RESPONSABILIDADE EXTRA CONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
CONTRATO DE SEGURO
SEGURO OBRIGATÓRIO
Sumário

1. Está abrangido pelo seguro obrigatório um acidente em que uma máquina se desloca para trás e para a frente em terraplanagem de ampliação dum caminho público e, num desses movimentos, colhe um menor.
2 . Age com culpa e até grosseira o condutor dessa máquina que com ela assim trabalha em caminho utilizado por crianças no trajecto de a para a escola sem que as obras estejam sinalizadas e circunscritas e colhe um menor com a parte de trás da mesma máquina.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I -
"AA" e BB, vieram instaurar a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum ordinário, contra:
A Empresa-A (1)

Alegaram, em síntese, que:

No dia 15 de Dezembro de 1995, pelas 8 horas, no caminho Público de Agrelos que liga Bairro às escolas primárias do lugar do Calvário, na Freguesia de Santa Cruz e ao lugar da Portela, Freguesia do Gôve, mais precisamente no lugar do Bairro, o filho deles, EE, de oito anos de idade, foi atropelado por uma máquina motoniveladora, propriedade de CC, conduzida por um seu empregado.
Tal acidente deveu-se a distracção e inconsideração, quer por parte do empreiteiro, quer do dono da máquina relativamente aos perigos decorrentes da utilização e circulação daquela.
Do atropelamento resultou a morte do EE, com os inerentes danos patrimoniais e não patrimoniais que descrevem.
O proprietário da máquina havia transferido para a R. a sua responsabilidade civil por danos causados a terceiros, com tal viatura, através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º 52233841.

Pediram, em conformidade:
A condenação da Ré a pagar-lhes a quantia de 10.290.000$00 acrescida de juros, desde a citação até pagamento.

Esta contestou.
Sustentou não estar abrangido pelo seguro o acidente e apresentou uma versão diferente deste, atribuindo culpa ao sinistrado.

II -
A acção prosseguiu a sua normal tramitação e, na altura própria, foi proferida sentença.
Entendeu-se que, à míngua de factos sobre a culpa efectiva, impendia sobre o condutor da máquina uma presunção de culpa por ter para com o dono uma relação de comissário-comitente. E que o acidente estava abrangido pelo contrato de seguro.
Consequentemente, condenou-se a seguradora a pagar aos AA 50.578,11 euros, acrescidos de juros.

III -
Recorreu ela para o Tribunal da Relação do Porto.
Neste, seguiu-se entendimento de que o contrato de seguro não abrangia o acidente.
Nessa conformidade, absolveu-se a seguradora do pedido.
IV -
Trazem agora os AA revista.

Concluem as alegações do seguinte modo:

1ª -Como resulta dos autos, o tomador do seguro transferiu para a ré, por contrato de seguro titulado pela apólice número 52233841, os prejuízos decorrentes da sua utilização.
2ª -A ré seguradora sabia das características da máquina, por isso, aceitou contratar o risco decorrente da utilização da mesma.
3ª -Também sabia que a máquina é de grandes dimensões, quer em comprimento quer em largura, logo, que apenas potencialmente podia circular pelos próprios meios.
4ª -Sabia que não tem matrícula automóvel atribuída.
5ª -Portanto, o contrato de seguro em causa cobre todas as responsabilidades inerentes à máquina.
6ª -Se não fosse este o entendimento, da própria ré seguradora e do segurado, que sentido faria a existência deste seguro?
7ª -A motoniveladora, na altura do acidente, laborava e circulava.
8ª -Circulava por meios próprios, em marchas prolongadas para a frente e para trás, para levar à sua frente, na lâmina, terra e, em marcha-atrás, retomava o mesmo ponto de onde partira ou antes deste, uma nova massa de matéria inerte que de novo espalhada por algumas centenas de metros ao longo do caminho, no novo movimento de marcha para a frente, e assim sucessivamente.
9ª -Esta unidade é que determinou a indiscutível necessidade de contratação do seguro obrigatório e a sua aceitação pela recorrida seguradora, pelo que, o acidente se situa, dentro desta perspectiva no âmbito do risco próprio decorrente da utilização normal da motoniveladora.
10ª -Foi naquele vaivém e na ocasião em que fazia marcha-atrás que atropelou mortalmente o Bruno.
11ª -Manifestaram-se, assim, os riscos próprios de um veículo que não desaparecem pelo facto de se encontrar em laboração. Não obstante, não deixa de ser considerada um veículo e, por conseguinte, os riscos próprios de um veículo não desaparecem por esse facto.
12ª -Portanto, estamos face a um acidente de viação, abrangido pelos riscos próprios de veículo automóvel.
13ª -A sentença do tribunal da primeira instância entendeu, a nosso ver bem, que "o menor só morreu devido à máquina ter circulado em marcha-atrás e ter atropelado o menor que circulava a pé, no caminho público que fazia a ligação às escolas primárias do lugar do Calvário, para onde se deslocava o menor".
14ª -Qualquer veículo terrestre a motor está sujeito à obrigação de se encontrar seguro, artigo 1 ° do Decreto -Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro.
15ª -A motoniveladora é um veículo que está dotado de motor, circula por meios próprios, na via pública, independentemente do uso que dela se fizer.

Contra-alegou a seguradora, concluindo do seguinte modo:

lª-Como resulta do contrato de seguro junto a fls.. , sob o ponto 4 do contrato, este inclui a condição especial 06 , constando expressamente "Também fazem parte integrante deste seguro as Condições Especiais com os nº 01/06/09 " ;
pelo que,
2ª-O acidente dos autos está excluído da garantia do contrato de seguro celebrado no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel;
3ª-Dado que o acidente ocorreu quando a motoniveladora desenvolvia a sua aptidão laboral normal, isto é, procedia ao nivelamento subsequente ao alargamento do caminho, no movimento de vaivém que lhe é característico;
4ª-Estando excluído da garantia do contrato de seguro pela condição especial 06, sendo inaplicável o disposto no art. 29°, n°l, al.a) do DL 522/85 , dado se tratar de um acidente de laboração ;
Por outro lado,
5ª-Dos factos provados e dos documentos juntos aos autos, o acidente é imputável a culpa do próprio menor, pois ao colocar-se nas traseiras da máquina e em local não visível para o manobrador, deu causa em exclusivo ao acidente ;
6ª-Cabendo a culpa do acidente ao próprio menor lesado, está excluído o dever de indemnizar nos termos do art. 570°, nº 2 do C. C.;

V -
Importa, pois, saber se o acidente estava abrangido pelo contrato de seguro e, na hipótese afirmativa, se a indemnização deve ser excluída por ter havido culpa exclusiva do menor sinistrado.

VI -
Das instâncias vem provado o seguinte:

No dia 15 de Dezembro de 1995, na freguesia de Santa Cruz do Douro, no lugar do Bairro, concelho de Baião ocorreu um acidente.
Deste acidente resultou a morte do menor EE, de oito anos de idade, filho dos Autores.
Nas circunstâncias descritas em A) procedia-se à realização de obras de motonivelamento subsequentes ao alargamento do caminho municipal e encontrava-se em laboração uma máquina motoniveladora, propriedade de CC.
Em consequência do acidente, o EE sofreu diversas e graves lesões, que lhe causaram a morte imediata, como consequência directa e necessária das mesmas.
A Ré Empresa-A celebrou com CC um contrato de responsabilidade civil automóvel, no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, referente a uma máquina industrial motoniveladora, marca O&K 68 Deutz 2136331 e titulado pela apólice n.º 5223841.
O acidente aludido em A) ocorreu entre as 8,30h e as 9h, no caminho público de Agrelos, que liga Bairro às Escolas Primárias do Lugar do Calvário.
As obras aludidas em C) eram levadas a cabo por CC para a Câmara Municipal de Baião.
A motoniveladora referida em C) era conduzida por DD enquanto empregado e no interesse de CC.
O acesso ao caminho público e ao local do acidente, não se encontrava vedado, de forma a impedir o trânsito de peões e veículos.
Nessas circunstâncias e no dia em referência, circulava a pé o menor EE, que, como outras crianças, utilizava diariamente aquele único caminho na sua deslocação para a escola.
Quando a referida máquina se deslocava em marcha-atrás, atropelou mortalmente o EE, sem que o seu condutor se tivesse sequer apercebido do facto, alertado que foi por populares, tendo-se posto em fuga.
No local do acidente referido em A) não existiam meios de sinalização de perigo, nem funcionários a advertirem ou impedirem a aproximação à máquina em manobras.
A circulação do menor não foi detectada ou impedida por ninguém, nem mesmo percebida pelo condutor da máquina, que só viu a vítima após o seu atropelamento, alertado por um passante.
O caminho Municipal em questão era utilizado diariamente por vários menores na sua deslocação para a escola, sendo tal facto do conhecimento dos responsáveis pelas referidas obras.
A máquina em causa sendo de terraplanagem, é de grandes dimensões, produz grande ruído e é munida de uma lâmina transversal junto ao solo.
O EE era uma criança forte, perfeita e saudável, denotando alegria pela vida.
A morte do EE constituiu para os Autores uma perda irreparável, dado tratar-se à data do filho único do casal.
A Autora mãe encontrava-se, à data dos factos, grávida de oito meses, tendo sofrido um forte choque emocional, que impôs o seu internamento no Hospital de Amarante de 15 a 16 de Dezembro de 1995.
O EE sofreu dores, momentâneas, motivadas pelas lesões que teve.
Com o funeral do EE, os Autores despenderam a quantia de 140.000$00 (698,32€).
Os AA. adquiriram roupas de luto.
A máquina andava num vaivém em marcha para a frente e em marcha a trás para o nivelamento do terreno.
O condutor da máquina não se apercebeu da criança.
A negociação do seguro, que deu origem à apólice aludida em E), não se debruçou sobre as condições especiais juntas aos autos a fls. 47.
O subscritor do seguro ao efectuar o referido seguro pretendeu segurar todos os riscos da máquina.

VII -
Da enumeração factual consta que a Ré Bonança celebrou com CC um responsabilidade civil automóvel, no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, referente a uma máquina industrial motoniveladora da marca ali referida, contrato esse titulado pela apólice n.º 5223841.

Incluíram os outorgantes o seu contrato no "âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel".

O que nos conduz, para efeitos de interpretação daquele, ao artigo 1.º do Decreto-Lei n.º522/85 de 31.12.

VIII -
Assim situada a interpretação, parece-nos claro que estamos em pleno campo do direito e não em terreno factual. (2)
Na verdade, as partes quiseram subsumir a sua vontade negocial ao que impõe aquele preceito quanto ao seguro obrigatório, quiseram que estivessem incluídos na responsabilidade dele emergente os casos em que a lei impõe tal seguro e que não estivessem quando a lei o dispensa.
Sendo assim, temos, como Supremo Tribunal e, concomitantemente, tribunal de revista, inteira liberdade para traçarmos os limites a que a interpretação do contrato de seguro conduz.

IX -
O seguro obrigatório constitui uma medida de alcance social inquestionável, visando-se com o mencionado Decreto-Lei e como consta do seu preâmbulo, "reforçar e aperfeiçoar, procurando dar uma resposta cabal aos legítimos interesses dos lesados por acidentes de viação."
É, pois, sem perder de vista este escopo, que há-de proceder-se à interpretação daquele n.º1.

Exige ele, antes de mais, que se trate de veículo terrestre a motor.
Ao tempo do acidente, vigorava o Código da Estrada aprovado pelos DL n.º114/94, de 3.5 que continha uma definição de veículos automóveis. Dispunha, efectivamente, o n.º1 do artigo 108.º que:
"São veículos automóveis todos os veículos de tracção mecânica destinados a transitar pelos seus próprios meios nas via públicas."
Por sua vez, a Directiva do Conselho de 24.4.1972 (72/166/CEE) definia veículo como "qualquer veículo automóvel destinado a circular sobre o solo, que possa ser accionado por uma força mecânica, sem estar ligado a uma via-férrea, bem como os reboques, ainda que não atrelados". Esta definição foi acolhida pela Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho de 16.5.2000 (2000/26/CE)-Quarta Directiva Automóvel, a qual foi transposta para a Ordem Jurídica Portuguesa pelo DL n.º 72-A/2003.
Destas definições, mesmo sem precisarmos de as cotejar, resulta que a máquina em causa estava abrangida pelo seguro obrigatório.

X -
Onde a discussão do presente recurso se situa essencialmente é na questão de saber se o acidente em si estava ou não englobado por tal seguro.
A definição de acidente para estes efeitos há-de atender à ideia de "circulação" exigida por aquele artigo 1.º. "Para que estes veículos possam circular" diz o texto legal.
A exigência de circulação tem se ser entendida logo em termos hábeis porque não pode traduzir a ideia de que o veículo sinistrado tenha que estar em "circulação". Um veículo parado em certas circunstâncias pode constituir um risco enorme para a segurança de pessoas e bens. (3)
Seria, por isso, incompreensível que se considerasse o não movimento do veículo como preclusor da indemnização emergente do seguro obrigatório.
Assim, se se entendesse que a máquina em questão no presente caso não "circulava", porque se limitava a andar para trás e para a frente em actos de terraplanagem, não era por aqui que se excluía a situação, do contrato havido.

XI -
Mais delicada é a questão do escopo com que a máquina se movimentava. Não visava ela a deslocação em si, mas antes a dita terraplanagem.
Não se trata aqui da distinção entre actividade viária e actividade laboral. Muitas actividades são, concomitantemente, laborais e viárias, de sorte que a lei expressamente prevê essa situação.
O que assume foros de discutibilidade é antes a afectação exclusiva a um movimento que, primacialmente, não é viário. O condutor da máquina não queria deslocar esta dum ponto para o outro. Queria terraplanar e, por via disso, tinha que efectuar os movimentos para trás e para a frente.

Ora, neste tipo de situações, cremos dever distinguir:
Os danos derivados de actividade que não esteja relacionada com os riscos da actividade viária;
Os danos, ainda que emergentes do desempenho funcional da própria máquina, mas que derivam também dos riscos dela relativamente à segurança viária. (4

Àqueles pertencem os casos como os que são ventilados pelos acórdãos deste Tribunal de 3.5.2001 (CJ STJ, IX, II, 43) (em que ocorreu a amputação duma mão por uma máquina agrícola) e da Relação de Lisboa de 12.12.1996 (CJ XXI, V, 139) (este, invocado pela seguradora em abono da sua tese, em que uma retroescavadora, na sua função de escavação, corta cabos subterrâneos condutores de electricidade).
Mas, se o acidente ocorreu porque a máquina se movimentava, mal se compreenderia a isenção de seguro, só porque o fazia em movimentos próprios da sua funcionalidade.
É que, nestes casos, vem ao de cima, tanto como em circulação normal, o risco especial causado por veículos de que fala Vaz Serra no local citado, em palavras que nos parecem actuais. Para os demais utentes da via, potenciais sinistrados, tanto importa que a máquina se desloque porque o condutor pretende seguir para outro local, como que se desloque porque o condutor apenas quer terraplanar a zona. Só vista pelo prisma destes, a medida traduzida pelo seguro obrigatório atinge os fins de alcance social e de tutela dos interesses dos lesados a que supra se aludiu.
É, aliás, o próprio DL n.º 522/85 que, com a preocupação de excluir da garantia do seguros os danos causados a terceiros em consequência de operações de carga e descarga (al. c) do n.º4 do artigo 7.º) revela que a natureza ou a razão de ser da inserção na actividade viária não é ponto de referência para, no plano geral, excluir o seguro.
Continuamos, assim, o entendimento deste tribunal plasmado no Acórdão de 19.3.2002, que se pode ver em www.dgsi.pt.

XII -
Argumenta a seguradora com o estipulado na cláusula 06 ou seja que: "Esta apólice abrange apenas os acidentes de viação produzidos pela viatura segura quando em trânsito nas vias públicas ficando, portanto, expressamente excluído do âmbito de cobertura do contrato todo e qualquer acidente ocorrido durante a execução de quaisquer trabalhos que lhe sejam inerentes."

Esta cláusula é muito discutível. Primeiro porque de acordo com o seu texto, ficariam excluídos os casos de acidentes em vias ou outros locais particulares, que, conforme entendimento corrente, não escapam ao seguro obrigatório.
Depois, porque a dicotomia entre "trânsito nas vias públicas" e "execução de quaisquer trabalhos" não está correcta. Muitos trabalhos há, próprios destas máquinas, que incluem necessariamente o "trânsito em vias públicas".
Tem, assim, que ser interpretada, na parte que nos importa -que é esta segunda -em termos hábeis. Interpretação essa que não deve, também aqui, perder de vista a, duplamente referida, função social do seguro obrigatório.
O que se pode entender estar na ressalva é que à abrangência do seguro escapam os casos em que os danos não estão relacionados com a actividade viária em geral. Voltamos à distinção que fizemos supra, valendo aqui as razões ali apontadas. Se se entendesse que a execução de trabalhos "inerentes" à função da máquina, só por si, afastava a garantia do seguro, estaríamos a deixar sair pela janela o que se pretendeu guardar com a porta fechada.
Assim interpretada a cláusula, não afasta a responsabilidade da seguradora, pelo que prejudicada fica a questão relativa à sua validade atentas as regras respeitantes às cláusulas contratuais gerais.

XIV -
Para a hipótese de se considerar que o contrato de seguro abrange o nosso caso, a seguradora argumenta ainda que o acidente se deveu a culpa do próprio sinistrado.
Vigorava, já ao tempo, o Decreto Regulamentar n.º33/88 de 12.9. Nos seus artigos 1.º e 8.º alude vários tipos de sinalização quando haja obras e, no artigo 21.º refere mesmo uma sinalização específica para peões nestes casos.
E embora refira que a sinalização temporária compete à JAE (entretanto extinta) e às Câmaras, tal não afasta a responsabilidade de quem assegurava o trabalho da máquina (e, corolariamente, da seguradora). Não havia que laborar naquelas condições, tanto mais que se tratava dum caminho municipal que se sabia ser utilizado diariamente por menores na sua deslocação de e para a escola e que se tratava duma máquina que podia atropelar e matar uma criança sem que o condutor disso sequer se apercebesse.
A negligência existe e é mesmo grosseira.
Não a afastando ou sequer minimizando o facto, que pode considerar-se mesmo notório, de que muitas obras com este tipo de máquinas são levadas a cabo com perfeito improviso e amadorismo em termos de segurança. Será um caso em que o julgador não deixará de ter presente a realidade quotidiana, mas para fortemente a censurar. Perdeu-se a vida duma criança, não nos esqueçamos.

XV -
Face a todo o exposto, concede-se a revista, revogando-se a decisão da 2.ª instância para ficar a subsistir a da 1.ª.
Custas em todas as instâncias pela seguradora.

Lisboa, 23 de Novembro de 2006
João Bernardo
Abílio Vasconcelos
Ferreira Girão
------------------------------------------------------------------
(1) Foi também demandado o FGA e foram chamados CC e DD, tendo todos sido absolvidos da instância.
(2) Com Galvão Teles, Manual dos Contratos em Geral, 446, entendemos que a interpretação dos contratos pode integrar quer matéria factual, quer matéria jurídica.
(3) Assim, Vaz Serra, RLJ, 104, 47 e Pires de Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, I, 514.
(4) De certo modo, esta distinção corresponde ao que se passa com todos os veículos, porquanto estes podem estar na origem de danos que nada têm a ver com os riscos específicos deles enquanto veículos, como no caso de alguém se ferir porque tropeçou num automóvel que estava na garagem (Veja-se Prof.s Pires de Lima e A. Varela, ob. cit. 515). Só que, enquanto para os veículos ditos habituais, estas situações são muito raras, porque eles se destinam praticamente só a circular, com as máquinas que podem circular, a frequência de danos que nada têm a ver com a circulação é muito maior.