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JUIZ
NOMEAÇÃO
CATEGORIA PROFISSIONAL
ANTIGUIDADE
Sumário
I - A Lei do CEJ é clara ao indicar que o provimento na categoria de juiz é feito pelo CSM após graduação dos auditores de justiça e, portanto, só a partir da publicação no Diário da República da respectiva nomeação como juízes de direito em regime de estágio começa a contar a antiguidade na categoria. II - Esta regra de contagem da antiguidade dos magistrados na categoria de juiz de direito aplica-se actualmente, sem excepção, a todos os juízes, oriundos de um curso normal de formação ou de um curso especial.
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
1.A, juíza de direito, apresenta recurso contencioso, nos termos do art.º 168.º e segs. do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), da deliberação do Plenário do Conselho Superior de Magistratura de 7 de Novembro de 2006, que indeferiu uma reclamação que apresentara da lista de antiguidade referente a 31/12/2004 e também do Aviso n.º 4929/2005 (publicado no Diário da República, II Série, n.º 90, de 10/05/2005, a págs. 7294 e segs) e que ordenou uma correcção da mesma lista de antiguidade na parte referente ao tempo de serviço como juiz de direito da reclamante (e de outros).
A RECORRENTE INDICA A SEGUINTE MATÉRIA FACTUAL:
A recorrente frequentou o XXI curso normal de formação de magistrados do Centro de Estudos Judiciários, tendo sido nomeada auditora de justiça pelo Despacho n.º 21 337/2002, do Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça, publicado no Diário da República, II Série, n.º 228, de 2/10/2002, a págs. 16 525, com efeitos a partir de 16/09/2002.
Concluído tal curso, foi nomeada juíza de direito em regime de estágio pelo Despacho do Conselho Superior da Magistratura n.º 19 297/2004, publicado no Diário da República, II Série, n.º 217, de 14/09/2004, a págs. 14 015 e 14 016, com efeitos a partir de 15/09/2004.
Os colegas que frequentaram o I curso especial de formação de magistrados foram nomeados auditores de justiça através do Despacho n.º 10 751/2003, publicado no Diário da República, II Série, n.º 125 de 30/05/2003, a págs. 8375 e 8376, com efeitos a partir de 19/05/2003 e foram nomeados juízes estagiários pelo Despacho n.º 19 889/2003 do juiz secretário do Conselho Superior da Magistratura, publicado no Diário da República, II Série, n.º 241, de 17/10/2003, com efeitos a partir ele 08/10/2003.
O Conselho Superior da Magistratura elaborou a lista de antiguidade a que se refere o art.º 76.º do EMJ, com referência à data de 31/12/2004 e, nela, a recorrente, bem como todos os demais juízes que frequentaram o XXI curso normal de formação de magistrados, foram colocados abaixo dos colegas que frequentaram o I curso especial de formação de magistrados, apesar de aí constar que a recorrente e os demais juízes que frequentaram aquele XXI curso normal terem, em 31/12/2004, 2 anos, 3 meses e 17 dias de serviço, tanto na categoria como na função, e os colegas que frequentaram o referido I curso especial de formação terem, em 31/12/2004, 1 ano, 7 meses e 21 dias de serviço, tanto na categoria como na função.
No Aviso n.º 4 929/2005 (publicado no Diário da República, II Série, n.º 90, de 10/05/2005, a págs. 7294 e segs), respeitante ao movimento judicial ordinário de 2005, referia-se que os juízes do I curso especial de formação de magistrados, independentemente da respectiva modalidade de recrutamento (de entre juízes de nomeação temporária ou de entre assessores dos tribunais da Relação e de 1.ª instância), seriam colocados, a par dos juízes do XXI curso normal de formação de magistrados, em tribunais de primeiro acesso e, no ponto 8, indicava-se que os juízes de direito do XXI curso normal de formação de magistrados “serão movimentados após o I Curso Especial”.
A recorrente apresentou ao CSM uma reclamação contra a referida lista de antiguidade e contra o aludido Aviso, considerando que deveria ter sido colocada na lista de antiguidade antes dos juízes do I Curso Especial, por ter mais tempo de serviço na categoria do que eles e que deveria ser movimentada antes desses juízes pela mesma razão.
Na deliberação recorrida, proferida em sessão plenária de 07/11/2006, o Conselho Superior da Magistratura julgou improcedentes as reclamações apresentadas pela aqui recorrente e pelos demais colegas e ordenou ainda a correcção da lista de antiguidade "na parte referente ao tempo de serviço como juiz de direito, tanto relativamente aos reclamantes como aos respondentes, por forma a que dela passe a constar apenas o tempo de serviço na magistratura, contado a partir da sua nomeação como juiz de direito estagiário ou em regime de estágio”.
CONCLUSÕES APRESENTADAS PELA RECORRENTE NO RECURSO PARA ESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
I. A antiguidade dos juízes de primeira instância (seja na carreira seja na categoria) conta-se desde a data do provimento como auditor de justiça, pois é a este provimento que se refere o art. 72.º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais;
II. O Conselho Superior da Magistratura sempre o reconheceu, tendo desde sempre e até hoje contado o tempo de serviço de todos os magistrados desde a data do seu provimento como auditores de justiça;
III. A recorrente e os seus colegas que frequentaram o XXI Curso Normal de Formação de Magistrados foram providos como auditores de justiça em data muito anterior aos colegas que frequentaram o I Curso Especial de Formação de Magistrados, pelo que (como o Conselho Superior da Magistratura bem o reconhece na lista de antiguidade que ora se impugna) têm maior antiguidade seja na carreira seja na categoria que estes últimos;
IV. Assim sendo, tem a recorrente e os demais magistrados oriundos do XXI Curso Normal de ser graduados antes dos colegas que frequentaram o I Curso Especial, pelo que a lista de antiguidade impugnada está manifestamente mal elaborada e viola o citado art.º 72.º, n.º 1 do EMJ;
V. Do mesmo modo, o aviso n.º 4 929/2005 (publicado no Diário da República, II Série, n.º 90, de 10/05/2005, a págs. 7.294 e ss.), respeitante ao movimento judicial ordinário de 2005 (bem como os relativos aos movimentos judiciais posteriores a este), viola o disposto no art. 44.º, n.º 3 do EMJ, na medida em que, apesar de os magistrados que frequentaram o XXI Curso Normal terem maior antiguidade do que aqueles que frequentaram o I Curso Especial (e uma vez que todos tinham àquela data a mesma classificação presumida de Bom, nos termos do disposto no art. 36.°, n.º 4 do EMJ, pois nenhum tinha ainda sido inspeccionado), aquele aviso determinou que estes últimos seriam colocados antes e com preferência sobre os primeiros;
VI. A deliberação recorrida contraria expressamente (sem fundamentar minimamente tal inversão de posição), o entendimento e a prática desde sempre seguidos pelo Conselho Superior da Magistratura no que toca à contagem do tempo de serviço;
VII. Em deliberação proferida na sessão plenária de 30/05,/2005, o Conselho Superior da Magistratura expressamente decidiu que a antiguidade dos magistrados (seja na carreira, seja na categoria) se conta desde a data de provimento como auditor de justiça, o que está de acordo com o que sempre tez;
VIII. A deliberação recorrida, sem sequer fazer qualquer referência a esta deliberação anterior ou mencionar quaisquer normas legais que justificassem a mudança de posição, contrariou expressamente aquela posição que sempre o CSM seguiu;
IX. Mais ainda, não apenas o Conselho Superior da Magistratura anteriormente à deliberação sempre seguiu entendimento diferente, como após a deliberação continuou a seguir aquele primeiro entendimento;
X. Efectivamente, no movimento judicial ordinário de Julho de 2006, o Conselho Superior da Magistratura para efeitos de colocação de magistrados como juízes de círculo (art.º 45.° do EMJ) contou o tempo de serviço desde a data de provimento como auditor de justiça e não (como decidiu na deliberação recorrida) desde a data de tornada de posse como juiz estagiário;
XI. Ou seja, apenas e só no caso do XXI Curso Normal e do I Curso Especial o Conselho Superior da Magistratura decidiu contar o tempo de antiguidade do modo que fez na deliberação recorrida - não havendo qualquer justificação legal ou material para este tratamento especial e não o justificando sequer o Conselho Superior da Magistratura na deliberação recorrida, o que constitui manifesta e clamorosa violação do princípio da igualdade plasmado no art. 13.º da CRP;
XII. A deliberação recorrida gera desigualdades manifestas no que toca à posição comparativa dos magistrados que frequentaram o XXI Curso Normal e daqueles que frequentaram o I Curso Especial;
XIII. Por um lado, colegas que - tal como aqueles que acederam ao I Curso Especial - eram assessores dos tribunais e (ao contrário dos demais) fizeram e foram aprovados nos exames de acesso ao XXI Curso Normal (como os colegas do XXI Curso Normal José Carlos Lopes Pinto e Ana Tânia Melro Vidal Correia), vêem-se agora ultrapassados por colegas que ou desistiram ou reprovaram nestes mesmos exames;
XIV. Esta situação é tanto mais injusta quanto os colegas em causa chegaram a pedir a mudança para o I Curso Especial (pois frequentariam o curso deformação por um período menor, com os consequentes menores transtornos de deslocação e maior remuneração por tomarem posse como estagiários mais cedo), e o Conselho Superior da Magistratura indeferiu o seu pedido;
XV. Mas por outro lado, mesmo em relação a todos os magistrados oriundos do XXI Curso Normal a situação criada pela deliberação recorrida é gritantemente injusta;
XVI. Vários colegas que frequentaram o I Curso Especial concorreram ao XXI Curso Normal e ou desistiram ou não foram aprovados nos exames de acesso;
XVII. Com a deliberação recorrida, estes colegas passam agora à frente daqueles que obtiveram aprovação nos mesmos exames em que eles ou desistiram ou reprovaram;
XVIII. Note-se que nenhum dos magistrados do XXI Curso Normal foi excluído ou viu o seu estágio prolongado no CEJ - todos cumpriram à risca o tempo de formação, não lhes sendo imputável qualquer acto que pudesse gerar um "atraso" na carreira que os pudesse colocar atrás dos colegas do I Curso Especial;
XIX. Assim, na prática os magistrados oriundos do XXI Curso Normal estão a ser prejudicados por terem sido aprovados nos exames de acesso, estando a beneficiar-se quem desistiu ou reprovou, o que é de todo em todo ilógico e manifestamente injusto;
XX. Por último, e sem conceder, ainda que se entendesse que deve ser mantido o indeferimento das reclamações apresentadas pela recorrente, nunca a parte da deliberação na qual se ordena a reelaboração da lista de antiguidade contando-se o tempo de serviço apenas desde a data de tornada de posse como juiz estagiário poderá ser mantida, pois excede manifestamente o que fora pedido ao Conselho Superior da Magistratura na reclamação apresentada.
A deliberação recorrida violou, entre outros, os art.ºs 44.º e 72.º e ss. do EMJ, bem como o art. 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser anulada a deliberação recorrida, por ilegal, determinando-se ao Conselho Superior da Magistratura que
A) revogue a lista de antiguidade referente a 3112/2004, elaborando-se uma nova, na qual a recorrente e os demais Colegas que frequentaram o XXI Curso Normal de Formação de Magistrados sejam graduados acima dos Excm.ºs Colegas que frequentaram o I Curso Especial de Formação de Magistrados, situação que deve obviamente manter-se nas listas de antiguidade elaboradas a partir daquela aqui impugnada;
B) revogue o Aviso n.º 4929/2005 (publicado no Diário da República, II série, n.º 90, de 10/05/2005, a págs. 7294 e ss.) na parte do seu ponto 8 em que se refere que os juízes de direito do XXI Curso Normal de Formação de Magistrados serão movimentados após o I Curso Especial, passando a considerar-se que os juízes de direito do XXI Curso Normal de Formação de Magistrados deveriam ter sido movimentados antes do I Curso Especial nesse movimento judicial, bem como em todos os movimentos judiciais (ordinários e subsequentes.
Sem prescindir, ainda que se não entendesse revogar a deliberação no seu todo conforme acima pedido, sempre deverá a deliberação recorrida ser anulada na parte em que ordena reelaboração da lista de antiguidade e a contagem do tempo de serviço nos termos aí ordenados pelo Conselho Superior da Magistratura.
2.O Conselho Superior da Magistratura respondeu ao recurso, alegando, em resumo, o seguinte:
- Nos termos do art.º 72° do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a antiguidade dos magistrados na categoria conta-se desde a data da publicação do provimento no Diário da República.
- Esse provimento só pode ser entendido, tendo em conta o disposto no art.º 70°, n.º 1 da Lei 16/98 de 8/04 (Lei do CEJ), como o provimento em que o auditor de justiça é nomeado juiz de direito em regime de estágio, pelo Conselho Superior da Magistratura, nos termos do art.º 68° da mesma Lei.
- Pois que, só então, apesar de se encontrarem em regime de estágio e com a assistência de formadores, os juízes estagiários passam a exercer, sob responsabilidade própria, as funções inerentes à respectiva magistratura, com os respectivos direitos, deveres e incompatibilidades (art.º 70° da referida Lei).
- Sendo certo que, antes dessa primeira nomeação pelo CSM como juízes de direito em regime de estagio, estes têm o estatuto de auditor de justiça estando sujeitos, quanto a direitos, deveres e incompatibilidades ao regime da função pública (art.ºs 52º e 53.º da Lei 16/98), podendo mesmo nem vir a ficar aprovados na fase de formação teórico-prática inicial.
- E só após terem sido classificados e graduados como auditores de justiça é que poderão fazer a opção pela magistratura judicial ou do M.º Público, só podendo então ser nomeados juízes estagiários, se essa for a opção, e ficar sujeitos ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, com os inerentes direitos e deveres.
- Não pode assim considerar-se, tal como defende a recorrente, a data do ingresso no CEJ, em curso normal de formação, como provimento a atender para efeitos de antiguidade na categoria, desde logo, porque a admissão no CEJ não depende de qualquer provimento do CSM mas antes da aprovação do candidato nos testes de aptidão, num processo de selecção que é dirigido e realizado pelo próprio CEJ.
- Esta regra de contagem da antiguidade dos magistrados na categoria aplica-se actualmente, sem excepção, a todos os juízes de direito nomeados como tal pelo CSM, sejam eles oriundos de um curso normal de formação ou de um curso especial.
- Não tendo assim ocorrido no passado em que por força do art.º 2°, n.º 3 do DL n.º 264-A/81 de 3/09 (revogado pela actual Lei do CEJ) a antiguidade dos magistrados saídos de cursos especiais se contava desde a data da publicação do provimento como auditores de justiça.
- Ora, os Excm.ºs juízes do I curso especial, foram nomeados juízes de direito em regime de estágio, com efeitos a partir de 8 de Outubro de 2003 conforme Despacho n.º 19 889/2005 do Sr. juiz secretário do Conselho Superior da Magistratura, publicado no DR n.º 241, II série, de 17/10/03. e como tal, foram incluídos na lista de antiguidade referente a 31.12.2003.
- Por sua vez a Excm.ª juíza recorrente e todos os demais que com ela foram classificados e graduados no XXI curso normal de formação, foram nomeados como juízes estagiários pelo Conselho Superior da Magistratura, pelo Despacho n.º 19 297/2004, publicado no DR n.º 217, II série, de 14/09/04, com efeitos a partir de 15/09/04 e só então puderam ser incluídos na lista de antiguidade na categoria reportada a 31/12/2004, tendo sido graduados, como resulta da lei, imediatamente a seguir àqueles.
- A lista de antiguidade referente a 31/12/2004, contra a qual os Excm.ºs juízes do XXI curso normal reclamaram, obedeceu, pois, na sua elaboração, ao disposto no art.º 72° do EMJ e dela constam todos os elementos exigidos no art.º 76°, n.º 2 do mesmo diploma.
- Ao contrário do alegado pela Excm.ª juíza, o Aviso n.º 4929/2005 respeitante ao movimento judicial ordinário de 2005 não podia deixar de prever, como previu, além do mais, que os juízes de direito do XXI curso normal de formação de magistrados seriam movimentados após o I curso especial, pois só assim se estava a dar cumprimento à lei.
- E não se diga que deste entendimento possam ter resultado "desigualdades" no que toca a posição comparativa entre magistrados que podiam ter acedido ao I curso especial, por terem sido assessores e que foram aprovados nos exames de acesso ao XXI curso normal, e aqueles outros que tendo desistido ou reprovado em tais exames, por terem frequentado o curso especial, acabaram por ultrapassar aqueles.
- Estamos perante uma situação excepcional - existência de um curso especial - motivada pela necessidade de extrema carência de quadros ao nível da magistratura judicial que então se fez sentir, que só poderia atingir os objectivos para que foi projectado através de uma formação encurtada e acelerada de novos juízes,
- Que por força da lei adquiriram de pleno os mesmos direitos que os restantes juízes do XXI curso normal de formação, a partir do momento em que todos eles foram nomeados como juízes estagiários pelo Conselho Superior da Magistratura.
- Na situação anterior referida pela recorrente, o Conselho Superior da Magistratura pronunciou-se pela contagem do tempo de serviço, que não se confunde com antiguidade na categoria, para efeitos de subida de escalão remuneratório.
- De todo o modo, ao CSM assiste o direito de rever e alterar as suas deliberações, desde que o faça de forma fundamentada, como fez no caso da decisão recorrida.
- Igualmente não se vislumbra em que medida a deliberação recorrida afecta a nomeação dos juízes de círculo e viola o princípio da igualdade uma vez que a exigência dos 10 anos de serviço prevista no art.º 45° do EMJ, para a nomeação como juiz de círculo, tem sido entendida pelo CSM, como atinente ao serviço na carreira, contabilizando-se nesta o período da formação como auditores, o que não coincide com a antiguidade na categoria como juiz de direito.
- Por último, quanto ao alegado "excesso de pronúncia" da decisão recorrida, estando em causa uma questão da lista da antiguidade na categoria, tendo o CSM constatado, pelos próprios fundamentos da reclamação que esteve na origem da decisão recorrida, que existia um erro material na graduação, optou desde logo por determinar as necessárias correcções, o que fez ao abrigo da faculdade de correcção oficiosa prevista no art.º 79.º do EMJ.
- Nestes termos, entende o Conselho Superior da Magistratura que o recurso da Excm.ª juíza deve ser apreciado em conformidade com o exposto e julgado improcedente.
3. Citados os interessados referidos pela recorrente, nos termos e para os efeitos do art.º 175.º do EMJ, responderam as Excm.ªs Juízas Dr.ªs B, C e D.
Recorrente e recorrido alegaram, mantendo as suas posições anteriores e o Ministério Público junto deste Supremo pronunciou-se no sentido de se reiterar o recente Ac. do STJ, da Secção do Contencioso, proferido em caso similar e com idênticos fundamentos, datado de 26/10/2007, no proc. 184/07-2.
4. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
As principais questões a decidir são as seguintes:
1ª- A deliberação recorrida violou os art.ºs 44.º e 72.º e segs. do EMJ, isto é, as regras legais sobre colocação de juízes e sua antiguidade?
2ª- A deliberação recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia?
3ª- A deliberação recorrida é contraditória com outras anteriores ou posteriores do mesmo órgão?
3ª- A deliberação recorrida violou o art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa, isto é, o princípio da igualdade?
VIOLAÇÃO DAS REGRAS LEGAIS SOBRE A ANTIGUIDADE E COLOCAÇÃO DOS JUÍZES?
Nos termos do art.º 72° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, de ora em diante designada por EMJ) a antiguidade dos magistrados na categoria conta-se desde a data da publicação do provimento no Diário da República.
Como resulta da simples leitura desta norma, o “provimento” refere-se ao provimento na “categoria” do magistrado, isto é, como juiz de direito, como juiz Desembargador ou como juiz Conselheiro.
O provimento dos juízes é sempre feito pelo Conselho Superior da Magistratura (art.ºs 38.º e seguintes do EMJ).
E o primeiro provimento como juiz está regulado no art.º 42.º do EMJ, onde se diz, sob a epígrafe “primeira nomeação”, que os juízes de direito são nomeados segundo a graduação obtida nos cursos e estágios de formação.
Assim, não faz qualquer sentido face às normas jurídicas em vigor defender, como faz a recorrente, que a antiguidade dos magistrados na categoria se conta desde o ingresso no Centro de Estudos Judiciários, pois a admissão no CEJ não depende de qualquer provimento do CSM mas antes da aprovação do candidato nos testes de aptidão, num processo de selecção que é dirigido e realizado pelo próprio CEJ e é nessa escola que se desenrola o curso e o estágio de formação.
Tanto mais que o ingresso no CEJ confere ao candidato admitido apenas o estatuto de auditor de justiça (art.º 52.º da Lei 16/98) e os auditores de justiça não estão sujeitos, quanto a direitos, deveres e incompatibilidades, ao estatuto de magistrados judiciais, mas ao regime da função pública (art.º 53.º), podendo nem vir a ficar aprovados na fase de formação teórico-prática inicial ou, então, mesmo que aprovados, podendo optar pela magistratura do M.º P.º.
Tal Lei clarifica, ainda, no art.º 68.º, n.ºs 1 e 2, que os auditores de justiça graduados são nomeados juízes de direito ou delegados do procurador da República em regime de estágio, respectivamente, pelo Conselho Superior da Magistratura ou pelo Conselho Superior do Ministério Público e que, enquanto não forem nomeados, os candidatos à magistratura mantêm o estatuto de auditores de justiça, pelo que os direitos, deveres e incompatibilidades da magistratura judicial só se adquirem quando o auditor de justiça é nomeado juiz de direito em regime de estágio (art.º 70°, n.º 1).
Daí que a Lei do CEJ também seja clara ao indicar que o provimento na categoria de juiz é feito pelo CSM após graduação dos auditores de justiça e, portanto, só a partir da publicação no Diário da República da respectiva nomeação como juízes de direito em regime de estágio começa a contar a antiguidade na categoria.
Esta regra de contagem da antiguidade dos magistrados na categoria de juiz de direito aplica-se actualmente, sem excepção, a todos os juízes, oriundos de um curso normal de formação ou de um curso especial.
O recorrido bem lembra que nem sempre foi assim no passado, em que por força do art.º 2°, n.º 3 do DL n.º 264-A/81 de 3/09 (revogado pela actual Lei do CEJ) a antiguidade dos magistrados saídos de cursos especiais se contava desde a data da publicação do provimento como auditores de justiça, “norma que, então fazia todo o sentido dada a frequência dos chamados cursos especiais de formação em simultâneo com os cursos normais, precisamente para salvaguardar a maior antiguidade dos juízes saídos dos primeiros, sempre de menor duração, e para fazer face ás enormes carências de juízes que então se faziam sentir”.
A revogação daquela norma indica que a antiguidade dos magistrados judiciais saídos de cursos especiais, como dos magistrados judiciais saídos de cursos normais, passou a ser aferida pelos mesmos critérios, isto é, face ao disposto no art.º 72.º do Estatuto dos Magistrados judiciais, conjugado com o disposto no art.º 70.º da Lei nº 16/98 de 8/04.
Ora, os juízes do I curso especial foram nomeados juízes de direito em regime de estágio, com efeitos a partir de 8 de Outubro de 2003, conforme Despacho n.º 19 889/2005 do juiz secretário do Conselho Superior da Magistratura, publicado no DR n.º 241, II série, de 17/10/03, e como tal, foram incluídos na lista de antiguidade referente a 31.12.2003.
Por sua vez a Excm.ª juíza recorrente e todos os demais que com ela foram classificados e graduados no XXI curso normal de formação, foram nomeados como juízes estagiários pelo Conselho Superior da Magistratura, pelo Despacho n.º 19 297/2004, publicado no DR n.º 217, II série, de 14/09/04, com efeitos a partir de 15/09/04 e só então puderam ser incluídos na lista de antiguidade na categoria reportada a 31/12/2004, tendo sido graduados, como resulta da lei, imediatamente a seguir àqueles.
A lista de antiguidade referente a 31/12/2004, contra a qual a recorrente se insurge, obedeceu, pois, na sua elaboração, ao disposto no art.º 72° do EMJ e dela constam todos os elementos exigidos no art.º 76°, n.º 2 do mesmo diploma (“a lista de antiguidade dos magistrados judiciais é publicada anualmente pelo Ministério da Justiça, no respectivo Boletim ou em separata deste...os magistrados são graduados em cada categoria de acordo com o tempo de serviço...”).
Consequentemente, e por força do disposto no art.º 44°, n.º 3 do EMJ, a Excm.ª juíza recorrente tal como os demais juízes do XXI curso normal de formação foram colocados, a primeira vez, como juízes de direito, em comarcas de primeiro acesso ou como auxiliares a aguardarem vaga para o 1° acesso, imediatamente após os juízes do I curso especial, com mais antiguidade na categoria, segundo a graduação obtida nos cursos e estágios de formação, uma vez que nem uns nem outros haviam sido submetidos ao tempo, a qualquer inspecção judicial, nos termos do disposto nos art.ºs 42°, 44°, n.º 2 e 75°, al. a), todos do EMJ.
Por isso, ao contrário do invocado pela recorrente, o Aviso n.º 4929/2005 respeitante ao movimento judicial ordinário de 2005 não podia deixar de indicar que os juízes de direito do XXI curso normal de formação de magistrados seriam movimentados após o I curso especial, pois só assim se estava a dar cumprimento à lei.
Em suma, a deliberação recorrida não violou os art.ºs 44.º e 72.º e segs. do EMJ.
A DELIBERAÇÃO RECORRIDA ENFERMA DE NULIDADE POR EXCESSO DE PRONÚNCIA?
Como se mostra referido no relatório deste acórdão, o Conselho Superior da Magistratura elaborou a lista de antiguidade a que se reporta o art.º 76.º do EMJ, com referência à data de 31/12/2004 e, nela, a recorrente, bem como todos os demais juízes que frequentaram o XXI Curso Normal de Formação de Magistrados, foram colocados abaixo dos juízes que frequentaram o I Curso Especial de Formação de Magistrados, fazendo-se constar que a recorrente e os demais juízes que frequentaram aquele XXI Curso Normal tinham, naquela data, 2 anos, 3 meses e 17 dias de serviço, tanto na categoria como na função, e os juízes que frequentaram o I Curso Especial de Formação tinham, também naquela data, 1 ano, 7 meses e 21 dias de serviço, tanto na categoria como na função.
Porém, na deliberação recorrida, proferida após reclamação da ora recorrente (e de outros), o Conselho Superior da Magistratura julgou improcedentes as reclamações apresentadas e ordenou ainda a correcção da lista de antiguidade "na parte referente ao tempo de serviço como juiz de direito, tanto relativamente aos reclamantes como aos respondentes, por forma a que dela passe a constar apenas o tempo de serviço na magistratura, contado a partir da sua nomeação como juiz de direito estagiário ou em regime de estágio”.
Contra esta última parte insurge-se a recorrente, não só pela violação de lei (cuja falta de fundamento já apurámos), mas por excesso de pronúncia, já que, na sua óptica, o CSM teria de decidir a sua reclamação e nesta não tinha sido posta em causa a contagem do tempo de serviço.
Contudo, a lista de antiguidade contra a qual a recorrente reclamou junto do CSM continha, tal como formulada originalmente, uma contradição insanável nos seus próprios termos, que forçosamente teria de vir a ser corrigida. Na verdade, se os juízes do curso normal tinham, alegadamente, mais tempo de serviço na categoria do que os do I curso especial e se não estavam invocados outros critérios, como eventuais classificações de desempenho, como poderiam estes últimos estar colocados à frente daqueles outros? Havia, pois, um erro patente, facilmente detectável pelo observador comum, pois, das duas uma, ou a contagem do tempo de serviço estava incorrecta ou a graduação não estava certa.
O Conselho Superior da Magistratura, alertado para esse erro patente pelo teor da reclamação da recorrente, corrigiu-o na primeira oportunidade que teve, isto é, na decisão dessa reclamação e fê-lo com base legal, pois o CSM quando verifica que há um erro material na graduação, pode a todo o tempo ordenar as necessárias correcções (art.º 79.º, n.º 1, do EMJ).
Deste modo, o CSM não incorreu em excesso de pronúncia e agiu de acordo com as normas jurídicas aplicáveis, nada havendo a lhe censurar.
A recorrente, no fundo, pretendia e pretende ainda fazer-se prevalecer de tal erro material em benefício próprio, mas não pode agora invocar que, perante tal erro, o CSM tivesse de ficar manietado e não o pudesse corrigir, transformando-o num facto consumado e num “direito adquirido” a favor da recorrente e dos juízes do curso normal, mas em prejuízo dos colegas do curso especial.
A DELIBERAÇÃO RECORRIDA É CONTRADITÓRIA COM OUTRAS ANTERIORES OU POSTERIORES DO MESMO ÓRGÃO?
Os órgãos da Administração Pública, entre os quais se inclui o CSM, devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos. É o princípio da legalidade, vertido no art.º 3.º, n.º 1, do CPA (Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro).
No direito português, portanto, a Administração Pública não está vinculada à prática igual de actos anteriores, numa espécie de “case-law” que é uso noutros países.
Por isso, carece de suporte legal a crítica da recorrenteà deliberação recorrida de que é contraditória com outras anteriores ou posteriores do mesmo órgão, já que, ainda que tal fosse verdade, não havia vinculação a procedimento igual, mas apenas ao cumprimento dos exactos termos da Lei. Na verdade, nada garante que o procedimento anterior ou posterior do CSM não tenha violado a lei e, portanto, seria absurdo exigir que o procedimento adoptado no caso em apreço fosse igualmente ilegal por mera exigência de repetição.
De resto, a recorrente não documenta os casos anteriores e posteriores que menciona e não cabe a este STJ o ónus de indagar que casos foram esses e qual ou quais as soluções adoptadas e com que fundamento.
Seja como for, o recorrido adianta que o facto de se ter pronunciado, muito antes da decisão recorrida, sobre uma situação atinente à antiguidade como juiz de direito para efeitos remuneratórios, nos termos constantes de um parecer então elaborado pelo técnico superior jurista, não invalida a decisão ora recorrida, já que então estava apenas em causa a contagem do tempo de serviço, que não se confunde com antiguidade na categoria, para efeitos de subida de escalão remuneratório. E que na nomeação dos juízes de círculo a exigência dos 10 anos de serviço prevista no art.º 45° do EMJ tem sido entendida pelo CSM como atinente ao serviço na carreira, contabilizando-se nesta o período da formação como auditores, o que não coincide com a antiguidade na categoria como juiz de direito.
Assim, nem sequer existirá semelhança de situações, como alega a recorrente, mas não compete a este STJ confirmá-lo ou infirmá-lo.
Assim, não tem fundamento a alegação de dualidade de critérios feita pela recorrente.
A DELIBERAÇÃO RECORRIDA VIOLOU O ART.º 13.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, ISTO É, O PRINCÍPIO DA IGUALDADE?
Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, afirma o art.º 13.º, n.º 1, da Constituição da República.
E, em conformidade, o art.º 5.º, n.º 1, do CPA, dispõe que nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum administrado em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.
Oprincípio da igualdade exige, assim, que todos os que se encontram na situação da recorrente têm de ser objecto do mesmo tratamento. Mas igualdade não é o mesmo que igualitarismo, antes, a exigência de tratar igualmente o que é igual e de modo diferenciado o que é diferente.
Ora, no caso em apreço, os juízes do curso normal e os do curso especial foram tratados por igual perante a lei, pois aplicou-se a ambos o mesmo princípio de contagem do tempo de serviço na categoria para o efeito de antiguidade.
Pelo contrário, a recorrente pretende com o presente recurso que lhe seja reconhecido um tratamento diferenciado, contando-se o seu tempo de serviço na carreira de modo diferente do previsto na lei para todos os demais juízes, incluindo os do curso especial.
Portanto, a haver violação do princípio da igualdade seria se a posição da recorrente lograsse provimento.
Adianta o recorrido que “nessa altura (Julho de 2005), sete dos Excm.ºs juízes do I curso especial já se encontravam colocados obrigatoriamente em comarca de primeiro acesso desde Setembro de 2004, por então terem sido abrangidos pelo movimento judicial ordinário realizado em Julho desse ano e os restantes encontravam-se colocados como juízes auxiliares em diversos tribunais desde 1/04/04, altura em que deixaram de ser juízes de direito estagiários. A defender-se a tese da Excm.ª juíza recorrente, então os Excm.ºs juízes saídos do curso especial e já colocados há um ano em comarcas de primeiro acesso, como efectivos, deveriam ter ficado a aguardar a colocação, em primeiro lugar, dos Excm.ºs juízes do XXI curso normal, que haviam terminado o estágio pouco tempo antes e se encontravam colocados como auxiliares a aguardar a primeira colocação e só depois seriam colocados, de novo no primeiro acesso se ainda houvesse vaga ou então como auxiliares a aguardar vaga para o primeiro acesso. O que, além de traduzir uma subversão das regras de movimentação dos magistrados previstas nos art.ºs 40.º e ss. do EMJ, se traduziria numa situação de discriminação e desigualdade para com os juízes do I curso especial que seriam assim penalizados pelo facto de o respectivo curso de formação ter sido especial e, como tal, mais reduzido para satisfazer as necessidades de carência de juízes em alguns tribunais, situação para a qual de todo não haviam contribuído.”
A recorrente pode sentir-se prejudicada por terem sido parcialmente defraudadas as suas expectativas, pois, já estando como auditora de justiça e com a ideia de ingressar na magistratura judicial, viu que outros que ainda não tinham essa expectativa lhe passavam à frente na carreira, por força de uma lei excepcional, a Lei n.º 7-A/03 de 9/05 que organizou cursos especiais de formação específica para recrutamento de magistrados judiciais ou para magistrados do Ministério Público, com dispensa da realização de testes de aptidão, dando satisfação à necessidade de extrema carência de quadros ao nível da magistratura judicial que então se fez sentir, que só poderia atingir os objectivos para que foi projectado através de uma formação encurtada e acelerada de novos juízes.
Admite-se até que foi possível que colegas seus que não haviam logrado entrar no CEJ nas provas de acesso para o curso normal ou que dele desistiram, mas que estavam como juízes de nomeação temporária em exercício efectivo de funções, ao abrigo do disposto na Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e no Decreto-Lei n.º 179/2000, de 9 de Agosto, ou como assessores dos tribunais da relação e de 1.ª instância, lhe passaram à frente na carreira.
Mas, essa é uma crítica que deve dirigir ao legislador ou ao poder político e não ao Conselho Superior da Magistratura, que se limitou, no âmbito da sua competência, a cumprir a Lei.
Nestes termos, o recurso da Excm.ª juíza deve ser julgado improcedente.
5. Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em seis UC (art.º 73°-D, n.º 3, do CCJ).
Notifique.