CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
SEGURANÇA SOCIAL
RECURSO
PRAZO
Sumário

I - A Lei 107/2009, de 14.09, remete, em matéria de contagem de prazos, para o regime do Código de Processo Penal, ou seja, para o artigo 107°, n°5 deste diploma.
II - Assim, e enquanto no âmbito do RGCO, o prazo de impugnação da decisão administrativa se suspende aos sábados, domingos e feriados, já no que respeita à Lei 107/2009, por força do seu artigo 6°, a contagem dos prazos é contínua, só não se suspendendo durante as férias.

Texto Integral

Processo nº228/11.8TTBGC.P1
Relator: M. Fernanda Soares - 959
Adjunto: Dr. Ferreira da Costa -

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I
Nos autos de contra-ordenação, a correr termos no Tribunal do Trabalho de Bragança, em que é arguida B…, Lda., em 11.05.2011, o Mmº. Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: (…) “Nos termos conjugados dos artigos 6º e 33º, nº2 da Lei 107/2009 de 14.09 (Regime Jurídico do Procedimento Aplicável às Contra-Ordenações Laborais e de Segurança Social – RJPCOLSS), do artigo 104º, nº1 do CPP e 144º, nº1 do Cód. De Proc. Civil, o prazo de interposição do recurso de impugnação é de 20 dias após a notificação da decisão de aplicação da coima, é contínuo e a sua contagem não se suspende durante as férias judiciais. Neste ponto, o RJPCOLSS diverge do regime fixado no art.60º, nº1 do regime geral das contra-ordenações estabelecido no DL 433/82 de 27.10, que expressamente prevê a suspensão do prazo de impugnação aos sábados, domingos e feriados. No caso presente a arguida e o seu ilustre mandatário foram notificados da decisão que aplicou a coima em 15/03/2011 (cf. fls.54 e 55), pelo que o prazo de recurso terminou em 04.04.2011. Ora, o requerimento de interposição do recurso e respectivas alegações foram remetidos à autoridade administrativa por telecópia expedida em 7/04/2011 (cf. fls. 57), ou seja, três dias após o termo do prazo legal. Daí que seja manifestamente extemporâneo o recurso de impugnação da arguida, o que, em conformidade com o disposto no art.38º do RJPCOLSS, conduz à sua rejeição” (…).
Inconformada, veio a arguida recorrer pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por outra que considere tempestivo o recurso, concluindo do seguinte modo:
1. A Lei nº107/2009 criou várias normas que divergem do regime geral das contra-ordenações, entre as quais, o seu artigo 8º, que prescreve para as notificações em processo de contra-ordenação laboral e de segurança social, a utilização da carta registada com aviso de recepção (nº1) e que estipula que as notificações se consideram efectuadas “na data em que seja assinado o aviso de recepção ou no 3ºdia útil após essa data, quando o aviso seja assinado por pessoa diversa do notificando”.
2. Não é, por isso, necessário recorrer a qualquer disposição da legislação subsidiária (designadamente o art.113º, nº2 do CPP), para se determinar a data em que se deve considerar (ou presumir como) efectuada a notificação realizada no processo de contra-ordenação laboral e de segurança social, uma vez que existe norma específica no regime jurídico do procedimento aplicável a estas contra-ordenações que directamente regula e rege a questão.
3. No caso dos autos, as notificações da decisão administrativa foram remetidas à sociedade arguida e ao seu mandatário em 14.03.2011, por carta registada com aviso de recepção e o aviso de recepção da notificação remetida ao mandatário da arguida foi assinado de facto em 15.03.2011, mas não pelo destinatário; antes sim, foi assinado «por pessoa diversa do notificando».
4. Tal notificação considera-se efectuada no 3ºdia útil após a data da assinatura do aviso de recepção, ou seja, no dia 18.03.2011, pelo que o prazo de 20 dias para apresentação do recurso de impugnação judicial da decisão administrativa só terminava no dia 07.04.2011, data em que o acto foi validamente praticado através de telecópia.
5. O presente recurso de impugnação judicial da decisão administrativa é por isso, tempestivo.
6. Foram violados os artigos 8º, nº3 e 60º da Lei 107/2009.
A Digna Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo veio contra alegar pugnando pela manutenção da decisão recorrida e concluindo nos seguintes termos:
1. A arguida não beneficia do 3ºdia útil após a assinatura do aviso de recepção, porquanto tal dispositivo normativo não é aplicável às pessoas colectivas e sociedades.
2. Por isso, no processo de contra-ordenação, quando o arguido for uma pessoa colectiva, tem sido aplicado, em matéria de notificações, as regras da citação das pessoas colectivas do Código de Processo Civil – artigo 4º do C. P. Civil.
3. E assim, deve a arguida ser considerada pessoalmente notificada na pessoa da empregada da sede, a qual assinou o aviso de recepção em 15.03.2011.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Admitido o recurso e corridos os vistos cumpre decidir.
* * *
II
Matéria de facto a ter em conta para além do já referido anteriormente.
1. Em 14.03.2011 foram expedidas pela Autoridade Administrativa cartas registadas, com aviso de recepção, para notificação à arguida e ao seu ilustre mandatário da decisão administrativa proferida nos presentes autos de contra-ordenação.
2. O aviso de recepção da notificação remetida ao mandatário da arguida foi assinado em 15.03.2011 por “C… ….”
3. O aviso de recepção da notificação remetida à arguida mostra-se assinado por D….
4. A arguida apresentou recurso de impugnação judicial em 07.04.2011.
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III
Questão a apreciar.
Da tempestividade do recurso de impugnação judicial.
A arguida defende que tendo o aviso de recepção respeitante à notificação do seu mandatário sido assinado, em 15.03.2011, por pessoa diferente (que não o mandatário), há que aplicar ao caso o disposto no artigo 8º, nº3, parte final, da Lei 107/2009 de 14.09, a determinar, assim, a tempestividade do recurso. Vejamos então.
Nos termos do artigo 32º da Lei 107/2009 de 14.09 – aplicável ao caso – “A decisão da autoridade administrativa de aplicação de coima é susceptível de impugnação judicial”.
Segundo o disposto no artigo 8º da referida Lei “1. As notificações em processo de contra-ordenação são efectuadas por carta registada, com aviso de recepção, sempre que se notifique o arguido do auto de notícia, da participação e da decisão da autoridade administrativa que aplique coima, sanção acessória ou admoestação. 2. Sempre que o notificando se recusar a receber ou assinar a notificação, o distribuidor do serviço postal certifica a recusa, considerando-se efectuada a notificação. 3. A notificação por carta registada considera-se efectuada na data em que seja assinado o aviso de recepção ou no 3ºdia útil após essa data, quando o aviso seja assinado por pessoa diversa do notificando”.
Da leitura do artigo 8º resulta que a notificação a que aí se alude é apenas a que é feita ao arguido, não tendo a ver com a notificação feita ao mandatário do arguido, na medida em que o prazo para impugnar a decisão administrativa inicia-se a partir da notificação ao arguido da referida decisão (artigo 33º, nº2 da Lei 107/2009).
Ora, e como a arguida não põe em causa ter sido notificada da decisão administrativa em 15.03.2011 – conforme foi considerado na decisão recorrida – o prazo de 20 dias para recorrer iniciou-se em 16.03.2011 e terminou em 04.04.2011.
Mas aqui chegados cumpre referir o seguinte.
Ao contrário do disposto no artigo 60º, nº1 do DL 433/82 de 27.10 – “O prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa suspende-se aos sábados, domingos e feriados” – a Lei 107/2009 não regula, em especial, a contagem do prazo para impugnação da decisão administrativa.
No entanto, a Lei 107/2009 contém uma norma sobre contagem de prazos e que vamos analisar de seguida.
O artigo 6º da Lei 107/2009, [o qual está incluído no Capítulo II “Actos Processuais na Fase Administrativa”], sob a epígrafe “Contagem de Prazos” diz o seguinte: “1. À contagem dos prazos para a prática de actos processuais previstos na presente lei são aplicáveis as disposições constantes da lei do processo penal. 2. A contagem referida no número anterior não se suspende durante as férias judiciais”.
Daqui decorre que a Lei 107/2009, remete, em matéria de contagem de prazos, para o regime do Código de Processo Penal, ou seja, para o artigo 107º, nº5 deste diploma.
Assim, e enquanto no âmbito do RGCO, o prazo de impugnação da decisão administrativa se suspende aos sábados, domingos e feriados, já assim não é no que respeita à Lei 107/2009. Neste caso, e por força do referido artigo 6º, a contagem dos prazos é contínua só não se suspendendo durante as férias.
E levando o nosso raciocínio até às últimas consequências, então, e por força do disposto no artigo 107º, nº5 do Código do Processo Penal, é aplicável ao caso o estabelecido no artigo 145º, nº5 e nº6 do Código Processo Civil.
Em suma: em face do disposto no artigo 6º da Lei 107/2009 – o qual prevê expressamente o modo de contagem dos prazos para a prática de actos processuais na fase administrativa – ter-se-á de aplicar as normas do Código de Processo Penal, concretamente o disposto no artigo 107º, nº5 deste Código e também o disposto no artigo 145º do Código de Processo Civil, a significar, igualmente, que a referida Lei se afastou do disposto no nº1 do artigo 60º do RGCO, e consequentemente, da natureza administrativa do referido prazo, conforme acórdão para Uniformização de Jurisprudência do STJ nº2/1994 de 10.03, publicado no DR, 1ªsérie, de 7.5.1994.
Em face da conclusão a que se chegou cumpre dizer que tendo o requerimento de impugnação da decisão administrativa dado entrada no dia 07.04.2011 (3ºdia útil após o termo do prazo), o mesmo será tempestivo se a arguida pagar a multa a que alude o artigo 145º, nº5 e nº6 do Código de Processo Civil, com referência ao disposto no artigo 107º-A al. c) do C. Processo Penal.
Por isso, e ainda que por fundamentos diversos, o recurso procede.
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Termos em que se acorda, em conferência, em revogar a decisão recorrida, devendo o Tribunal a quo ordenar a notificação da arguida para os termos do artigo 145º do Código de Processo Civil, e posteriormente, se a multa for paga, conhecer do recurso de impugnação da decisão administrativa.
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Sem custas.
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Porto, 5.12.2011
Maria Fernanda Pereira Soares
Manuel Joaquim Ferreira da Costa