CONDOMÍNIO
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ADMINISTRADOR
LOCATÁRIO
Sumário


I. Não estando indicado no título constitutivo da propriedade horizontal a forma de ocupação dos espaços comuns, designadamente onde os respectivos titulares do direito de uso, poderiam estacionar as suas viaturas em garagem colectiva, não pode a Assembleia Geral de Condóminos nem o Administrador do Condomínio atribuir lugares de estacionamento a uns e excluí-los a outros que sejam também beneficiários do mesmo direito.

II. Não pode o Administrador do Condomínio (que representa os condóminos), refugiar-se em deliberações da Assembleia que vão directamente contra o título constitutivo da propriedade horizontal que define a propriedade e compropriedade dos bens (e o inerente direito de uso das partes comuns), e por isso se mostram contaminadas com vícios insanáveis.- art. 1422.º do CC.

III. Se não houver possibilidade física de estacionamento simultâneo de viaturas de todos os condóminos que tenham esse direito de uso tem o Administrador do condomínio de diligenciar por si ou através da Assembleia de Condóminos, por forma a arranjar-se solução que viabilize o direito da A. a também aceder e usar o espaço cujo direito ao uso também lhe pertence, repartindo o direito colectivo segundo critérios de equidade ( a que não pode ser alheio o da proporcionalidade na compropriedade do edifício), que poderão passar, por exemplo, pela distribuição de tempos (horários diurno ou nocturno, por dias da semana ou mês), pela marcação não individualizada de espaços físicos para ocupação, (fazendo-se esta segundo os espaços livres a cada momento, conforme um vulgar local de estacionamento na via ou num parque), o estabelecimento de escalas de ocupação, ou a estipulação de outras soluções abertas à criatividade ou até por compensações financeiras, designadamente a nível de atenuação das despesas de condomínio de quem não precise de ocupar físicamente a garagem em determinados dias ou horas.

IV. O locatário fica investido na posição do locador, pelo que não lhe pode ser negado o direito de uso que ao locador competia.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I. Relatório

“Q.... - E... e M... para G... de E...., SA”, veio propor,
contra
o “Condomínio do prédio sito na Rua ...., n.ºs ...-..., em Lisboa”, na pessoa da respectiva Administradora, acção declarativa sob a forma de processo ordinário
pedindo
- a condenação do R. a reconhecer o direito da A. à utilização das garagens do aludido prédio e, bem assim, a pagar-lhe, pelos prejuízos decorrentes da privação do respectivo uso, indemnização no montante de Esc. 2.100.000$00 pela privação do uso de garagem desde 1993 até à data (então 2001.05.18), acrescido de Esc. 25.000$00 mensais, até reconhecimento daquele direito, e juros moratórios à taxa legal, desde a citação.
Para o efeito alegou ser locatária da fracção N da parcela B, pertencendo ao locado o direito de usar e fruir as garagens na cave e sub-cave, uma vez que estas são partes comuns de todas as fracções excepto daquelas cuja exclusão conste do título constitutivo de propriedade horizontal do edifício.
Tal utilização tem-lhe sido proibida, o que lhe tem vindo a acarretar danos, cuja indemnização peticiona.

Contestou o R., defendendo-se com a ilegitimidade activa da A. face ao pedido de indemnização anterior a 95.12.14 (data até à qual a A. não era locatária) e passiva (por não ter a A. proposto a presente acção contra os condóminos individualmente e também por não ter impugnado a deliberação da assembleia geral que decidira não lhe reconhecer o direito de uso das garagens), impugnando por outro lado factos indicados onde a A. assenta o direito invocado e os alegados prejuízos - concluindo pela improcedência da acção.

A A. replicou.

No Saneador decidiu-se que a A. era parte ilegítima para formular pedidos no que respeita ao período de exercício anterior a 1995/12/14, absolvendo por isso o R. da instância no que concerne ao pedido indemnizatório ( pagamento de 25.000$00 mensais) no período anterior a essa data; por outro lado, julgou o Réu parte ilegítima, por ter entendido que teria a acção de ser proposta contra os condóminos individualmente considerados.

A A. recorreu da parte de decisão que considerou o Condomínio parte ilegítima, tendo a Relação dado provimento no agravo.

Foi então o Réu Condomínio que tentou novo recurso dessa decisão, em agravo continuado.
O Supremo Tribunal de Justiça não aceitou o referido recurso, pelas razões fundamentadas a fls. 220 dos autos.

Procedeu-se então à remessa dos autos à 1.ª instância, para que o processo prosseguisse, onde foi operada a condensação, com a indicação dos factos que se consideravam assentes e aqueles que careciam de ser levados á base instrutória.
Decorrida a fase de instrução, foi efectuada audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida Sentença, na qual se considerou a acção parcialmente procedente, condenando-se o R. a reconhecer o direito da A. à utilização das caves e sub-cave que integram o edifício, destinadas a estacionamento, com as diversas rampas e escada de acesso entre elas e à via pública, incluindo todo o espaço das entradas localizado no rés-do-chão, concedendo-lhe para tanto as respectivas chaves de acesso, e absolvendo-o do demais peticionado.

Inconformadas, vieram ambas as partes interpor recursos de apelação.

A Relação veio no entanto a julgar improcedentes ambos os recursos, confirmando a Sentença.

Recorreu o R., pedindo Revista, o mesmo vindo a fazer o A., ainda que tão só subordinadamente. (fls. 608, 612, 615)

Apresentaram então as respectivas alegações ( fls. 618 e 641).
A Relação admitiu ambos os recursos, mas o Supremo apenas aceitou o recurso independente (ou seja, o do R. Condomínio), por haver julgado deserto o recurso subordinado (o da A. Q...).


II. Âmbito do recurso

Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o Recorrente apresente nas conclusões alegacionais respectivas.- arts. 684.º-3 e 690.º-1 do CPC.
Vamos por isso passar a transcrevê-las:

“1. O Condomínio não tem personalidade jurídica, mas apenas personalidade
judiciária que lhe é conferida pelo art° 6° e) do CPC.
2. O administrador, por sua vez, tem legitimidade para agir em juízo, podendo ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício, exceptuando-se aquelas em que está em causa a posse de bens comuns - art° 1437° do CC.
3. Apesar de a questão da legitimidade estar decidida, mantém-se a questão da possibilidade de procedência ou improcedência do pedido contra o Condomínio.
4. A questão que aqui importa é pois de saber se, tal como o pedido foi formulado pela apelante (A.) e face à matéria considerada provada na acção, pode proceder contra o Condomínio.
5. Entende a recorrente (R.) que, face à factualidade provada, o Condomínio não pode ser condenado no reconhecimento do direito da apelada à utilização das caves do prédio.
6. Não é o Condomínio que impede a recorrida de estacionar no local!
7. O pedido apenas pode proceder contra os condóminos, individualmente considerados, que impedem a apelada de estacionar nas caves, quer porque utilizam todos os lugares disponíveis para estacionamento, quer porque deliberaram nesse sentido em assembleias de condomínio.
8. A administração, órgão executivo do condomínio, carece de poderes para "impor" aos condóminos a redistribuição de lugares de estacionamento, quando, há mais de vinte anos, os lugares de estacionamento se encontram totalmente preenchidos e não há lugar para estacionamento de mais viaturas de outros condóminos.
9. Não se trata de regular o uso das coisas comuns, mas sim de alterar o direito dos condóminos que têm lugar de estacionamento.
10. Cabe aos condóminos regulamentar a sua utilização e não ao administrador do condomínio.
11. Só a intervenção dos condóminos na acção, poderia regular definitivamente a situação concreta.
12. O pedido não pode, pois, proceder contra o Condomínio!
Por outro lado,
13. Os condómino são também proprietário das partes comuns do edifício, (art. 1420° do CPC), pelo que têm o direito de defesa em caso de ofensa ao seu direito sobre estas.
14. Há, pois, um direito legítimo dos condóminos que importa salvaguardar.
15. A situação factual existente, apenas contestada pela apelada, não pode deixar de levar à conclusão de que apenas as fracções destinadas à habitação tinham direito a estacionamento.
16. A decisão recorrida viola, pois, o disposto no art° 1473, n.º 3, 1420.º e 1425 n.º1 do CC. (fls. 618)”

Tendo em conta o acima transcrito, fácil e concluir que a única questão que nos está colocada para análise é a de saber se, face aos factos provados, houve ou não erro de direito na condenação do Condomínio ( cuja legitimidade não pode voltar a ser discutida, por haver Acórdão da Relação transitado em julgado.)

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III. Fundamentação

III.-A) Os factos

Foram considerados assentes e/ou provados os factos seguintes:

“1) A A. celebrou com “E... L... - S... de L... F..., SA”, o acordo escrito, denominado compra e venda, locação financeira com fiança, cuja cópia foi junta como doc. 1 da petição inicial e se dá por reproduzido, nos termos do qual foi locada à A. a fracção autónoma designada pela letra N da parcela B, correspondente ao rés-do-chão, destinado a armazém, escritório ou comércio, do prédio urbano sito na Rua ..., n.ºs ... a ...-C e ... a ...-C, freguesia de S.Domingos de Benfica, concelho de Lisboa, inscrito na respectiva matriz sob o art. 566.º e descrito na 5.ª CRP de Lisboa sob o n.º 00358 da freguesia de Benfica (al. A).
2) Encontra-se registada a transmissão da fracção autónoma identificada em A) para “BPI L... - S... de L... F..., SA”, por transferência global de património e fusão, nos termos que constam do doc. 2 da petição inicial que se dá por reproduzido (al. B).
3) No título constitutivo de propriedade horizontal do prédio identificado em A), cuja cópia foi junta como doc. 3 da petição inicial que se dá por reproduzido, são comuns a todas as fracções, com exclusão das fracções D1, D2, D3 e D4 da parcela A e J1, J2, J3 e J4 da parcela B, a cave e a sub-cave que integram o edifício, destinadas a estacionamento, com as diversas rampas e escada de acesso entre elas e à via pública, incluindo todo o espaço das entradas localizado no rés-do-chão (al. C).
4) Nas caves em causa foram desenhadas divisórias para parqueamento individual (al. D).
5) Não se prevendo qualquer lugar destinado à fracção da A. (al. E).
6 ) Não foi permitido à A. o parqueamento de viaturas em qualquer outro espaço das caves, desde 95.12.14 (al. F).
7) Em reunião da Assembleia Geral de condóminos realizada no dia 96.06.26, a A. reclamou o direito a um lugar de parqueamento (al. G).
8) Discutida a questão foi deliberado por maioria proceder à redistribuição dos lugares de garagem, constituindo-se um grupo de trabalho com esse fim (al. H).
9) Mais se deliberou que, caso não houvesse possibilidades de aumentar os lugares de estacionamento, a assembleia deveria reunir novamente (al. I).
10) Em reunião da assembleia geral de condóminos de 14/5/99 foi apresentada a proposta de fixar um lugar de estacionamento, destinado à fracção da A., na parte final da rampa de acesso do piso 1 para o piso 2, na parte interior da curva (al. J).
11) Tal proposta foi recusada, continuando a A. a ser privada da utilização das garagens e de aí estacionar viaturas (al. K).
12) À A. não foi concedida chave para a entrada das garagens (al.L), dos factos assentes).
13) Na sequência da deliberação aludida em H) e I) foi efectuada uma experiência de estacionar um veiculo na parte interior da curva da parte final da rampa de acesso do piso 1 para o piso 2 (ponto 1). 14) A A. tem cinco viaturas ao seu serviço (ponto 2).
15) No local do prédio identificado em A) o estacionamento na via pública é difícil (ponto 3).
16) A A. presta serviços de assistência informática (ponto 4).
17) O que implica operações de carga e descarga de material (ponto 5).
18) Por vezes não é possível parar no local (ponto 6).
19) Por isso os funcionários da A. carregam o material pela rua e por longas distâncias (ponto 7).
20) Em virtude da impossibilidade de estacionamento os funcionários da A. levam as viaturas para casa com despesas para a A. (ponto 8).
21) A mesma dificuldade de estacionamento se depara a clientes e fornecedores da A. (ponto 9).
22) Desde 1995.12.14 até à data da instauração da presente acção o valor médio de um estacionamento no local referido em A), em condições similares à do condomínio R., é de € 77,89 mensais (ponto 10).
23) No prédio referido em A) os estacionamentos estão identificados com a fracção a que se encontram afectados (ponto 11).
24) Encontram-se efectuadas demarcações desde a data da conclusão do prédio (ponto 12).
25) A cave e sub-cave, destinadas a estacionamento, encontram-se totalmente preenchidas com lugares de estacionamento, não havendo espaço físico para estacionamento de mais viaturas (ponto 15).
26) Situação existente há mais de 20 anos e que se mantém actualmente (ponto 16).
27) Na assembleia de condóminos realizada no dia 96.06.26, os condóminos pronunciaram-se no sentido de que a A. ou o proprietário da fracção N não tinha direito a qualquer lugar na garagem, porque no decurso de mais de 20 anos nunca tinham participado nas despesas de conservação e manutenção da garagem, nunca tinham estacionado qualquer viatura na garagem e o parqueamento não dispõe de espaço para mais lugares de estacionamento (ponto 18).
28) Deliberaram os condóminos proceder à redistribuirão dos lugares de garagem, criando um grupo de trabalho para estudar a sua viabilidade e caso não fosse possível aumentar o número de lugares, o assunto seria de novo discutido em assembleia geral (ponto 19).
29) Para decidir o assunto de forma a satisfazer as necessidades dos condóminos com direito a parqueamento (ponto 20).
30) A proposta para estacionamento apresentada pela A. na assembleia de 14/5/99 foi recusada, tendo o condómino do 8°H do n.º18, Eng. Carlos Jacinto, feito constar, como declaração de voto, que votou contra por não achar reunidas as informações necessárias para a resolução (ponto 25).
31) A cave e sub-cave do prédio identificado em A) destinavam-se a estacionamento de viaturas ligeiras (ponto 26).
32) As garagens têm acesso directo ao interior do prédio, onde estão localizadas as fracções habitacionais (ponto 27).
33) As fracções do prédio identificado em A) que são destinadas ao comércio têm acesso directo à via pública (ponto 28).
34) A fracção G) do prédio identificado em A), também destinada ao comércio, não tem, nunca teve, nem reclama qualquer direito a estacionamento (ponto 29), da base instrutória).”

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III-B) O Direito


Já está decidido com trânsito em julgado na presente acção, que tanto a A. como o Condomínio gozam de legitimidade processual.
Tanto a litispendência como o caso julgado têm por fim evitar que o Tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior. – art. 497.º-2 do CPC.
Estando estabelecida quanto a essa matéria “caso julgado formal”, não pode mais ressuscitar-se a discussão sobre a legitimidade das partes no seio deste processo ou discutir a bondade de tal decisão, impondo-se, consequentemente, o respeito por ela.

São funções do Administrador, além de outras que a Assembleia decida atribuir-lhe, regular o uso das coisas comuns e a prestação dos serviços de interesse comum.- art. 1436.º-g) do CC.

Na propriedade constituída em regime de propriedade horizontal, é o seu título constitutivo que define as partes do edifício correspondentes às várias fracções, por forma a que estas fiquem devidamente individualizadas, e é nele que será fixado o valor relativo a cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem do valor total do prédio.- art. 1418.º-1 do CC.
Além das especificações acima referidas, o título constitutivo pode ainda conter, designadamente, a menção do fim a que se destina cada fracção ou parte comum e o regulamento do condomínio, disciplinando o uso, fruição e conservação, quer das partes comuns, quer das fracções autónomas. – art. 1418.º-2 do CC

A forma de alterar o título de propriedade horizontal obedece a um procedimento específico e tem que ter na sua base uma deliberação prévia e unânime de todos os condóminos. - art.1419.º, n.ºs 1 e 3, em conjugação com o art. 1416.º do CC.
Como não ocorreu tal situação, é no título constitutivo de propriedade horizontal que temos de continuar a assentar a titularidade dos direitos dos condóminos.

Pois bem:

A garagem existente no prédio está descrita na propriedade horizontal como sendo um bem comum, de utilização exclusiva de alguns dos condóminos, entre os quais a entidade proprietária da fracção N, do bloco B, ou seja, o “BPI L... - S... de L... F..., SA”
Por força da locação a favor da A., ficou esta investida no direito possessório de uso que à locadora pertencia, pelo que pode esta usar a cave e sub-cave, nos mesmos termos que o podia fazer a locadora.- art. 1022.º, 1031.º do CC.

No título constitutivo da propriedade horizontal não estava indicada a forma de ocupação dos espaços comuns, designadamente onde os respectivos titulares do direito de uso, poderiam estacionar as suas viaturas.
E como ficou provado que no espaço destinado a estacionamento de viaturas não há possibilidade física para todos os que nele têm direito a estacionar usarem esse espaço simultaneamente, não podia a Assembleia de Condóminos deliberar sobre quem deve ser excluído, sendo certo que face ao título o locador condómino excluído tem um direito idêntico aos demais, por estar a ocupar o lugar do locador, também ele condómino.- art. 1422.º do CC.
Como explicou Henrique Mesquita na Revista de Direito e Estudos Sociais n.º 23- 138, não podem ser suprimidos ou coarctados pela Assembleia de Condóminos ou pelo Administrador direitos especiais de uso que hajam sido conferidos pelo título constitutivo da propriedade horizontal.

A individualização de espaço de utilização em zonas comuns ou o seu regime de utilização é tarefa que se insere nos poderes do Administrador do Condomínio.- art. 1430.º-1 e 1436.º-g) do CC..
Embora este seja, por via de regra, a entidade responsável por dar execução às deliberações da Assembleia de Condóminos, tem competência própria para regular o uso das partes comuns.
Só se mostra obrigado a levar à execução as deliberações da Assembleia de Condóminos quando estas não colidam com os regulamentos e disposições legais e administrativas relativas ao condomínio.
Por isso, não pode o Administrador do Condomínio (que representa os condóminos), refugiar-se em deliberações da Assembleia de Condóminos que vão directamente contra o título constitutivo da propriedade horizontal que define a propriedade e compropriedade dos bens (e o inerente direito de uso das partes comuns), e por isso se mostram contaminadas com vícios insanáveis.- art. 1422.º do CC.

O Condomínio (na pessoa do Administrador) deve por isso ser condenado a reconhecer o direito da A., enquanto titular do uso de um condómino, com direito à fruição da cave e sub-cave (tal como os outros condóminos que à face do título detenham tal direito), devendo por isso entregar-lhe a chave e providenciar sobre a forma como o direito deve ser assegurado e exercido.

A impossibilidade física de ocupação dos espaços da cave e subcave só acontece se todos os condóminos, simultaneamente, a ocuparem.
E se não é possível fisicamente haver lugar para todos ao mesmo tempo, tem o Administrador do condomínio de diligenciar por si ou através da Assembleia de Condóminos, por forma a arranjar-se solução que viabilize o direito da A. a também aceder e usar o espaço cujo direito ao uso também lhe pertence, repartindo o direito colectivo segundo critérios de equidade, que poderão passar, por exemplo, pela distribuição de tempos (horários diurno ou nocturno, por dias da semana ou mês), pela marcação não individualizada de espaços físicos para ocupação, (fazendo-se esta segundo os espaços livres a cada momento, conforme um vulgar local de estacionamento na via ou num parque), o estabelecimento de escalas de ocupação, ou a estipulação de outras soluções abertas à criatividade (por que não compensações financeiras, designadamente a nível de atenuação das despesas de condomínio de quem não precise de ocupar físicamente a garagem em determinados dias ou horas)?
Em qualquer dessas situações (ou muitas outras abertas à criatividade do Administrador ou dos condóminos) será possível optimizar a fruição por todos do espaço comum sem ser em situação de privilégio de alguns e à custa da negação do direito de outros.

O que não pode continuar a perpetuar-se é o pleno direito a uns e a negação total a outros.

No tocante à matéria de recurso – porque só sobre essa é que nos pronunciamos - não se mostra por isso violada qualquer norma legal no Acórdão recorrido.

Face ao exposto, não foi violado no Acórdão recorrido qualquer norma legal nem feita qualquer indevida interpretação dos preceitos em que assentou.
Deve por isso ser negada a Revista.

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IV. Decisão

Na negação da Revista, mantém-se o Acórdão recorrido.
Custas pelo R.

Lisboa, 3 de Dezembro de 2009

Mário Cruz (Relator)
Garcia Calejo
Helder Roque