coberta de 199,38 m2, e logradouro com a área de 1132,5 m2, sito no Local-A, Perre, Viana do Castelo, está inscrito na matriz predial respectiva sob o art. 284° e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo com o nº 46.294.

- O referido prédio foi adjudicado ao l ° A. através de escritura de partilha lavrada em 19 de Março de 1994, no 2° Cartório Notarial de Viana do Castelo.

- O 1° A. sucedeu no prédio atrás referido a seus pais, DD, falecido a 23 de Março de 1962, e esposa EE, falecida a 18 de Abril de 1981.

- O prédio referido está registado na Conservatória do Registo Predial a favor de FF e DD, na proporção de metade indivisa para cada um.

- O prédio descrito resultou da divisão feita entre os pais do 1° A., ditos DD e EE, e FF e mulher GG, por escritura pública lavrada, em 27 de Dezembro de 1938, no cartório do Notário Bacharel Pinto Rodrigues, a fls. 34.136 v, livro de notas 103.

- O prédio misto de casa de rés-do-chão, com a superfície coberta de 186.90 m2, 1º andar e águas furtadas, com terreno de lavradio, vinha, árvores de fruto, e outras, com a área de 4.540 m2, sito no Local-A, Perre, Viana do Castelo, está inscrito n a matriz predial respectiva sob o art. urbano 911 e rústico 1329, e descrito na Conservatória Predial com o nº 1358 - Perre, a favor dos segundos AA..

- Por escritura de 28/8/87, foi doado aos 2°s AA., pelos pais do 2° A., HH e mulher, II, a raiz do prédio referido.

- O usufruto desse prédio está registado a favor dos donatários.

- O prédio rústico, composto de terreno de lavradio e vinha, com a área de 8.280 m2, sito no Local-A, Perre, Viana do Castelo, a confrontar do norte e nascente com caminho público, do sul com JJ, e do poente com FF, está inscrito na matriz predial respectiva sob o art. 1326 e descrito na Conservatória do Registo Predial com o nº 1357 - Perre, a favor dos 2°s AA..

- Este prédio foi transmitido aos 2°s AA. por sucessão testamentária de KK.

- Dá-se aqui por reproduzida a certidão da escritura de divisão e demarcação de fls. 44 e ss..

- O R. está a abrir uma nova estrada entre a Local-B do Castelo, que se inicia na freguesia da Meadela, Viana do Castelo, e termina na freguesia de Nogueira, deste concelho, denominada IC 1 - Nó de Viana - Nó de Nogueira - l ª Fase, Variante à E.N. 202 e E.N. 526.

- Essa estrada atravessa a freguesia de Perre, no sentido nascente-poente, passando no Local-C.

- Há mais de 50 e mais anos que o A., por si e antecessores, de forma pública, pacifica, ininterrupta, de modo exclusivo, e sem qualquer oposição, tem usufruído do prédio referido, habitando a casa, nela tomando as refeições, dormindo, recebendo amigos, cultivando a parte de terreno de lavradio, pagando as contribuições, é único e exclusivo proprietário de tal prédio, todos reconhecendo e respeitando tal posse.

- Há mais de 50 e mais anos que os 2°s AA., por si e seus antepossuidores, de forma pública, pacífica, ininterrupta, exclusiva, e sem qualquer oposição, têm usufruído do dito prédio, habitando a casa, nela tomando as refeições, dormindo, recebendo amigos, cultivando a parte dos terrenos de lavradio, contribuições respectivas, feito benfeitorias, como coisa sua, com o animus de quem são únicos e exclusivos proprietários de tais prédios.

- Do prédio referido faz parte uma mina de água.

- A referida mina tem as seguintes características:

Comprimento: 205 metros;

Altura, à entrada, dentro do prédio urbano do 1° A., 1,3 metros;

Depois, durante cerca de 20 metros tem l, 3 m; seguindo-se, nos seguintes 50 metros, com 1,80 metro de altura; de seguida, nos 135 metros finais, com uma altura média de 3 metros;

A largura é, em média, l metro;

Parte da mina está empedrada outra está em terreno escavado.

- Essa mina tem o seu início no prédio referido, seguindo, depois, para noroeste, numa distância de 35 metros, na qual existe um óculo de limpeza que sai no prédio referido, depois corre para noroeste numa distância de 55 metros, no qual existe outro óculo de limpeza no prédio de LL.
- A seguir, faz uma ligeira derivação para nor/noroeste, numa distância de 20 metros, passando por debaixo da E.N. 302-1, onde tem outro óculo de limpeza no prédio de MM e outro; segue, depois, para nor/nordeste, numa distância de 60 metros, onde tem outro óculo de limpeza, no prédio de LL, e, por fim, segue durante mais ou menos 35 metros, no mesmo sentido, onde surge a nascente de água.
- Esta mina existe na forma como se encontra há mais de 200 anos e mais que a memória dos vivos já não recorda.
- Há mais de 50 e mais anos que os AA., e antepossuidores, usufruem de tal mina, conservam-na, fazendo uma limpeza anual e restaurando as paredes quando caem, sempre todos respeitando os AA. como proprietários dessa mina, nomeadamente os proprietários dos prédios que estão onerados com a servidão dos óculos de limpeza.
- Os AA., e seus antepossuidores, sempre limparam e cuidaram a mina como coisa sua, como verdadeiros proprietários dela.
- Também os AA. usufruem, em comum, de toda a água que nasce subterraneamente no fim da mina supra descrita, por si e seus antecessores, há mais de 200 anos, de forma pública, pacífica, ininterrupta, à vista de toda a gente, de forma exclusiva, e todas respeitando essa posse e direito de propriedade.
- Os AA., e antepossuidores dessa água, aproveitam-na todos os dias e durante todos os anos para regar os seus terrenos de cultivo.
- O R., ao construir a estrada referida, na zona do Local-A, Perre, teve de fazer um desaterro de cerca de 9 metros da profundidade para que essa nova estrada passasse por debaixo do viaduto a construir para dar continuidade à E.N. 302-1.

- E, ao fazê-la, logo na 1ª fase, fizeram um furo para meter um pilar para apoio do dito viaduto.

- Esse furo destruiu um troço da mina atrás referida, a cerca de 30 metros da nascente.

- Logo que isso aconteceu, o A. BB entrou em contacto com os operários do Empresa-A que lhe disseram o que tinha sucedido.

- O referido A. tinha ficado parcialmente sem água, que não chegava ao seu tanque como era habitual.

- O referido pilar tinha penetrado na mina e esta estava quase toda obstruída com o cimento injectado.

- Então, o A. BB escreveu, em 31 de Agosto de 2000, ao Empresa-A a solicitar as providências devidas para não ser destruída a mina ou a nascente.

- O Empresa-A continuou as obras e, em 9 de Outubro de 2000, foi escrita nova carta ao R. a comunicar que, nessa data a mina estava totalmente obstruída e já não corria qualquer água por ela.

- A nascente foi destruída, e a mina também foi destruída num comprimento de 30 metros.

- A água da nascente foi desviada pelo R. para o ribeiro que fica a nascente, impossibilitando o reaproveitamento da água.

- A mina no restante do seu trajecto, cerca de 170 metros, ficou completamente inutilizada, por aí não correr qualquer outra água.

- A preços actuais, a escavação de um túnel subterrâneo com as características da mina em causa custará à volta de € 50.000,00.

- Os AA. aproveitavam a água da nascente em causa para regar cerca de 3 hectares de terra.

- O aproveitamento dessa água fazia-se durante todas as estações no ano.

- Os AA., embora não exclusivamente, pelo facto de terem água de poço para esse efeito, aproveitavam também a água para consumo doméstico.

- Na altura de mais consumo de água, na Primavera/Verão, o consumo de água pelos AA. atingia uma média de 50 m3 por dia.

- Foi a partir de Agosto do ano 2000 que os AA. ficaram sem a água da dita mina.

- Os AA. ficaram privados definitivamente da água em causa.

- A Câmara de Viana aplica os seguintes preços de venda de água aos seus consumidores domésticos:

l ° Escalão: 0 a 5 m3 = € 0,35 por m3;

2° Escalão: 0 a 15 m3- € 0,56 por m3;

3° Escalão: 0 a 25 m3 = € 0,80 por m3;

4° Escalão: > 25 m3 = € 1,19 por m3.

- O A. BB deu conhecimento da existência da mina de água a representantes do R..

III -

Quid iuris?

As partes estão de acordo quanto à obrigação de indemnizar que pende sobre o R. por via da destruição da mina de água que era pertença dos AA..

A discordância está apenas no montante de tal indemnização.

Os AA., inicialmente, reclamaram o pagamento total de 62.500 €, nele englobando 50.000 € relativamente à destruição da mina e 12.500 € pela destruição da nascente da mina, valor aquele que mereceu a contraproposta de 3.800.000$00 por parte do R.

A 1ª instância concordou com os valores iniciais avançados pelos AA. e, por isso, julgou a acção parcialmente procedente, dando guarida àqueles.

Insurgiu-se o R. e disse-o no recurso de apelação que interpôs para a Relação de Guimarães: não só não estava de acordo com os valores consagrados como também com a acumulação de indemnizações, uma por causa o valor da mina, outra pela perda da água.

Na revista por si interposta, o R. insistiu nestes precisos pontos e, verdade seja dita, que acabou por propor um valor indemnizatório mui perto do que avançou na contestação (19.225 €).

Já os AA. pugnam agora pela repristinação do julgado na 1ª instância.

O problema que nos ocupa é, assim, o de determinar o quantum justo para indemnizar os AA. do prejuízo sofrido por virtude de acção do R, ofensiva da sua propriedade.

Interessa, por isso mesmo, trazer à colação os seguintes factos dados como provados:

- O R., ao construir a estrada, teve de fazer um furo e, por via disso, destruiu um troço da mina. Esta ficou destruída num comprimento de 30 metros.

- A água da nascente foi desviada pelo R., impossibilitando o reaproveitamento da água.

- A mina no restante do seu trajecto, cerca de 170 metros, ficou completamente inutilizada.

- A preços actuais, a escavação de um túnel subterrâneo com as características da mina custará à volta de 50.000 €.

- Os AA. ficaram privados definitivamente da água.

- Na altura de mais consumo de água, na Primavera/Verão, o consumo dos AA. atingia uma média de 50 m3/dia.

- A CMVC pratica para consumo doméstico os preços supra referidos.

Ora bem.

O art. 483º do CC obriga o lesante a indemnizar o lesado pelos danos sofridos - todos os danos sofridos - em resultado da sua conduta

Com a sua conduta, o R. não só privou os AA. dum bem precioso qual seja o da água, como também destruiu de modo irremediável a mina.

Como assim, impende sobre o R. a obrigação de indemnizar os AA. por virtude de a lesão da sua conduta ter provocado tais danos.

Uma coisa é a destruição da mina, outra, bem diferente, é a privação da água.

O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado (a perda da mina), como o benefício que os AA. deixaram de obter em consequência da lesão (deixaram de poder captar a água), como determina o nº 1 do art. 564º do CC.

Isto é, assim o cremos, suficiente para demonstrar a sem razão do R. no que tange à consagração pelas instâncias destes dois danos e à consequente reparação dos mesmos.

Posto isto, há que cuidar dos valores com vista à obtenção de uma indemnização de acordo com os critérios que a nossa lei consagrou.

A mina ficou destruída. Para sempre e na totalidade.

Por virtude da acção do R. os AA. ficaram definitivamente privados de um bem que lhes pertencia e que lhes dava água.

Não mais é possível repor o statu quo ante, mas apenas atribuir aos AA. o equivalente.

Ou seja, não é possível, in casu, a reconstituição in natura (esta a primeira preocupação na mens legislatoris - art. 566º, nº 1 do CC), razão pela qual há que fixar a indemnização devida pela perda deste bem no equivalente em dinheiro.

E, aqui, entramos em total desacordo com a tese avançada e consagrada pela Relação de Guimarães: não se pode dizer que "a mina ficou destruída em cerca de 30 metros contados desde o nascente, mas nos restantes cerca de 170 metros continua a existir, apenas estando inutilizada no sentido em que dela não se pode retirar a utilidade para que foi construída", restringindo-se, como consequência, a indemnização ao equivalente ao que "efectivamente" ficou destruído.

Não pode ser!

A mina, por obra e graça da acção do R., ficou destruída na sua totalidade e de modo irremediável: a parte afectada podia mui bem ser um metro, um centímetro apenas, e o resultado seria precisamente o mesmo.

Não mais é possível a reconstituição da mina (coisa imóvel e, portanto, não fungível): com a sua destruição aos seus donos é apenas possível a reparação através do pagamento de uma indemnização em dinheiro.

Há, pois, que tudo fazer para os AA. sejam colocados numa situação (hipotética) à que tinham quando usufruíam da mina (art. 562º do CC).

A obrigação de indemnizar a perda de tal bem passa, assim, pela atribuição aos AA. de uma importância que lhes permita construir algo que seja equivalente ao que foi destruído pelo R..

A fixação do quantum indemnizatório resulta da aplicação da chamada teoria da diferença, tal como está consagrada na nossa lei, isto é, o montante a atribuir aos AA. deve ser encontrado tendo em conta a diferença entre a sua situação real e a situação hipotética em que eles se encontrariam se não fosse a lesão (nº 2 do art. 566º)..

Ora, a este respeito ficou provado que, a preços actuais, a escavação de um túnel subterrâneo com as características da mina custará à volta de 50.000 €: é esse o valor que o R. terá de pagar aos AA. em virtude de terem ficado privados daquele seu bem.

Com isto queremos significar que nos parece inteiramente correcta a posição adoptada pelo Mº juiz de Círculo de Viana do Castelo a este respeito e, por isso mesmo, repomos o valor que por ele foi encontrado para indemnizar os AA. deste prejuízo.

Resta-nos, agora, avaliar a bondade da decisão impugnada no que tange aos danos resultantes da perda da água.

É isso que está em causa já que foi isso mesmo que os AA. reclamaram: indemnização pela perda total da água (cfr. art. 74º da petição).

E para tanto justificaram o seu pedido dizendo que "a indemnização pela destruição total desse bem tem de ser calculada em função do rendimento ...que tinham com essa água anualmente".

Neste ponto as instâncias não divergiram do montante - 12.500 €.

Atendendo ao que está em jogo e à míngua de elementos que permitam a fixação de um valor de acordo com a referida teoria da diferença, há que seguir o outro caminho que o legislador colocou nas mãos do julgador, qual seja o da equidade (nº 3 do apontado art. 566º).

O material fáctico captado pelas instâncias é escasso a este respeito: os AA. desde 2000 ficaram privados da água, sendo que a usavam não só para uso doméstico como rega da exploração agrícola, chegando nos meses de Primavera/Verão a terem um consumo de 50 metros cúbicos diários.

Atendendo aos custos que a Câmara de Viana pratica - 1,19 € para consumos superiores a 25 metros cúbicos - parece-nos, recorrendo ao juízo ex aequo et bono (citado nº 3 do art. 566º e art. 4º do CC), perfeitamente justificável o valor encontrado, mesmo não considerando como certo tudo o referido pelas instâncias a este propósito. Desde logo, parece-nos deslocada a referência à "imemorabilidade" e aos "custos": há apenas que considerar a "perda da água".

Mas, à parte esta leve discordância, entendemos perfeitamente aceitável que os AA. sejam indemnizados, a este título, pelo valor de 12.500 €.

A soma dos valores encontrados é, na sua globalidade inferior ao peticionado pelos AA., mui embora o primeiro - valor relativo à perda da mina - seja inferior ao referenciado na petição. Razão de sobra para se dizer que não houve - nem há - transgressão ao preceituado no nº 1 do art. 661º do C. Adjectivo.

Aqui chegados, importa extrair todas as consequências à luz das conclusões que as partes verteram nas suas minutas de recurso.

Assim, procede a tese dos AA. e improcede a do R.

IV -

Decisão

Concede-se a revista aos AA. e nega-se ao R., ficando a prevalecer o sentenciado na 1ª instância.

Custas de ambas os recursos pelo R..


Lisboa, 14 de Novembro de 2006
Urbano Dias
Paulo Sá
Borges Soeiro.