PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
BAIXA DO PROCESSO AO TRIBUNAL RECORRIDO
Sumário

A(s) deficiência(s) de resposta(s) a número(s) da base instrutória contende(m) com os poderes do STJ quando, na sua específica função de tribunal de revista, entende que aquela(s) são atinentes a facto(s) essencial (essenciais) para a decisão de direito, impondo-se, então, mandar voltar o processo ao tribunal recorrido para ampliação da matéria de facto (1ª parte do nº 3 do artº 729º do CPC).

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. a) "AA" intentou acção declarativa, com processo sumário, acção de despejo, contra BB, impetrando, por mor do que ressalta de fls. 1 a 7, na procedência da acção:
1. A declaração de "resolução do contrato de arrendamento constante da escritura pública outorgada em 6 de Fevereiro de 1992 no 1º Cartório Notarial de Leiria onde se encontra exarada a fls. 11 do Livro 229-A" e a condenação do réu "a despejar e a entregar" à autora o arrendado, a fracção autónoma designada pela letra "E", correspondente à loja "B" do rés-do-chão do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva da freguesia de Leiria, sito na Rua Capitão Mouzinho de Albuquerque, nº ..., em Leiria, "livre de quaisquer bens e/ou pessoas".
2. A condenação do demandado a entregar a fracção "E" no mesmo estado em que foi entregue pela autora, nos termos do contrato de arrendamento anexo à escritura outorgada em 6 de Fevereiro de 1992, referida em 1., e depois de removidas todas as obras realizadas pelo réu para exploração do snack-bar não licenciado pela Câmara Municipal de Leiria.
3. A condenação de BB a pagar à autora Esc. 1.568.435$00 (7.823,32 euros), quantia essa correspondente às rendas vencidas " com os acréscimos legais a que houver lugar."
4. A condenação do réu a pagar, "a título de indemnização, as quantias correspondentes às rendas vincendas e até integral desocupação e entrega da fracção à autora, livre de pessoas e bens."
5. A condenação do demandado "a proceder à reparação do tecto da garagem da autora que se localiza no piso inferior ao da fracção "E".

b) Contestou o réu, consoante flui de fls. 38 a 44, concluindo no sentido da improcedência da acção,
c) Respondeu AA à contestação, como na petição inicial terminando (cfr. fls. 63 e 64).
d) Suscitado, oficiosamente, o incidente de verificação do valor da causa, foi este fixado em 16.357,85 euros, razão pela qual a acção passou a seguir a forma ordinária.
e) Elaborado despacho saneador tabelar, foi seleccionada a matéria de facto considerada como assente e organizada a base instrutória.
f) Cumprido o demais legal, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, proferida tendo sido sentença em que, por via de decretada parcial procedência da acção:

1. Foi declarada a resolução do contrato de arrendamento constante da escritura pública outorgada em 6 de Fevereiro de 1992 no 1º Cartório Notarial de Leiria onde se encontra exarada a fls. 11 do Livro 229-A.

2. Foi BB condenado:
a') A despejar e a entregar à autora a fracção autónoma designada pela letra "E", correspondente à loja "B" do rés-do-chão do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva da freguesia de Leiria, sito na Rua Capitão Mouzinho de Albuquerque, nº..., em Leiria, "livre de quaisquer bens e/ou pessoas."
b') A entregar a fracção autónoma a que se alude em a'), "ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato", no mesmo estado em que foi entregue pela autora, nos termos do contrato de arrendamento anexo à escritura outorgada em 6 de Fevereiro de 1992 no 1º Cartório Notarial de Leiria, exarada a fls. 11 do Livro 229-A, e depois de removidas todas as obras realizadas pelo réu para exploração do estabelecimento não licenciado pela Câmara Municipal de Leiria.
c') A pagar à autora a quantia de 7.823,32 euros (= Esc. 1.568.435$00), "correspondente às rendas vencidas até à instauração da acção, acrescida de juros de mora à taxa legal a partir da data do trânsito em julgado da sentença.
d') A pagar à autora, a título de indemnização, as quantias correspondentes às rendas vencidas desde a data da instauração da acção e as vincendas até integral desocupação e entrega da fracção à autora, livre de pessoas e bens, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, a partir da data do trânsito em julgado da sentença.

3. Foi BB absolvido do "pedido de condenação de proceder à reparação do tecto da garagem da autora que se localiza no piso inferior ao da fracção "E" ".

g) Com a sentença se não tendo conformado, da mesma, com êxito, apelou o réu, já que o TRC, como brota de fls. 349 a 361, por acórdão de 07-01-16, julgou procedente a apelação, assim:
1') Revogando a sentença recorrida no tocante à declaração de resolução do noticiado contrato de arrendamento e à condenação do réu a despejar e entregar o arrendado, de tais pedidos absolvendo BB.
2') No mais, mantendo a sentença "intocada", ressalvando, porém, quanto à condenação citada em f) 2. d'), "a absolvição antes decretada, pelo que o pagamento ali estatuído das rendas vencidas e vincendas desde a instauração da acção deverá ter lugar, por parte do R./Recorrido, no quadro do pleno cumprimento das prestações sobre ele impendentes (apenas) em contrapartida do ininterrupto gozo da coisa locada, e sem prejuízo das demais que - no prosseguimento da relação locativa -, se continuarem sucessivamente a vencer".

h) É do predito acórdão que, irresignada, traz revista a autora, a qual, na alegação oferecida, tirou as seguintes conclusões:

1. - As obras descritas nos pontos 18 e 19 dos factos assentes e transcritos nas alegações (cfr.Capítulo II) foram executadas pelo Réu sem qualquer licenciamento da Câmara Municipal de Leiria ou de qualquer outra entidade administrativa:
2. Todas as obras executadas no ano de 2001 na loja dada de arrendamento inscrita na matriz predial urbana no artigo 2.291 da freguesia de Leiria e descrita no nº 85416 a fls 51 verso do Livro 203 da Conservatória do Registo Predial de Leiria, nomeadamente a construção de uma casa-de-banho para uso dos empregados do estabelecimento e a colocação de nova porta de entrada na loja, alteraram substancialmente a estrutura da fracção nos termos e para os efeitos do Art. 64º nº 1 alínea d) do regime do Arrendamento Urbano (RAU).
3. Todas as obras executadas e descritas nos factos assentes transcritos nos pontos 18 e 19 das alegações (Cfr. Capítulo II) foram realizadas pelo Réu/Recorrido sem que a Autora/Recorrente tivesse dado o seu consentimento por forma escrita, prévia e por referência às obras efectivamente efectuadas. (cfr. ponto 20 dos factos assentes - Capítulo II).
4. A declaração da Autora ora Recorrente constante do ponto 45 dos factos assentes transcritos no Capítulo II das alegações mais não é que a reafirmação constante da Lei do Arrendamento Urbano com referência ao objecto do contrato e não correspondeu a uma autorização para a execução das obras descritas nos pontos 18 e 19 dos mesmos factos assentes (Cfr Capítulo II das alegações) pelo que a conclusão constante do Acórdão recorrido é uma extrapolação sem o mínimo fundamento, contrária aos próprios factos assentes com violação da Lei aplicável e sem qualquer correspondência com legislação citada no Acórdão.
5. O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra violou o Direito Substantivo e decidiu contra matéria de facto porque ignorou o facto assente de as obras terem sido realizadas sem que a Autora desse o seu consentimento por forma escrita prévia e por referência às obras efectivamente efectuadas tal como foi convencionado no contrato de arrendamento celebrado em 1992.

6. Consta do contrato de arrendamento que as obras e benfeitorias que o arrendatário pretenda levar a efeito no local dado de arrendamento carecem de consentimento prévio, dado por escrito pela senhoria/recorrente. (Cfr. ponto 5 dos factos assentes transcritos no Capítulo II das alegações).
7. Foi convencionado entre as partes no contrato reduzido a escritura pública no ano de 1992 que o local dado de arrendamento se destina a casa de chá e/ou similar estabelecimento comercial, não lhe podendo ser dado outro destino.
8. A declaração da senhoria ora Recorrente constante do ponto 45 transcrito nos factos assentes (Cfr. Capítulo II das alegações) não abrange quaisquer das obras realmente executadas pelo Réu porque não foi demonstrado, nem provado que as obras decorram de qualquer legislação que tenha sido publicada e que seja directamente aplicável ao estabelecimento comercial do Réu.
9. A publicação do Decreto Lei 168/97 de 4 de Julho não impôs ao Réu a obrigatoriedade de executar as obras que levou a cabo na fracção dada de arrendamento pela Recorrente, porque a autoridade administrativa não determinou a sua realização nem sequer aprovou as obras realizadas no mesmo local, conforme consta do facto assente e transcrito no ponto 44 do Capítulo II das alegações.
10. A conjugação da declaração emitida pela senhoria/Autora/ Recorrente e constante dos factos assentes (cfr. ponto 45 do Capítulo II das alegações) não corresponde a qualquer autorização para as obras realizadas na fracção dada de arrendamento porque não ficou demonstrada e muito menos provada a necessidade de tais obras para o exercício da actividade comercial constante do objecto do contrato de arrendamento celebrado no ano de 1992.
11. As obras efectivamente executadas pelo Réu na loja dada de arrendamento não foram justificadas nem legalmente impostas pelo Decreto Lei 168/97 de 4 de Julho invocado no Acórdão recorrido, porque quaisquer obras decorrentes da aplicação do referido diploma legal depende da prévia aprovação das autoridades administrativas competentes no caso de não terem sido as próprias autoridades administrativas a determinarem a realização de obras em função do fim específico constante do contrato.
12. O Réu foi titular de um alvará para estabelecimento comercial de sala de chá e não submeteu a qualquer aprovação da autoridade administrativa competente as obras realizadas sem o consentimento da senhoria/Recorrente como lhe seria exigível se fosse admissível a tese a que aderiu o Acórdão recorrido.
13. Após a realização das obras descritas nos factos assentes e transcritos nos pontos 18 e 19 do Capítulo II das alegações, o Réu passou a explorar, realmente um estabelecimento comercial distinto daquele para que estava autorizado - sala de chá - conforme foi constatado pelos serviços de fiscalização da Câmara Municipal de Leiria e consta dos pontos 14, 15, 16 e 17 dos factos assentes transcritos nas alegações (Cfr. Capítulo II) e dos Documentos juntos como nºs 10 e 11 com a Petição Inicial.
14. A realização de obras no local locado por iniciativa do arrendatário estão, nos termos do contrato de arrendamento estabelecido entre as partes no ano de 1992 sempre dependentes de autorização do senhorio, não só por via do contratado entre as partes mas também por via do disposto no Art. 64º nº 1 alínea d) do Regime de Arrendamento Urbano (RAU).

15. O Réu não alegou, não demonstrou e por isso não consta dos factos assentes que as obras executadas na fracção dada de arrendamento tivessem sequer dado início a um processo de licenciamento junto da Câmara Municipal de Leiria e também não consta dos factos assentes por qualquer das instâncias que as obras executadas tivessem tido por finalidade a realização do fim do arrendamento.
16. O Acórdão recorrido ao concluir pela existência de uma autorização implícita da senhoria para a realização das obras identificadas nos pontos 18 e 19 dos factos assentes (cfr transcrição constante do Capítulo II das alegações) ao mesmo tempo que invoca o Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho, faz deste uma interpretação errada uma vez que é reconhecido no próprio Acórdão que as obras não foram licenciadas, nomeadamente, pela Câmara Municipal de Leiria.
17. No caso dos autos o Réu foi titular de um alvará para casa de chá e está realmente, a explorar no local locado um snack bar com confecção e venda de refeições sem qualquer licenciamento administrativo para o efeito porque a Câmara Municipal de Leiria não licenciou, nem as obras nem o estabelecimento que se encontra instalado na fracção dada de arrendamento e que são a causa da resolução peticionada na acção.
18. O Acórdão recorrido ao concluir que as obras realizadas na fracção dada de arrendamento eram estritamente necessárias à actividade exercida pelo Réu no local locado, sem que as mesmas tenham sido licenciadas, violou a Lei substantiva porque não distinguiu a legislação aplicável e os fins para que o arrendamento foi celebrado e omitiu a necessidade do licenciamento do estabelecimento.
19. O Acórdão recorrido acolhendo a tese do Réu recorrente na Apelação e aqui recorrido faz do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho uma aplicação que tem, necessariamente, por pressuposto o Art. 48º do referido diploma legal o qual manteve em vigor o Art.34º do Decreto Lei nº 328/86 de 30 de Setembro para os estabelecimentos de restauração e bebidas na parte respeitante aos estabelecimentos similares.
20. A aplicação do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho mesmo através do recurso ao disposto no seu Art. 48º e atento o mecanismo previsto no Art. 34º do Dec.-Lei 328/86 de 30 de Setembro (diploma este revogado expressamente pelo Dec.-Lei 167/97 de 4 de Julho à excepção apenas do Art. 34º) é sempre dependente da aprovação pelas competentes autoridades administrativas dos projectos previamente apresentados nos termos do próprio diploma.
21. O Acórdão recorrido ao concluir pela existência de uma autorização implícita da Autora/Recorrente por via da declaração constante do ponto 45 dos factos assentes transcritos nas alegações (Cfr. Capítulo II) e por aplicação do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho profere uma decisão contraditória com os próprios factos assentes porque é o próprio acórdão recorrido a aditar à matéria de facto da 1ª instância que "as obras enunciadas no item 18) foram levadas a cabo pelo Réu sem qualquer licenciamento administrativo designadamente por parte da Câmara Municipal de Leiria".

22. O Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho ao manter em vigor para os efeitos desse mesmo diploma o Art. 34º do revogado Decreto Lei nº 328/86 de 30 de Setembro, instituiu um regime, à revelia da legislação específica do arrendamento, de dispensa de autorização do senhorio para os estabelecimentos de restauração e bebidas para além do previsto no Art. do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) introduzido pelo Dec.-Lei 257/95 de 30 de Setembro, o qual entrou em vigor em 5 de Outubro de 1995.
23. A publicação do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho com a inclusão do seu Art.48º prescreveu, através da técnica legislativa de manutenção em vigor de um artigo de um diploma expressamente revogado por outro diploma publicado no mesmo dia, um regime distinto do previsto no Art. 120º do Rau, em vigor desde 5 de Outubro de 1995 para os contratos celebrados a partir desta data. (cfr. Art. 6º do Decreto Lei nº 257/95 de 30 de Setembro).
24. No regime previsto no Art. 120º do RAU para que seja dispensada a autorização do senhorio as obras deverão ser determinadas pelas autoridades administrativas em função do fim específico do contrato, enquanto que no Art. 34º do Decreto-Lei nº 328/86 de 30 de Setembro, mantido em vigor pelo Art. 48º do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho, as obras deverão ter sido aprovadas desde que interessem directamente à indústria e consistam em meras benfeitorias.
25. A dispensa de autorização do senhorio é uma limitação ao direito do proprietário/locador e, nessa medida, o Decreto-Lei nº 168/97 de 4 de Julho através da adopção do prescrito no Art. 34º do Decreto-Lei nº 328/86 de 30 de Setembro manteve um regime diferente e mais restritivo do previsto no Art. 120º do RAU porque pode ficar dependente apenas da vontade do locatário.
26. É inconstitucional o Art. 48º do Decreto-Lei nº 167/97 de 4 de Julho sem que o Governo tenha obtido autorização legislativa da Assembleia da República para legislar em matéria de arrendamento, sendo também inconstitucional o próprio Art. 34º do Decreto Lei nº 328/86 de 30 de Setembro e a sua manutenção em vigor por aquele primeiro diploma, tudo por violação da reserva de competência legislativa da Assembleia da Republica.
27. O Governo legislou sobre matéria que se enquadra no Regime Geral do Arrendamento Urbano, através de simples Decreto-Lei e utilizou a técnica de manutenção em vigor de uma excrescência de um diploma legal, substraindo-se ao controlo legislativo da Assembleia da Republica uma vez que é este o órgão de Soberania com competência para legislar em matéria de arrendamento.

28. Não sendo aplicável às obras descritas nos factos assentes o Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho por inexistência de licenciamento das autoridades administrativas, nem pela via do regime previsto Art. 120º do RAU na redacção que lhe foi dada pelo Decreto nº 257/95 de 30 de Setembro é dispensável a autorização da senhoria/recorrente, uma vez que o contrato de arrendamento cuja resolução se pede na presente acção foi celebrado em 6 de Fevereiro de 1992 e o Art. 120º do RAU é apenas aplicável aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, ou seja, após 5 de Outubro de 1995.
29. O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra violou o direito substantivo e decidiu contra matéria de facto assente (Cfr. pontos 14, 17, 20 e 45 do Capítulo II destas alegações), porque fez uma utilização abusiva e despropositada do Decreto-Lei nº 168/97 de 4 de Julho.
30. O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 16 de Janeiro de 2007, para além da violação da Lei substantiva, por inaplicabilidade do Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho em face da reconhecida inexistência de licenciamento da obras, aplicou em bloco o referido Decreto Lei nº 168/97 de 4 de Julho, incluindo o seu Art. 48º, ou seja, fez uso de uma norma materialmente inconstitucional, infringindo, também desse modo, o disposto no Art. 204º da Constituição da República Portuguesa.

NORMAS VIOLADAS
Art. 165º alínea h); Art. 198º nº 1 a) e Art. 204º todos da Constituição da República Portuguesa na redacção de 1997.
Art. 294º C. Civil.
Art. 64º, alínea d) do RAU aprovado pelo Decreto Lei nº 321-B/90 de 15 de Outubro na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 257/95 de 30 de Setembro.
Art.s 264º, Art. 664º, Art. 659º nº 3, Art. 712º, Art. 713º nº 2 Código do Processo Civil.
Art. 2º, Art. 5º, Art. 48º, Art. 49º, Art. 50º do Dec-Lei nº 168/97 na redacção do Decreto-Lei nº 139/99.
Art. 35º do Decreto Regulamentar nº 38/97.
Art. 2º do Decreto Regulamentar nº 49/99 de 1 de Abril.
O Art. 34º do Decreto-Lei 328/86 de 30 de Setembro.

Nestes termos deve ser concedido provimento ao presente recurso de Revista e, em consequência ser proferido Acórdão a revogar o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra e, em consequência, a julgar procedentes os pedidos formulados na Acção Ordinária e identificados em a), b), c) e d) da P.I. não só, nos termos em que foi decidido pela 1ª Instância para fundamentar a resolução do Contrato de Arrendamento, mas também com fundamento em todas as obras realizadas na fracção objecto do contrato de arrendamento.

i) Contra-alegou o réu, pugnando pela confirmação do julgado.
j) Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. A materialidade fáctica que como definitivamente fixada se tem é elencada no acórdão sob recurso, para o qual, quanto a tal conspecto, remetemos, consoante permitido pelo art. 713º nº 6 do CPC, normativo este aplicável, na hipótese "sub judice", "ex vi" do plasmado no art. 726º do mesmo Corpo de Leis.

III. O DIREITO:

1. Estando-se ante caso contemplado no art. 713º nº 5 do CPC, o qual joga por força do preceito já nomeado em II., dita-se o naufrágio da pretensão recursória, remetendo para os fundamentos da decisão impugnada, doravante tão só designada por "acórdão".
2. Sem embargo de tal, por de toda a pertinência isso se perfilar, sopesado o levado às conclusões da alegação da recorrente, as quais, como consabido, delimitam o âmbito do recurso (art.s 684º nº 3, 690º nº 1 do CPC), sempre se acrescentará:
a) A vertente acção de despejo foi intentada com os fundamentos a que aludiam as als. b) e d) do nº 1 do art. 64º do RAU, obras alegadamente levadas a cabo pelo arrendatário, no locado, com eficácia resolutória, sendo as enumeradas no art. 30º do articulado primeiro.

Pois bem:
Na sentença apelada, "inter alia", decidiu-se:
1'. Não proceder a acção com o primeiro dos enunciados fundamentos.
2'. Proceder a acção, com o fundamento citado na al. d) do nº 1 do art. 64º do RAU, tão só por construção, pelo réu, no arrendado, de "uma casa de banho na cozinha, para uso dos empregados do estabelecimento", "por configurar uma alteração substancial da disposição interna das divisões do prédio arrendado, sem consentimento escrito da senhoria, não, consequentemente, pela apurada feitura de outras obras, à liça trazidas por AA, em prol da procedência da acção com o fundamento em dissecação.
Acontece que a autora, a recorrida, não requereu a ampliação do âmbito da apelação, com arrimo no art. 684º-A nº 1 do CPC.
Logo, como indúbio tal temos, em sede de revista, não pode, procedentemente, a autora sustentar a bondade da concessão daquela, chamando, de novo, à discussão, como é realidade, obras feitas pelo arrendatário, sem a eficácia dita, como foi julgado por sentença, quanto a tal transitada em julgado (art. 677º do CPC).
Admitir a redita de tal discussão, ora, consubstanciaria, é tal apodíctico, defeso olvido do alcance do caso julgado material (cfr. art.s 671º nº1 e 673º do CPC).
Temos, nesta conformidade, que, a discutir pelo Tribunal "a quo", tão só, outrossim, estava a eficácia resolutória da obra já destacada, como "expressis verbis" salientando no "acórdão", aliás (vide fls. 358).

Prossigamos:
b) Da não prova da necessidade invocada, nomeadamente, nas conclusões 10ª e 15ª da alegação da ré:
Se é um facto que o nº 36º da base instrutória não mereceu resposta afirmativa, menos verdade não é que a que houve foi deficiente, já que é flagrante que o Tribunal deixou, em substância, de decidir a factualidade-objecto de tal nº da base instrutória (cfr. Alberto dos Reis, in "Código de Processo Civil Anotado", vol. IV, pág. 528).
"Quid juris", ponderado tal vício na resposta citada?
Como certo se tem que a (s) deficiência (s) da (s) resposta (s) a nº(s) da base instrutória implica (m) com os poderes do STJ quando, na sua função específica de Tribunal de revista, entende que a (s) deficiência(s) respeita (m) a facto (s) essencial (ciais) para a decisão de direito (1ª parte do nº 3 do art. 729º do CPC), hipótese essa em que se impõe o ordenar do regresso a que alude este último artigo de lei, para ampliação da matéria de facto (vide Ac. do STJ, de 02-05-02, proferido nos autos de Revista registados sob o nº 1144/02-7ª).
No caso em apreço, todavia, entendemos que, pese embora a deficiência, relatada, não se impõe ordenar a baixa do processo ao Tribunal "a quo", já que a escrita necessidade da única obra de que urge curar, pelo já expandido, à data da sua efectivação, note-se, para o desenvolvimento, no locado, das actividades contratualmente consentidas, para, em súmula, o vazado na carta citada no "acórdão" sob o nº II-B) 45. (cfr. fls. 356), resulta da lei, como naquele sublinhado, onde, com sageza, se explicita o porquê do dever ter-se essa obra como, por escrito, implicitamente, consentida pela senhoria, contradição alguma, acrescente-se, havendo entre tal e o constante de II. A) 20 do "acórdão", tal como, é líquido, com o expresso na conclusão 21ª da alegação da revista.
A ocorrência de não consentimento, por parte da senhoria, para a efectivação da obra a que se reporta o "acórdão", como, ao arrepio do decidido em 1ª instância, também destituída de eficácia resolutória, por parte do arrendatário, considerado (s) o (s) fim (fins) do arrendamento e os normativos citados no "acórdão" em III. 4. e 4.1, constituiria, isso sim, paradigma de abuso de direito (art. 334º do CC) - cfr. Aragão Seia, in "Arrendamento Urbano-Anotado e Comentado", 4ª Edição, págs. 346 e 347 - nota 2.
O não licenciamento administrativo da obra, a inexistência de alvará para o desenvolvimento, no locado, de determinada actividade contratualmente consentida, não desagua, sem mais, é vítreo, na procedência da acção com o fundamento constante da alínea d) do nº 1 do art. 64º do RAU, antes constituindo contra-ordenações puníveis nos termos da lei.
Nem se antolha, minimamente, a violação com a fonte levada à conclusão 18ª da alegação da demandada.
Não é, mas seguramente, o licenciamento da obra que a torna estritamente necessária ao exercício, no arrendado, do(s) fim (fins) contratados (s)!...
O que há, tal sendo díspar, é uma série de requisitos legais mínimos das instalações e do funcionamento de estabelecimentos como o existente no arrendado, aqueles demandando, a não se mostrarem, obviamente, satisfeitos, a efectivação de obras sujeitas a licenciamento.

c) Atento o dilucidado, prejudicado fica o conhecimento da suscitada questão da inconstitucionalidade material das normas invocadas pela recorrente (conclusão 26ª da sua alegação), razão pela qual dela se não conhece (art.s 660º nº 2, 713º nº2 e 726º, todos do CPC).
Efectivamente:
O Tribunal "a quo", com acerto, não fez uso de tais dispositivos legais para ancorar a bondade da procedência da apelação.

IV. CONCLUSÃO:

Termos em que se nega a revista, confirmando-se o "acórdão".
Custas pela recorrente (art. 446º nºs 1 e 2 do CPC).

Lisboa, 13 de Setembro de 2007.

Pereira da Silva
Rodrigues dos Santos
João Bernardo.