Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
HABEAS CORPUS
MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU
PRISÃO LEGAL
CONTAGEM DE PRAZO
Sumário
I - O que releva para efeito da contagem dos prazos fixados no art. 30.º da Lei 65/2003, de 23-08 [A detenção da pessoa procurada cessa quando, desde o seu início, tiverem decorrido 60 dias sem que seja proferida pelo tribunal da relação decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu (n.º 1); 90 dias se for interposto recurso da decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu proferida pelo tribunal da relação (n.º 2); 150 dias se for interposto recurso para o Tribunal Constitucional (n.º 3)], são as datas da prolação dos acórdãos, designadamente na Relação e no STJ, e não a do respectivo trânsito em julgado.
II - Assim, numa situação em que: - o arguido foi detido no dia 18-03-2009, na sequência de MDE emitido pelas autoridades espanholas; - o MP requereu a execução desse mandado e, apesar de o arguido ter deduzido oposição, o Tribunal da Relação, por acórdão de 21-04-2009 – logo, dentro do prazo de 60 dias referido no n.º 1 do art. 30.º da Lei 65/2003, de 23-08 –, deferiu a execução do MDE; - o arguido interpôs recurso para o STJ, que, por acórdão de 28-05-2009 – ou seja, ao 71.º dia após a detenção, por isso, também dentro do prazo (de 90 dias) a que alude o n.º 2 do mencionado preceito –, negou provimento e manteve a decisão recorrida; - o arguido pediu a aclaração do acórdão do STJ, pedido esse que foi indeferido por decisão de 18-06-2009;é de indeferir a petição de habeas corpus apresentada com o fundamento de que o arguido/requerente se encontra em prisão ilegal desde o dia 16-06-2009, por se mostrar ultrapassado o prazo de 90 dias prescrito pelo art. 30.º, n.º 2, da Lei 65/2003, de 23-08.
III - Não pode sustentar-se, pois não decorre da lei, que a decisão do recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação tem de estar transitada no prazo de 90 dias contados desde a data da detenção da pessoa procurada.IV - Por isso, o pedido de aclaração formulado pelo arguido é irrelevante para efeitos de contagem dos prazos previstos no referido art. 30.º
Texto Integral
AA, devidamente identificados nos autos, peticiona o presente habeas corpus ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em suma, com os seguintes fundamentos:
1 - O requerente encontra-se detido desde o dia 18 de Março 2009 (á ordem do processo 100/09.4YRLSB.S1).
2 – De acordo com o disposto no artigo 30º-2 da Lei 65/2003, de 23 de Agosto, o prazo de duração máxima da detenção é de 90 dias, se tiver sido interposto recurso da decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu proferida pelo Tribunal da Relação.
3 – Foi interposta reclamação do doutamente decidido pelo Tribunal da Relação, pelo que a decisão judicial ainda não transitou.
4 – O requerente/arguido mantém-se, porém, preso, encontrando-se em prisão ilegal desde o dia 16 de Junho uma vez que no dia 15 deste mês perfez 90 dias de detenção.
5 – Deve ao requerente ser concedida a providência de “Habeas Corpus”, sendo o mesmo restituído á liberdade imediatamente, de acordo com o disposto nos artigos 222º-2-c) e 215º-2, ambos do CPP.
O Exm.º Sr. Juiz Conselheiro relator do respectivo processo (supra referido), prestou a seguinte informação (transcrição):
AA foi detido a 18 de Março de 2009 (fls.2).
Por decisão de 21 de Abril de 2009, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu deferir a execução do M. D. E. (fls. 103).
Desta decisão foi interposto recurso, que deu origem ao acórdão deste S.T.J. de 28 de Maio de 2009, o qual considerou o recurso improcedente e por isso manteve a decisão da Relação.
A 9 de Junho de 2009 AA veio pedir a aclaração do acórdão de 28 de Maio de 2009.
Por acórdão de hoje, deste S.T.J., foi considerado que a decisão ac1aranda não encerrava qualquer ambiguidade ou obscuridade, e daí que o pedido de aclaração tenha sido indeferido.
De acordo com o artº 30° da Lei 65/2003, de 23 de Agosto, a detenção da pessoa cessa quando tiverem decorrido 60 dias, "sem que seja proferida pelo tribunal da relação decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu". Como se viu, a decisão da Relação de Lisboa é muito anterior ao fim desse prazo de 60 dias.
Nos termos do nº 2 do preceito, tal prazo é elevado para 90 dias, se for interposto recurso. A decisão deste S.T.J. de 28 de Maio último, produzida em recurso, ocorreu 71 dias depois da data da detenção.
A nosso ver, quando a lei menciona a "decisão sobre a execução do mandado", não pode estar a querer referir-se a decisão transitada em julgado, porque, a ser assim, nenhum sentido faria a previsão de prorrogação de prazos em virtude de recurso para o S. T. J. ou para o Tribunal Constitucional (150 dias segundo o nº 3 do preceito).
A decisão a ter em conta para aferição de prazos, não é pois a decisão transitada, seja qual for a instância que a profere.
Por outro lado, o pedido de aclaração, indeferido, em nada atinge o facto de se ter que considerar que a decisão, desta feita produzida neste S.T.]., teve lugar antes de decorridos 90 dias sobre a data da detenção. A não ser assim, estaria aliás encontrado o expediente fácil para libertação dos detidos.
Por todo o exposto, a nosso ver, não existe qualquer ultrapassagem de prazo de detenção.
Convocada a secção criminal e notificados o MP e a ilustre mandatária dos requerentes, teve lugar a audiência (art.ºs 223.º, n.º 3 e 435.º do CPP).
Importa agora, tornar pública a respectiva deliberação e, sumariamente, a discussão que a precedeu.
A pretensão do requerente assenta, como se vê, em alegada ilegalidade da prisão – art.º 222.º, n.º 2, c), do Código de Processo Penal – e, assim, alegadamente «manter-se para além dos prazos fixados na lei ou por decisão judicial», designadamente para além de 90 dias (artigo 30º-2, da Lei 65/2003, de 23 de Agosto).
Todavia, não tem razão.
Vejamos:
O artigo 31- nº 1 da Constituição da República Portuguesa, integrante do título II (Direitos, Liberdades e garantias) e capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), determina que haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente..
A previsão e, precisão, da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, o seu carácter excepcional, vocacionado para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, de fundamento constitucionalmente delimitado.
Daí que, como decidiu este Supremo e Secção, (por Ac. de 20-12-2006, Proc. n.º 4705/06), a providência de habeas corpus, enquanto medida excepcional e remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, que se traduzam em abuso de poder, ou por serem ofensas sem lei ou por serem grosseiramente contra a lei, não constitui no sistema nacional um recurso dos recursos e, muito menos, um recurso contra os recursos.
Tal não significa que a providência deva ser concebida, como frequentemente o foi, como só podendo ser usada contra a ilegalidade da prisão quando não possa reagir-se contra essa situação de outro modo, designadamente por via dos recursos ordinários (cf. Ac. do STJ de 29-05-02, Proc. n.º 2090/02 - 3.ã Secção, onde se explana desenvolvidamente essa tese).
Com efeito, a excepcionalidade da providência não se refere à sua subsidiariedade em relação aos meios de impugnação ordinários das decisões judiciais, mas antes e apenas à circunstância de se tratar de «providência vocacionada a responder a situações de gravidade extrema ou excepcional», com uma celeridade incompatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação.
A providência visa, pois, reagir, de modo imediato e urgente, contra a privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifestamente ilegal, ilegalidade essa que se deve configurar como violação directa, imediata, patente e grosseira dos seus pressupostos e das condições da sua aplicação.
Atento o carácter excepcional da providência, para que se desencadeie exame da situação de detenção ou prisão em sede de habeas corpus, há que se deparar com abuso de poder, consubstanciador de atentado ilegítimo à liberdade individual - grave, grosseiro e rapidamente verificável - integrando uma das hipóteses previstas no artigo 222º nº 2, do Código de Processo Penal (acórdão do Tribunal Constitucional de 24 de Setembro de 2003 in proc. nº 571/03).
A providência de habeas corpus tem, pois, como resulta da lei, carácter excepcional.
Não no sentido de constituir expediente processual de ordem meramente residual, mas, por se tratar de providência vocacionada a responder a situações de gravidade extrema ou excepcional. (1).
“E é precisamente por pretender reagir contra situações de excepcional gravidade que o habeas corpus tem de possuir uma celeridade que o torna de todo incompatível com um prévio esgotamento dos recursos ordinários”. (2)
Porque é assim, a petição de habeas corpus,em caso de prisão ilegal, tem os seus fundamentos taxativamente previstos no n.º 2 do artigo 222.º do Código de Processo Penal:
a) Ter sido (a prisão) efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; c) Manter-se para além dos prazos fixados por lei ou por decisão judicial.
Ora, no caso em apreço, foi invocado o citado artigo 222º-2 do CPP e, como resulta da alegação, o fundamento é o da alínea c), por violação do artigo 30º-2 da Lei 65/2003, de 23 de Agosto (cfr. nº 2 do requerimento inicial, não se compreendendo a alusão feita ao 215º-2 – sem discriminação da respectiva alínea - do Código de Processo Penal, feita nº nº 5 do mesmo requerimento): a detenção da pessoa procurada cessa quando, desde o seu início, tiverem decorrido 90 dias, se for interposto recurso da decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu proferida pelo Tribunal da Relação. Porém, no caso “sub Júdice”, a prisão não se mantém para além dos prazos fixados na lei, como se passa a demonstrar.
São os seguintes os factos:
1 – O juiz de instrução competente do Julgado de Instrução nº 1 de Palma de Maiorca, emitiu no âmbito do "Processo de Diligências Prévias" nº 4720/05, ali pendente, um Mandado de Detenção Europeu (M. D. E.) datado de 15/5/2006, contra o cidadão italiano AA que também usou os nomes BB ou CC, casado, nascido a 20 de Fevereiro de 1955, natural de Livorno, Itália, filho de P... B... e de L... M..., e residente antes de preso na Rua .... nº ... - A, Benfica, Lisboa, com vista à sua prisão e entrega.
2 - Foi-lhe imputada a prática de crimes de burla dos arts. 247°, 248°, e 250º 1. 1., 6 e 7 do Código Penal Espanhol, bem como de um crime de apropriação indevida do artº 252° do mesmo Código.
3 - O arguido veio a ser encontrado e detido, a 18/03/09, pelas 11 H., na rua onde mora, em Lisboa.
4 - Foi oportunamente inserida, no Sistema de Informação Schengen (S,1.S.), a indicação da necessidade de detenção de AA, nos termos do artº 95° da Convenção do Acordo de Schengen de 16/06/1985 (Registo Schengen E 180 585 842 41 A 1 1002 1), com data de expiração do pedido prevista para 16/10/2009.
5 – O MºPº junto do Tribunal da Relação de Lisboa pronunciou-se ao abrigo do disposto no artigo 16º-1 da lei 65/2003, de 23 de Agosto e, na audiência que teve lugar, promoveu a execução do dito MDE proveniente das autoridades espanholas.
6 – Na verdade, pedido paralelo havia sido emitido pelas autoridades judiciárias italianas (Procuradoria Geral da República de Campobasso, Itália), com data de 09.10.2007, concretamente para cumprimento de pena de 4 anos e 6 meses de prisão aplicada pelo Tribunal da Relação de Campobasso, com a informação adicional de que o condenado tem ainda por cumprir 22 anos e 6 meses de prisão, devido a "acumulação de sentenças".
7 - Ao abrigo do artigo 23° na 1 da Lei 65/2003 de 23 de Agosto, foi proferido despacho no sentido de se preterir o M.D.E. oriundo de Itália e se passar a proceder, apenas, pelo M.D.E procedente de Espanha, aliás, o primeiro emitido, e relativo a uma responsabilidade penal que ainda não originara condenação.
8 - O detido foi ouvido com observância do disposto no art. 18º da referida lei, e declarou não consentir na sua entrega às autoridades espanholas, requerendo prazo para deduzir oposição, o que lhe foi facultado por cinco dias.
9 - Ficou preso preventivamente, nos termos do art° 34°, da Lei 65/2003,de 23 de Agosto, e do artº 202º n° 1 al. c) do C.P.P.
10 - Fundou a dita oposição nos art°s 3° nº 2, 12° n° 1 al. d), e 21º nº 2, da Lei 65/2003 citada, e invocou, em síntese, o facto de faltar a tradução do M, D. E. oriundo de Espanha, poder haver erro de identidade quanto à pessoa visada no pedido, estar a ser investigado em processo da comarca do Entroncamento (Pº de inquérito 62/08.2 JALRA) e não se saber se tal processo se refere aos mesmos factos, e, finalmente, o arguido sofrer de claustrofobia e não poder viajar de avião.
11 – O MºPº requereu que se obtivesse a pertinente informação a respeito daquele processo do Entroncamento e a resposta foi no sentido de que naqueles autos se investigavam "factos que, pelo menos, poderão integrar a prática do crime de falsificação de documentos, crime p. e p. pelo art° 256º nº 1- a) e nº 3, do Código Penal, factos de que é suspeito o arguido AA. Os indícios constantes dos autos não são de tal modo fortes que justifiquem. desde já a aplicação de qualquer medida de coacção de carácter detentivo. Informa-se ainda que, por ora, não interessa a detenção do arguido".
12 – Por acórdão de 21 de Abril de 2009, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu deferir a execução do referido MDE.
13 – Dessa decisão foi interposto recurso para este STJ.
14 – Por acórdão de 28 de Maio de 2009, o STJ decidiu julgar aquele recurso improcedente e manteve a decisão recorrida (do Tribunal da Relação de Lisboa).
15 – Em 09 de Junho de 2009, o arguido AA pediu a aclaração do acórdão do STJ de 28 de Maio de 2009.
16 – Por acórdão do STJ de 18 de Junho de 2009 foi considerado que a decisão aclaranda não encerrava qualquer ambiguidade ou obscuridade e, por isso, aquele pedido de aclaração foi indeferido.
Sendo estes os factos, pode desde já afirmar-se que não assiste razão ao peticionante pois o pressuposto de que parte para demonstrar a pretensa ilegalidade da sua prisão – e esse pressuposto é o de que se encontra detido e que o respectivo prazo máximo está ultrapassado – não se confirma.
Na verdade, o processo diz respeito, á execução de um Mandado de Detenção Europeu (MDE) emitido pelas autoridades judiciárias espanholas contra o ora requerente.
Na sequência desse mandado, o requerente foi detido no dia 18 de Março de 2009, na rua onde morava, em Lisboa, o MºPº requereu a execução desse MDE, e apesar de o arguido/requerente ter deduzido oposição, o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão proferido em 21 de Abril de 2009 deferiu a execução desse MDE.
O arguido interpôs recurso para o STJ que, por acórdão de 28 de Maio de 2009 negou provimento a esse recurso e manteve a decisão recorrida do Tribunal da Relação de Lisboa.
O arguido pediu a aclaração daquele acórdão do STJ de 28.05.2009, pedido esse que foi indeferido por acórdão de 18.06.2009, do mesmo Supremo Tribunal.
Do exposto resulta claro que estando em causa – como estava – a execução de um Mandado de Detenção Europeu emitido contra o ora requerente e tendo este, por via desse MDE, sido detido no dia 18.03.2009, a decisão do Tribunal da Relação foi proferida em 21.04.2009, isto é, dentro do prazo de 60 dias referido no artigo 30º-1 da Lei nº 65/2003, de 23 de Agosto.
O arguido interpôs recurso dessa decisão para o STJ que proferiu acórdão em 28 de Maio de 2009, confirmando a decisão do Tribunal da Relação.
Assim, é fácil verificar que o acórdão deste STJ foi proferido dentro do prazo de 90 dias referido no nº 2 do citado artigo 30º da mencionada Lei 65/2003.
Tal acórdão foi proferido, concretamente, no 71º dia após a data da detenção do arguido/peticionante (como bem refere o Exmº Conselheiro Relator do processo respectivo, na informação que prestou nestes autos).
É certo que, como atrás se disse, o arguido formulou um pedido de aclaração desse acórdão de 28.05.2009 do STJ, pedido esse que foi indeferido por acórdão de 18.06.2009, do mesmo Supremo Tribunal.
Porém, o que releva para efeito da contagem dos prazos fixados no citado artigo 30º da mencionada Lei 65/2003, são as datas da prolação dos acórdãos quer da Relação, quer do STJ.
Na verdade, no nº 1 daquele normativo refere-se que “A detenção da pessoa procurada cessa quando, desde o seu início, tiverem decorrido 60 dias sem que seja proferida pelo tribunal da relação decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu …”
E, no nº 2 do mesmo preceito, estatui-se que “O prazo previsto no número anterior é elevado para 90 dias se for interposto recurso da decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu proferida pela relação”.
Assim, e no que respeita ao nº1 do citado preceito legal, a letra da lei é clara ao referir que seja proferida decisão pelo tribunal da relação.
Portanto, dúvidas não pode haver que, nesse caso, aquele prazo de 60 dias se há-de contar desde a data da detenção da pessoa procurada até á data em que for proferida decisão pela Relação.
A lei refere-se apenas á data em que é proferida a decisão e não á data do trânsito em julgado dessa decisão.
E só tal interpretação é compatível com a previsão de prorrogação de prazos em virtude de interposição de recurso ou para o STJ (90 dias – nº 2 do mesmo preceito) ou para o Tribunal constitucional (150 dias – nº 3).
No que respeita ao nº 2 do mesmo normativo, refere-se apenas que o prazo previsto no número anterior (de 60 dias, referido nº nº1) é elevado para 90 dias se for interposto recurso da decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu proferida pela relação.
Sendo assim e porque a letra da lei não é expressa sobre a forma de contar aquele prazo de 90 dias, não pode tal contagem ser efectuada em modos diferentes da respeitante ao prazo do nº 1, tanto mais que a “ratio legis” da fixação daqueles prazos é a mesma.
Isto é, o critério aplicável á contagem dos prazos de 60 e de 90 dias (e também de 150 dias, referido no nº 3 do mesmo normativo) aludidos respectivamente, nos nº 1 e 2 do artigo 30º, da Lei 65/2003, de 23 de Agosto, tem de ser o mesmo.
Nenhuma razão existe para que esse critério haja de ser diferente
Sendo assim, se no caso do nº1 daquele preceito o prazo de 60 se conta desde a data da detenção da pessoa procurada até á data em que for proferida a decisão da relação, também no caso do nº 2 do mesmo normativo, se tiver havido recurso da decisão da relação, o prazo de 90 dias tem de contar-se desde a data da detenção da pessoa procurada até á data em que for proferida decisão pelo STJ, isto é, até á data da decisão daquele recurso.
Como se disse, nenhuma razão justifica que se adoptem critérios diferentes na contagem daqueles prazos.
Por isso, não pode sustentar-se – como parece sustentar o ora peticionante – que a decisão do recurso interposto do acórdão da relação tem de estar transitada no prazo de 90 dias contados desde a data da detenção da pessoa procurada.
Nada justifica tal interpretação.
Antes, como se disse, aquele prazo de 90 dias conta-se desde a data da detenção da pessoa procurada até á data em que for proferida a decisão que julgue o recurso interposto do acórdão da Relação.
A decisão a considerar para efeitos dos prazos referidos no citado artigo 30º da Lei 65/2003 não é a decisão transitada em julgado, seja qual for a instância que a profere, mas sim a data em tal decisão é proferida.
Por isso também, o pedido de aclaração formulado pelo peticionante no citado processo de execução do MDE, é irrelevante para os efeitos atrás referidos, na medida em que a decisão do STJ, isto é, a decisão que julgou o recurso interposto da relação, foi proferida dentro do prazo de 90 dias referido no nº 2 do artigo 30 da lei 65/2003 (como se disse, no 71º dia após a detenção do arguido/peticionante).
Daí que, relevante, seja a data em o STJ decidiu o recurso interposto da decisão da Relação (como se disse, em 28.Maio.2009) e não a data da decisão daquele pedido de aclaração.
Aliás – e como bem refere o Exmº Sr. Conselheiro relator do processo respeitante ao MDE, na informação prestada nestes autos – se assim não fosse, estava encontrada a forma de, nestes casos, obter facilmente a libertação dos arguidos: bastaria lançar mão de expedientes dilatórios com vista a impedir o trânsito em julgado da decisão o que, como é óbvio, não pode aceitar-se.
Acresce que, dos facto supra referidos e tidos por assentes, não se vislumbra abuso de poder ou erro grosseiro na aplicação do direito, por parte do Tribunal, nem uma situação de prisão arbitrária ou manifestamente ilegal.
Ora o assento tónico do habeas corpus é posto na ocorrência de abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal, na protecção do direito à liberdade reconhecido constitucionalmente, sendo providência a decretar apenas nos casos de atentado ilegítimo á liberdade individual – grave e grosseiro e rapidamente verificável – que integram as hipótese da causas de ilegalidade da detenção ou da prisão taxativamente indicadas nas disposições legais que desenvolvem o preceito constitucional mas, neste caso, é necessário a invocação do abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, do atentado ilegítimo à liberdade individual grave e em princípio grosseiro e rapidamente verificável, invocação que obrigatoriamente aponte os factos em que se apoia (neste sentido, Acs. STJ de 10.01.2002, in Proc. 2/02, da 5ª Secção e 23.05.2002, in Proc. 2023/02 da 5ª Secção).
E esta providência deve ser rejeitada sempre que a prisão tenha sido aplicada por entidade competente, por factos pelos quais a lei o permita e a prisão se encontre dentro do prazo legalmente fixado por aquela entidade (neste sentido cfr. Ac. STJ de 24.11.2005, in Proc. 3906/05, da 5ª Secção).
Em face do que se deixa dito, não assiste razão ao peticionante ao deduzir esta providência excepcional que, por isso, é infundada, pois o requerente está detido na sequência de um MDE válida e legalmente emitido, cuja execução foi deferida por decisão do tribunal competente, decisão essa confirmada em recurso interposto para o STJ, estando a detenção (do arguido/requerente) dentro do prazo legalmente permitido (artigo 3º-1 e 2 da Lei 65/2003, de 23 de Agosto).
Decisão:
Termos em que, tudo visto, deliberam neste Supremo Tribunal, após audiência, indeferir, por infundado – (art.º 223.º, n.º 4, a) do CPP) – o pedido de habeas corpus formulado no processo nº 1009/09.4YRLSB.S1, deste STJ, pelo arguido AA.
Custas pelo requerente, com 5 UCs de taxa de justiça.
Lisboa, 25 de Junho de 2009
Fernando Fróis (Relator)
Henriques Gaspar
Pereira Madeira
___________________________________________
1- Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, 1986, págs. 273: “o habeas corpus é a providência destinada a garantir a liberdade individual contra o abuso de autoridade”.
2- Cfr., Cláudia Cruz Santos, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 10, fascículo 2.º, págs. 309.