Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
PODERES DA RELAÇÃO
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
NULIDADE PROCESSUAL
SUBSÍDIO DE DOENÇA
SEGURANÇA SOCIAL
ÓNUS DA PROVA
CADUCIDADE
SUSPENSÃO PREVENTIVA
FALTA DE PAGAMENTO DA RETRIBUIÇÃO
RESOLUÇÃO PELO TRABALHADOR
Sumário
I - Das decisões do Tribunal da Relação que ordenam a ampliação da matéria de facto quando a considere insuficiente para decidir do mérito da causa, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (art. 712.º, n.º 6, do CPC).
II - Porém, não se enquadra no âmbito da ampliação da matéria de facto, antes contende com a regular tramitação processual, a decisão da Relação que ordena que o juiz de 1.ª instância convide as partes a completar os seus articulados. III - Por isso, de tal decisão é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. IV - A omissão do juiz consistente em não ter convidado as partes a completar e corrigir os articulados, como devia ter feito por força do disposto no art. 27.º, al. b), do CPT, admitindo-se que constitua irregularidade processual, susceptível de integrar uma nulidade processual, depende de arguição. V - As faltas por motivo de doença determinam a perda de retribuição, desde que o trabalhador beneficie de um regime de segurança social de protecção na doença. VI - Constitui condição de acesso do trabalhador por conta de outrem à protecção social prevista no regime geral da segurança social, a inscrição (do trabalhador e da respectiva entidade empregadora) no referido regime e, bem assim, o cumprimento das obrigações contributivas. VII - Compete à entidade empregadora alegar e provar que o trabalhador, no período em causa, beneficiava de um regime válido de protecção na doença (art.º 342.º, n.º 2, do CC), sob pena de ser condenada no pagamento das retribuições referentes ao mesmo. VIII - Independentemente da sanção disciplinar que a final venha a ser aplicada ao trabalhador, deve observar-se o disposto no art. 417.º do Código do Trabalho, quanto à suspensão preventiva do trabalhador, se a entidade empregadora instaurou o procedimento disciplinar com intenção de despedimento com justa causa IX - Neste circunstancialismo, quando a suspensão preventiva é ordenada antes de o trabalhador receber a nota de culpa, constitui formalidade ad substantiam da licitude daquela, a justificação por escrito das razões determinantes da mesma. X - O prazo de caducidade de trinta dias de que o trabalhador dispõe para resolver o contrato de trabalho com fundamento na ilicitude da suspensão preventiva só começa a correr após aquela medida ser revogada, ainda que tacitamente. XI - De igual modo, o prazo de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho com fundamento no não pagamento da retribuição (ilícito de efeitos continuados) só começa a correr quando essa conduta infraccional tiver cessado, ou seja, com o pagamento da retribuição em falta. XII - A suspensão preventiva do trabalhador, ainda que ilícita, não tem a virtualidade de constituir, só por si, uma causa subjectiva de resolução do contrato por banda do trabalhador, a menos que, cumulativamente, se surpreenda no comportamento da entidade empregadora uma violação do dever de ocupação efectiva. XIII – Inexiste justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador, com fundamento na suspensão preventiva ilícita e no não pagamento da retribuição, se, anteriormente àquela suspensão, o trabalhador já se tinha auto-suspenso, e, após a mesma, entrou de baixa por doença, e o não pagamento da retribuição se reporta ao período de 30 dias de baixa por doença, por não demonstração por parte da entidade empregadora de um regime de protecção social na doença, sendo certo que esta havia justificado ao trabalhador o não pagamento com a situação de baixa.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
1. AA propôs no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia a presente acção emergente de contrato individual de trabalho contra INDE - Intercooperação e Desenvolvimento, CRL, pedindo que:
a) a sanção disciplinar de 18 dias de suspensão com perda de retribuição que lhe foi aplicada pela ré seja declarada inválida e abusiva e que, em consequência, a ré seja condenada a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 18.876,00, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação;
b) se reconheça que a resolução do contrato de trabalho que mantinha com a ré foi efectuada com justa causa e que, em consequência disso, a ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização no valor de € 43.764,00, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação;
c) a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação;
d) a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 17.403,76, a título de retribuições vencidas, acrescida de juros de mora a contar da data da citação;
e) a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 380,70, a título de reembolso de despesas por ele efectuada com a aquisição de equipamentos para a ré, acrescida de juros de mora a partir da data da citação.
Em resumo, o autor alegou que foi admitido ao serviço da ré, mediante a celebração de um contrato de trabalho a termo certo, com início em 21.7.2004 e a duração de 12 meses, para desempenhar as funções de chefe de missão em Timor Leste, mediante a retribuição mensal de € 2.726,00, dos quais € 1.320,00 eram processados como ajudas de custo; que foi ilicitamente suspenso pela ré; que a sanção disciplinar de 18 dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição foi ilícita e abusiva; que a ré deixou de lhe pagar as retribuições, a partir de 16.3.2005; que resolveu o contrato com justa causa e que a conduta da ré lhe causou danos não patrimoniais.
Na contestação, a ré excepcionou a caducidade do direito de resolução do contrato relativamente a dois dos fundamentos invocados pelo autor (suspensão de funções e não pagamento das retribuições), defendeu a improcedência de todas as pretensões formuladas pelo autor, com ressalva da quantia de € 1.827,80, sendo € 1.406,00 a título de subsídio de férias e € 421,80 a título de retribuição de férias (9 dias), e, em reconvenção, pediu que o autor fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 1.312,27, a título de indemnização pela resolução do contrato sem justa causa e sem aviso prévio, acrescida de juros de mora a partir da notificação da reconvenção.
Realizado o julgamento, com gravação da prova e dadas as respostas aos quesitos que integravam a base instrutória, foi proferida sentença que, julgando parcialmente provada e procedente a acção e improcedente a reconvenção, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 6.327,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais pela resolução do contrato com justa causa, e a quantia de € 1.827,80, a título de subsídio de férias e de nove dias de remuneração, acrescidas de juros de mora desde a data da citação, e absolveu o autor do pedido reconvencional.
Mais concretamente, para que adiante se perceba melhor a fase recursória, na sentença decidiu-se:
- que a excepção da caducidade do direito de resolução do contrato era procedente relativamente a um dos fundamentos invocados pelo autor: o não pagamento da retribuição desde 15.3.2005 até 13.6.2005;
- que a sanção disciplinar aplicada ao autor era lícita;
- que a suspensão preventiva de que o mesmo foi alvo, desde 9.2.2005 até 20.6.2005, era ilícita;
- que a ilicitude dessa suspensão constituía justa causa de resolução do contrato;
- que a resolução do contrato conferia ao autor o direito a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;
- que a quantia processada ao autor a título de ajudas de custo não integrava a retribuição;
- que a indemnização devida ao autor devia ser calculada tendo por base 45 dias da retribuição base, com um mínimo de três [meses] – € 6.327,00 (€ 2.109,00 x 3);
- que o autor não tinha direito nem à retribuição nem às ajudas de custo referentes ao período de 16.3.2005 a 13.6.2005, em que esteve doente, em Portugal;
- que o autor também não tinha direito às ajudas de custo no período de 20.12.2004 a 7.1.2005, em que esteve de férias em Portugal;
- que, no que toca aos créditos salariais peticionados, o autor só tinha direito à quantia de € 1.827,80 que a ré tinha reconhecido estar em dívida.
Inconformados com a sentença, dela recorreram o autor e a ré.
O autor, por entender que a sentença era nula, por alegada contradição entre os fundamentos e a decisão, no que toca à caducidade do direito de resolução do contrato com fundamento no não pagamento das retribuições, e por entender que tinha direito às retribuições referentes ao período de 16.3.2005 a 20.6.2005.
A ré, por entender que, relativamente à suspensão preventiva do autor, também se verificava a caducidade do direito de resolução do contrato, e por considerar que esse fundamento não constituía justa causa de resolução.
Apreciando os recursos, o Tribunal da Relação do Porto, depois de ter alterado oficiosamente a matéria de facto dada como provada na 1.ª instância, decidiu da seguinte forma:
«A) Quanto ao recurso do Autor, conceder parcial provimento ao recurso do Autor e, em consequência:
- Julgar improcedente a arguida nulidade da sentença;
- Revogar a decisão recorrida na parte em que julgou procedente a excepção da caducidade do direito de o A. resolver, com justa causa, o contrato de trabalho com fundamento no não pagamento das retribuições;
- Anular a decisão recorrida quanto ao pedido de pagamento das retribuições correspondentes ao período de 16.03.05 a 14.04.05, determinando-se que o tribunal a quo proceda à ampliação da matéria de facto, nos termos referidos no ponto III. 5.1.2., com vista a apurar se o A. estava, ou não, abrangido pelo regime geral (trabalhador por conta de outrem) da Segurança Social de protecção na doença (podendo ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão) e, de seguida, profira sentença, em conformidade, conhecendo do mencionado pedido, bem como da justa causa de resolução do contrato de trabalho, por iniciativa do A., com fundamento na falta de pagamento dessa retribuição [-];
- No mais, negar provimento ao recurso do A., confirmando-se a sentença recorrida.
B) Quanto ao recurso da Ré, negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.»
A ré interpôs recurso de revista, concluindo as respectivas alegações da seguinte forma:
1 - Por comunicação de 4.2.2005, o Recorrido informou o seu superior hierárquico que suspendia qualquer contacto com ele;
2 - O Recorrido exercia as suas funções em Timor-Leste, mantendo-se em Lisboa aquele superior;
3 - Na mesma comunicação, o Recorrido declarou suspender o trabalho planeado;
4 - A Recorrente comunicou, em 9.2.2005, ao Recorrido a suspensão de todas as suas funções;
5 - O Recorrido resolveu o contrato de trabalho mediante comunicação de 19.7.2005, invocando, entre outros fundamentos julgados insubsistentes com trânsito em julgado, a suspensão ilegal de todas as funções e o não pagamento da retribuição referente ao período de 15.3.05 a 13.6.05;
6 - O douto Acórdão recorrido considerou ilícita a ordem de suspensão, por entender que a Recorrente faltou ao "dever de justificação prevista no art.º 417.º do Cód. do Trabalho”;
7 - O art.º 417.º insere-se na Divisão I, com a epígrafe "Despedimento por facto imputável ao trabalhador" e é inaplicável ao caso dos autos, uma vez que o processo disciplinar instaurado ao Recorrido não conduziu ao seu despedimento, mas sim à aplicação de sanção de suspensão por 18 dias;
De resto,
8 - Não estava a Recorrente obrigada a procedimento disciplinar idêntico ao referente ao despedimento (Ac. 16.10.2002, Rel. Lisboa, CJ 2002, 4.º, pág. 152).
Por seu turno,
9 - O art.º 371.º, 3, do Cód. do Trabalho não exige que a suspensão seja escrita, nem fundamentada.
10. O Acórdão recorrido fez, pois, incorrecta aplicação do art.º 417.º do Cód. do Trabalho.
De resto,
11 - Ainda que se considerasse exigível a fundamentação escrita, sempre se teria de considerar que “não constitui nulidade do processo disciplinar a suspensão do trabalhador contra preceito legal expresso” (Ac. STJ, de 4.12.97, in SASTJ, 15°/16°, pág. 250);
12 - A justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador tem de ser apreciada nos termos do n.º 2, do art.º 396.º do Cód. Trabalho;
13 - A suspensão, “sponte sua”, por parte do Recorrido, justifica a ordem de suspensão decretada pela Recorrente.
Aliás,
14 - Pode mesmo concluir-se pela irrelevância da mesma, atenta a prévia suspensão decidida pelo Recorrido.
15 - A suspensão preventiva não constitui fundamento para o trabalhador resolver o contrato com justa causa, como vem sendo jurisprudência constante dos nossos Tribunais Superiores (i.e. Ac. STJ, de 28.7.87, in A.D. 314, pág. 287).
16 - Ainda que se considerasse ilícita a suspensão preventiva, mesmo então se teria de concluir pela caducidade do direito do Recorrido de resolver o contrato.
Com efeito,
17 - A suspensão é acto instantâneo, embora os seus efeitos permaneçam (Ac. STJ, de 8.5.2002, in CJ/STJ, 2002, 2°, pág. 262).
18 - Conhecida a suspensão em 9 de Fevereiro, dispunha o Recorrido do prazo de 30 dias para resolver o contrato.
19 - Desatendendo a invocada caducidade, violou o Acórdão o n.º 1 do art.º 442.º do Cód. do Trabalho.
20 - O Acórdão recorrido juntou o melhor de dois mundos “dos n.os 1 e 2 do art.º 443.º do Código”.
21 - Ou bem que a indemnização é calculada de acordo com o número um daquele artigo, e não há lugar à multiplicação por três, ou bem que se cai na previsão do n.º 2 e, então, é a remuneração base que é multiplicada por três.
22 - O Recorrido teria, por conseguinte, se fosse lícita a resolução, direito a € 4.218,00 (€ 1.406 x 3) e não a uma remuneração e meia vezes três como decidido.
23 - Encontrando-se provado que a Recorrente comunicou à Segurança Social o início de actividade do Recorrido e tendo este junto atestado de doença, não pode a Recorrente ser condenada a pagar a retribuição pelo tempo correspondente à doença (230.º, 2, a), do Cód. do Trabalho).
24. Em qualquer caso, igualmente deixou o Recorrido caducar o direito à resolução pelo não pagamento da remuneração – única ainda em discussão – pelo período compreendido entre 16.3.05 e 14.4.05.
25 - Sendo ilícita a resolução, deve o pedido reconvencional ser julgado procedente.
O autor contra-alegou defendendo a confirmação do julgado e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta emitiu “parecer” no mesmo sentido.
Corridos os vistos dos juízes conselheiros adjuntos, cumpre apreciar e decidir.
2. Os factos
Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
Da especificação:
A) O A. tem uma experiência como docente durante mais de 15 anos no Instituto Superior de Serviço Social do Porto.
B) Nos últimos anos, o A. dedicou o seu tempo e saber ao desenvolvimento de Timor--Leste, onde esteve ao serviço da Nações Unidas de Março a Outubro de 2001, de Janeiro a Maio de 2002 e de Outubro de 2003 a Abril de 2004.
C) O A. foi admitido ao serviço da R. mediante a celebração de contrato de trabalho a termo certo, com início em 21.07.2004, nos termos que constam do documento de fls. 39 e 40.
D) Como deste documento decorre, o contrato foi celebrado pelo período de 12 meses.
E) No desempenho das funções para que foi contratado incumbia ao A. a actividade de Chefe de Missão/Representante da Ré em Timor-Leste, coordenando o projecto “Reconstruir Timor”, financiado pela Comissão Europeia, por conta, no interesse e sob a direcção e fiscalização da R.
F). A actividade do A. foi prestada nas instalações da R. sitas em Timor Leste, designadamente nas casas de missão sitas em Dili, Los Palos, Maliana e, ainda, em Liquiça, em apoio a uma rádio local, bem como, ocasionalmente, aquando da sua vinda a Portugal, nas instalações da R. sitas em Lisboa.
G) O período diário normal de trabalho do A. era de 8 horas, de segunda a sexta-feira, das 9 às 18 horas.
H) A R. retribuía o A. com o valor mensal de € 2.726,00, sendo € 1.406,00 a remuneração mensal e € 1.320,00 subsídio de ajudas de custo por mês de missão em Timor--Leste.
I) As viagens de ida e de regresso Timor-Leste/Portugal foram pagas pela R..
J) O A. gozou um período de férias de 12 dias, entre 20/12/2004 e 07/01/2005, em Portugal, para onde se deslocou a expensas da R..
K) Na viagem de regresso a Timor Leste e sob instruções da R., em 11.01.2005, o A. adquiriu para a Ré no “free shop” do aeroporto de Hong Kong, usando o seu cartão de crédito pessoal, uma máquina fotográfica e dois telemóveis, tudo no valor de € 380,70.
L) Em 18/01/2005, já em Timor-Leste, o A. enviou um relatório ao Dr. A..., no qual, entre outras, inseriu as seguintes afirmações:
«Veículos
Em Dili, o nosso fiel e velho Toyota Hilux está avariado (com problemas de bomba de injecção). Esperemos resolver o assunto talvez amanhã (se chegar a peça …).
O Mitsubishi Pajero continua “encalhado”. Já insisti com o Colombo … seria bom que fizesses o mesmo sobre Jakarta para podermos trabalhar.
Casa INDE em Dili
A casa INDE em Kampu Alor mete muita água em diferentes locais. A contratada casa da INDE em Kaikoli está pronta a ocupar depois de obras de beneficiação conforme previamente acordado com o senhorio.
Assim, consideramos fundamental uma tua decisão antecipada sobre a mudança de casa, também para acautelar mais prejuízos.
Recordamos ainda que dada a proximidade de visitas da A...S..., da Uli e do Presidente da Câmara de Odemira, seria importante receber estas visitas em espaço com melhores condições (…). Caso o entendas como necessário, poderei sensibilizar o Sr. Colombo para a pertinência e importância de mais estas mudanças que só beneficiam o decurso do projecto.
Casa de Los Palos
Embora não tenha ainda chegado a Los Palos, o Rico informa que a obra vai andando no ritmo possível dado o carácter da administração directa da obra. O telhado está concluído, o forro está em construção. As paredes estão rebocadas em cerca de metade. O material de acabamento já está em Los Palos. A fossa está feita. As casas de banho (3) estão iniciadas. A varanda posterior está em reconstrução. O final do mês de Fevereiro é a data prevista para a conclusão da obra.
Transferências bancárias
O final do mês aproxima-se e a INDE não fez a transferência mensal para a gestão corrente. Agradecemos que efectuem a transferência o mais rápido possível para não se repetir o episódio do ano passado (Setembro) em que não tínhamos dinheiro para pagar ao nosso pessoal e aos senhorios.
M) No dia 31.01.2005, o A. enviou novo relatório ao Dr. A..., no qual fez constar as seguintes indicações:
Para partir para Los Palos e cumprir com compromissos assumidos anteriormente (Dezembro 2004), beneficiamos da boa vontade e cooperação dos nossos amigos da missão agrícola que, mais uma vez, nos emprestaram o carro.
Veículos
Como já te disse, os meus amigos da Missão agrícola emprestaram um carro para podermos ir a Los Palos, caso contrário não teríamos saído de Dili.
O Toyota Hilux já está a andar, mas precisa de mais uma reparação na caixa de velocidades e outras mais … vamos saber o custo total da reparação para ver se pomos o carro operacional para os próximos meses.
O Mitsubishi Pajero, como sabes, continua “encalhado” … aguardamos o cumprimento da INDE Lisboa sobre os pedidos de Jakarta.
Esperamos que não demore muito tempo, caso contrário não poderemos sair de Dili …
Casa(s) INDE em Dili
Neste momento – dada a tua ordem de não mudança de casa – a INDE é arrendatária de duas casas, uma em Kampu Alor (a antiga e em mau estado) e outra em Kaikoli (a nova e em bom estado).
Isto quer dizer que a INDE gastou em Janeiro mais $USD330,00 do que o que estava planeado, e sem qualquer benefício.
O absurdo aumenta e os gastos também.
Estranho procedimento de uma organização com poucos recursos …
Até quando esta situação?!...
Na conversa telefónica que tivemos sobre este assunto em Dezembro – já depois de eu ter firmado o contrato com a senhoria e de tu teres dado contra-ordem de mudança – tu assumiste o compromisso de falares com senhoria em Dili em Janeiro de 2005. Janeiro terminou.
Que novos compromissos e/ou instruções?...
Casa de Los Palos
Depois de ver a obra “in loco”, constato que está bem mais atrasada.
Estudamos a situação em conjunto com a dona da casa e decidimos fasear a finalização da obra. Depois conto mais …
Transferências bancárias
O problema é que os gastos da casa em Los Palos e mais as compras que são necessárias para equipamento – impressora, fotocopiadora, … o dinheiro não chega, ou seja, precisamos de mais fundos para trabalhar.
Esta é a nossa sucinta previsão orçamental (em breve te enviarei uma mais circunstanciada):
Gestão corrente: $USD4.116,00
Casa LP: (Já gastamos cerca de $USD 2.500,00) prevemos um gasto de mais $ USD 2.000,00 (mas sabemos as “derrapagens” deste tipo de obras … no entanto, estamos atentos à baliza dos $USD 5.000,00)
Equipamento para escritório de Los Palos e Dili : …
Moto para Los Palos : $USD - $USD 1.300,00,
Outros – a curto prazo – já confirmados, mas ainda em estudo:
Formação sabão – pagamento viagem e a formador de Bali para Los Palos.
Apoio à Pousada de Tutuala: forte investimento imediato.
Apoio à Dª R...: forte investimento imediato.
Apoio à Dª A...: forte investimento imediato.
Ponte de Malahara: forte investimento imediato.
N) Em 02.02.2005, o A. enviou ao Dr. A... uma nova mensagem com o seguinte texto «Continuamos sem resposta e sem carro. Como está o processo?... em que fase está?... Já reenviaste os documentos para Jakarta?!.. Estamos sem carro!»
O) Na sua resposta, em 04.02.2005, o Dr. A..., entre outras, profere as seguintes afirmações:
«(…) No 22 de Novembro, pedi que o vendedor mandasse por fax a factura pró-forma. Não um email teu com a conta bancária, mas uma factura pró-forma do vendedor. Enquanto não houver estes elementos, não pode haver pagamento. Temos trabalhado 5 meses em Timor sem carro»;
«Não está previsto nenhuma despesa para a Pousada de Tutuala no orçamento nem no projecto, portanto preciso de explicações, tal como os outros “fortes investimentos” que anuncias»;
«Casa Dili: como as instruções já foram dadas 4 vezes e não cumpridas, a Uli irá falar com o Sr para dizer que acabou»;
«Casa Los Palos: uma derrapagem orçamental não é normal, é resultado de uma negligência, além disso com atraso. Um aumento de 50% do custo previsto é incompetência pura. Vindo de alguém que repita cada mês que é pena gastar dinheiro em Dili numa casa alugada contrariando instruções escritas, já não sei como chamar isso. A A... tem de “recuperar” a obra para geri-la directamente, ela própria.»
P) Na mesma data, o Dr. A... enviou uma segunda mensagem de correio electrónico a A... M..., com conhecimento ao A., cujo teor era o seguinte:
«Ana,
Sou informado pelo L... de um atraso considerável e de uma derrapagem de preço de 50%. Na medida onde temos deixado uma casa onde estávamos há 4,5 anos sem problema para, em princípio, melhorar a situação é muito importante resolver isso.
Agradeço que em coordenação com a U... L..., que irá chegar no próximo dia 9, tomasse todas medidas de acompanhamento para que a obra seja concluída nos prazos e no custo combinados.»
Q) Esclarece-se que A... M..., funcionária expatriada, era, então, colaboradora da R. em Timor-Leste, com funções na área da logística, subordinada do A..
R) Por sua vez, U... L... é funcionária da R. em Lisboa e, nessa data, preparava-se para se deslocar a Timor Leste com o intuito de preparar uma acção de formação promovida pela R..
S) Logo em 04.02.2005, após ter recebido as duas mensagens identificadas nas alíneas O) e P) supra, por volta das 23h45m, hora local, o A. enviou ao Dr. A... uma comunicação, na qual inseriu as seguintes afirmações:
«Depois da desautorização e deslealdade de que fui alvo através das suas últimas mensagens, revelando a sua desconfiança no meu/nosso trabalho apenas e tão só baseado nas suas falsas “verdades”e perante a certeza que tenho sobre o empenho, dedicação e bom serviço que venho dedicando à INDE, como seu representante em Timor Leste e coordenador de projecto cofinanciado pelo Comissão Europeia,
Só me resta dizer-lhe o seguinte:
1. A reserva de confiança que ainda era obrigado a ter relativamente à sua pessoa enquanto responsável pelos assuntos de Timor da INDE e responsável perante Bruxelas do Projecto Reconstruir Timor aprovado e cofinanciado pela Comissão Europeia, esgotou-se com esta sua lamentável e intolerável atitude;
2. Como através das suas últimas mensagens me desautoriza e retira a possibilidade de exercer as minhas funções de forma súbita e não esperada, a sua atitude obriga-me a suspender qualquer contacto consigo e a pedir-lhe que transmita esta mensagem aos elementos da direcção da INDE, entidade que me contratou, a quem eu respondo e com quem eu quero esclarecer este conflito por si agora despoletado;
3. Em seguida, aguardo um contacto da presidente da direcção ou de qualquer outro elemento com responsabilidades na direcção da INDE;
4. Após a transmissão desta mensagem aos elementos da direcção, tanto quanto eu sei, nas pessoas de C...C..., M...C... e R...T..., solicito-lhe que me envie com a máxima urgência os seus contactos (correio electrónico e telemóvel), para que me seja possibilitado o seu contacto e para que eu lhes possa dar a conhecer a minha versão deste incidente conflitual, possam arbitrá-lo e possam decidir o que seja melhor para a INDE;
5. Depois do seu acto, impeditivo do desempenho das minhas funções para as quais a INDE me contratou, passarei a garantir os assuntos de gestão corrente porém, suspenderei o trabalho planeado, até novas instruções da direcção da INDE, pela consequente desconfiança na sua pessoa enquanto elemento de ligação com a INDE em Lisboa;
6. Lembro-lhe ainda que não sou um “júnior” mas sim um “sénior” em trabalho social/comunitário como bem sabe pelo meu CV, a si então enviado. Muito embora o meu horizonte de trabalho não se limite à INDE (…) persisto em honrar os compromissos com a INDE assumidos;
7. Recordo-lhe ainda que estou ao serviço da INDE e não do Sr. A..., e sobretudo, quando o Sr. A... decide não respeitar as regras mínimas do respeito profissional, da verdade, lealdade e regras básicas da convivência e trabalho profissional. É à INDE que eu devo e quero prestar contas – estou totalmente disponível para tal – pois estou com a consciência tranquila que fiz o meu melhor (com o total apoio da equipa de timorenses da INDE) e com o mais sério empenho, apesar da sua persistente falta de apoio. Dediquei-me à INDE e ao trabalho que me era exigido, sem limites de tempo e ou outros constrangimentos;
8. Por último, Sr. A..., gostaria de pensar que amanhã o Sr. me enviaria nova mensagem a dizer que tinha sido um erro de leitura/comunicação da minha parte, talvez por um erro de envio de mensagem da sua parte, ou outra justificação qualquer minimamente credível mas, estou quase certo, tal não acontecerá …
Então, certo do reenvio desta minha mensagem aos membros da direcção e aguardando um contacto por parte da direcção da INDE, bem como as informações solicitadas sobre os seus contactos telefónicos, obviamente com a máxima urgência.
T) Em 07.02.2005, através de mensagem de correio electrónico com o assunto «situação do colaborador AA», recebida pelo A. em 09.02.2005, a R. comunicou a este último a suspensão de todas as suas funções «enquanto colaborador do INDE, incluindo coordenação e representação da INDE em Timor-Leste, mantendo por enquanto o seu vínculo contratual.
U) Em 11.02.2005, o A., através do então respectivo mandatário, solicitou à R. «a comunicação dos fundamentos da suspensão do exercício de funções, bem como o tempo da sua duração».
V) A resposta a tal carta foi dada em 28.02.2005 pela R. directamente ao A. anunciando que, «na sequência de inquérito prévio instaurado pela Direcção desta Cooperativa [ora R.]», e «tendo sido indiciariamente apurada matéria passível de ser qualificada como integrando justa causa de despedimento, decidiu a Direcção instaurar processo disciplinar sendo intenção – caso se confirmem aqueles indícios – proceder ao despedimento do [autor] com justa causa”.
X) A suspensão de funções do A. não foi mantida nas relações internas entre o A. e a R., antes foi comunicada pela R. às diversas entidades oficiais com quem aquele se relacionava, no exercício das suas funções, designadamente às autoridades locais, aos representantes da União Europeia e à Embaixada de Portugal.
Y) E logo que regressou a Portugal o A. foi visto em 16.03.2005 por médico que lhe diagnosticou “Uma depressão major e aconselhado a sua observação, avaliação e orientação terapêutica por um médico psiquiatra”.
W) O A. acabou por ser internado no Hospital Magalhães Lemos entre 21.03.2005 e 01.04.2005, facto dado a conhecer à R. em 28.03.2005, como tudo resulta dos documentos que se juntam e dão por integrados e reproduzidos.
Z) Por carta datada de 26.04.2005, o A. foi notificado da nota de culpa elaborada na sequência do processo disciplinar contra si instaurado.
AA) O A. defendeu-se nos termos constantes da carta expedida em 11.05.2005.
BB) Para além disso, por carta datada de 16.05.2005, o A. solicitou à R. esclarecimento quanto ao facto de apenas ter recebido a quantia de € 130,42, depositada na sua conta bancária em 12/04/2005 e alegadamente referente ao mês de Março, e de não ter recebido qualquer quantia relativa à sua retribuição de Abril.
CC) Na mesma data de 16.05.2005, o A. solicitou o reembolso do valor de € 380,70 conforme já referido em K.
DD) Através de carta datada de 09.06.2005, a R. informou o A. que:
- o processamento do salário do mês de Março dizia respeito apenas a meio mês, deduzido de quantia despendida com bilhete de avião de criança;
- considerava suspenso o pagamento da retribuição do A. com efeitos a partir de 16/03/2005; e
- confirmava a solicitação do equipamento comprado pelo A..
EE) Nessa mesma carta, a R. alega que desconhecia a conta bancária do A. para pagar a prestação por si designada como ajudas de custo, referente aos primeiros 15 dias de Março.
FF) Em carta recebida pelo A. em 20.06.2005 a R. comunicou àquele a decisão de lhe aplicar a sanção disciplinar de suspensão com perda de remuneração pelo período de 18 (dezoito) dias.
GG) Por carta expedida em 23.06.2005, o A. interpelou a R. para proceder ao pagamento da totalidade das suas retribuições vencidas entre a comunicação da sua suspensão e a comunicação da decisão do processo disciplinar.
HH) Através de carta datada de 01.07.2005, a R. reafirmou a sua indisponibilidade para pagar as retribuições do autor referentes ao período compreendido entre 16.03.2005 e 20.06.2005.
II) O A. fez cessar unilateralmente o contrato de trabalho celebrado com a R., com efeitos imediatos, mediante comunicação dirigida à R. em 19.07.2005, conforme documentos de fls. 92 e 93.
JJ) O A. fundamentou a resolução unilateral por si operada nas seguintes circunstâncias:
- suspensão ilegal de todas as suas «funções enquanto colaborador da INDE, incluindo de coordenação e representação da INDE em Timor», determinada por email datado de 07.02.2005 e confirmada através do relatório final do processo disciplinar que posteriormente lhe foi instaurado;
- não pagamento da totalidade da retribuição que lhe era devida, referente ao período compreendido entre 15.03 e 13.06.2005, definitivamente confirmada pela carta da R. datada de 01.07.2005, incluindo a parcela que, sem qualquer correspondência com a realidade dos factos, tinha vindo a ser imputada a título de ajudas de custo;
- aplicação de sanção abusiva, consubstanciada em suspensão com perda de retribuição pelo período de 18 dias, por factos praticados no exercício dos direitos e garantias que lhe assistiam, na sequência de processo disciplinar instaurado através de comunicação datada de 28.02.2005; e
- ofensas à sua honra e dignidade pessoal e profissional praticadas por representante da R. e ratificadas pela Direcção da mesma, nos termos constantes do relatório final do processo disciplinar de que foi alvo.
KK) No âmbito do contrato de trabalho dos autos, a R. pagou ao A. as seguintes quantias:
- € 1.003,12, referente à retribuição do mês de Julho de 2004;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Agosto de 2004;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Setembro de 2004;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Outubro de 2004;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Novembro de 2004;
- € 626,84, referente a subsídio de Natal de 2004;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Dezembro de 2004;
- € 1.802,00, referente à retribuição do mês de Janeiro de 2005;
- € 2.726,00, referente à retribuição do mês de Fevereiro de 2005; e
- € 703,00, referente à retribuição do mês de Março de 2005;
no valor total de € 20 490,52.
LL) A R. nunca pagou ao A. qualquer quantia a título de subsídio de férias, mas o autor gozou férias em Portugal de 20/12/2004 a 9/01/2005, num total de treze dias úteis.
MM) A Ré não procedeu à denúncia do contrato de trabalho a termo celebrado com o Autor.
Do questionário:
1. Findo o último contrato com as Nações Unidas o autor passou a exercer as funções de representante e chefe de missão em Timor-leste.
2. A ré disponibilizou ao autor alojamento na casa de missão de Los Palos.
3. A ré disponibilizou ao autor uma viatura automóvel (Toyota) e combustível, telefone e internet, para utilização no exercício das suas funções.
4. O autor exerceu as suas funções dispondo da colaboração de dois elementos locais.
5. No exercício das suas funções, o autor sempre actuou de forma diligente e zelosa, avalizado pelo Dr. A....
6. O autor apresentou apelos e queixas, remetidas à ré na pessoa do dr. A..., por correio electrónico.
7. Durante o período de férias referido na al. J) supra e a solicitação da ré, o autor reuniu-se em Lisboa, na sede da ré, e foi reiterada confiança no mesmo e planeado trabalho para o futuro com a normalidade de uma relação pessoal e profissional estável que apontava para a continuidade.
8. O autor regressou a Timor após o gozo do seu período de férias e levou consigo a sua filha menor com 3 anos de idade, com a concordância da ré.
9. A ré jamais comunicou ao autor a cessação da suspensão referida na al. T).
10. A suspensão e subsequente comunicação referidas nas als. T) e X) deram origem à formação de um clima de suspeição em relação ao autor, com reflexos negativos nos contactos e relacionamentos extra-profissionais do autor em Timor-Leste.
11. Através da sua suspensão e desprovido do estatuto profissional que era a única razão de ser e de estar do autor em Timor-Leste, assim como dos bens (veículo e comunicações) retirados pela ré, o autor sentiu uma enorme angústia por súbita e inesperadamente não poder cumprir com os compromissos profissionais programados.
12. E por ver maltratado, em vez de reconhecido, todo o empenho e dedicação por si colocado ao serviço da ré a quem deu todo o seu nome, saber e prestígio profissional.
13. O autor ficou isolado e excluído do contacto com as pessoas e entidades com quem trabalhava e que eram, na prática, as únicas com quem mantinha relacionamento pessoal, já que o trabalho em missão é a única razão de ser da convivência entre as pessoas expatriadas.
14. Como consequência da situação criada pela ré o autor passou a viver num estado de grande ansiedade e depressão pela suspeição levantada e incerteza face ao futuro, com custos acrescidos e com a responsabilidade de educar e alimentar a sua filha de 3 anos, a seu cargo, num dos países mais pobres do mundo.
15. Face à ausência de condições para efectuar o devido tratamento em Timor-Leste, nomeadamente por carência de médicos especialistas e de medicação adequada no foro psicológico e psiquiátrico e ao agravamento do seu estado de saúde, o autor foi obrigado a regressar a Portugal, o que fez em 15.03.2005.
16. É falso o constante da al. EE).
17. Nessa mesma carta afirmou ainda que iria proceder ao pagamento das “ajudas de custo” referentes “aos primeiros 15 dias do mês de Março”.
18. Na sequência das comunicações que lhe foram dirigidas pelo Dr. A... e da sua subsequente suspensão, o autor foi afectado por doença do foro neuro psiquiátrico, que o obrigou a regressar a Portugal e, inclusivamente, a ser internado para tratamento no Hospital Magalhães Lemos por um período de 12 dias.
19. Após ter terminado o seu período de internamento o autor passou a depender de ansiolíticos para, por via medicamentosa, recuperar a estabilidade e o equilíbrio emocionais que os actos da ré lhe causaram.
20. O autor passou a alimentar-se mal, a ter permanentes insónias, a centrar o tema das suas conversas nos actos praticados pela ré que culminaram no seu internamento no Hospital Magalhães de Lemos.
21. Foi o autor quem se ofereceu à ré para trabalhar, pedindo o emprego que veio a obter.
22. O subsídio de ajudas de custo não foi pago ao autor relativamente ao período de Dezembro de 2004/Janeiro de 2005 em que se deslocou a Portugal e aqui gozou férias.
23. Sem que o autor jamais tivesse reclamado o respectivo pagamento.
24. O subsídio em referência, destinava-se precisamente, a permitir ao autor fazer face às despesas inerentes à estadia em Timor-Leste.
25. O autor arrendou casa própria em Dili, suportando o respectivo encargo.
26. A ré não custeou os gastos com a alimentação do autor.
27. Os referidos instrumentos de trabalho foram colocados à disposição do autor para uso no exercício da sua actividade profissional.
28. A filha do autor é igualmente filha de A... M..., pessoa contratada pela ré na sequência de indicação do autor.
29. A ré dispunha de seguro de saúde.
30. O autor regressou a Portugal.
31. As ajudas de custo respeitantes aos primeiros quinze dias de Março foram efectivamente pagas por transferência bancária.
32. O autor foi sujeito a uma intervenção cirúrgica à cabeça em data anterior ao ingresso na ré.
33. A ré pagou ao autor as férias por este gozadas e referidas na al. LL).
34. O autor pediu à ré que lhe adiantasse o custo do bilhete de avião da filha, obrigando--se a restituir a quantia em três prestações.
35. Foi deduzido 1/3 daquele custo nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2005 em cumprimento do acordo.
36. Tendo, no pagamento de Janeiro, igualmente sido descontado o montante correspondente à ajuda de custo de Dezembro paga por inteiro, uma vez que o autor tinha estado em Portugal de 20 de Dezembro a 9 de Janeiro.
37. A remuneração e respectivas ajudas de custo respeitantes aos primeiros quinze dias de Março foram pagas ao autor.
38. A partir de 16/03/2005 o autor encontrava-se em Portugal em situação de doença.
39. O Dr. A... era o secretário executivo da ré e superior hierárquico directo do autor.
40. Facto de que o autor tinha conhecimento.
41. A afectação do tratamento da questão respeitante à casa de Dili a outra técnica da ré de categoria igual à do autor e de maior antiguidade, sendo certo que a expressão “a U... irá falar com o Sr. para dizer que acabou” significava que a U... iria falar com o senhorio a dar por cessado o contrato de arrendamento.
42. A decisão do autor, obrigou a ré a concentrar esforços na sua substituição, alterando a afectação de quadros seus, modificando prioridades com reflexos negativos na sua produtividade, obrigando a novo processo de selecção e contratação de técnico para as funções do autor.
43. A ré fez deslocar uma técnica sua para acompanhar o recém contratado.
44. A ré nunca entregou ao autor os recibos do seu salário no momento próprio, tendo--os apenas enviado em 09.06.2005.
45. Em Janeiro de 2005 a ré pagou ao autor apenas a quantia de € 754,89.
46. Durante o período de tempo em que esteve doente, o autor não recebeu qualquer subsídio de doença da ADSE, e, entre 16.03.2005 e 12.06.2005, não recebeu subsídio de doença da Segurança Social. - (1)
47. Como resulta da correspondência trocada entre os dois já junta ao processo, o tratamento entre ambos sempre foi por tu.
Aos factos referidos, a Relação aditou ainda os seguintes:
NN) - Aos 06.08.2004, deu entrada na Segurança Social a “Comunicação da Entidade Empregadora de Admissão de Novos Trabalhadores/declaração do Trabalhador de Início de Actividade e Vínculo Profissional a Nova Entidade Empregadora”, relativa ao A. e assinada por este e pela Ré, que consta do documento que constitui fls. 76/7 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
OO) O A. remeteu à Ré o “Atestado”, datado de 16.03.2005, que consta do documento que constitui fls. 130 dos autos, no qual se refere que: «João M. Pacheco Cabral de Carvalho, licenciado em Medicina (…) atesta por sua honra profissional que AA (…), se encontra doente e impossibilitado de exercer as suas funções laborais no período previsível de 30 dias.»
PP) Entre 13.06.05 e 23.08.05, o A. não recebeu subsídio de doença da Segurança Social.
3. O direito
Como decorre das conclusões formuladas pela recorrente, as questões a apreciar, segundo a ordem da sua precedência lógica, são as seguintes:
- Saber se a Relação, ao “anular” a decisão da 1.ª instância, quanto ao pedido de pagamento das retribuições correspondentes ao período de 16.3.2005 a 14.4.2005, e ao ordenar a ampliação da matéria de facto com vista a apurar se o A. estava, ou não, abrangido pelo regime geral da segurança social de protecção na doença violou o disposto no art.º 664.º, n.º 2, do CPC;
- Na hipótese afirmativa, saber se o autor tem direito à retribuição correspondente ao período de 16.3.2005 a 14.4.2005;
- Saber se a suspensão de funções de que o autor foi alvo deve ser considerada ilícita;
- Sendo ilícita, saber se o eventual direito de o autor a resolver o contrato de trabalho com esse fundamento já tinha caducado;
- Saber se o direito de resolver o contrato com fundamento no não pagamento das retribuições já tinha caducado;
- Não havendo caducidade, saber se a suspensão preventiva e o não pagamento das retribuições constituem justa causa de resolução do contrato de trabalho;
- Saber se a indemnização arbitrada ao autor é excessiva;
- Saber se o pedido reconvencional deve ser julgado procedente.
3.1 Da ordenada ampliação da matéria de facto
Na petição inicial o autor pediu que a ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 17.403,76 de retribuições vencidas antes da data em que ele resolveu o contrato com invocação de justa causa. No que toca a essas peticionadas retribuições, na sentença da 1.ª instância decidiu-se que o autor só tinha direito a receber da ré a quantia de € 1.827,80. E mais concretamente decidiu-se que o autor não tinha direito a receber a retribuição referente ao período de 16 de Março a 13 de Junho de 2005, pelo facto de o contrato de trabalho se encontrar suspenso, devido à situação de doença do autor.
No recurso de apelação o autor insurgiu-se contra tal decisão, alegando que tinha direito à retribuição referente ao período de 16 de Março a 20 de Junho de 2005.
No acórdão recorrido decidiu-se que o autor não tinha direito à retribuição referente ao período posterior a 15.4.2005, uma vez que nesta data o contrato de trabalho tinha ficado suspenso, pelo facto de ele se encontrar na situação de doença desde 16.3.2005.
E, no que toca ao período de 16.3.2005 a 14.4.2005, entendeu-se que era necessário ampliar a matéria de facto, com a seguinte fundamentação:
«Quanto ao período de 16.03.05 a 14.04.05, devendo, como se viu, considerar-se justificada (por doença) a indisponibilidade do A. para prestar a sua actividade laboral (artº 225º, nº 2, al. d)), impõe-se apreciar, face ao disposto no artº 230º, nº 2, al. a), se essa situação determina, ou não, a perda do direito à retribuição correspondente.
Dispondo este preceito que as faltas por doença determinam a perda da retribuição, desde que o trabalhador beneficie de um regime de segurança social de protecção na doença, há que apreciar se o A. estaria, ou não, abrangido por algum desses regimes.
No que se reporta ao regime previdencial conferido pela ADSE, este é o regime de assistência na doença dos funcionários e agentes da administração pública, sendo que, no caso, a Ré não é administração pública ou equiparada, pelo que, estando o A. ao serviço desta, não se vê como pudesse beneficiar do regime previdencial em matéria de subsídio de doença a cargo daquela entidade (havendo-se também provado que o A., no período em questão nos autos, não auferiu subsídio de doença por esta entidade).
No que se reporta ao regime previdencial da Segurança Social:
No caso, estando embora assente que o A., nesse período, não auferiu subsídio de doença da Segurança Social e que a Ré, em Agosto de 2004, comunicou a esta entidade a admissão do A. ao seu serviço (através da entrega do respectivo modelo que consta de fls. 76/77 e que se reporta à «Comunicação da Entidade empregadora de Admissão de Novos Trabalhadores / Declaração do Trabalhador de Início de Actividade e Vínculo Profissional a Nova Empregadora»), desconhece-se, no entanto e designadamente, se o A. foi, ou não, inscrito na Segurança Social, se foi, ou não, efectuado o registo de remunerações, se foi, ou não, certificada, nos termos legalmente previstos, a incapacidade temporária para o trabalho, e/ou quaisquer outros factos eventualmente relevantes quanto à abrangência do A. pelo regime da Segurança Social que o protegesse na doença, factos esses que não foram alegados por nenhuma das partes [-], nem averiguados pelo tribunal.
Desconhecem-se, também, as razões pelas quais o A. não auferiu o subsídio de doença pela Segurança Social.
Com efeito, a este propósito, a Ré nada alegou.
E, quanto ao A., limitando-se a dizer que o não recebeu porque a Ré não lhe indicou o número de beneficiário (facto não levado à base instrutória), não é esta justificação suficientemente esclarecedora da situação do A. perante a Segurança Social.
Se a mera omissão, pela ré ao A., do número de beneficiário, não impediria a cobertura previdencial conferida pelo regime de segurança social (considerando-se que o A. poderia supri-la pedindo tal informação à Segurança Social), diferente seria a situação se essa omissão tivesse resultado da não inscrição, a essa data, do A. na Segurança Social, o que, no entanto e como se disse, não foi alegado por nenhuma das partes, nem averiguado pelo tribunal a quo.
A factualidade relativa à questão de saber se o A., no período subsequente a 16.03.05, estava, ou não, abrangido pelo regime previdencial da Segurança Social afigura-se-nos essencial à boa apreciação e decisão do direito, ou não, do A. à retribuição correspondente ao período de 16.03.05 a 14.04.05, tanto mais tendo em conta a natureza imperativa do disposto no artº 230º, nº 2, al. a) e do normativo legal em matéria previdencial.
Nos termos do disposto no artº 27º, al. b), do CPT, o juiz tem o dever de convidar as partes a completar e corrigir os articulados relativamente a factos que, tendo sido omitidos, possam interessar à decisão da causa, assim como tem o dever de ordenar as diligências probatórias necessárias ao correcto e cabal esclarecimento dos factos (cfr. artºs 266º, 519º e 535º do CPC).
Em face do referido, e atento o disposto no artº 712º, nº 4, do CPC, afigura-se-nos, assim, necessária a ampliação da matéria de facto com vista ao cabal esclarecimento pelo tribunal a quo dos factos relativos e pertinentes à questão de saber se o A., mormente no período compreendido entre 16.03.05 e 14.04.05, se encontrava, ou não, abrangido pelo regime previdencial (dos trabalhadores por conta de outrem) da Segurança Social (designadamente, e entre outra que considere relevante, saber se e quando o A. foi inscrito na segurança Social, se foram cumpridas as correspondentes obrigações em matéria de registo de remunerações, se foi, ou não, dado pelo A. cumprimento ao legalmente previsto em matéria de certificação da incapacidade temporária para o trabalho e sua comunicação à Segurança Social[-], e as razões por que o A. não auferiu o subsídio de doença), para o que deverá a 1ª instância formular convite às partes para, em conformidade, aperfeiçoarem os articulados, repetir o julgamento em relação a essa parte (podendo embora apreciar outros pontos da matéria de facto com o fim de evitar contradições na decisão), determinando as diligências de prova pertinentes (designadamente pedindo à Segurança Social os pertinentes esclarecimentos) e, de seguida, proferir sentença em conformidade.» (Fim de transcrição)
Como decorre do excerto transcrito, a Relação entendeu que havia necessidade de ampliar a matéria de facto e considerou que a tal não obstava a circunstância de os factos objecto da ampliação não terem sido alegados pelas partes, mormente pela ré, uma vez que o M.mo Juiz não tinha convidado as partes a completar e corrigir os articulados, como devia ter feito por força do disposto no art.º 27.º, al. b), do CPT.
A ré discorda, alegando ter provado que enviou atempadamente à Segurança Social a declaração de admissão do autor ao seu serviço, tendo preenchido, assim, o requisito para a atribuição do subsídio de doença ao autor, e que, ao invés, o autor não tinha provado por que razões não obteve o dito subsídio, nem sequer tendo alegado que requerera a concessão do mesmo, não podendo o tribunal de recurso substituir-se ao autor, conjecturando factos que este não alegou. Fazendo-o, o acórdão recorrido violou o disposto no art.º 230.º, n.º 2, al. a), do Código do Trabalho e o art.º 664.º, n.º 2, do CPC, que veda ao juiz levar em consideração factos não articulados.
Sobre esta questão, o “parecer” da Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta foi no sentido de que a decisão recorrida não era susceptível de recurso nesta parte, por a tal obstar o estabelecido no n.º 6 do art.º 712.º do CPC.
Vejamos se assim é.
O art.º 712.º do CPC versa sobre os poderes da Relação relativamente à matéria de facto e um dos poderes aí previstos é precisamente o de a Relação poder ordenar a ampliação da matéria de facto quando a considere insuficiente para decidir do mérito da causa (n.º 4 do referido artigo).
Acontece que o n.º 6 do art.º 712.º estipula que “[d]as decisões da Relação previstas nos números anteriores não cabe recurso para o Supremo tribunal de Justiça”. Daí que a decisão da Relação a ordenar a ampliação da matéria de facto não seja susceptível de recurso.
E, sendo assim, à primeira vista dir-se-ia que a decisão recorrida no segmento agora em apreço não era realmente susceptível de recurso para o Supremo. Porém, numa análise mais atenta da questão, verificamos que na situação em apreço assim não acontece.
Com efeito, o que a Relação realmente decidiu não foi a ampliação da matéria de facto, mas sim que o M.mo Juiz convidasse as partes a completar os seus articulados, e tal decisão, como parece evidente, já não cabe no âmbito do art.º 712.º do CPC.
Na verdade, trata-se de uma decisão que contende com a regular tramitação processual que, segundo a Relação, não teria sido respeitada pelo M.mo Juiz, e a Relação, ao decidir daquela forma, entendeu, embora implicitamente, que tinha ocorrido uma irregularidade processual, que se traduziu no facto de o M.mo Juiz não ter cumprido o disposto na al. b) do art.º 27.º do CPT, e considerou que tal irregularidade, pela influência que tinha na decisão da causa, configurava uma nulidade processual, ordenando, por isso, que a mesma fosse suprida.
Todavia e como é bem de ver, ainda que se admitisse que estávamos perante uma irregularidade processual e que a mesma seria susceptível de integrar uma nulidade processual, a verdade é que tal nulidade não seria de conhecimento oficioso, por não fazer parte do elenco das nulidades referidas no art.º 202.º do CPC, o que só por si é suficiente para que a decisão da Relação não possa ser mantida e que, por isso, se revoga, o que implica, face ao estatuído nos art.os 721.º, n.º 2 e 729.º, n.º 1, do CPC, que se tenha de conhecer do pedido do autor de pagamento da retribuição referente ao período de 16.03.2005 a 14.4.2005, período em que faltou ao trabalho por motivo de doença (em relação ao período posterior a 15.04.2005, já foi decidido, com trânsito em julgado, que o autor não tinha direito à retribuição, pelo facto de o contrato se encontrar suspenso).
3.2 Do direito à retribuição referente ao período de 16.03.2005 a 14.4.2005
Nos termos legais (n.º 1 do art. 224.º do CT), «[f]alta é a ausência do trabalhador no local de trabalho e durante o período em que devia desempenhar a actividade a que está adstrito».
Por sua vez, o art. 225.º, n.º 1 e n.º 2, alínea d), do CT estipula que as faltas podem ser justificadas ou injustificadas, considerando-se justificadas “ [as] motivadas por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto que não seja imputável ao trabalhador, nomeadamente doença, acidente ou cumprimento de obrigações legais”.
Tendo em conta que as faltas dadas pelo autor no período em questão (de 16.03.2005 a 14.4.2005) são faltas justificadas, uma vez que ocorreram por motivo de doença, importa ter presente o disposto no n.º 1 e n.º 2, alínea a), do art. 230.º do CT, nos termos dos quais as faltas por motivo de doença determinam a perda de retribuição, desde que o trabalhador beneficie de um regime de segurança social de protecção na doença.
Assim, tais faltas determinam a perda de retribuição, desde que o trabalhador beneficie de um regime de segurança social de protecção na doença.
Impõe-se, pois, apurar se no período em causa o autor beneficiava de um regime de protecção social na doença.
Importa deixar referido, em breve parêntesis, que estando em causa o reconhecimento de créditos salariais, ao autor compete alegar e provar os factos constitutivos do seu direito (n.º 1 do art.º 342.º do C. Civil), ou seja, no caso, a celebração e vigência do contrato de trabalho e a existência de faltas justificadas em relação ao período em causa em que formula o pagamento da retribuição, recaindo sobre a ré, nos termos do art.º 342.º, n.º 2, do C. C., o ónus de alegar e provar que, durante o período em causa, o autor beneficiava de um regime de segurança social de protecção na doença, dado que este facto é impeditivo do direito à retribuição que, em regra, ao trabalhador assiste nos casos de faltas justificadas por motivo de doença.
Deverá, pois, averiguar-se, perante a matéria fáctica apurada, se é possível afirmar-se que o autor, no período em análise, beneficiava de um regime de protecção na doença.
A Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro (Lei de bases da segurança social) tem como âmbito pessoal de aplicação, entre o mais, os trabalhadores por conta de outrem, abrangendo a protecção social, entre outras eventualidades, a doença (n.º 1 dos art.os 28.º e 29.º).
Considerando que o subsistema previdencial assenta no princípio da contributividade (no sentido de que deve ser autofinanciado, tendo em conta, por um lado a obrigação legal de contribuir e, por outro, o direito às prestações – art.º 30.º), estipula-se, no n.º 1 do art. 32.º, como condições de acesso à protecção social prevista no referido diploma, não só a inscrição do trabalhador por parte da entidade empregadora, como ainda o cumprimento das respectivas obrigações contributivas.
Por sua vez, constitui condição de atribuição das prestações, a inscrição no subsistema previdencial e, quando tal for exigido, o decurso de um período mínimo de contribuição ou situação equivalente (n.º 1 do art.º 34.º), não podendo, contudo, a falta destes elementos (declaração de início de actividade ou falta de pagamento das contribuições), quando não imputáveis aos trabalhadores por conta de outrem, prejudicar o direito destes às prestações (n.º 3, do mesmo preceito legal).
Também o art. 9.º do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de Fevereiro (diploma que define o regime jurídico de protecção social na eventualidade de doença no âmbito do subsistema previdencial) estipula que a atribuição do subsídio de doença depende de os beneficiários, à data do início da incapacidade temporária para o trabalho, terem cumprido um prazo de garantia de seis meses civis, seguidos ou interpolados, com registo de remunerações.
Das referidas disposições legais, extrai-se, pois, que constitui condição de acesso do trabalhador por conta de outrem à protecção social prevista no regime geral da segurança social, a inscrição do trabalhador e da respectiva entidade empregadora no referido regime (inscrição a efectuar por esta) e, bem assim, o cumprimento das obrigações contributivas.
Ora, da factualidade que assente ficou, e no que agora importa, apenas resulta que:
- em 06-08-2004 deu entrada na segurança social a comunicação, assinada pela ré e pelo autor, relativa à admissão deste ao serviço daquela (facto NN);
- entre 16.03.2005 e 12.06.2005, o autor não recebeu subsídio da segurança social (facto PP).
A exposta factualidade apenas revela que a ré cumpriu o primeiro requisito para acesso do autor ao regime da segurança social (inscrição no respectivo regime), mas já não que tenha cumprido a obrigação contributiva.
Nesta sequência, e como se afirmou supra, competindo à ré a prova de que o autor beneficiava de um regime de protecção social na doença, há que reconhecer o direito do autor à retribuição referente ao período que vem sendo referido, o que implica a consequente condenação da ré.
Considerando que já se mostra decidido, com trânsito em julgado, que a importância auferida pelo autor a título de ajudas de custo, não fazia parte da retribuição, destinando-se a fazer face aos acréscimos de despesas pela deslocação em Timor, e, sendo certo que o autor a partir de 16.03.2005 se encontrava em Portugal, o valor da retribuição deverá ser fixado em € 1.406,00, valor correspondente à remuneração mensal (cfr. alínea H) da matéria de facto).
3.3 Da alegada ilicitude da suspensão preventiva do autor
Conforme está provado, em 7.2.2005, a ré suspendeu o autor de todas as suas funções, através de mensagem de correio electrónico que por ele foi recebida em 9.2.2995, (alínea T) dos factos). E provado está também que o autor resolveu, com invocação de justa causa, o contrato de trabalho que mantinha com a ré, através da carta que à mesma dirigiu em 19.7.2005 (alíneas HH) e II) e documento de fls. 92-93).
Por outro lado, como da dita carta consta, o autor considerou ilícita aquela suspensão e esse foi um dos motivos por ele invocados para resolver o contrato de trabalho que mantinha com a ré (al. JJ) dos factos).
E com interesse para a questão agora em apreço, provado está também que, em 11.2.2005, o autor solicitou à ré, através do então seu mandatário, informação acerca dos fundamentos da suspensão e do tempo da duração da mesma; que, em 28.2.2005, a ré respondeu ao autor, comunicando-lhe que, na sequência dos indícios recolhidos no inquérito prévio, fora decidido instaurar-lhe processo disciplinar com intenção de despedimento, caso se viessem os ditos indícios se viessem a confirmar; que por carta datada de 26.4.2005, o autor foi notificado da nota de culpa; e que por carta recebida pelo autor em 20.6.2005 a ré comunicou ao autor que havia decidido puni-lo com 18 dias de suspensão com perda de retribuição (alíneas U), V), Z) e FF) dos factos).
Na comunicação da resolução do contrato, o autor não explicitou as razões por que considerava ilícita a suspensão, mas fê-lo na petição inicial. Aí alegou, citando os artigos 371.º e 417.º do Código do Trabalho, que a suspensão tinha sido ilícita, por não ter sido acompanhada de qualquer fundamento e justificação no sentido de que a sua presença na empresa se mostrava inconveniente e por não ter ocorrido em simultâneo com a comunicação da instauração do processo disciplinar ou da nota de culpa (vide art.os 80.º e 81.º da p. i.).
Na 1.ª instância, decidiu-se que a suspensão preventiva do autor tinha sido ilícita pelo facto de a ré nada ter alegado, quer no processo disciplinar quer na acção, relativamente à inconveniência da presença do autor na empresa, e por se ter entendido que a mesma era desproporcionada em relação à gravidade da situação, como a ré implicitamente acabou por reconhecer ao não ter despedido o autor.
No recurso de apelação, a ré impugnou aquela decisão, mas a Relação manteve o entendimento de que a suspensão preventiva tinha sido ilícita, por não ter sido motivada.
No recurso de revista a ré insurgiu-se contra tal entendimento, alegando que o art.º 371.º, n.º 3, do C.T. não exige que a suspensão seja escrita nem fundamentada e que o art.º 417.º do mesmo Código não é aplicável ao caso, uma vez que o autor não foi despedido.
Vejamos se a razão está do lado da recorrente.
O art.º 371.º insere-se nas disposições gerais do procedimento disciplinar e no seu n.º 3 estipula que “[i]niciado o procedimento disciplinar, pode o empregador suspender o trabalhador, se a presença deste se mostrar inconveniente, mas não lhe é lícito suspender o pagamento da retribuição”.
Por sua vez, o art.º 417.º insere-se nas normas que regulam o procedimento disciplinar instaurado com intenção de despedimento com invocação de justa causa subjectiva, ou seja, por facto culposo imputável ao trabalhador, e o seu n.º 1 preceitua que “[c]om a notificação da nota de culpa, o empregador pode suspender preventivamente o trabalhador, sem perda de retribuição, sempre que a sua presença se mostrar inconveniente”. E no seu n.º 2 estabelece que “[a] suspensão referida no número anterior pode ser determinada 30 dias antes da notificação da nota de culpa, desde que o empregador, por escrito, justifique que, tendo em conta indícios de factos imputáveis ao trabalhador, a sua presença na empresa é inconveniente, nomeadamente para a averiguação de tais factos, e que não foi ainda possível elaborar a nota de culpa”.
O art.º 417.º constitui, pois, uma norma especial relativamente ao art.º 371.º e, por via disso, quando o procedimento disciplinar seja instaurado com intenção de despedimento com justa causa, o normativo aplicável, no que toca à suspensão preventiva do trabalhador, será o art.º 417.º e não o art.º 371.º, como decorre dos princípios gerais atinentes à aplicação das normas legais.
E, ao contrário do que a ré defende, a aplicação do art.º 417.º não depende da sanção que a final venha a ser aplicada ao trabalhador. O que releva é a intenção manifestada pelo empregador aquando da instauração do procedimento disciplinar: se com este visar o despedimento do trabalhador, aplica-se o disposto no art.º 417.º; se o desiderato não for esse, aplica-se o disposto no art.º 371.º.
No caso em apreço, a intenção da ré era despedir o autor, devendo, por isso, a questão agora em apreço ser ajuizada à luz do art.º 417.º do C.T..
Ora, conforme está provado, a suspensão preventiva do autor foi ordenada antes deste ter recebido a nota de culpa e, como do teor da mensagem de correio electrónico, junta a fls.55, através da qual a ré comunicou ao autor a suspensão de todas as suas funções, se constata, a ré não avançou qualquer justificação para tal suspensão, o que torna a suspensão ilícita, uma vez que a justificação por escrito das razões determinantes da suspensão quando ordenada antes da remessa da nota de culpa constitui uma formalidade ad substantiam (art.º 220.º do C.C.).
Concluindo, diremos que a suspensão preventiva do autor foi ilícita, o que implica a improcedência do recurso nesta parte.
3.4 Da caducidade da resolução do contrato com base na ilicitude da suspensão preventiva
Ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato de trabalho, mas a declaração de resolução deve ser feita por escrito, com a indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos (artigos 441.º, n.º 1 e 442.º, n.º 1, do C.T.).
No caso em apreço e como está provado, o autor, invocando justa causa, resolveu, com efeitos imediatos, o contrato de trabalho que mantinha com a ré, mediante comunicação enviada em 19 de Julho de 2005. E, como já se disse, um dos fundamentos invocados pelo autor para resolver o contrato de trabalho com justa causa foi o facto de ele ter sido ilicitamente suspenso preventivamente, por email datado de 7 de Fevereiro de 2005 (vide al. II) dos factos provados e o doc. de fls. 92-93 para que aí se remete) .
A questão que a ré vem colocando desde a contestação é a de saber se o direito de resolução com base em tal fundamento não se encontrava já extinto por caducidade.
Em prol da sua tese, na contestação, a ré alegou que o prazo de 30 dias de que o autor dispunha para resolver o contrato de trabalho com base na alegada ilicitude da suspensão preventiva tinha começado a decorrer em 7 de Fevereiro de 2005, data em que ele tomou conhecimento da decisão da suspensão.
Em sede da matéria de facto, ficou provado que a comunicação da suspensão preventiva foi enviada ao autor por mail expedido em 7.2.2005, que tal comunicação foi por ele recebida no dia 9 do mesmo mês e ano (al. T) dos factos) e que a resolução do contrato por parte do autor foi comunicada à ré por carta expedida em 19.7.2005, ou seja, quando haviam decorrido já mais de 30 dias sobre a data em que a suspensão preventiva chegou ao conhecimento do autor.
Apesar disso, na 1.ª instância decidiu-se que a caducidade do direito de resolução ainda não tinha operado aquando do envio da carta de resolução em 19.7.2005, com o fundamento de que a suspensão configurava uma situação de facto continuado que só tinha terminado em 20 de Junho de 2005 – data em que o autor tomou conhecimento da decisão final proferida no processo disciplinar – e com o fundamento de que, nas infracções continuadas, o prazo de caducidade só se inicia quando a infracção terminar.
No recurso de apelação, a ré insurgiu-se contra tal decisão, por considerar que a suspensão de funções é um facto de natureza instantânea e, sem prescindir, por entender que a situação de doença em que o autor se manteve desde 16 de Março de 2005 até à resolução do contrato anulou os efeitos da suspensão preventiva, uma vez que a mesma acarretou a suspensão do contrato a partir daquela data, sendo, por isso, a partir daquela data que o prazo de caducidade começou a decorrer.
Na Relação entendeu-se que a suspensão preventiva constituía um facto de natureza continuada ou, pelo menos, um facto com efeitos continuados, e que a ilicitude da mesma se tinha mantido até 20.6.2005, sendo, por isso, esta a data em que o decurso do prazo da caducidade se iniciou. E mais se entendeu que a suspensão do contrato por facto imputável ao trabalhador não determinava a cessação da suspensão preventiva, por se tratar de situações diferentes, “sendo que nada impede que a suspensão preventiva cesse, mantendo-se embora a suspensão do contrato ou vice-versa”.
No recurso de revista, a ré não pôs em causa o decidido pela Relação relativamente à irrelevância da situação de doença do autor na suspensão preventiva, o que significa que ela se conformou com o decidido a esse respeito.
Na verdade, como se constata das alegações de revista, o inconformismo da ré restringiu-se à parte em que a Relação considerou a suspensão preventiva como um facto de natureza continuada ou, pelo menos, de efeitos continuados, pois, segundo a ré, tal facto é de natureza instantânea, devendo o prazo da caducidade contar-se a partir da data em que o autor tomou conhecimento da comunicação da suspensão (9.2.2005).
É, pois, desta sub-questão que temos de conhecer, uma vez que o decidido relativamente à outra sub-questão (a influência da situação de doença na suspensão preventiva a que o autor estava sujeito) já transitou em julgado.
E, adiantando desde já a resposta, diremos que a ré não tem razão quando afirma que a suspensão é um facto de natureza instantânea.
Com efeito, a conduta infraccional da ré não se consumou com a decisão da suspensão, uma vez que a infracção não está propriamente na decisão da suspensão, mas no evento que se lhe seguiu, ou seja, na efectiva suspensão de funções de que o autor foi alvo, a qual se manteve para além da data da comunicação da mesma. Se estivéssemos perante um crime, diríamos que se tratava de um crime permanente, que, como é sabido, é aquele em que o evento criminoso se prolonga por mais ou menos tempo, protraindo-se assim a consumação do delito.
No caso em apreço e como vem decidido pela Relação, com trânsito em julgado (sublinha-se), a suspensão preventiva manteve-se até 20 de Junho de 2005, data em que o autor foi notificado da decisão proferida no processo disciplinar que o puniu com 18 dias de suspensão com perda de retribuição. Na verdade, acrescentamos nós, não tendo a mencionada suspensão sido expressamente revogada antes daquela data (sendo que a ré nada alegou sequer a esse respeito), deve entender-se que a mesma só foi revogada, tacitamente, aquando da notificação ao autor da decisão final que veio a ser proferida no processo disciplinar.
E sendo assim, o prazo de caducidade de 30 dias de que o autor dispunha para resolver o contrato de trabalho com fundamento na ilicitude da suspensão preventiva só começou a correr em 20 de Junho de 2005, o que vale por dizer que ainda não se tinha esgotado quando ele, em 19 de Julho de 2005, comunicou à ré a resolução do contrato.
Ignora-se, é certo, a data em que a dita comunicação foi recebida pela ré, para se ajuizar da tempestividade ou não da resolução, uma vez que se trata de uma declaração negocial de natureza recipienda. Mas tal facto não obsta a que se julgue improcedente a excepção da caducidade deduzida pela ré, uma vez que o prazo de 30 dias referido no n.º 1 do art.º 442.º é um prazo de caducidade do direito de resolução do contrato por parte do trabalhador e, como tal, um facto extintivo daquele direito. Pertencia, pois, à ré, nos termos do art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil, alegar e provar que a comunicação da resolução do contrato só tinha chegado ao seu conhecimento depois de decorridos aqueles 30 dias, ou seja, depois de 20 de Julho de 2005. Não o tendo feito, a caducidade do direito de resolução por ela invocada tem necessariamente de ser julgada improcedente.
3.5 Da caducidade do direito de resolução do contrato com base no não pagamento das retribuições
No caso, está provado que a ré não pagou ao autor a remuneração a partir da 2.ª quinzena (inclusive) de Março de 2005, até 20 de Junho do mesmo ano (factos HH) e KK) do n.º 2); ou seja, é facto incontroverso que, desde 16 de Março e até 20 de Junho de 2005, a ré não pagou a retribuição ao autor.
Todavia, como se mostra decidido, com trânsito em julgado, de 15 de Abril a 20 de Junho de 2005 (data em que cessou a suspensão preventiva) essa retribuição não era devida.
Daí que, referente a este último período, não sendo devida, pela ré, retribuição ao autor, não se pode considerar que existe falta (ainda que não culposa) de pagamento pontual da retribuição.
Assim, a falta de pagamento da retribuição verificou-se apenas quanto ao período de 16--03-2005 a 14-04-2005.
A ré alega que o autor/recorrido deixou caducar o direito à resolução do contrato com fundamento no não pagamento da retribuição relativa no período compreendido entre 16.03.05 e 14.04.2005, uma vez que a resolução do contrato só lhe foi comunicada em 19.07.2005.
Como já foi dito a propósito da questão anterior, ocorrendo justa causa o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato, mas deve fazê-lo por escrito, com a indicação sucinta dos factos que a resolução e nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos.
No caso em apreço, quando a resolução foi comunicada à ré já haviam decorrido mais de 30 dias sobre a data em que a retribuição em causa devia ter sido paga, uma vez que a retribuição referente aos dias de Março (de 16 a 31) devia ter sido paga no final desse mês e a relativa aos dias de Abril (de 1 a 14) devia ter sido paga no final desse mesmo mês.
Todavia, como também decorre do que já foi dito na apreciação da questão anterior, o não pagamento da retribuição constitui um ilícito de efeitos continuados e em relação a este tipo de ilícitos tem-se entendido, e bem, que o prazo de caducidade do direito de resolução só começa a decorrer quando a conduta infraccional tiver cessado, o que, no caso em apreço, vale por dizer que o autor estaria em tempo de resolver o contrato com fundamento no não pagamento das referidas retribuições enquanto a falta de pagamento das mesmas se mantivesse (sem que isso signifique que o tempo decorrido entre a constituição da mora do empregador e a data da resolução do contrato por parte do trabalhador seja indiferente em sede da apreciação da justa causa).
Improcede, pois, o recurso nesta parte.
3.6 Da justa causa da resolução do contrato de trabalho
Na sentença da 1.ª instância entendeu-se que a suspensão preventiva do autor, sendo ilícita, constituiu justa causa de resolução do contrato por parte do autor.
No mesmo sentido decidiu o acórdão recorrido, considerando, para tanto, e em suma, que a ré não podia suspender preventivamente o autor, antes da nota de culpa, sem indicação das razões que, nos termos legais, poderiam justificar e manter essa situação, e que tal violação, pela gravidade das consequências e pelo tempo que perdurou, tornou impossível a subsistência da relação laboral.
A recorrente, para além de alegar a caducidade do direito de resolução do contrato com base na suspensão preventiva – questão já analisada supra –, sustenta também que, no caso, a suspensão preventiva se tornou irrelevante face à prévia suspensão decidida pelo recorrido.
Em situações consideradas graves, em si mesmas ou nas suas consequências (que tornem imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho que o contrato pressupõe), a lei possibilita ao trabalhador a desvinculação contratual, através de declaração unilateral, sem necessidade de observar o período de aviso prévio previsto no art.º 447.º, n.º 1, do CT (cfr. n.º 1 do art.º 441.º do CT).
Constituem justa causa de resolução, entre outras, a violação culposa das garantias legais ou convencionais do trabalhador (n.º 2, alínea b) do art.º 441.º do CT).
A declaração de resolução do contrato deve ser feita por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos trinta dias subsequentes ao conhecimento desses factos, havendo lugar a uma indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos a fixar entre quinze e quarenta e cinco dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade (n.º 1, dos art.os 442.º e 443.º do CT).
De acordo com o art.º 441.º, n.º 4, do CT, a justa causa de resolução imediata do trabalhador, é apreciada nos termos previstos no n.º 2, do art. 396.º, com as necessárias adaptações, ou seja, deve o tribunal atender ao carácter das relações entre as partes, ao grau de lesão de interesses e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.
Assim, o trabalhador só pode resolver o contrato com justa causa subjectiva se o comportamento do empregador for ilícito e culposo e, face à gravidade e consequências, tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
Analisemos, então, as consequências da suspensão preventiva como fundamento para a justa causa de resolução do contrato.
Como se afirmou no acórdão deste tribunal de 02.04.2008 (Recurso n.º 4104/07 – 4.ª Secção), com referência ao ensinamento de Júlio Gomes (in Direito do Trabalho, vol. I, 2007, pág. 1008, nota 2416), «[a] suspensão preventiva não constitui uma sanção disciplinar, nem, tão pouco, uma suspensão do contrato de trabalho, mas apenas uma renúncia temporária do empregador à prestação do trabalho, assente no pressuposto de que a presença continuada do trabalhador pode prejudicar o procedimento disciplinar ou o próprio inquérito (…) [e]nquanto medida provisória no quadro do procedimento disciplinar laboral, a suspensão preventiva só deve ser sindicada judicialmente para efeitos de eventual declaração da sua ilicitude e, sendo caso disso, para a consequente responsabilização civil do empregador pelos danos porventura causados».
E, conclui o referido aresto, a suspensão preventiva, ainda que ilícita, não tem a virtualidade de constituir, só por si, uma causa subjectiva de resolução do contrato por banda do trabalhador, a menos que, cumulativamente, se surpreenda no comportamento do empregador uma violação do dever de ocupação efectiva.
Também Monteiro Fernandes (in Direito do Trabalho, Almedina, 13.ª edição, pág. 589-590), reconhecendo que embora a suspensão preventiva não represente, em princípio, uma sacrifício económico para o trabalhador, já o mesmo não sucede quanto à prestação da actividade, pois aquela implica a colocação forçada do trabalhador em inactividade, por decisão do empregador, neutralizando, por essa via, o dever de ocupação efectiva (art.º 122.º, alínea b), do CT).
Extrai-se, em suma, do que se deixa assinalado, que a suspensão preventiva não constituirá, só por si, fundamento para a resolução do contrato pelo trabalhador, a menos que, em consequência dessa suspensão tenha(m) sido violado(s) outro(s) direito(s) do trabalhador, como seja o direito à ocupação efectiva.
Ora, volvendo ao caso em apreço, verifica-se que:
- o autor foi suspenso preventivamente das funções por e-mail datado de 7 de Fevereiro de 2005, por ele recebido em 9.2.2005 (alínea T) dos factos assentes);
- essa suspensão manteve-se até 20 de Junho de 2005, data da decisão da ré que lhe aplicou a sanção disciplinar de suspensão com perda de remuneração pelo período de 18 dias (alínea FF) dos factos assentes).
Acontece, porém, que o autor, já em 04.02.2005, após ter recebido duas mensagens do Dr. A..., secretário executivo da ré e superior hierárquico do autor, tinha enviado ao mesmo uma comunicação em que afirma, além do mais, que, a partir de tal data, passaria (em Timor) a garantir apenas os assuntos de gestão corrente, suspendendo o trabalho planeado, até novas instruções da direcção da ré, e que, a partir de 16.03.2005, o autor encontrava-se em Portugal em situação de doença (n.º 38 dos factos provados).
Da referida factualidade decorre que quando a ré suspendeu preventivamente o autor das funções já este havia suspenso o trabalho planeado, assegurando apenas os assuntos de gestão corrente.
Daí que, apesar de ser ilícita a suspensão preventiva do autor, como se decidiu supra, da mesma não decorreu uma violação relevante do dever de ocupação efectiva daquele.
Refira-se que não estão em causa os efeitos da ilicitude da suspensão preventiva, em termos de responsabilização civil da empregadora, questão que o acórdão recorrido não apreciou, por considerar tratar-se de questão nova (vide fls. 456 a 458), sem que o autor tenha reagido contra tal decisão, pelo que se encontra, também, vedado a este tribunal apreciar essa questão.
Deste modo, o período de suspensão preventiva – de 07-02-2005 a 20-06-2005 – assume, in casu, diminuta relevância, pois não só, como afirmámos, o trabalhador já se tinha anteriormente auto-suspenso das suas funções essenciais, como logo a partir de 16 de Março entrou de baixa por doença, pelo que a partir desta, ainda que não se tivesse auto-suspenso ou não tivesse sido suspenso preventivamente pela empregador, encontrava-se efectivamente impossibilitado de exercer a actividade.
Nesta sequência, impõe-se concluir que a suspensão preventiva não assumiu, só por si, gravidade que justificasse a resolução com justa causa do contrato por parte do autor.
Acontece, porém, que o autor também fundamentou a resolução do contrato no não pagamento da retribuição (em relação a outros fundamentos invocados, as instâncias já os julgaram insubsistentes, sem reacção do autor).
Já se concluiu (supra) que, não tendo a ré demonstrado que o autor gozava de um regime de protecção social na doença, deverá ser condenada no pagamento da retribuição referente ao período de 16.03.2005 a 14.04.2005.
E perante isto, importa averiguar se o não pagamento dessa retribuição, em conjugação com a suspensão preventiva ilícita, constitui fundamento bastante para a insubsistência da manutenção da relação de trabalho.
E adiantando, desde já a resposta, diremos que não. Vejamos porquê.
A retribuição é um dos elementos essenciais do contrato de trabalho e o seu pagamento pontual constitui uma obrigação do empregador. Está provado que a ré não pagou ao autor a retribuição referente ao período em questão. Não tendo a ré provado que a falta de pagamento não resultava de culpa sua, temos de concluir que tal falta é de imputar a culpa da ré, por força do disposto no art.º 799.º, n.º 1, do C.C., nos termos do qual “[i]ncumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua”.
Todavia, para que se dê por verificada a justa causa, não basta o incumprimento culposo das obrigações contratuais ou legais. Esse incumprimento tem de ser apreciado à luz do conceito de justa causa contido no art.º 396.º, n.º 1, do Código do Trabalho, devendo essa apreciação ser feita nos termos do disposto no n.º 2 do mesmo artigo, com as necessárias adaptações, conforme prescreve o art.º 441.º, n.º 4, do C.T, o que vale por dizer que só haverá justa causa para o trabalhador resolver o contrato com efeitos imediatos quando a conduta culposa do empregador, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a manutenção da relação de trabalho.
Ora, tendo presente todo o circunstancialismo em que a conduta da ré ocorreu, entendemos que a mesma não assumiu gravidade suficiente para justificar a resolução do contrato por parte do trabalhador.
Com efeito, no que toca à ilicitude da suspensão preventiva já ficou dito que da mesma não decorreu uma violação relevante do dever de ocupação efectiva do autor e, por sua vez, no que toca ao não pagamento da retribuição referente ao período de 16.3.2005 até 14.4.2005, também temos de convir que a conduta da ré não assume contornos de acentuada gravidade.
Com efeito, importa ter presente que a culpa da ré, no que toca ao não pagamento da aludida retribuição, é uma culpa que decorre de uma mera presunção legal (art.º 799.º, n.º 1, do C.C) e, por outro lado, encontrando-se o autor de baixa por doença, o direito à retribuição no período em questão era muito controvertido, por não ser líquido que o autor não beneficiasse das prestações na doença previstas no regime geral da segurança social em que havia sido inscrito.
Tenha-se em atenção que na carta que remeteu ao autor, datada de 9 de Junho de 2005 (facto DD) - fls. 70), a ré justifica ao autor o motivo do não pagamento do salário a partir de 16 de Março de 2005: ter recebido da parte dele um atestado médico por 30 dias, a contar dessa data.
Concluindo, diremos que a resolução do contrato foi levada a cabo sem justa causa, ficando, por esta razão, prejudicado o conhecimento da questão de saber se a indemnização arbitrada ao autor pelas instâncias, àquele título, é excessiva, ou não (cfr. art.º 660.º, n.º 2, do CPC).
3.7 Do pedido reconvencional
Pede a ré a condenação do autor a pagar-lhe a quantia de € 1.312,27, a título de indemnização pela resolução do contrato sem justa causa e sem aviso prévio, acrescida de juros de mora a partir da notificação da reconvenção, bem como o pagamento de outros danos que se vierem a apurar em liquidação.
Segundo estipula o art.º 446.º do C.T., “[a] resolução do contrato pelo trabalhador com invocação de justa causa, quando esta não tenha sido provada, confere ao empregador o direito a uma indemnização pelos prejuízos causados não inferior ao montante calculado nos termos do artigo 448.º “.
Por sua vez, o art.º 448.º preceitua que “[s]e o trabalhador não cumprir, total ou parcialmente, o prazo de aviso prévio estabelecido no artigo anterior, fica obrigado a pagar ao empregador uma indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período de antecedência em falta, sem prejuízo da responsabilidade civil pelos danos eventualmente causados em virtude da inobservância do prazo de aviso prévio ou emergentes da violação de obrigações assumidas em pacto de permanência”.
Por outro lado, nos termos do art.º 447.º, n.º 3, do C.T., sendo o contrato de trabalho a termo, como era o caso, o trabalhador que pretenda desvincular-se antes do decurso do prazo acordado deve avisar o empregador com a antecedência mínima de 30 dias, se o contrato tiver duração igual ou superior a seis meses, ou de 15 dias, se for de duração inferior.
Ora, conforme já foi referido, o autor resolveu o contrato com efeitos imediatos com invocação de justa causa, mas esta foi julgada não provada. Sobre ele recai, pois, a obrigação de pagar à ré a indemnização prevista no citado art.º 446.º, sendo que tal indemnização não pode ser inferior à do aviso prévio em falta.
Conforme está provado, o autor foi contratado pelo período de 12 meses, com início em 21.7.2004. O aviso prévio que estava obrigado a dar era, pois, de 30 dias, o que significa que, auferindo ele € 1.406,00 de retribuição base, estava obrigado a pagar à ré uma indemnização não inferior àquele montante.
A ré limitou-se, todavia, a pedir a título de aviso prévia a indemnização de € 1.312,27 acrescida de juros de mora desde a notificação da reconvenção (27.3.2006, fls. 145) até integral pagamento. Tratando-se de um direito disponível, o tribunal não poderá condenar em quantia superior à que foi pedida.
É certo que a recorrente também pediu que o autor fosse condenado a pagar aquilo que se vier a liquidar, mas quanto a esta matéria apenas se provou que a decisão do autor obrigou a ré a concentrar esforços na sua substituição, alterando a afectação dos quadros e fazendo deslocar uma técnica sua para acompanhar o recém contratado (factos n.º 42 e 43).
Ora, da referida matéria, o que resulta é que com a resolução do contrato pelo autor a ré teve que reorganizar a sua estrutura de funcionamento, mas desse facto não se extrai que do comportamento do autor tenham decorrido directamente danos para a ré e, sem a prova da existência de danos, a aplicação do disposto no art.º 661.º, n.º 2, do CPC não é possível.
Resumindo, o autor apenas tem de pagar à ré a indemnização de € 1.312,27, acrescida de juros de mora contados desde a notificação da reconvenção (27.3.2006) até integral pagamento.
4. Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar parcialmente procedente a revista e, em consequência:
a) revoga-se o acórdão recorrido na parte em que condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 6.327,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais pela resolução do contrato;
b) condena-se a ré a pagar ao autor a quantia de € 1.406,00 (correspondente à remuneração de 16-03-2005 a 14-04-2005), acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, como peticionado;
c) condena-se o autor a pagar à ré, por não observância do prazo de aviso prévio, a quantia de € 1.327,27, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados a partir de 27.3.2006 até integral pagamento;
d) mantém-se a decisão recorrida quanto ao mais.
Custas na proporção do vencido.
Lisboa, 8.10.2008
Sousa Peixoto (Realator)
Sousa Grandão
Pinto Hespanhol
______________________
(1) Resposta dada ao quesito 54.º, na redacção que lhe foi dada pela Relação.
(2) Por não ter reparado que a relação dos factos admitidos por acordo na 1.ª instância já incluía a alínea MM), a Relação designou as alíneas NN), OO) e PP) por alíneas MM), NN) e OO).