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RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
PRESCRIÇÃO
DIREITO DE REGRESSO
INÍCIO DO PRAZO PRESCRICIONAL
Sumário
1.A norma constante do nº2 do art. 498º do CC é analogicamente aplicável aos casos em que o direito ao reembolso se efectiva, não através da constituição de um direito de regresso nas relações internas entre responsáveis solidários, mas pela via da subrogação legal.
2. Na verdade, assentando decisivamente a subrogação , enquanto fonte da transmissão de um crédito, no facto jurídico do cumprimento, o prazo prescricional de curta duração, previsto no nº1 do art. 498ºdo CC, apenas se inicia – no que se refere ao direito ao reembolso efectivado através da figura da subrogação – com o pagamento efectuado ao lesado, já que anteriormente a esse facto o demandante está privado da possibilidade de exercer o direito que lhe assiste no confronto do principal responsável pelo dano causado, constituindo restrição excessivamente onerosa a que decorreria da aplicação, nessas circunstâncias, de um prazo prescricional curto, contado da originária verificação do facto danoso na esfera do lesado.
Texto Integral
1. AA– Companhia de Seguros, S.A., intentou acção de condenação, na forma ordinária, contra a R. Companhia de Seguros BB, S.A., alegando que, na qualidade de seguradora dos danos sofridos por determinado edifício, em consequência de incêndio, satisfez ao seu segurado indemnização no montante de €59.941,37 por ter ocorrido sinistro daquela natureza, ficando, consequentemente, subrogada nos direitos do condomínio lesado contra o lesante, proprietário da viatura que causou o incêndio e respectiva seguradora de responsabilidade civil, a ora R, invocando como base da sua pretensão o disposto no art. 441º do CCom.
Na 1ª instância foi proferida decisão a julgar procedente a invocada excepção de prescrição, por , na data em que ocorreu a citação –que a A. não requereu como «urgente» - já se ter consumado o prazo prescricional de 3 anos, contados da data da ocorrência do incêndio no imóvel : fundando-se a pretensão da A. na figura da subrogação ( e não na invocação do direito de regresso) o prazo de 3 anos, previsto no nº1 do art. 498º do CC, teria como termo inicial a ocorrência do facto danoso, e não a data do cumprimento da obrigação que gerou a subrogação a favor da seguradora, por o regime fixado no nº2 daquele preceito legal ser privativo dos casos em que a acção se funda no direito de regresso.
Inconformada, recorreu a A. para a Relação do Porto, que concedeu provimento à apelação, revogando a decisão recorrida por entender que - independentemente de a pretensão se fundar nas figuras da subrogação ou do direito de regresso – porque o facto jurídico de que emana o direito ao reembolso é sempre o pagamento, o termo inicial do prazo prescricional fixa-se na data desse cumprimento, e não na data do facto danoso, já que só após tal cumprimento o direito do credor subrogado pode ser exercido.
2.Inconformada com esta decisão interpôs a R. Fidelidade Mundial a presente revista, que encerra com as seguintes conclusões:
1. Porque, tendo em conta os factos que os autos nos fornecem a autora age na presente acção na qualidade de sub-rogada nos direitos que antes assistiam ao seu segurado;
2 . Aliás, conforme decorre do que dispunha o artigo 441° do código comercial, aplicável à situação dos autos, do que actualmente dispõe o artigo 136° da lei do contrato de seguro, e porque assim é qualificada em letra de lei no artigo 592° do código civil;
3 . porque sub-rogação consiste, como bem salienta o saudoso Prof. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, Almedina, volume 1, pág. 783 e 784, na "(...) transmissão das garantias e dos outros acessórios da esfera jurídica de lesado para a do (...) segurador, para quem o direito se transmite de armas e bagagens,
4 . E diferencia-se do que acontece com o chamado direito de regresso, que consiste numa figura jurídica que leva à constituição na esfera jurídica de um terceiro de um direito novo relativamente ao direito do lesado sobre o responsável pelos danos;
5 . Porque, assim sendo, e uma vez que à subrogada podem ser opostos os mesmos meios de defesa que ao credor originário - cfr. Acórdão do STJ, de 30.04.96, acessível na base de dados do itij, in http://www.dgsi.pt, sob o doc. n°s 0000000000;
6 . E que a responsabilidade da autora e da aqui recorrente perante o segurado daquela não é solidária, uma vez que a da autora é de natureza contratual e a da recorrente é, a verificar-se, de cariz extracontratual,
7 . Não tem, por isso, aplicação ao caso dos autos o disposto no artigo 497° do código civil;
8 . Porque de tudo quanto se deixou dito é insusceptível de aplicação ao presente processo o que dispõe o artigo 498°, n°2, do código civil, sob pena de, no limite, se poder transformar um prazo de prescrição de três anos em relação ao credor originário num prazo de prescrição de vinte anos relativamente ao credor sub-rogado, que substitui aquele,
9 . O início de contagem da invocada prescrição deve ser o da ocorrência do facto danoso - o incêndio - e não o do cumprimento da obrigação derivada do contrato outorgado entre a autora e o seu segurado,
10 . Ao decidir de forma diversa o douto acórdão em crise violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos artigos 497°, 498°, n° e 593° do código civil, pelo que, face ao que se deixa dito, e com o douto suprimento de Vossas Excelências,
deve ser concedida a revista e, em consequência, declarado que se encontra prescrito o direito invocado pela autora na presente acção, como é de JUSTIÇA.
A recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.
3. A Relação fixou a seguinte matéria de facto relevante para a dirimição da questão suscitada:
1) No..dia.05..de.Abril de 2003 deflagrou um incêndio na cave/garagem colectiva do 'Edifício..............', sito na Rua da ......., 1......./ 1...., Lavra, em Matosinhos (vide o documento de fls. 26 dos autos).
2) Em .14 de Agosto de .2003 a Autora pagou por isso a indemnização de 57.219,90 (cinquenta e sete mil, duzentos e dezanove euros, noventa cêntimos) - (vide o documento de fls. 55 dos autos).
3) Em.27 de .Janeiro de .2005 - data da assinatura do aviso de recepção - a Ré recebeu uma carta da Autora a solicitar-lhe o reembolso daquela quantia, tudo conforme ao registo de fls. 56, à missiva de fls. 57 e ao aviso de recepção de fls. 59 dos autos.
4) Em.31..de..Março..de.2006, a Autora interpôs a presente acção, por correio electrónico, conforme a menção aposta a fls. 12 dos autos.
5) E em 19 de Abril de.2006 foi a Ré citada na acção (vide o respectivo aviso de recepção que agora constitui o documento de fls. 65 dos autos).
4. Como dá nota o acórdão recorrido, a questão jurídica em debate no presente recurso, - consubstanciada na aplicabilidade do regime, atinente ao início da prazo prescricional de 3 anos, expressamente previsto para o direito de regresso no nº2 do art . 498º do CC, também às situações em que a pretensão do A. se funda na figura da subrogação – não é inédita na jurisprudência do Supremo, surgindo frequentemente colocada a propósito de situação equiparável à dos autos: a determinação do início do referido prazo prescricional nos casos m que o FGA , subrogado nos direitos do lesado a quem satisfez a indemnização, pretende obter, em via e regresso, o seu reembolso pelo lesante.
Ora, é possível detectar uma firme corrente jurisprudencial no sentido de que deve aplicar-se analogicamente o referido preceito legal, constante do nº2 do art. 498º, aos casos em que o direito ao reembolso, invocado pelo A., se funda na subrogação legal, e não na atribuição de um inovatório direito de regresso no plano das relações internas entre os vários devedores solidários, vinculados no confronto do credor. Como se afirma, por exemplo, no ac. de 17/12/07 (proferido no p. 02A3540):
. As dúvidas surgem, e prendem-se, com a questão de saber qual o momento em que inicia a contagem daquele prazo de 5 anos:
- data do acidente (13.9.91), como decidiu o acórdão recorrido; ou
- data em que o Fundo indemnizou o lesado (18.12.93), como defende o recorrente?
2.1. Para o primeiro termo da alternativa - data do acidente - apontam os elementos atrás recenseados acerca da natureza jurídica da sub-rogação e sua distinção do direito de regresso.
Na verdade, ao menos numa primeira aproximação poder-se-ia dizer que, sendo o crédito do sub-rogado o mesmo que pertencia ao antigo credor, e não um crédito novo, o devedor deveria poder opor ao sub-rogado os mesmos meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o credor primitivo.
Como assim, e no que especificamente respeita à prescrição, o prazo continuaria a correr contra o sub-rogado, como se do primitivo credor se tratasse (neste sentido, os acórdãos do STJ de 06.07.2000, CJSTJ, ano VIII, tomo II-148, e de 29.01.2002, Proc. nº 4176/01).
2.2. Propendemos para diferente entendimento, na linha dos já citados acórdãos de 13.04.200 e de 20.02.2001 (no mesmo sentido, veja-se ainda o acórdão do STJ de 23.05.2000, Proc. nº 438/00, e em sentido idêntico o acórdão, também do STJ, de 20.10.98, CJSTJ, ano VI, tomo 3-71).
Com efeito, pensamos que a resposta à questão tem de atender à substância e razão de ser das normas em confronto, privilegiando os interesses em jogo, sem se quedar por uma argumentação formalista e bastando-se com um raciocínio que se arrime apenas aos conceitos atrás precisados.
2.2.1. Como se sublinhou já, fulcro da sub-rogação e medida dos direitos do sub-rogado é o cumprimento.
Sendo a sub-rogação uma transmissão do crédito, fonte desta transmissão é, em todos os casos, o facto jurídico do cumprimento (Galvão Telles, "Obrigações", 3ª ed., p. 230).
Mas então, se a sub-rogação supõe o pagamento, não pode deixar de entender-se que antes dele não há ... sub-rogação.
Ou seja, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor (cfr. RLJ, ano 99º-360).
2.2.2. Não pode razoavelmente aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido).
É esta, precisamente, a situação aqui em causa.
Antes de satisfazer, por imperativo legal, a indemnização ao lesado, o A não é titular de qualquer direito de crédito que possa exercer em substituição do lesado - nomeadamente, não pode, antes de cumprir, interromper a prescrição mediante a propositura de acção contra o responsável civil (5).
Aliás, sublinhe-se, a solução que sustentamos encontra arrimo na própria letra da lei, na medida em que ela decorre, com alguma clareza, do nº 1 do citado artigo 25º do DL nº 522/85, ao estabelecer que o A fica sub-rogado ... "satisfeita a indemnização".
Ademais - uma vez a indemnização "satisfeita", e assim nascido o direito do A -, pode dizer-se que esse direito já só indirectamente tem como fundamento o acidente que determinou a indemnização, passando antes a basear-se no seu direito de ser reembolsado daquilo que pagou ao lesado (cfr. acórdão do STJ de 22.1.97, BMJ, nº 463-587).
2.3. De todo o exposto se conclui, fundadamente a nosso ver, que o prazo de prescrição do direito que a lei reconhece ao A se deve contar a partir do cumprimento, conforme prescreve o nº 2 do artigo 498º.
Certo que esta norma apenas dispõe, de forma directa e expressa, para o caso do direito de regresso entre os responsáveis, ao passo que, no caso do A, deparamos com um caso de sub-rogação.
Entendemos, porém, que, procedendo as razões justificativas da regulamentação estabelecida naquele nº 2, deve ela aplicar-se, por analogia, à situação em apreço.
No mesmo sentido, veja-se o ac. de 21/1/03, proferido na revista 4110-02 (inCJ/STJ I/03, pag.39) onde se considera:
3 - Com efeito, o direito de regresso assiste ao devedor solidário que houver satisfeito o direito do credor, além da parte que lhe competia no crédito comum, contra cada um dos condevedores pela quota respectiva - artigo 524º do Código Civil, diploma a que pertencerão os normativos que se indiquem sem menção da origem.
Por sua vez, a sub-rogação pode ser definida como a transmissão do crédito em favor daquele que, substituindo-se ao devedor, cumpre a obrigação a que este se encontrava adstrito - artigo 589º. Supõe sempre um pagamento feito por terceiro ao originário credor, ingressando esse terceiro na posição jurídica que o primitivo credor ocupava na relação obrigacional.
Ou seja, a sub-rogação é uma forma de transmissão do crédito, enquanto o direito de regresso constitui um crédito novo, que nem sequer tem o mesmo objecto do direito extinto (2).
Abordando a problemática da natureza jurídica da sub-rogação, escreve Antunes Varela: "A doutrina tradicional considera a sub-rogação como uma modalidade de transmissão do direito de crédito. Embora a sub-rogação assente no facto do cumprimento e este constitua a causa extintiva da obrigação por excelência, a circunstância de a satisfação do interesse do credor ser operada, não pelo devedor, mas por terceiro, ou com meios por este facultados, tem como efeito que o crédito, em lugar de se extinguir, transita de armas e bagagens para esse terceiro" (3).
Quer isto dizer que a sub-rogação envolve a transmissão de todas as garantias e outros acessórios do crédito (artigos 594º e 583º). E não é esse o regime que quadra a um direito ex novo, como o direito de regresso, nem à natureza própria da obrigação solidária, que está na base do direito de regresso.
Daí que o legislador, ao referir-se de forma diferente, por um lado, ao direito do "A" como sub-rogação (artigo 25º do diploma citado) e, por outro, ao direito de reembolso das Seguradoras, como direito de regresso (artigo 19º do mesmo diploma), o tenha feito intencionalmente, estando o fundamento da distinção de regimes na própria origem dos créditos.
Na verdade, a seguradora é, por força do contrato de seguro, directamente responsável perante a vítima até ao limite fixado na lei. Não tem, ao contrário do "A", função subsidiária.
4 - A sub-rogação do "A" nos direitos do lesado é a legal, operando-se a investidura do solvens na posição até então ocupada pelo credor ope legis (artigo 592º, nº 1).
Ora, de acordo com o nº 1 do artigo 593º, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam. Quer isto dizer que a sub-rogação coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito, se bem que limitado pelos termos do cumprimento, que pertencia ao credor primitivo (4).
Improcede, pois, a conclusão 1ª.
5 - Na busca da resposta para as restantes, configura-se como indispensável proceder à interpretação do artigo 498º do Código Civil, que assim dispõe:
"1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.
2. Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.
3. Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável".
Formulam-se, a propósito, quatro breves observações.
- Estabelece-se neste normativo um prazo especial de prescrição do direito de indemnização (embora sem prejuízo do prazo ordinário - 20 anos).
- Prazo que é de três anos, nas hipóteses previstas nos dois primeiros números.
- Porém, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo - situação que não é a dos presentes autos -, é este o prazo aplicável (nº 3).
- Sublinhem-se, por fim, as diferentes estatuições (constantes dos nºs 1 e 2), no tocante ao início da contagem do prazo de prescrição
- a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete (nº 1);
- a contar do cumprimento (nº 2).
Retomar-se-á, oportunamente, a problemática relativa ao início da contagem do prazo de prescrição (5).
6 - Ora, sem prejuízo do prazo (de vinte anos) correspondente à prescrição ordinária (contado sobre a data do facto ilícito - artigos 498º, nº 1, in fine, e 309º), o direito à indemnização fundada na responsabilidade civil está sujeito a um prazo curto de prescrição (três anos) (6).
Assim, tendo o "A" ficado sub-rogado no crédito do lesado, nos termos acima expostos, para que ora se remete, a situação dos autos é, inevitavelmente, subsumida ao disposto no nº 1 do mesmo artigo 498º, nos termos do qual "o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso".
Dito isto, o problema em equação não ficou, desde já resolvido.
7 - As dúvidas surgem, e prendem-se, com a questão de saber qual o momento em que se inicia a contagem daquele prazo de 3 anos:
- data do acidente (19-06-95), como decidiu o acórdão recorrido; ou
- data em que o "A" indemnizou o lesado (06-10-98), como (subsidiariamente) pretende o recorrente?
7.1.. Para o primeiro termo da alternativa - data do acidente - apontam os elementos atrás recenseados acerca da natureza jurídica da sub-rogação e sua distinção do direito de regresso.
Na verdade, ao menos numa primeira aproximação, poder-se-ia dizer que, sendo o crédito do sub-rogado o mesmo que pertencia ao antigo credor, e não um crédito novo, o devedor deveria poder opor ao sub-rogado os mesmos meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o credor primitivo.
Como assim, e no que especificamente respeita à prescrição, o prazo continuaria a correr contra o sub-rogado, como se do primitivo credor se tratasse (7).
7.2. Propendemos, porém, para diferente entendimento, na linha dos já citados acórdãos de 13.04.200 e de 20.02.2001 (8). Com efeito, pensamos que a resposta à questão tem de atender à substância e razão de ser das normas em confronto, privilegiando os interesses em jogo, sem se quedar por uma argumentação formalista e bastando-se com um raciocínio que se arrime apenas aos conceitos atrás precisados.
7.2.1. Como resulta do acima exposto, fulcro da sub-rogação e medida dos direitos do sub-rogado é o cumprimento.
Sendo a sub-rogação uma transmissão do crédito, fonte desta transmissão é, em todos os casos, o facto jurídico do cumprimento (Galvão Telles, "Obrigações", 3ª ed., p. 230).
Mas então, se a sub-rogação supõe o pagamento, não pode deixar de entender--se que antes dele não há ... sub-rogação.
Ou seja, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor (9).
7.2.2. Não pode razoavelmente aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido).
É esta, precisamente, a situação aqui em causa.
Antes de satisfazer, por imperativo legal, a indemnização ao lesado, o "A" não é titular de qualquer direito de crédito que possa exercer em substituição do lesado - nomeadamente, não pode, antes de cumprir, interromper a prescrição mediante a propositura de acção contra o responsável civil (10).
Aliás, sublinhe-se, a solução que sustentamos encontra arrimo na própria letra da lei, na medida em que ela decorre, com alguma clareza, do nº 1 do citado artigo 25º do DL nº 522/85, ao estabelecer que o "A" fica sub-rogado ... "satisfeita a indemnização".
Ademais - uma vez a indemnização "satisfeita", e assim nascido o direito do "A" -, pode dizer-se que esse direito já só indirectamente tem como fundamento o acidente que determinou a indemnização, passando antes a basear-se no seu direito de ser reembolsado daquilo que pagou ao lesado (11).
7.3. De todo o exposto se conclui que o prazo de prescrição do direito que a lei reconhece ao "A" se deve contar a partir do cumprimento, conforme prescreve o nº 2 do artigo 498º.
Certo que esta norma apenas dispõe, de forma directa e expressa, para o caso do direito de regresso entre os responsáveis, ao passo que, no caso do "A", deparamos com um caso de sub-rogação.
Entendemos, porém, que, procedendo as razões justificativas da regulamentação estabelecida naquele nº 2, deve ela aplicar-se, por analogia, à situação em apreço.
No mesmo sentido da aplicabilidade, por analogia, do regime contido no nº2 do art. 498º a situações em que o direito ao reembolso do demandante se funda na figura da subrogação, só se iniciando o prazo prescricional contra ele no momento em que ocorre o cumprimento da obrigação que gera a transmissão do crédito, podem citar-se ainda os acs do STJ de 22/2/04 (p. 04B404), de 17/11/05 (p.05B3061) e de 13/4/00 (p.00B200).
5.É a esta corrente jurisprudencial que inteiramente se adere.
Não se nega que – se nos movermos num plano estritamente lógico-jurídico, adoptando uma metodologia interpretativa que estaria mais próxima de uma « jurisprudência de conceitos»- poderia efectivamente ser-se levado a considerar que , assentando a subrogação legal na estrita ideia de transmissão do crédito ( que não sofre qualquer alteração objectiva), o transmissário sucederia estritamente na posição jurídica do transmitente, devendo, consequentemente, suportar, nos precisos termos em que a este eram oponíveis, as excepções contra ele invocáveis .
Não pode, porém, olvidar-se que tal diferenciação radical de regimes entre a subrogação e o direito de regresso, assente na respectiva fisionomia dogmática ou conceitual, e não na ponderação dos interesses que lhe vão subjacentes, acaba por conduzir a um tratamento injustificadamentediferenciado de situações que, de um ponto de vista material, não merecem a aplicação de regimes radicalmente divergentes ( podendo conduzir , em última análise, a uma verdadeira impossibilidade prática de obtenção pelo interessado do reembolso através da via da subrogação, bastando que tenha ocorrido uma dilação significativa – e não necessariamente imputável ao credor subrogado, podendo a demora radicar numa situação litigiosa quanto ao apuramento exacto dos danos causados pelo sinistro - entre os momentos do evento danoso e daquele em que se realizou o cumprimento que gera a subrogação).
E essa dualidade de tratamentos torna-se particularmente injustificável se tivermos presente que não tem havido no ordenamento jurídico uma separação , clara e estanque, entre o âmbito de aplicação das figuras da subrogação e do direito de regresso, não sendo poucos os casos em que se discute o enquadramento e qualificação jurídica do direito ao reembolso em certa situação específica, bem como aqueles em que tal fundamento tem oscilado ao longo do tempo e da sucessão de regimes legais ( veja-se o Ac de5/11/09, por nós relatado no p. 3162/08.5TBLRA.C1.S1).
Por outro lado, movendo-nos no plano da responsabilidade extracontratual, estamos confrontados com um prazo prescricional de curta duração – 3 anos – drasticamente encurtado relativamente ao prazo da prescrição ordinária, podendo facilmente transmutar-se num prazo exíguo ou insuficiente para o exercício do direito que, por subrogação, advém e quem cumpriu a obrigação no confronto do lesado e se pretende reembolsar à custa do lesante e principal responsável, colocando-o numa situação de excessiva onerosidade : na verdade, e como é óbvio, se esse prazo curto se contar a partir da originária ocorrência do facto danoso, irrelevando de todo, para tal efeito, o momento em que ocorreu o acto de cumprimento que gera a subrogação, o demandante fica inelutavelmente sujeito ao decurso desse prazo prescricional curto contado de um momento em que está absolutamente privado da possibilidade de exercer o direito aoreembolso, pela via da subrogação, - podendo facilmente tal prazo estar já inelutavelmente exaurido no momento em que o cumprimento teve lugar .
6.Nestes termos e pelos fundamentos apontados nega-se provimento à revista, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 25 de Março de 2010
Lopes do Rego (Relator)
Barreto Nunes
Orlando Nunes