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PATROCÍNIO OFICIOSO
SUBSTABELECIMENTO SEM RESERVA
SUBSTABELECIMENTO COM RESERVA
NOTIFICAÇÃO
Sumário
Se um substabelecimento “sem reserva” implica a exclusão do mandatário anterior, art° 36° n.º 3 do Código de Processo Civil, o substabelecimento “com reserva” implicará que o patrono primitivo mantenha todos os poderes de representação que lhe tinham sido conferidos, na prática passando a parte a ser representada no processo por dois patronos, podendo qualquer deles praticar actos processuais e podendo qualquer deles passar a receber notificações relativas a processos judiciais pendentes (sem necessidade de notificação simultânea aos dois patronos).
Texto Integral
● Rec. 2765/08.2TBVNG-A.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Mª das Dores Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão recorrida de 23/5/2011.
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Súmula do Processo
Recurso de apelação interposto na acção com processo comum e forma sumária, com o nº2765/08.2TBVNG-A, do 4º Juízo Cível da comarca de Vª Nª de Gaia. Autora – B…. Réus – C… e marido D….
Na sequência da respectiva citação para a acção, os Réus C… e D… formularam pedido de Apoio Judiciário, na modalidade de nomeação de patrono e de dispensa de taxa de justiça e de outros encargos com o processo, na Segurança Social, no dia 22/2/2010, tendo sido nomeada para o respectivo patrocínio a ilustre advogada Srª Drª E…, com escritório em Vª Nª de Gaia.
Tais pedidos foram deferidos, o de D… em 1/4/2010, e o de C…, em 10/5/2010.
Os Réus contestaram a acção no dia 11/5/2010, sendo a mesma subscrita pelo ilustre advogado substabelecido, Sr. Dr. F….
O referido substabelecimento foi outorgado pela Srª Drª E… “com reservas”.
Foi proferida sentença no processo, a qual foi notificada à Srª Drª E….
Veio então o Réu marido, patrocinado “por substabelecimento”, pelo Sr. Dr. F…, invocar a nulidade de todos os actos que lhe não foram notificados, e subsequentes à apresentação nos autos do “substabelecimento”.
A referida nulidade foi julgada inverificada, e improcedente o requerido, nos termos do despacho de 23/5/2011, de que ora se recorre, do seguinte teor:
“Fls. 224 – Consta efectivamente de fls. 209 um substabelecimento a favor do ilustre subscritor do requerimento aqui em análise.”
“Porém, tal substabelecimento não implicou, ao contrário do pretendido, a exclusão da Exmª Srª Drª E… do processo, porquanto o mesmo foi outorgado “com reserva”.”
“Assim sendo, visto o disposto no artº 36º nº3 C.P.C. “a contrario”, e porque a sentença foi notificada à ilustre patrona do Réu, que não perdeu tal qualidade, julgo não verificada a nulidade invocada.”
“Vila Nova de Gaia, d.s.”
Conclusões do Recurso de Apelação de D…:
1ª – O despacho de que ora se recorre violou o artº 35º nº1 Lei nº 34/2004 de 29/7, alterada pela Lei nº 47/2007 de 28 de Agosto, e o artº 36º nº3 CPC.
2ª – Substabelecer o mandato com reserva significa investir outra pessoa em poderes de representação forense em conjunto com o primeiro mandatário, sendo que apenas se o primeiro vier ao processo dizer que deseja prescindir do substituto se demonstra um reassumir de funções, devendo até lá as notificações serem feitas ao substabelecido – Ac.R.E. 11/5/95 Bol.447º/601.
3ª – A defensora inicialmente nomeada não só não veio dizer ao processo que prescindia do substituto, como ficou convencida que as notificações se passariam a fazer também na pessoa do substabelecido.
4ª – Solução diferente viola os artºs 13º e 20º da C.R.P. pois o presente recurso apenas se deve à condição económica desfavorável do Recorrente.
5ª – A igualdade consiste em tratar de forma diferente o que for essencialmente diferente; a igualdade proíbe as distinções arbitrárias, sem fundamento material bastante.
6ª – O advogado substabelecido nenhuma notificação recebeu da Secretaria do 4º Juízo Cível, o que constitui nulidade por omissão que expressamente se invocou e que, no contexto supra referido, foi prejudicial para a defesa dos direitos do réu/recorrente, com violação do disposto no artº 201º CPC.
Factos Provados
Encontram-se provados os factos relativos ao teor da tramitação processual e do despacho impugnado, supra resumidamente expostos.
Fundamentos
Em função das conclusões do recurso, as questões a apreciar no presente recurso serão as seguintes:
- apreciação da validade do substabelecimento efectuado por ilustre advogada no âmbito da respectiva nomeação como patrona oficiosa num processo judicial e respectivas consequências;
- apreciação da regularidade das notificações feitas na pessoa dessa ilustre advogada, que estabeleceu com reserva os respectivos poderes;
- ofensa da interpretação efectuada no despacho recorrido ao disposto nos artºs 13º (igualdade) e 20º (acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva) C.R.P.
Vejamos então.
I
A primeira questão é de resposta apodíctica, por via do disposto no artº 35º nº1 Lei nº 34/04 de 29 de Julho, sobre o regime de acesso ao direito e aos tribunais e sob a epígrafe “substituição em diligência processual” – o patrono nomeado pode substabelecer, com reserva, para diligência determinada, desde que indique substituto.
Aliás, conforme o nº 2 do mesmo inciso legal, a remuneração do substituto é da responsabilidade do patrono nomeado.
O artº 36º nº3 C.P.Civ. prescreve que o substabelecimento sem reserva implica a exclusão do anterior mandatário. Portanto, esse “cenário”, o do substabelecimento “sem reserva” encontra-se afastado in casu, não apenas pelos termos do substabelecimento em concreto, mas sobretudo pela impossibilidade legal de um tal substabelecimento, no âmbito do acesso ao direito.
Segue-se então que a Srª Drª E…, patrona nomeada, substabeleceu com reserva os poderes que para si resultassem do patrocínio oficioso no Sr. Dr. F… – o substabelecimento em causa foi junto aos autos com a Contestação da acção.
Se um substabelecimento sem reserva implica a exclusão do mandatário anterior, como vimos, o substabelecimento com reserva naturalmente implicará que o patrono primitivo mantenha todos os poderes de representação que lhe tinham sido conferidos, na prática passando a parte a ser representada no processo por dois patronos, podendo qualquer deles praticar actos processuais (substabelecer com reserva significa que se reservam para si poderes iguais aos estabelecidos) – assim, S.T.J. 12/1/94Col.I/39, Ac.R.E. 29/10/96Bol.460/832, Ac.R.P. 8/2/90inwww.dgsi.pt, pº 0309694, relator: Aragão Seia, Ac.R.L. 29/3/93inwww.dgsi.pt, pº 0067672, relator: Santos Bernardino, Ac.R.L. 26/10/99in www.dgsi.pt, pº 0044261, relator: Seara Paixão e Ac.R.C. 25/10/2011in www.dgsi.pt, pº 1006/10.7TBCVL.C1, relator: Henrique Antunes.
II
Em matéria de notificações judiciais, e no que respeita à posição do mandatário substabelecido com reserva, tem-se entendido que qualquer dos mandatários – o estabelecido e o substabelecido – se encontra em condições de receber tais notificações, em consonância com o argumento anterior de que a parte passa a ser representada por dois patronos.
Designadamente o Ac.S.T.J. 12/1/94cit. prevê a regularidade da notificação do mandatário estabelecido nessas condições da existência de um substabelecimento “com reserva”.
Outros arestos pugnaram porém pela regularidade da notificação do substabelecido “com reserva”, até ao reassumir de funções pelo primitivo mandatário, isto é, até à revogação implícita do substabelecimento – cf. Ac.R.E.11/5/95Bol.447/601 (citado nas doutas alegações de recurso) e Ac.R.L. 22/4/96Col.II/111.
Será útil porém realçar que tais acórdãos não se pronunciam sobre a irregularidade da notificação da parte na pessoa do primitivo mandatário – deixam incólume a doutrina da existência de dois mandatários, com a implícita desnecessidade de as notificações serem feitas na pessoa desses dois mandatários, cumulativamente (bastará, como é doutrina corrente no mandato plural, ser notificado apenas um dos mandatários forenses).
Visam tais acórdãos justificar a regularidade da notificação para determinados actos processuais feita na pessoa do mandatário substabelecido “com reserva”, e apenas.
Desse ponto de vista, então, um primeiro argumento a favor da bondade do douto despacho recorrido – nos termos do mandato em geral, as notificações feitas na pessoa da ilustre mandatária que substabelece são de considerar válidas.
Mas um outro argumento parece apodíctico, e retirado, como se retira, da própria lei reguladora do acesso ao direito – Lei nº 34/2004 de 29 de Julho, com as alterações da Lei nº 47/2007 de 28 de Agosto – o substabelecimento encontra-se previsto para o Apoio Judiciário apenas para substituição do patrono em diligências processuais, ou seja, pontualmente, como refere expressamente Salvador da Costa, Apoio Judiciário, 7ª ed., pg. 227.
Desta forma, também por esta via, todas as notificações posteriores ao oferecimento da Contestação que hajam sido efectuadas na pessoa da advogada Srª Drª E… são notificações válidas e regulares, na pessoa de patrono oficioso regularmente nomeado pela Ordem dos Advogados.
Restava aos beneficiários do Apoio ter requerido substituição de patrono, em tempo, se fosse esse o caso (artº 32º L.A.J.) ou à patrona nomeada pedir a respectiva escusa, se para tanto possuísse fundamento bastante (artº 34º L.A.J.).
III
A interpretação a que procedemos ofende o disposto nos artºs 13º (igualdade) e 20º (acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva) C.R.P.?
Parece-nos que não – nem por via do acesso ao direito (que foi facultado ao Recorrente com a nomeação de patrono oficioso e a assunção do pagamento, por parte do Estado, dos respectivos serviços), nem por via da igualdade, já que a dita nomeação de advogado, acrescida do pagamento de honorários, colocou o Recorrente em condições de aceder ao direito e aos tribunais, em paridade com os demais cidadãos, pese embora ter revelado não possuir meios económicos que lhe permitissem tal, fora das normas relativas ao instituto do Apoio Judiciário.
Dir-se-á, como o Recorrente, que as normas do substabelecimento, no Apoio Judiciário, são mais gravosas para a parte que as normas do substabelecimento que resultam da aplicação das normas gerais civilísticas – artº 264º C.Civ.? Não, e por duas ordens de razões:
- em primeiro lugar, porque só o substabelecimento sem reserva, no regime comum, provoca a evicção do processo do mandatário primitivo – artº 36º nº3 C.P.Civ. – coexistindo, no substabelecimento com reserva, nos termos gerais, o procurador e o seu substituto;
- em segundo lugar porque a selecção dos patronos, para efeitos de Apoio Judiciário, é mister da Ordem dos Advogados, mediante portaria dimanada do Ministério da Justiça (artº 45º nº2 L.A.J.), razão por que a respectiva substituição ou escusa devem ser, em paralelo, sempre fundamentadas.
Nestes termos, nada obsta à confirmação do decidido em 1ª instância.
Resumindo a fundamentação: I – Se um substabelecimento “sem reserva” implica a exclusão do mandatário anterior (artº 36º nº3 C.P.Civ.), o substabelecimento “com reserva” implicará que o patrono primitivo mantenha todos os poderes de representação que lhe tinham sido conferidos, na prática passando a parte a ser representada no processo por dois patronos, podendo qualquer deles praticar actos processuais e podendo qualquer deles passar a receber notificações relativas a processos judiciais pendentes (sem necessidade de notificação simultânea aos dois patronos). II – Retira-se da própria lei reguladora do acesso ao direito – Lei nº 34/2004 de 29 de Julho, com as alterações da Lei nº 47/2007 de 28 de Agosto – que o substabelecimento apenas se encontra previsto (no âmbito do Apoio Judiciário) para substituição pontual do patrono, em diligências processuais.
Com os poderes conferidos pelo disposto no artº 202º nº1 da Constituição da República Portuguesa, decide-se neste Tribunal da Relação:
Na improcedência do recurso de apelação, confirmar o douto despacho recorrido.
Custas pelo Apelante, sem prejuízo do Apoio Judiciário de que goza.
Porto, 13/XII/2011
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
Maria das Dores Eiró de Araújo
João Carlos Proença de Oliveira Costa