CONTRATO DE SUBEMPREITADA
Sumário


Tendo as partes firmado contrato de subempreitada sujeito ao regime jurídico das empreitadas de obras públicas na modalidade de série de preços, não pode o subempreiteiro exigir qualquer pagamento sem que, previamente, tenham sido feitas e aprovadas as respectivas medições.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I – Relatório
AA intentou, no Tribunal Cível do Porto, acção ordinária contra
BB, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento de 60.605.268$00 acrescida de juros vincendos até integral pagamento.
Em suma, alegou que
- No exercício da sua actividade de construção civil, realizou, a pedido da R., a construção do colector de lixiviados de Arcena/Alverca e Alverca integrado no Aterro Sanitário de Mato da Cruz, obra promovida por CC S.A.;
- No âmbito do contrato celebrado com a R. emitiu as facturas nºs 31 e 32 nos montantes de 21.451.823$00 e 8.072.386$00, tendo aquela sido substituída pela factura nº38 no valor de 23.069.737$00; em 5/05/99 foram por si emitidas as facturas nºs 35 e 36 com os valores de 12.703.632$00 e 14.247.272$00;
- Tais facturas foram recepcionadas pela R.;
- As medições foram sempre aprovadas pela fiscalização mas tais facturas não foram pagas no respectivo vencimento, ou seja, 60 dias após a recepção das mesmas e aprovação das medições.
A R. contestou, pugnando pela improcedência da acção e, para tal, não deixou de apontar o carácter de subordinação, de interdependência e de estrita conexão existente entre o contrato de empreitada e o contrato de subempreitada celebrado com o A., o qual fazia depender o pagamento das ditas facturas do reconhecimento e aceitação dos preços e quantidades de trabalhos a que se reportam os autos de medição em causa por parte do dono de obra, o que não sucedeu e, ainda, que os trabalhos cujo pagamento aquele reclama constituem trabalhos a mais cuja realização lhe foi imposta pelo dono da obra.
Foi admitida a intervenção, a título principal, como associada da R., de CC-Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos da Área Metropolitana de Lisboa (Norte), S.A., a qual apresentou contestação.
Após a elaboração do saneador, selecção de factos provados e a provar, a acção seguiu para julgamento e veio a ser julgada improcedente com a consequente absolvição da R. e da interveniente.
Não obstante o Tribunal da Relação do Porto, na apreciação ao mérito do julgado, ter ordenado a ampliação da matéria de facto, igual decisão à primeira foi proferida, posterius, pelo Mº Juiz da 8ª Vara Cível do Porto.
Apelou, então e novamente, o A. mas sem êxito, facto que motivou o presente recurso de revista na ideia de a sua pretensão ser julgada totalmente procedente.
Para o efeito, apresentou a respectiva minuta que fechou com as seguintes conclusões:
1ª - O contrato em apreço nos presentes autos celebrado entre recorrente e recorrida trata-se de um contrato de subempreitada com autonomia em relação ao contrato de empreitada para o qual remete, sendo ao abrigo das cláusulas constantes do mesmo que se deve aferir as relações entre as partes, e somente no que não esteja especialmente previsto no referido contrato e nos documentos que dele fazem parte integrante, se aplicará subsidiariamente o D. – L. 405/93, de 10 de Dezembro.
2ª - Recorrente e recorrida estabeleceram especialmente no que concerne a preços, medições e facturação:
a) Sobre preços – cláusula 9ª – “os trabalhos objecto da subempreitada serão executados por AA pelo valor total estimado de 77.081.204$00 de acordo com a lista de quantidades e preços anexa.
b) Sobre medições – cláusula 10ª – “as medições dos trabalhos executados no âmbito da subempreitada e a considerar para efeitos de pagamentos periódicos, serão as efectuadas mensalmente pela fiscalização da BB nos termos do contrato.
c) Sobre facturação – cláusula 11ª, nº 1 – AA facturará, mensalmente, ao empreiteiro, com base nos preços unitários estabelecidos na cláusula 9ª, os trabalhos da subempreitada cuja execução tenha sido reconhecida pela fiscalização da BB através das medições nos termos da cláusula 10ª; cláusula 12ª, nº 2 – as restantes facturas emitidas por AA nos termos da cláusula 11ª ser-lhe-ão pagas pelo empreiteiro após a aprovação das medições de acordo com a cláusula 10ª, e a 60 dias da data da recepção das facturas nos escritórios da BB.
3ª - Trata-se de uma subempreitada por séries de preços donde a remuneração do subempreiteiro resulta da aplicação dos preços unitários previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar às quantidades desses trabalhos realmente realizadas.
4ª - No caso em apreço nos presentes autos o pagamento do preço era feito escalonadamente, com base na medição periódica dos trabalhos executados de cada espécie, com vista ao pagamento das quantidades apuradas a que eram aplicados os preços unitários contratualmente definidos; para tanto o requerente juntava à factura lista de preços unitários e autos de medições.
5ª - Assim foi emitindo o recorrente as facturas correspondentes aos trabalhos que ia realizando as quais foram sempre pagas.
6ª - A recorrida tinha a obrigação de mensalmente efectuar as medições dos trabalhos executados de forma a poder confirmar as quantidades apresentadas pelo recorrente com as facturas mensais.
7ª - No âmbito dos presentes autos a recorrida procedeu à liquidação de duas das quatro facturas reclamadas – facturas 32 e 35 que correspondem a determinadas quantidades de trabalhos executados conforme medições anexas que não mereceram qualquer reparo, pelo que outra conclusão não se poderá tirar a não ser que a recorrida aceitou as medições efectuadas pelo recorrente.
8ª - De acordo com as clausulas acima descritas a BB através da sua fiscalização tinha a obrigação de efectuar mensalmente as medições dos trabalhos efectuados, cabendo ao recorrente emitir facturas mensais dos trabalhos cuja execução tenha sido reconhecida pelo fiscalização da BB através da medições por esta efectuadas, facturas que seriam entregues nos escritórios da BB para pagamento, o qual deveria ser efectuado no prazo de 60 dias após a recepção e aprovação das medições (que dependia das medições mensais).
9ª - Da conjugação das cláusulas referidas entendemos que será razoável defender que o prazo de 60 dias seria igualmente o prazo para que a recorrida aprova-se ou não as medições anexas às facturas, a não ser assim como poderiam ser efectuados pagamentos mensais (sic).
10ª - O recorrente não logrou provar que a recorrida tenha aprovado as medições anexas às facturas em causa nos presentes autos, as quais não se mostram assinadas pela fiscalização da BB, tal não significa que tais medições não tenham sido reconhecidas pela recorrida, tanto que esta veio a proceder a pagamento de facturas no decurso do processo.
11ª - A recorrida fundamentou o não pagamento das facturas na falta de reconhecimento e aceitação dos preços e quantidades de trabalhos a que se reportam os autos de medição anexos às facturas por parte do dono de obra, tal facto não constitui fundamento para tal recusa.
12ª - Não constituindo igualmente fundamento de recusa de pagamento a alegação de que os trabalhos cujo pagamento o dono de obra se recusa a efectuar constituem trabalhos a mais cuja realização foi imposta directamente pelo dono de obra ao recorrente, tendo em conta os factos provados nºs 42 e 43 (Os trabalhos respeitantes à construção dos ramais domiciliários (ligação casas de habitação/colector) foram acordados como “trabalhos a mais” entre a “CC” e o referido Consórcio - ­resposta ao quesito 20°; A remuneração acordada foi estabelecida entre a “CC” e o Consórcio - resposta ao quesito 21°.
13ª - As facturas actualmente em causa – 38 e 36 – referem-se a medições de 1 de Março de 1999 e 3 de Maio de 1999.
14ª - Facturas que apenas foram devolvidas pela recorrida em 24.09.99, não tendo invocado para o efeito a sua não-aceitação das medições e preços constantes das mesmas.
15ª – Os trabalhos em causa foram aceites pela recorrida.
16ª Por último, resulta não provado nos presentes autos que o recorrente realizou trabalhos constantes das facturas nºs 32, 35, 36 e 38 em quantidades não apuradas, tendo a recorrida procedido ao pagamento das facturas nºs 32 e 35, encontrando-se por liquidar os juros referentes a estas facturas bem como os trabalhos realizados constantes das facturas nºs 36 e 38, pelo que não podem os presentes autos ter como decisão final a absolvição da recorrida.
Em defesa do acórdão posto em crise, apresentou a R. contra-alegações.

II – As instâncias fixaram a seguinte factualidade:
1 - O A. dedica-se a trabalhos de empreitadas de construção civil.
2 - No exercício dessa actividade, o A. realizou, a pedido da R., a construção do colector de lixiviados de Arcena/Alverca e Alverca, integrado no Aterro Sanitário de Mato da Cruz, promovido por CC—Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos da Área Metropolitana de Lisboa (Norte), S.A..
3 - As condições contratuais são as que constam do documento junto a fls. 7 a 23 e memória descritiva com data de 07/06/98.
4 - No âmbito desse acordo e nos termos da sua cláusula 10ª o A. emitia as facturas correspondentes aos trabalhos que ia realizando.
5 - As facturas emitidas foram sempre pagas.
6 - Em 01/03/99 o A. emitiu as facturas nºs 31 e 32 nos montantes de 21.451.823$00 e 8.072.386$00.
7 - Sobre a factura nº 31 e dado ter havido por parte do A. um lapso aquando da quantificação da dedução do adiantamento foi elaborada uma nota de crédito de igual valor ao da factura com vista a poder ser emitida nova factura com valores correctos.
8 - Neste contexto foi elaborada a factura nº 38 no valor de 23.069.737$00 que, apesar de datada de 11/08/99 para efeitos de vencimento a data a relevar entre A. e R., seria a de 01/03/99.
9 - Em 05/05/99 foram emitidas pelo A. as facturas nºs 35 e 36 com os valores de 12.703.632$00 e 14.247.272$00 respectivamente.
10 - Tais facturas foram recepcionadas pela R. nas datas apostas nas mesmas, ou seja, em 01/03/99 e 05/05/99, já que estas eram entregues no escritório da R. sito na obra a pedido do Director da mesma.
11 - O vencimento de todas as facturas deveria ocorrer, de acordo com os termos contratuais, nomeadamente o nº 2 da cláusula 12ª do já referido acordo no prazo de 60 dias após a recepção das mesmas e aprovação das medições.
12 - A R. enviou ao A. cartas datadas de 24/09/99 e 13/10/99.
13 - Em 24/09/99 a R. procedeu à devolução das ditas facturas (nºs 35 e 36).
14 - Por concurso limitado internacional com apresentação de candidaturas e tendo como objectivo a construção do Aterro Sanitário de Mato da Cruz, publicado no Diário da República, 3ª Série, III Suplemento, de 12.02.97 e no Jornal Oficial das Comunidades Europeias nº S 28, em 08.02.97, e nos termos da decisão de 13 de Maio de 1997 do Conselho de Administração da “CC”, foi declarada a intenção de adjudicação da empreitada em causa ao consórcio externo formado pelas empresas BB, S.A. e DD, S.A..
15 - Tal intenção foi concretizada através da celebração do contrato entre a “CC” e “BB, S.A.” e “DD, S.A.” junto a fls. 232 a 528.
16 - A “CC” sempre se relacionou com o Consórcio formado pelas sociedades supra mencionadas e não, de forma exclusiva, com a “BB”.
17 - Através do telefax datado de 21 de Maio de 1998, foi o consórcio informado pela “CC” dos critérios de medição que tinham sido alcançados na sequência da realização de uma reunião que teve lugar na manhã do mesmo dia.
18 - Por telefax, datado de 19 de Março de 1999, remetido da “CC” para o Consórcio refere-se que “ (...) 3) Como é do conhecimento de V. Exas. tem a CC vindo a solicitar que lhe sejam presentes os elementos desenhados e escritos (medições) que lhes permita verificar os montantes das facturas que lhe sejam presentes. De referir que alguns desses elementos foram solicitados há cerca de 5 (cinco) meses e até ao presente, apesar de todas as insistências, ainda não foram entregues.
4) A “CC” volta a reafirmar que logo que entregues esses elementos procederá de imediato à sua verificação e ao desbloqueamento das facturas nos montantes confirmados devedores – documento junto a fls. 530.
19 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 539 a 540.
20 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 571/572.
21 - O Consórcio remeteu à “CC” o telefax de fls. 541.
22 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 542.
23 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 543.
24 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 544.
25 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls.545.
26 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 546-547.
27 - A “CC” remeteu ao Consórcio o telefax de fls. 548 a 551.
28 - O Consórcio remeteu à “CC” o telefax de fls. 552.
29 - O A. realizou os trabalhos constantes das facturas nºs 32, 35, 36 e 38 em quantidades não apuradas.
30 - O A. tinha conhecimento dos critérios de medição acordados entre a “CC” e a R..
31 - A “CC” não aceitou os critérios de medição conduzentes aos quantitativos e preços constantes dos autos de medição elaborados pelo A..
32 - A “CC” recusou o pagamento de cerca de 8.713.000$00 a título de custos com imobilização de mão-de-obra e de equipamento por paralisações dos trabalhos de construção do colector de Alverca.
33 - Recusou o pagamento da quantia de cerca de 23.000.000$00 de trabalhos de construção de ramais de ligações do colector às redes domésticas.
34 -Recusou pagar a quantia de cerca de 3.000.000$00 por trabalhos de “travessias especiais”, isto é, do cruzamento do colector com infra-estruturas existentes e que obrigavam a cuidados especiais no respectivo atravessamento.
35 - Cerca de 800 m3 de tout-venant, utilizado no enchimento das valas no colector de Alverca, cerca de 1387 m3 de terras transportadas a vazadouro, cerca de 650 ml de entivação em valas até h=6,0 m, cerca de 2333 m3 de aterro compactado e cerca de 3500 m3 de escavação em rocha.
36 - Os terrenos onde foram executados os trabalhos continham quantidades de rocha que não tinham sido previstas.
37 - O solo escavado era lodoso.
38 - A escavação e abertura da vala foram feitas numa largura que não estavam inicialmente previstas, para efeitos de medição e pagamento, com os inerentes sobrecustos advenientes da maior quantidade de terras transportadas a vazadouro.
39 - A realização de mais três “travessias especiais” do que o inicialmente projectado.
40 - A realização de todas as ligações e ramais do colector aos domicílios habitacionais conforme indicação dos SMAS de Vila Franca de Xira.
41 - Apresentados os autos de medição respectivos, a R. remeteu-os para pagamento à “CC”.
42 - Os trabalhos respeitantes à construção dos ramais domiciliários (ligação casas de habitação/colector) foram acordados como “trabalhos a mais” entre a “CC” e o referido Consórcio.
43 - A remuneração acordada foi estabelecida entre a “CC” e o Consórcio.
44 - Após o estudo do terreno efectuado pelo Consórcio, este apresentou à “CC” três travessias especiais:
- Travessias da conduta da “Solvay”;
- Travessias da conduta da ribeira das Silveiras;
- Travessias da conduta do adutor da EPAL.
45 - Estas travessias, sua existência e respectivo preço, foram acordadas entre a “CC” e o Consórcio.

III – Quid iuris?
Da análise das conclusões, malgrado a forma pouco clara como as mesmas estão expostas, é permitido dizer que o recorrente sustenta a tese, em abono da sua pretensão, de que houve por parte da R. BB o reconhecimento do vencimento de todas as facturas enviadas, decorrido que foi o prazo de 60 dias previsto para o respectivo vencimento.
E, no seu entendimento, esta ideia sai reforçada pela simples razão de a R. ter pago duas das quatro facturas que lhe foram apresentadas.
Ora bem.
Desde já avançamos que não vemos como tal tese possa ser suportada à luz dos factos dados como provados.
Cremos mesmo que o recorrente terá tido imensas dificuldades em defender o seu ponto de vista já que nem sequer uma única violação de norma apontou ou indicou uma forma diferente de interpretação das normas aplicadas ou até erro na aplicação de normas ao caso, como era seu dever (cfr. art. 690º, nº 2 do CPC).
Para clarificar toda a situação é bom dizer, ainda que em forma sintética, o está aqui em causa.
A. e R. celebraram entre si um contrato de subempreitada com vista à realização dos trabalhos indicados no ponto 2 dos factos provados.
Convencionaram que tal contrato assumiria na íntegra os precisos termos do contrato de empreitada, sendo do conhecimento do A. os precisos termos do mesmo, e, subsidiariamente, as regras do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas aprovado pelo D.-L. 405/93, de 10 de Dezembro, aplicável à data do contrato.
A verdadeira questão não é saber se o A. realizou os trabalhos cujo pagamento reclama da R., mas sim calcular as quantidades daqueles e seus correlativos montantes de pagamento.
Para isso importava que o A. lograsse fazer a prova que realizou os trabalhos correspondentes ao contratualizado e que, por isso mesmo, tinha direito a perceber os montantes reclamados.
Mas, como bem sublinharam as decisões das instâncias, não foi isso que aconteceu.
Aceita o recorrente que o contrato celebrado com a R. consagra o regime de série de preços.
A este respeito o art. 17º do D.-L. 405/93 preceitua que “a empreitada é estipulada por série de preços quando a remuneração do empreiteiro resulta da aplicação de preços unitários previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar às quantidades desses trabalhos realmente realizados”.
E o art. 20º do mesmo diploma, a respeito dos cálculos dos pagamentos, prescreve que “periodicamente, proceder-se-á à medição dos trabalhos executados para o efeito de pagamento das quantidades apuradas, às quais serão aplicados os preços unitários”.
Já no que diz respeito ao modus faciendi, o nº 1 do art. 182º estipula que “sempre que deva proceder-se a medições dos trabalhos efectuados, realizar-se-á esta mensalmente, salvo estipulação em contrário; o nº 2 prescreve que “as medições devem ser efectuadas no local da obra com a assistência do empreiteiro ou seu representante e delas se lavrará auto…”; o nº 3 estabelece os métodos e critérios adoptar para a realização das medições que serão obrigatoriamente estabelecidas no caderno de encargos. E o nº 4 textua que”se o dono da obra não proceder tempestivamente à medição dos trabalhos efectuados, aplicar-se-á o disposto no art. 188º” (referente a situações provisórias).

Foi à luz do que ficou referido que tiramos a conclusão adiantada.
Desde logo porque o A. não logrou fazer a prova da verdadeira razão de ser do peticionado, isto é, que o mesmo correspondia a trabalhos por si executados aprovados pela R. e segundo critérios aceites pela dona da obra.
Como resulta claramente das respostas aos quesitos 2º, 4º e 19º nada disso aconteceu.
Razão suficiente para a pretensão do A. recorrente não merecer acolhimento.
Mais: o A., como resulta da resposta dada ao quesito 1º (“o A. realizou os trabalhos constantes das facturas … em quantidades não apuradas”) nem sequer conseguiu fazer a prova das quantidades de trabalho por si executado, sendo certo que a ele, enquanto A., competia a alegação e subsequente prova dos trabalhos concretamente realizados e sua medição segundo critérios aceites pela dona da obra.
O argumento que o A. pretende fazer ora vingar – chamemos-lhe “da concludência” – não faz o menor sentido: o facto de a “BB” ter pago duas das quatro facturas por si apresentadas não tem a virtualidade de fazer com que pague tudo o mais por ele apresentado. Como bem salienta a R. nas suas contra-alegações (fls. 1665), admitir isso seria confundir a exigência judicial da obrigação com as condições do próprio vencimento.
Seria – acrescentamos nós – ignorar todo o clausulado, toda a exigência de medição prévia com aprovação dos critérios por parte da dona da obra.
Há que não confundir as cousas: sabemos apenas que a R. pagou duas das quatro facturas que lhe foram apresentadas, não sabemos as razões.
Um juízo só é concludente quando a partir dele se pode tirar uma conclusão: do facto de a R. ter pago duas facturas (não sabendo as razões pelas quais o fez), não é legítimo, é até abusivo, concluir que tem forçosamente de pagar as restantes, ignorando por completo todo o programa contratual ao qual as partes livremente se obrigaram.
Quer pelo que de forma clara resulta das cláusulas expressas, quer por aplicação subsidiária do regime das empreitadas das obras públicas, nunca poderia o A. exigir, tal como o fez, o pagamento de obras que descriminou nas facturas cujo pagamento reclama, a não ser que se ignorassem por completo os termos do próprio contrato celebrado e se convocasse para resolução do dissídio um outro puramente virtual.
Do que acaba de ser dito, salta à tona a justeza das decisões das instâncias.
O Mº juiz da 8ª Vara não deixou de sublinhar o facto de a dona da obra (a “CC”) não ter aceite os critérios de medição conduzentes aos quantitativos dos preços constantes dos autos de mediação elaborados pelo A., como motivo suficiente para a R. não pagar as quantias reclamadas, sendo que era àquele que competia provar que esta tinha aprovado as medições dos trabalhos a que se referem as ditas facturas. E, por isso mesmo, concluiu que “não estão reunidos os pressupostos, acordados por ambas as partes, para que seja possível ao Autor exigir da Ré o pagamento de tais facturas”.
E, na mesma linha argumentativa, o aresto impugnado não deixou também de salientar que é o “próprio contrato de subempreitada a estipular que o pagamento das facturas por ele emitidas está dependente da aprovação das medições do empreiteiro”, pelo que não tendo o A. provado tal factualidade, ou seja, “não tendo demonstrado tal aprovação, que era condição do vencimento da dívida do empreiteiro referente ao pagamento do preço da subempreitada, não pode exigir o que reclama na acção”.

Em conclusão:
As facturas representativas dos montantes reclamados pelo A. na presente acção apenas indicam medições da própria lavra do A., sem fiscalização da R. e sem aprovação da dona da obra.
Face ao contrato que A. e R. celebraram, cujas notas mais marcantes foram já referidas, a sorte da acção não podia ser outra que não fosse a de total improcedência: a aceitar-se como boa a argumentação do recorrente significaria total desprezo pelo livremente estipulado, mas não só isso, mais grave ainda, seria permitir que o A., a seu bel-prazer, sem justificação de espécie alguma, sujeitasse a R. a responder aos seus desejos, à margem do que fora estipulado. Isso equivaleria a obrigar esta a uma verdadeira passagem de cheque em branco a seu favor: ele apresentava as facturas elaboradas segundo os seus critérios e ela pagava sem mais.
Claro que não pode ser!
As partes firmaram livremente um contrato, incluindo nele as cláusulas que houveram por bem consagrar, e, em homenagem aos princípios da boa fé, impunha-se que na sua execução o mesmo fosse pontualmente (“ponto por ponto”) respeitado.
O A. só teria razão de queixa se ele próprio tivesse honrado o clausulado, ou seja, tivesse apresentado à R. das facturas após ter sido percorrido todo o iter previamente estabelecido e, mesmo assim, esta fizesse ouvidos de mercador aos seus chamamentos.
Foi provado que nada disso se passou; antes, pelo contrário, foi o A. que, sem qualquer justificação, pretendeu impor pagamentos à R. sem qualquer apoio no que ficou escrito no contrato.
Está, por isso, perfeitamente justificada a atitude da R. em não pagar.
Com isto queremos dizer que é perfeitamente injusta a crítica que foi dirigida ao aresto censurado.

IV – Decisão
Em conformidade com o exposto, nega-se a revista e condena-se o recorrente no pagamento das respectivas custas.

Lisboa, aos 22 de Março de 2007

Urbano Dias (relator)
Paulo Sá
Borges Soeiro