BANCÁRIO
PENSÃO DE REFORMA
REGIME GERAL DA SEGURANÇA SOCIAL
CONSTITUCIONALIDADE
Sumário


I – No quadro definido pelos sucessivos IRCT’s do sector bancário, a celebração do contrato de trabalho origina uma relação previdencial, entre a entidade bancária e o trabalhador, que os mantém ligados, mesmo após a cessação da relação laboral, e que importa a responsabilização daquela, enquanto entidade que usufruiu do trabalho, pela pensão de reforma correspondente ao trabalho prestado.
II – Embora a relação previdencial se constitua com a celebração do contrato de trabalho, não decorre de qualquer norma convencional ou legal, ou princípio constitucional, que o direito à pensão de reforma se adquira no momento da cessação do contrato de trabalho quando esta ocorra fora dos casos de: i) doença ou invalidez efectiva, verificadas em qualquer idade; ii) invalidez presumível, quando o trabalhador atinge os 65 anos de idade.
III - Até à verificação de qualquer destes factos, apenas se pode falar de uma expectativa jurídica, a que a lei dispensa protecção, através de providências destinadas a defender o interesse do respectivo titular e a garantir-lhe, tanto quanto possível, a aquisição futura do direito, que permanece como que em estado de gestação.
IV - Completando o autor 65 anos de idade em 7 de Outubro de 1998, é nesta data que adquire o direito à pensão de reforma - e não em 1 de Janeiro de 1975, data em que deixou de trabalhar para a instituição bancária -, sendo à luz do regime em vigor naquela data que deverão ser apreciados os efeitos de tal direito, cobrando aplicação a norma que então regulava o direito a prestações complementares de reforma (a Cláusula 140.ª do ACTV do sector, que entrou em vigor em 1982).
VI - O regime previdencial estabelecido na regulamentação colectiva do sector bancário tem a natureza de subsistema de segurança social, (substitutivo do sistema geral estatal), cuja existência e obrigatoriedade decorre das leis que sucessivamente têm vindo a regular o direito da segurança social.
VII - O âmbito pessoal das convenções colectivas do sector, na parte em que contemplam um regime previdencial específico, escapa ao princípio da filiação consagrado no artigo 7.º do Regime Jurídico das Relações Colectivas de Trabalho, constante do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro (LRCT) e artigo 552.º do Código do Trabalho.
VIII - A aplicação da Cláusula 140.ª à situação jurídica do autor não viola a proibição expressa de aplicação retroactiva de cláusulas emanadas de instrumentos de regulamentação colectiva [artigo 6.º, n.º 1, alínea f), da LRCT e artigo 533.º, n.º 1, alínea c), do Código do Trabalho], na medida em que esta proibição se refere a direitos já consolidados e adquiridos na vigência de instrumento anterior, não sendo esse o caso de um direito à pensão de reforma que só se consolidou em 1998.
IX - Não constitui violação dos princípios consignados nos n.os 1 e 4 do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa a aplicação da Cláusula 140.ª a trabalhadores cujo contrato de trabalho no sector bancário haja cessado antes de atingida a idade de invalidez presumível.
X - A diferença de regimes entre as Cláusulas 137.ª (só aplicável aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da instituição bancária quando passaram para a situação de reforma) e 140.ª justifica-se por contemplarem situações diversas: a diversidade entre uma carreira homogeneamente desenvolvida até ao seu termo no sector bancário (com um regime próprio de segurança social, caracterizado, além do mais, pela inexistência de contribuições, quer dos trabalhadores, quer das entidades patronais) e uma carreira heterogénea em termos de diversificados regimes de segurança social ou até incompleta (contemplando-se mesmo as situações em que o antigo trabalhador não esteve abrangido por qualquer outro regime nacional de segurança social - n.º 5 da Cláusula 140.ª).

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

1. AA intentou, em 2 de Outubro de 2003, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma comum, contra “Banco BB, S.A.”, pedindo a condenação deste a:
– Reconhecer-lhe o direito a uma pensão de reforma tal como é configurada na Cláusula 137.ª do Contrato Colectivo de Trabalho publicado no Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, ano XL, n.º 27, de 22 de Julho de 1973, em vigor em 1 de Abril de 1975, devidamente actualizada pelas suas sucessivas revisões e com exclusão de qualquer normativo posterior, nomeadamente da actual Cláusula 140.ª que, datando de 1982 e sendo estranha à invocada relação laboral, não logra aplicação na definição dos seus direitos.
– Pagar-lhe as mensalidades correspondentes à pensão de reforma por invalidez presumida (65 anos de idade) por referência ao tempo de trabalho prestado no “Banco Borges & Irmão” (BBI) desde 1 de Maio de 1959 a 1 de Abril de 1975, nos termos supra mencionados, a partir de 7 de Outubro de 1998 até à data da propositura da acção, assim como aquelas que se forem vencendo.

Pediu, outrossim, que a determinação dos montantes, correspondentes a tais mensalidades, fosse relegada para liquidação de sentença, sem prejuízo de, aos que já se encontrem vencidos, bem como aos que se vencerem na pendência da acção, acrescerem juros moratórios, à taxa legal supletiva, desde a data da citação ou do vencimento.

Em síntese, alegou que:

– Exerceu funções, como trabalhador dependente e administrador do BBI, no período compreendido entre 1 de Maio de 1959 e 14 de Março de 1975, data em que o Banco foi nacionalizado;
– Após a nacionalização, cessadas as funções de administrador, foi impedido de se apresentar ao trabalho, como pretendia, sendo que teve de sair do País para exercer actividade profissional que lhe permitisse assegurar a subsistência;
– Desde Novembro de 1976, data do seu regresso a Portugal, até 21 de Março de 2001, tentou através de inúmeros requerimentos e exposições retomar o seu contrato de trabalho com o BBI, o que não lhe foi concedido por o Réu ter considerado que, por não se ter apresentado pessoalmente ao serviço em devido tempo, o Autor havia perdido tal direito;
– Por carta datada de 16 de Março de 2001, o Réu reconheceu-lhe o direito à pensão de reforma devida pelo tempo de serviço que prestou ao BBI entre 1959 e 1 de Abril de 1975, nos termos da Cláusula 140.ª do Acordo Colectivo de Trabalho (ACTV) para o sector bancário;
– Porém, o normativo aplicável à sua situação é o que consta da Cláusula 137.ª do mesmo Instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho (IRCT), em face do disposto no n.º 4 do artigo 63.° da Constituição da República Portuguesa (CRP), que manda contar todo o tempo de serviço para cálculo das pensões de reforma dos trabalhadores e, também, resulta dos princípios da igualdade e da universalidade;
– O seu direito à percepção de uma pensão de reforma iniciou-se aquando da entrada ao serviço do BBI e completou-se em definitivo em 1 de Abril de 1975, data da cessação da relação laboral nas aludidas circunstâncias;
– A efectiva atribuição do direito à pensão ficou quantitativamente limitada ao período de trabalho prestado e qualitativamente aos direitos à época atribuídos aos trabalhadores bancários.
– Tem direito a receber uma pensão de reforma, por invalidez presumida, correspondente às mensalidades, devidamente actualizadas pelas revisões, calculadas de acordo com o estabelecido na Cláusula 137.ª, na redacção que vigorava em 1 de Abril de 1975, a partir da data em que perfez os 65 anos de idade, o que ocorreu em 7 de Outubro de 1998.
– A Cláusula 140.ª não existia à data da cessação do seu contrato de trabalho com o Réu, sendo certo que foi introduzida no IRCT por alteração de 1982, pelo que os seus efeitos não podem retroagir a situações constituídas mais de sete anos antes.
– Atenta a expressão que é directamente conferida ao tempo de trabalho que prestou ao Banco para efeitos de reforma pelo artigo 63.º, n.º 4.°, da CRP a desconsideração daquele período para efeito de pagamento de pensão de reforma ou a sua qualificação e quantificação por norma estranha e posterior a tal relação estaria ferida de inconstitucionalidade material.

Na contestação, o Réu, para concluir pela improcedência da acção, argumentou no sentido de que o Autor apenas tem direito a uma pensão de reforma calculada nos termos da Cláusula 140.ª do ACTV do Sector Bancário, sendo infundado o pedido de juros de mora.

Saneado o processo e elaborada a condensação, com a especificação dos factos assentes e a organização da base instrutória, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com registo das provas oralmente produzidas, após o que foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou o Réu “a pagar ao Autor as mensalidades de reforma por velhice devidas, nos termos do n.º 1 da Cláusula 140.ª do ACT de 1992, tendo em conta o tempo de serviço que este último lhe prestou, desde 31 de Dezembro de 1959 até 1 de Abril de 1975”, relegando “o apuramento do valor devido a tal título até esta data para incidente de liquidação”, e condenou também o Réu “a pagar ao Autor juros de mora, à taxa legal, sobre os montantes em dívida desde a data da liquidação da condenação até integral pagamento”.

Desta decisão apelaram Autor e Réu, sem sucesso, pois o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento aos recursos.

2. Interposto pelo Autor e admitido que foi o presente recurso de revista, vieram os seus sucessores – entretanto, devido ao falecimento do Autor, habilitados para com eles prosseguir a lide – apresentar a respectiva alegação com as conclusões assim redigidas:

A – O Recorrente prestou serviço ao Banco Borges & Irmão entre 31 de Dezembro de 1959 e 1 de Abril de 1975;

B – Com a cessação do seu contrato de trabalho na referida data, o Recorrente adquiriu o direito a receber uma pensão de reforma nos termos da regulamentação então existente e exclusivamente competente para o efeito: a cláusula 137.ª do ACT bancário;

C – O direito a receber uma pensão de reforma nasceu integralmente consubstanciado e materializado na esfera jurídica e patrimonial do Recorrente na data de 1 de Abril de 1975, configurando-se como um verdadeiro direito e não como mera expectativa apenas;

D – O ordenamento jurídico vigente em 1 de Abril de 1975 consagrava o direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma, não limitando ou excluindo em norma alguma tal direito;

E – Tanto os princípios gerais de direito como os regimes constitucionais vigentes à época, interpretados ou não pelos actuais valores constitucionais, consagram a necessidade e existência plena do direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma;

F – O direito à pensão de reforma reclamado pelo Recorrente nasce do disposto na cláusula 137.ª do ACT bancário e não da cláusula 140.ª do mesmo IRC;

G – As entidades bancárias sempre reconheceram e pagaram o direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma tanto antes como depois da entrada em vigor da cláusula 140.ª do ACT; pelo menos até 2001, os Tribunais sempre reconheceram, também, aquele direito.

H – A cláusula 140.ª (então 141.ª) do ACT surge e entra em vigor em 1982, mais de sete anos após a cessação do contrato de trabalho do Recorrente com o Banco Borges & Irmão;

I – A cláusula 140.ª do ACT não pode em momento e por razão alguma ser aplicável à situação do Recorrente na medida em que, à data da sua entrada em vigor, não existia nem mais tarde voltou a existir nenhum nexo pessoal, laboral ou de outro tipo entre o Recorrente e o ACT de 1982;

J – A aplicação do ACT de 1982 – e por conseguinte da sua cláusula 140.ª – a situações não abrangidas pelo seu âmbito de aplicação pessoal – como se pretende, no caso, impor ao Recorrente – viola o princípio da filiação, actualmente consagrado no artigo 522.º do CT; (1)

K – A aplicação da cláusula 140.ª do ACT à situação jurídica do Recorrente em termos de pensão de reforma viola a proibição expressa de aplicação retroactiva das cláusulas emanadas de IRC’s, actualmente constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 533.º do CT;

L – A aplicação do regime da cláusula 140.ª do ACT bancário à situação jurídica do Recorrente em matéria de reforma consubstancia aplicação retroactiva de uma norma que já de si não possui força jurídica para tal a um direito adquirido e já plenamente formado na esfera jurídica do Recorrente, violando a proibição contida no artigo 12.º do Código Civil;

M – Como tal, o direito do Recorrente à pensão de reforma não pode ter sido constituído nem pode ser modificado pelo regime da cláusula 140.ª do ACT bancário;

N – A actual cláusula 140.ª do ACT bancário, surgida em 1982, resulta de uma composição de interesses temporalmente bem definida e fundamentada na então “pretendida” integração dos trabalhadores bancários no regime geral da segurança social, nunca tendo sido efectivamente gizada para regular os direitos à reforma dos trabalhadores que até essa data tivessem abandonado o sector antes de se reformarem - direitos esses que à data eram pré-existentes;

O – A própria cláusula 140.ª reconhecia a sua limitação de aplicabilidade aos trabalhadores que abandonassem o sector após 15 de Julho de 1982;

P – A aplicação ao recorrente do regime contido na cláusula 140.ª do ACT reveste-se de inconstitucionalidade por representar aplicação retroactiva de lei – aliás, de norma que no caso nem força equivalente à Lei reveste – e constitui denegação do disposto nos n.os 1 e 4 do Art.º 63.º da CRP.

Q – Aos trabalhadores bancários que tenham deixado de prestar serviço no sector antes de 15 de Julho de 1982 aplica-se, para efeitos de configuração e cálculo de pensão de reforma o disposto na cláusula 137.ª do ACT bancário.

De tudo resultando a necessidade de alteração do Mui Douto e, no demais, Mui Justo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de que aqui se recorre no sentido de se declarar e reconhecer que a pensão de reforma devida ao Recorrente deve ser definida, configurada e calculada nos termos da cláusula 137.ª do ACT bancário e não através da cláusula 140.ª, como actualmente resulta tanto do Douto Acórdão, como da Douta Sentença nele acolhida.

O Réu concluiu do seguinte modo a contra-alegação que apresentou para sustentar a improcedência de recurso:

1. O presente recurso foi interposto do douto acórdão de Fls ...., que atribuiu ao Recorrente o direito a uma pensão de reforma calculada nos termos da cláusula 140.ª do ACT do sector bancário, e não da cláusula 137.ª do mesmo instrumento de regulamentação colectiva de trabalho peticionada pelo Recorrente.

2. O douto Acórdão recorrido, ao confirmar a douta sentença da 1.ª instância, fez uma correctíssima aplicação da Lei aos factos que ficaram provados.

3. O regime de pensões de reforma constante da cláusula 137.ª do ACT do sector bancário aplica-se apenas aos trabalhadores que se encontrem a prestar a sua actividade profissional para um Banco quando passem à situação de reforma, o que não foi o caso do Recorrente.

4. O regime constante da actual cláusula 140.ª aplica-se aos trabalhadores que tenham saído do sector bancário e só posteriormente passem à situação de reforma, o que foi o caso do Recorrente.

Ora,

5. O Recorrente, deixou de exercer funções no Banco Borges & Irmão, (Banco que foi integrado, por fusão, no ora Recorrido), em 1 de Abril de 1975.

6. E só atingiu os 65 anos de idade em 7 de Outubro de 1998, tendo-se aposentado, ao que parece, como Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, quando atingiu 70 anos de idade.

7. Assim, o Recorrente não teria adquirido direito a qualquer pensão de reforma, se não tivesse sido instituído, como foi, pelos ACTV's de 1982, e de 1988, um regime específico de reformas para os trabalhadores bancários que saíram do sector bancário e se reformaram já fora do sector, (regime que consta da cláusula 140.ª do actual ACTV do sector bancário).

Deste modo,

8. A pensão de reforma a que o Recorrente tem direito, em função do tempo de serviço prestado ao Banco Borges & Irmão só pode ser calculada pelo regime constante da actual cláusula 140.ª do ACT do sector Bancário.

9. O douto acórdão recorrido não cometeu qualquer inconstitucionalidade ao interpretar e aplicar os n.os 1 e 4 do artigo 63.º da Constituição da República nos precisos termos em que o fez.

10. O douto acórdão recorrido, ao confirmar, como confirmou, a douta sentença da 1.ª instância deve ser mantido, no que respeita à aplicação da cláusula 140.ª do ACT do sector bancário, pois tal aplicação está inteiramente correcta.

Neste Supremo Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu douto parecer, no sentido de ser negada a revista.

Tal parecer não mereceu resposta de qualquer das partes.

Corridos os vistos, cumpre decidir.


II

1. As instâncias fixaram, sem crítica das partes, a matéria de facto provada, nos termos que seguem:

A) O Autor exerceu funções de Director Adjunto (classe A) do Banco Borges & Irmão (que se passa a denominar como BBI) a partir de 1 de Maio de 1965.

B) Entre 1 de Junho de 1970 e 17 de Março de 1973 o Autor foi Adjunto da Administração do BBI.

C) Em 17 de Março de 1973, o Autor foi designado para integrar o Conselho de Administração do BBI.

D) O Autor exerceu as funções referidas em C) até 14 de Março de 1975.

E) O Autor deixou de exercer funções para o Réu em 1 de Abril de 1975.

F) Em 1975 os trabalhadores do BBI proibiram o Autor (bem como outros administradores) de entrar no Banco.

G) Em 12 de Junho de 2000, o Autor remeteu ao Presidente do Conselho de Administração do BBI a carta cuja cópia constante de fls. 11 a 22 dos autos aqui se dá por integralmente transcrita.

H) Em 16 de Março de 2001, o Administrador do BB, Dr. Rui Lélis remeteu ao Autor a carta cuja cópia, constante de fls. 23 e 24 do processo, aqui se dá por integralmente transcrita.

I) Em 2 de Setembro de 2003, o Autor remeteu ao Presidente do Conselho de Administração do BB a carta cuja cópia constante de fls. 26 a 28 do processo aqui se dá por integralmente reproduzida.

J) O Banco Borges & Irmão, SA, foi integrado por fusão no Banco BB, SA.

K) O Autor nasceu em 7 de Outubro de 1933.

1- Em data que não foi possível apurar de 1959, o Autor passou a integrar o Conselho Económico/Jurídico do Banco Borges & Irmão. Desde então o Autor dava ordens e instruções a trabalhadores do Banco, recebendo instruções do Sr. Dr. CC, que era Administrador do Banco Borges & Irmão.

2- Em 17 de Maio de 1965, o Autor assinou o requerimento de abono de família constante de fls. 60 dos autos que aqui se dá por integralmente transcrito.

2. A questão fundamental a resolver é, face ao teor das conclusões da revista, a de saber se a pensão de reforma devida ao Autor deve ser calculada nos termos da Cláusula 137.ª do ACTV do Sector Bancário ou de harmonia com o estipulado na Cláusula 140.ª do mesmo IRCT.

A sentença da 1.ª instância, após detalhado excurso sobre a evolução da regulamentação colectiva atinente ao problema da norma aplicável ao caso dos autos, observou que, quando a relação laboral entre o Autor e o BBI cessou, em 1 de Abril de 1975, embora a regulamentação colectiva, então em vigor, já contemplasse a existência de uma pensão de reforma a suportar pelos estabelecimentos bancários para com os seus trabalhadores no caso de invalidez presumível (65 anos), apenas a garantia àqueles que nessa data estivessem ao serviço, não conferindo, pois, quaisquer direitos àqueles que, fosse por que razão fosse, tivessem abandonado o sector bancário.

E prosseguiu:

“[...]

Em nosso entender, não se pode considerar que em 1-4-1975 se venceu o direito do Autor a uma reforma atribuída pelo Banco por invalidez presumível (por ter atingido os 65 anos de idade).

Nessa data o Autor tinha essa expectativa, caso se mantivesse ao serviço da Ré, mas não adquiriu esse direito; isto é, não o chegou a integrar na sua esfera patrimonial.

O direito à pensão por invalidez presumível é um direito diferido, sendo certo que só se alcança com o atingir da idade de 65 anos.

Todavia a regulamentação colectiva, até por imposição dos sucessivos processos negociais (aos quais certamente não foi alheio o texto constitucional) foi sofrendo alterações neste ponto.

Assim, em 1982 a cl.ª 138.ª do ACT veio concretizar as mensalidades a que o trabalhador doente, inválido ou que tivesse atingido 65 anos tinha direito; sendo certo que esses direitos se passaram a aplicar a todos os trabalhadores que estivessem nessa situação quer a mesma fosse anterior à entrada em vigor do ACT quer ocorresse posteriormente.

Todavia, é patente que uma coisa é o direito a determinadas prestações por parte dos trabalhadores bancários e outra diferente são os direitos dos ex-trabalhadores bancários ou seja daqueles que abandonam o sector bancário.

O n.º 3 da cl.ª 141.ª do ACT veio conferir direito a um complemento de reforma aos trabalhadores bancários que abandonassem o sector bancário – por razões que não fossem da sua iniciativa – quando fossem colocados na situação de reforma por invalidez ou velhice.

Todavia o n.º 6 desta norma veio estatuir que a mesma apenas era aplicável aos trabalhadores que abandonassem o sector bancário a partir de 15 de Julho de 1982.

Esta norma veio a manter-se nos ACT de 1984 e 1986.

Mas o ACT de 1988 veio introduzir alterações.

Na realidade a cl.ª 142.ª passou a abranger não só os trabalhadores que abandonassem o sector bancário por razões que não fossem da sua iniciativa, mas também os trabalhadores ao serviço de instituição bancária ou parabancária que não estando inscritos no regime de segurança social por qualquer razão deixassem de estar abrangidos pelo regime de segurança social previsto no ACT.

Esta norma foi mantida na cl.ª 140.ª do ACT de 1992 que se encontrava em vigor quando o Autor atingiu os 65 anos de idade, o que ocorreu em 7-10-1998 passando o Autor a estar em condições de beneficiar da pensão de reforma por velhice.

Mas nos termos estatuídos na cl.ª 137.ª do ACT tal como sustenta?

A nosso ver, salvo o devido respeito por opinião diversa, essa norma – que define as condições de atribuição de um direito e o seu conteúdo – contempla as condições de concessão do direito aos trabalhadores em serviço efectivo (em tempo completo ou parcial) que venham a atingir as condições nela previstas.

No que concerne ao conteúdo do direito (à sua quantificação prática) a norma atinge não só os trabalhadores efectivos já mencionados, mas também todos os ex-trabalhadores que anteriormente já tivessem integrado o direito ao recebimento de uma pensão na sua esfera patrimonial por reunirem as devidas condições (vg: que já estivessem reformados).

Ora em 1992 o Autor não só não se podia considerar como trabalhador ao serviço do Réu como também não havia anteriormente adquirido direito a qualquer pensão.

Mas não terá o Autor direito (por ter atingido em 7-10-1998 a situação de reforma por invalidez presumível nos termos da cl.ª 137.ª do ACT) na proporção do tempo de serviço que prestou à Ré ao pagamento pela mesma da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no Sector Bancário fosse considerado como tempo de inscrição no Regime de Segurança Social ou outro mais favorável que lhe seja aplicável?

Entendemos afirmativamente.

Desde logo, porque a cl.ª 140.ª do ACT de 1992 além de deixar de fazer alusão ao trabalhador ao serviço (como fazia a cl.ª 142.ª do ACT de 1988) também deixou de conter qualquer limitação temporal à sua aplicabilidade tal como sucedia nas normas semelhantes constantes dos ACT de 1982, 1984 e 1986.

Quanto à referência da não inscrição em qualquer Regime de Segurança Social reporta-se obviamente ao período durante o qual o trabalhador prestou serviço para a instituição de crédito ou parabancária.

E nem se argumente que este regime só se aplica para o futuro.

Não é o que resulta das cl.as 142.ª do ACT de 1988 e 140.ª do ACT de 1992; sendo certo que a supra mencionada interpretação é a que se mostra mais conforme com a efectiva realização do direito à segurança social constitucionalmente consagrado.

Deve ainda salientar-se que os comandos constitucionais se destinam não apenas ao Estado mas também aos particulares.

Cabe igualmente referir que a interpretação das normas dimanadas de regulamentação colectiva segue as regras próprias da interpretação e integração da lei.

Por outro lado, é de presumir que durante o espaço de tempo em que esteve ao serviço da Ré o Autor não estava inscrito no regime geral de segurança social.

O Autor invocou a inconstitucionalidade material, em face do disposto no n.º 4 do art. 63.º da CRP, da desconsideração do período de tempo que esteve ao serviço do Réu (vide art. 29.º da douta petição inicial).

Todavia não se vislumbra que a orientação aqui perfilhada e consequente interpretação normativa desconsidere esse período temporal para efeitos de pagamento de pensão de reforma, sendo certo que a norma aplicada – a cl.ª 140.ª do ACTV – até prevê expressamente que todo o tempo prestado ao serviço da instituição bancária seja tomado em linha de conta para a atribuição da prestação da reforma.

Igualmente não se detecta qualquer tipo de inconstitucionalidade na interpretação em apreço na parte em que aplica à relação jurídica estabelecida entre os litigantes uma norma aparecida posteriormente quando a existente nessa data não consagrava um direito semelhante.

Por outro lado, a nosso ver, salvo o devido respeito por opinião distinta, a cl.ª 140.ª não coloca em causa os princípios da igualdade e universalidade consagrados na invocada Lei de Bases da Segurança Social – Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto (vide art. 19.º da petição inicial), a qual contempla a existência transitória de regime especiais entre os quais se conta o dos bancários (vide artigo 69.º).

Em sentido semelhante regula o art. 123.º da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro.

Entendemos, pois, que a pretensão do Autor apenas procede parcialmente e que o Réu deve suportar o complemento de reforma que se lhe mostrar devido, mas nos termos mencionados no n.º 1 da cl.ª 140.ª do ACT de 1992, no tocante ao lapso de tempo em que o mesmo lhe prestou trabalho.

[...]”

O Tribunal da Relação, por sua vez, para concluir pela confirmação da sentença, discorreu assim:

“[...]

Estamos perante um pedido de pagamento de uma pensão de reforma tal como é configurada na cl.ª 137.ª do CCT publicado no Boletim do INTP, ano XL, n.º 27, de 22 de Julho de 1973, em vigor em 1 de Abril de 1975, por parte de um ex-trabalhador bancário que deixou de exercer funções no Banco Réu em 1 de Abril de 1975 por motivo diferente da sua vontade, e atingiu a idade da reforma em 7.10.1998.

O direito à pensão de reforma é um direito diferido que só se adquire no momento em que ficam acabadamente verificados os seus pressupostos, o último dos quais é o pressuposto da invalidez presumível (ou da velhice ou da invalidez), existindo, anteriormente, uma expectativa jurídica do seu recebimento (neste sentido cfr., entre outros, o Ac. STJ de 24.06.2003 in www.dgsi.pt).

Como se escreveu no Ac. da RL de 7.12.1999, citado no Ac. do STJ de 27.09.2000 in www.dgsi.pt, a propósito do direito à pensão de reforma: “Estamos, assim, perante uma situação jurídica de formação complexa ou factos jurídicos complexos de formação sucessiva que «enquanto não se produz o último elemento da série legalmente necessária, dizem-se incompletos, imperfeitos ou em formação (in itinere). Até esse momento não podem surtir os seus efeitos próprios, mas podem ir originando certos efeitos menores, preparatórios, ou preliminares daqueles outros» – M. Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, pág. 11”.

Por isso mesmo se vem entendendo que o direito à pensão de reforma é conferido pelo instrumento de regulamentação colectiva em vigor à data da rescisão do contrato de trabalho, mas o conteúdo e medida desse direito mede-se pelo texto correspondente do instrumento de regulamentação colectiva em vigor no momento em que ocorre o pressuposto da atribuição da reforma (neste sentido cfr., entre outros o Ac. desta Relação de 25.01.2006 in www.dgsi.pt.).

No presente caso – em que o ora recorrente manteve um contrato de trabalho com a instituição bancária recorrida até Abril de 1975, a qual assegurava, ela própria, a segurança social dos seus trabalhadores – o autor adquiriu, com o decurso desse contrato, a expectativa jurídica a uma pensão de reforma, se e quando atingisse 65 anos, por força do disposto, quanto a essa matéria, nos vários instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis.

Essa expectativa jurídica concretizou-se em 7 de Outubro de 1998 quando perfez 65 anos de idade e, por conseguinte, adquiriu o direito à pensão de reforma, também conferido pelo IRCT em vigor nessa data.

O conteúdo e a medida desse direito, então alcançado, têm de ser encontrados nas normas do ACT para o sector bancário de 1990 (com a alteração salarial e outras, publicadas nos B.T.E. n.º 31, 1.ª Série, de 22/8/92 BTE, n.º 42, de 15-11-94, pág. 1995, BTE n.º 2, de 15-1-96, pág. 42, BTE n.º 15, de 22-4-97, pág. 649, BTE n.º 24, de 29-6-98, pág. 1005, tal como consta da decisão recorrida.), “que era o que vigorava no momento em que o aqui Autor atingiu os 65 anos de idade. São essas normas, vigentes à data da plena aquisição do direito do recorrente à sua pensão de reforma bancária, que definem todos os contornos desse mesmo direito” ([Ac. do] STJ de 24.6.2003 acima mencionado).

A sentença ora em crise, julgou aplicável ao caso dos autos, a cl.ª 140.ª do ACT para os bancários, e, analisando a invocada inconstitucionalidade da aplicação desta cláusula, decidiu-se pela não verificação.

[...]”

E, após considerar que a sentença recorrida apreciou a questão de forma cuidadosa, minuciosa e ponderada, avançando argumentos plenamente convincentes, observou a Relação:

“[...]

Cumpre, no entanto, acrescentar, em abono da bondade da decisão, que, no mesmo sentido tem sido pacífica e unânime a jurisprudência saída do Supremo Tribunal de Justiça, citando-se a título de exemplo os Acs. de 12.02.01 (AD, 479, pág. 1530) de 18.04.01 (AD, 482, pág. 258), de 28.11.01 (CJ/STJ, Ano IX, T. III, pág. 283), de 12.12.01 (disponível em texto integral na Internet – www.dgsi.pt), de 16.01.02 e de 31.01.02 (ambos disponíveis em sumário na Internet – www.dgsi.pt), de 06.06.02 (AD, 488/489, pág. 1218), de 11.12.02 (CJ/STJ Ano X, T. III, pág. 286), de 22.01.03 (disponível em texto integral na Internet – www.dgsi.pt), 20.01.04 (disponível em texto integral na Internet – www.dgsi.pt), de 17.11.04 (disponível em sumário na Internet – www.dgsi.pt), de 08.06.05 e de 26.06.05 (ambos disponíveis em sumário na Internet – www.dgsi.pt), destrinçando esta, o alcance de cada uma das cl.as invocadas, do seguinte modo:

- A cl.ª 137.ª do ACTV para o Sector Bancário tem aplicação no caso de trabalhadores que se encontravam ao serviço da instituição bancária quando passaram para a situação de reforma;

- A cl.ª 140.ª do ACTV para o Sector Bancário prevê a situação de trabalhadores que saíram da actividade bancária antes de virem a estar em situação de reforma.

A dualidade de regimes assenta na diversidade das carreiras contributivas a considerar para atribuição da pensão: “enquanto no âmbito da cl.ª 137.ª a mesma se desenrola, na totalidade, no âmbito do sector bancário, acompanhando as suas vicissitudes, no caso da cl.ª 140.ª não existe uma carreira homogénea, mas antes diversificada ou pelo menos incompleta (contemplando-se mesmo as situações em que o antigo trabalhador não adquiriu direitos no âmbito de qualquer outro regime nacional de segurança social), pelo que se está, como é óbvio, perante situações diferentes, que merecem, consequentemente, tratamento diverso, salvaguardada que está a contabilização, em qualquer das situações, de todo o trabalho prestado, independentemente da entidade patronal que do mesmo beneficiou.”

Desenham-se, assim, regimes diversos para situações que são diversas.

E se as situações são desiguais, óbvio é que não podem merecer o mesmo tratamento jurídico, sob pena de se ofender o princípio da igualdade consagrado no art. 13.º da Constituição e que a lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, Lei de Bases da Segurança Social, não podia deixar de acolher – ver art. 5.º n.os 1 e 4. (cfr, entre outros, os Acs. do STJ de 12.12.2001 e STJ de 4.7.2002 in www.dgsi.pt)

Quanto à alegada inconstitucionalidade por violação do disposto no art.º 64.º, n.os 1 e 4 da CRP cumpre acrescentar o seguinte:

- O n.º 1 do art.º 64.º da CRP estabelece que “todos têm direito à segurança social”. Ora a decisão em crise não beliscou esse direito – tanto mais que o consagrou ao condenar a ré no pagamento da reforma;

- O n.º 4 do art. 63.º da CRP determina que, “todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, (sublinhado nosso) para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”.

Sendo inequívoco que o sistema unificado de segurança social que o legislador constituinte incumbiu o Estado de organizar, coordenar e subsidiar visa proteger os cidadãos em situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho, designadamente em situações de invalidez ou velhice, não é a Constituição, mas a lei ordinária, que define o conteúdo dos diversos direitos a prestações resultantes da concretização do direito à segurança social. Apenas no que respeita às pensões de invalidez e de velhice a Constituição foi um pouco mais longe ao consagrar o direito ao aproveitamento do total do tempo de serviço prestado pelo trabalhador, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado, mas deixa ainda ao legislador ordinário a concretização desse direito.

Ora, dado que na interpretação que fazemos das normas aplicáveis, se tem em conta todo o tempo de trabalho para efeito de cálculo da pensão de reforma, não vemos, pois, como podem ter-se por violados os invocados normativos constitucionais.

[...]”

A discordância dos recorrentes, em relação ao decidido pelas instâncias, funda-se, em síntese, na seguinte argumentação:

– O direito dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço no sector antes de atingirem a idade da reforma configurava, à luz do ordenamento jurídico em vigor em 1 de Abril de 1975, não uma mera expectativa, mas um verdadeiro direito consolidado e adquirido no momento da cessação contrato de trabalho, independentemente da idade;
– A Cláusula 140.ª do ACT, que entrou em vigor em 1982, não pode ser aplicável a situações não abrangidas pelo seu âmbito de aplicação pessoal, sob pena de violação do princípio da filiação, hoje consignado no artigo 552.º do Código do Trabalho;
– A aplicação da mencionada Cláusula a trabalhadores na referida situação viola a proibição expressa de aplicação retroactiva de cláusulas de instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho – actualmente constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 533.º do referido Código – bem como a “proibição contida no artigo 12.º do Código Civil”, e “reveste-se de inconstitucionalidade”, constituindo, outrossim, “denegação do disposto” nos n.os 1 e 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa.
3. Traçando o quadro evolutivo do regime de segurança social próprio dos trabalhadores do sector bancário, escreveu-se no Acórdão deste Supremo Tribunal de 12 de Dezembro de 2001 (Documento n.º SJ200112120025524, em www.dgsi.pt):

“[...]

Entre nós, foi só com a publicação da Constituição da República Portuguesa de 1976 que se procurou criar um sistema unificado e universal de segurança social, afirmando-se o princípio de que todos têm direito à segurança social, incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado. Anteriormente a essa data, vigorava um sistema de origem corporativa, que se iniciou com o Estatuto do Trabalho Nacional (Decreto n.º 23048, de Setembro de 1933), onde se previa a organização das caixas e instituições de previdência, cuja iniciativa competia aos organismos corporativos – grémios e sindicatos. A Lei n.º 1884, de 16 de Maio de 1935, veio reconhecer que a iniciativa e organização destas caixas incumbia aos grémios e sindicatos nacionais, por meio de acordos ou por meio de Contratos Colectivos de Trabalho, e no seu artigo 4.º estipulava que “as caixas sindicais de previdência destinam-se a proteger o trabalhador contra os riscos da doença, da invalidez e do desemprego involuntário e bem assim a garantir-lhe pensões de reforma”. Por sua vez, a Lei n.º 2115, de 18 de Junho de 1962, que revogou a Lei n.º 1884, veio estabelecer que as Caixas Sindicais de Previdência abrangiam obrigatoriamente, como beneficiários, os trabalhadores das profissões interessadas nas convenções colectivas ou definidas nos diplomas da sua criação. Essas Caixas de Previdência foram regulamentadas pelo Decreto-Lei n.º 45266, de 23 de Setembro de 1963, que no seu artigo 17.º, n.os 1 e 2, determinava a inscrição obrigatória dos trabalhadores, como beneficiários, e das entidades patronais abrangidas, como contribuintes.

Foi neste contexto que o CCT de 1944 para o sector bancário, publicado no Boletim do INTP, ano XI, n.º 3, de 15 de Fevereiro de 1944, veio estipular na sua cláusula 59.ª, que “os outorgantes obrigam-se quando as circunstâncias o permitirem a concluir o regulamento para a constituição da Caixa Sindical dos Bancários”.

E logo na cláusula 60.ª prescreveram que enquanto não funcionasse essa Caixa Sindical, os estabelecimentos bancários garantiam aos seus empregados, em caso de doença ou invalidez, certas prestações que especificam.

Esta cláusula 60.ª veio a desenvolver-se nas sucessivas revisões, sendo que a partir de 1964 – com o CCT publicado no Diário do Governo, I Série, de 12 de Março de 1964, passou a ter a seguinte redacção: “Os estabelecimentos bancários garantem aos seus empregados: 1. em caso de doença ou invalidez do empregado, ou quando tenha atingido 70 anos de idade (invalidez presumível) as mensalidades que lhes competirem de acordo com o mapa n.º 6”.

Em 1970, por decisão do Tribunal Arbitral, de 17 de Abril de 1970, publicada no Boletim do INTP, ano XXXVII, n.º 10, pág. 684, aquela cláusula passou a ter a seguinte redacção: “Enquanto não funcionar a Caixa de Previdência prevista na cláusula anterior, os estabelecimentos bancários, garantem aos seus empregados: 1. Em caso de doença ou invalidez do empregado ou quando atinjam 65 anos de idade (invalidez presumível) as mensalidades que lhe competirem de acordo com o mapa n.º 6”.

O CCT de 1970 para o sector bancário, e os posteriores, mantiveram esta redacção da cláusula (embora com outro número).

Assim sucede com o CCT de 1980, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), n.º 26, de 15 de Julho de 1980 (cláusula 133.ª, n.º 1), que esclarece na cláusula 134.ª, n.º 6, que estes benefícios aplicam-se a todos os trabalhadores na situação de doença, invalidez ou invalidez presumível, quer tivessem sido colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor do CCT.

E no ACT de 1982, publicado no BTE, n.º 26, de 15 de Julho de 1982, a cláusula 138.ª veio estatuir:

“No caso de doença ou invalidez, ou quando tenham atingido 65 anos de idade (invalidez presumível), os trabalhadores em tempo completo têm direito:

a) Às mensalidades que lhes competirem de harmonia com a aplicação das percentagens do anexo VI às retribuições fixadas no anexo II, líquidas do valor da contribuição para o Fundo de Desemprego e do imposto profissional correspondente a 13 vezes o montante de cada uma dessas retribuições;

b) A um subsídio de Natal de valor igual ao das mensalidades a que tiverem direito.

2 - Cada uma das prestações a que os trabalhadores têm direito nos termos do número anterior não poderá ser de montante inferior ao do valor ilíquido da retribuição do nível mínimo do respectivo grupo.

3 - Os trabalhadores em regime de tempo parcial terão direito às prestações referidas nos n.os 1 e 2, calculadas proporcionalmente ao período normal de trabalho.

(...)

8 - Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os trabalhadores na situação de doença, invalidez presumível, quer tenham sido colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor deste contrato”.

O ACT de 1984, publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1984, o ACT de 1986, publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 28, de 29 de Julho de 1986, bem como o ACT publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1988, mantiveram no essencial a mesma redacção da referida cláusula, que chegou ao ACT de 1990, com o n.º 137.ª, nos termos acima transcritos.

Por seu turno, o conteúdo da cláusula 140.ª do ACT de 1990 teve a sua origem na cláusula 141.ª do ACT de 1982, que, pela primeira vez, veio regulamentar a situação dos trabalhadores que saíssem do sector bancário sem terem atingido a idade da reforma, a qual estabelecia o seguinte, na parte que aqui interessa:

“3 - Enquanto não for concretizada a integração referida nos números anteriores, o trabalhador que abandonar o sector bancário, por razões que não sejam da sua iniciativa, nomeadamente o despedimento, terá direito, quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou velhice prevista no regime de segurança social que lhe for aplicável, ao pagamento pela respectiva instituição de crédito da importância necessária a complementar a sua pensão de reforma, até ao montante que lhe corresponder se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição na segurança social.

(...)

6 - O regime estabelecido no n.º 3 desta cláusula só se aplica aos trabalhadores que abandonarem o sector bancário nas condições aí referidas a partir de 15 de Julho de 1982”.

Os ACT do sector bancário de 1984 e de 1986, publicados no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1984, e no BTE, 1ª Série, 28, de 29 de Julho de 1986, mantiveram o teor da cláusula 141.ª, mas agora com o n.º 142.ª.

Porém, o ACT publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1988, alterou a cláusula 142.ª, que passou a ter a seguinte redacção:

“1 - O trabalhador ao serviço de instituição de crédito ou parabancária que não esteja inscrito no regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social garantido pelo presente ACT terá direito quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou velhice prevista no regime de segurança social que lhe for aplicável, ao pagamento pelas instituições de crédito ou parabancárias, na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para complementar a sua pensão de reforma até ao montante que lhe corresponde se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime de segurança social que lhe for aplicável.

2 - Para efeitos de contagem do tempo de serviço prestado no sector bancário referido no n.º 1, é aplicável o disposto nas cláusulas 16.ª e 154.ª”.

Deixou, portanto, de fazer referência que o regime dela constante só se aplicava aos trabalhadores que saíssem antes de 15 de Julho de 1982.

Esta cláusula transitou para o ACT de 1990, com o n.º 140.ª, acima transcrita.

[...]”.

Sobre a natureza do direito à pensão de reforma e sobre o momento em que tal direito se adquire, teve este Supremo Tribunal ensejo de se pronunciar, no Acórdão de 2 de Fevereiro de 2000 (Documento n.º SJ200002020003514, em www.dgsi.pt), nos seguintes termos:

“[...]

Para a compreensão da questão em análise importa, sem dúvida, efectuar o enquadramento, em termos gerais, na medida em que a atribuição de uma pensão de reforma (por velhice ou invalidez), se insere no âmbito de um campo mais vasto, e que se prende com o direito a uma prestação social, como uma das vertentes de uma realidade mais abrangente, que é o direito à Segurança Social.

Assim, este direito (independentemente das múltiplas acepções e definições admissíveis) pode ser considerado em termos de correspondência laboral, e como tal garantindo os rendimentos de trabalho anteriormente auferidos, sempre que se verifique qualquer circunstância que por alguma maneira os diminua.

Já em termos assistencialistas o direito à segurança social surge quando se verifica uma situação de carência, entendida como mínimo de subsistência, e independente das causas que a motivam, visando eliminá-la ou pelo menos torná-la menor.

Relativamente aos sujeitos passivos visados, revelam sem dúvida, as concepções universalistas, que atribuem o direito à segurança social a todos e a cada um dos cidadãos, independentemente da sua situação económica e/ou laboral, concretizando-se verificados que sejam determinados pressupostos, que se traduzam (ou possam traduzir) na diminuição de um mínimo de subsistência.

Tais acepções vão estar presentes na consagração legislativa (fruto de preocupações sociais cada vez mais marcantes) de sistemas ou esquemas mais ou menos complexos de previdência ou segurança social, nomeadamente, como os instituídos entre nós pela Lei 1884, de 10 de Março de 1935, ou a Lei 2115, de 18 de Junho de 1962, em que, tendo presente a ideia da defesa do trabalhador na doença, ou invalidez, bem como a concessão de pensões de reforma, se previam contribuições daquele e do empregador, para o financiamento do esquema instituído, impondo-se, até, a inscrição obrigatória de trabalhadores e entidades patronais, afloramento da tendência universalista (ainda que não nos termos absolutos supra referidos) do sistema de previdência social estabelecido.

A Constituição da República de 1976 consagrou o direito à segurança social, artigo 63.º, no âmbito dos “direitos e deveres sociais”, determinando que assiste a todos os cidadãos, independentemente da sua situação profissional (concepção universalista), devendo contabilizar-se (como resultou da revisão constitucional de 89) todo o trabalho prestado para o cálculo da pensão de velhice ou invalidez, princípios a que o Estado deve obedecer na organização do sistema de segurança social.

O direito à segurança social como direito fundamental, ainda que de cariz social, e na medida em que constitui o direito a uma prestação ou actuação positiva, não pode por si próprio, fundamentar um pedido a um órgão jurisdicional, com vista à sua efectivação (a não ser que já tenha tido consagração normativa) devendo contudo, neste caso, observar-se não só os imperativos constitucionais já referidos, como também respeitar outros, tais como o princípio da universalidade, artigo 12.º da C.R.P. (que atribui a cada cidadão, pelo facto de o ser, a qualidade de sujeito constitucional), e o princípio da igualdade, artigo 13.º da C.R.P. (quer no igual posicionamento em matéria de direitos e deveres, quer na proibição de discriminações, com afastamento das ilegítimas, por afastarem um fim legal pretendido, o que não significa igualdade absoluta em todas as situações).

A Lei 28/84, de 14 de Agosto, veio definir, em termos de legislador ordinário, as bases em que assenta o regime de segurança social, que não contrariando os termos constitucionais, as concretizam, afirmando o sistema constituído como universal, obrigatório e contributivo para os trabalhadores por conta de outrem ou independentes, como também, tendencialmente unitário, prevendo-se a subsistência, ainda que em termos provisórios, de regimes especiais, até porque a C.R.P. não impôs a obrigação da constituição de um sistema único (o que não é incompatível com a ideia de universalidade), ou o dever, pelo menos imediato, de integração de outros sistemas de protecção num sistema único.

De um sistema próprio de protecção tem vindo a usufruir a actividade bancária, fruto da autonomia contratual, de cariz colectivo, traduzida em instrumentos de regulamentação colectiva, em cuja génese está, ainda que em termos transitórios, face à intenção de constituir uma caixa sindical de previdência para os empregados bancários (C.C.T. de Março de 1944, in BINTP, n.º 3), o intuito de assegurar o pagamento de prestações, no caso de doença ou invalidez, das instituições de crédito aos seus trabalhadores, alargando-se, posteriormente (CCT de 15 de Março, 64, BINTP n.º 5), tal satisfação aos casos de atingida determinada idade (70 anos), incorrendo-se em invalidez presumida.

Nos sucessivos instrumentos de regulamentação colectiva que se seguiram foi mantida a obrigação da instituição de crédito, como entidade empregadora, assegurar a pensão de reforma no caso de invalidez real ou presumida (referida a um limite de idade, diminuído para 65 anos, e que pode sofrer alterações com a interacção de outros vectores, como o da antiguidade).

No caso de integração no regime geral da segurança social ou no caso do trabalhador não estar ao serviço da entidade bancária, quando reunir os requisitos necessários para a atribuição da pensão, prevê-se a contabilização do tempo de trabalho prestado na banca para a complementarização de pensões do regime geral, ou a atribuição de pensões relativas ao período de exercício de funções na banca, cfr. a título de exemplo, as cláusulas 137.ª e 141.ª, do CCT de 82, in BTE n.º 26, de 17 de Julho de 1982, e as 136.ª e 140.ª do CCT de 90, in BTE n.º 31, de 22 de Agosto de 1990.

Pode assim dizer-se que existiu, e ainda existe (até porque a referida caixa de previdência não chegou a ser criada, nem se verificou, em termos gerais, a integração no sistema geral de segurança, sem que, conforme vimos, deixe de haver consonância com os princípios constitucionais e legais vigentes) um regime de segurança social, ou subsistema, para o sector bancário, que constitui um verdadeiro seguro social, cuja percepção das prestações pelos beneficiários não se reporta à existência de um contrato de trabalho, aquando da verificação dos requisitos estipulados, estando sim, estas exclusivamente dependentes do “quantum” de trabalho prestado para uma entidade bancária.

Com efeito, o direito à pensão, nomeadamente por velhice, ou invalidez presumida, é um direito que poderemos designar de “diferido”, pois só se concretiza com o atingir de determinada idade, os 65 anos, existindo anteriormente uma expectativa jurídica do seu recebimento (que pode ter lugar a todo o tempo antes da idade da reforma), e que decorre de o trabalhador ter prestado serviço no sector bancário durante um certo período de tempo, considerando não só a consagração em termos de convenções colectivas de trabalho, como também, como já referimos, as normas constitucionais e ordinárias em sede de segurança social.

O direito à pensão não tem assim, necessariamente, de se constituir durante o tempo de prestação do trabalho, podendo sê-lo em momento ulterior, nada obstando a que o trabalhador beneficie das condições mais favoráveis, que em ordem à da concessão da mesma, possam ter vindo a ser estabelecidos, quanto mais não seja em obediência ao princípio da igualdade, relativamente àqueles que na mesma altura, e não tendo até então, deixado o sector bancário, obtêm a reforma, pois não está em causa a diversidade da prestação (questão que não se coloca), mas sim apenas o quantum de trabalho prestado, o qual, em situações idênticas, embora cronologicamente diversas permite a concessão, sem dúvidas, da proporcional pensão de reforma.

[...]”.

Importa sublinhar que, no quadro definido pelos sucessivos IRCT’s do sector bancário, a celebração do contrato de trabalho origina uma relação previdencial, entre a entidade bancária e o trabalhador, que os mantém ligados, mesmo após a cessação da relação laboral, e que importa a responsabilização daquela, enquanto entidade que usufrui do trabalho, pela pensão de reforma correspondente ao trabalho prestado (Acórdãos deste Supremo Tribunal de 20 de Janeiro de 2000, na Revista n.º 243/98, e de 8 de Fevereiro de 2001, na Revista n.º 2859/00, ambos da 4.ª Secção, sumariados em www.stj.pt – Sumários de Acórdãos).

Sendo certo que a relação previdencial constituída com a celebração do contrato de trabalho se desenvolve durante a execução do contrato e se mantém para além da vigência da relação laboral, não decorre, porém, de qualquer norma convencional ou legal, ou princípio constitucional, que o direito à pensão de reforma se adquira no momento da cessação do contrato de trabalho se esta ocorrer fora dos casos de: i) doença ou invalidez efectiva, verificadas em qualquer idade; ii) invalidez presumível, quando trabalhador atinge os 65 anos de idade.

Qualquer dos referidos factos configura verdadeiro pressuposto do direito à pensão de reforma, pois que só com a verificação de um desses factos nasce o direito ao recebimento das correspondentes prestações, então se definindo o seu conteúdo.

Até à ocorrência deles apenas se pode falar, como unanimemente tem entendido a jurisprudência, de uma expectativa jurídica, a que a lei dispensa protecção, através de providências destinadas a defender o interesse do respectivo titular e a garantir-lhe, tanto quanto possível, a aquisição futura do direito, que permanece como que em estado de gestação, nascendo no momento em que se mostrem verificados todos os seus pressupostos.

Não existindo o direito à pensão de reforma senão no momento em que o trabalhador atinge a idade da invalidez presumível ou se mostra afectado de doença ou invalidez efectiva, não pode a estes factos conferir-se a natureza de mera condição suspensiva, que só faz sentido quando reportada à produção de efeitos de direitos e obrigações já constituídos no âmbito de determinada relação jurídica (artigo 270.º do Código Civil).

No caso que nos ocupa, tendo o Autor, de harmonia com os factos provados, completado 65 anos de idade em 7 de Outubro de 1998, foi nesta data que adquiriu o direito à pensão de reforma, e não em 1 de Abril de 1975, data em que deixou de prestar trabalho para o BBI, entidade antecessora do Réu.

Não está em causa que o direito do Autor à pensão de reforma tem o seu regime definido na regulamentação colectiva do sector bancário, nem que a aplicação no tempo das normas das convenções colectivas se rege pelos critérios plasmados no artigo 12.º do Código Civil, de acordo com o qual a lei só dispõe para o futuro e, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que se destina a regular (n.º 1).

Ora, no caso, não pode falar-se de aplicação retroactiva, pois a situação factual de que emerge o direito à pensão de reforma apenas se mostrou apta a produzir efeitos em 7 Outubro de 1998, e, assim, tais efeitos hão-de ser apreciados à luz do regime então vigente, cobrando aplicação a norma que veio regular o direito a prestações complementares de reforma (a Cláusula 140.ª do ACTV).

A tal não obsta a circunstância de, à data da entrada em vigor daquela norma, que ocorreu por força do ACTV de 1982, não existir nem ter voltado a existir nenhum nexo pessoal ou laboral entre o Autor e a instituição bancária para a qual havia trabalhado, dado que, como se viu, a relação previdencial constituída com a celebração do contrato de trabalho se mantém para além da cessação da relação laboral.

É certo que o âmbito pessoal de aplicação das normas de convenções colectivas está sujeito ao princípio da filiação – artigo 7.º do Regime Jurídico das Relações Colectivas de Trabalho, constante do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro (LRCT) e artigo 552.º do Código do Trabalho.

Todavia, o regime previdencial estabelecido na regulamentação colectiva do sector bancário tem a natureza de subsistema de segurança social, (substitutivo do sistema geral estatal), cuja existência e obrigatoriedade decorre das leis que sucessivamente têm vindo a regular o direito segurança social.

Como se pode ler no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 174/2008, de 11 de Março de 2008 (em www.tribunalconstitucional.pt), “pode afirmar-se que o sistema de segurança social, correspondente ao sector bancário, coberto por convenções colectivas que o regulam, é, afinal, o próprio regime principal e obrigatório deste sector instituído por via convencional, e, por isso mesmo, independente e alheio aos outros sistemas, como é o caso do sistema de segurança social”.

Isto para dizer que o âmbito pessoal das convenções colectivas do sector, na parte em que contemplam um regime previdencial específico, escapa ao princípio da filiação.

Aliás, se assim não fosse, dado que, no caso dos autos, não está demonstrado, nem foi alegado, que o Autor tivesse alguma vez sido filiado nas associações sindicais subscritoras das convenções colectivas em causa, a consequência seria a de que não poderia sequer beneficiar do estatuído na Cláusula 137.ª.

Defendem os recorrentes que a aplicação da Cláusula 140.ª à situação jurídica do Autor em termos de pensão de reforma viola a proibição expressa de aplicação retroactiva de cláusulas emanadas de instrumentos de regulamentação colectiva.

Segundo o artigo 6.º, n.º 1, alínea f), da LRCT, os instrumentos de regulamentação colectiva não podem conferir eficácia retroactiva a qualquer das suas cláusulas (com a excepção atinente a tabelas salariais, em determinado condicionalismo, que aqui não releva) – idêntica disposição consta do artigo 533.º, n.º 1, alínea c), do Código do Trabalho.

Esta proibição refere-se, naturalmente, a direitos já consolidados e adquiridos na vigência de instrumento anterior, não sendo esse o caso que se nos apresenta, como acima se concluiu, a propósito da aplicação das leis no tempo.

Também, neste particular, não pode acolher-se a argumentação dos recorrentes.

E não sendo de perspectivar a situação como de aplicação retroactiva, não se vislumbra, sob esse aspecto, fundamento para sustentar a afirmação de inconstitucionalidade.

Quanto à alegada “denegação do disposto nos n.os 1 e 4 do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa”, o Acórdão deste Supremo de 12 de Dezembro de 2001 (acima referido), que se debruçou sobre um caso de contornos algo semelhantes aos do que nos ocupa, referindo-se à mais recente jurisprudência que vem considerando não constituir violação dos princípios consignados naquele artigo a aplicação da Cláusula 140.ª a trabalhadores, cujo contrato de trabalho no sector bancário haja cessado antes de atingida a idade de invalidez presumível, observou:

“[...]

Nessa jurisprudência, o encadeamento argumentativo desenvolvido tem sido o seguinte:

- no “regime transitório” instituído pelos n.os 3 e 6 da cláusula 141.ª do ACTV de 1982, reproduzido nos n.os 3 e 6 da cláusula 142.ª do ACTV e nos n.os 1 e 4 da cláusula 142.ª do ACTV de 1996, o complemento de reforma previsto apenas beneficiava os trabalhadores que tivessem abandonado o sector bancário sem ser por iniciativa própria e a partir de 15 de Julho de 1982;

- porém, esta restrição temporal (a 15 de Julho de 1982), constante dos aludidos ACTV, veio a revelar-se supervenientemente inconstitucional, por incompatível com o princípio, introduzido pela revisão constitucional de 1989, ao aditar o n.º 5 ao artigo 63.º da Constituição (n.º 4 do mesmo artigo 63.º, após a revisão constitucional de 1997), de que “todo o tempo de trabalho contribuirá, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”;

- por isso, nas correspondentes cláusulas dos subsequentes ACTV se omitiu qualquer referência ao momento em que o trabalhador, “por qualquer razão”, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social do sector bancário;

- assim, as instituições bancárias que tenham tido ao seu serviço trabalhadores que venham a ser colocados na situação de reforma por invalidez ou por invalidez presumível quando já não exerciam funções nesse sector de actividade estão obrigadas ao pagamento, “na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado nos sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral da Segurança Social ou outro regime nacional mais favorável que lhe seja aplicável” (n.º 1 da cláusula 140.ª do ACTV de 1990).

- Este entendimento respeita os aludidos princípios constitucionais e a diferença de regimes entre as cláusulas 137.ª (só aplicável aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da instituição bancária quando passaram para a situação de reforma) e 140.ª justifica-se por contemplarem situações diversas: a diversidade entre uma carreira homogeneamente desenvolvida até ao seu termo no sector bancário (com um regime próprio de segurança social, caracterizado, além do mais, pela inexistência de contribuições, quer dos trabalhadores, quer das entidades patronais) e uma carreira heterogénea em termos de diversificados regimes de segurança social ou até incompleta (contemplando-se mesmo as situações em que o antigo trabalhador não adquiriu no âmbito de qualquer outro regime nacional de segurança social - situação prevista e regulada no n.º 5 da citada cláusula 140.ª).

[...]”

Não se vêem motivos para divergir desta orientação.

Merece, por conseguinte, ser confirmado o douto acórdão impugnado.


III

Por tudo o exposto, decide-se negar a revista.

Custas a cargo dos recorrentes.

Lisboa, 10 de Julho de 2008.


Vasques Dinis (Relator)
Bravo Serra
Mário Pereira
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(1)- Quereria, certamente, escrever-se “artigo 552.º do CT”.