CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
FUNDAMENTAÇÃO
MEDIDA CONCRETA DA PENA
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
Sumário

I - O artigo 77º nº 1 do Código Penal, estabelece as regras da punição do concurso de crimes.

II - Há concurso de crimes quando os crimes são praticados antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles.

III - O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes.

IV - A consequência jurídica do concurso de crimes é a condenação numa única pena.

V - Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

VI - O artigo 71º nº 3 do mesmo diploma determina que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena

VII - O critério – especial -, da determinação da medida da pena conjunta do concurso é feita em função das exigências gerais da culpa e da prevenção, e impõe que do teor da decisão conste uma especial fundamentação, em função de tal critério.

VIII - Embora não seja exigível o rigor e a extensão nos termos do nº 2 do mesmo preceito, nem por isso tal dever de fundamentação deixa de ser obrigatório, quer do ponto de vista legal, quer do ponto de vista material, e, sem prejuízo de que os factores enumerados no citado nº 2, podem servir de orientação na determinação da medida da pena do concurso. (Figueiredo dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 291).

IX – A decisão que opera o cúmulo, após audiência específica para o efeito, deve descrever um resumo ou síntese dos factos, identificando os crimes e as datas da sua prática, bem como das decisões condenatórias e respectivo trânsito em julgado, além das circunstâncias sobre a condição pessoal e económica de cada condenado, bem como dos seus antecedentes criminais, e em que termos a natureza e a gravidade dos factos reflecte a personalidade do respectivo agente ou a influenciou, para que se possa obter uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, ou revela pluriocasionalidade, com vista à fixação da medida concreta da pena conjunta dentro da moldura penal do concurso, bem com ainda a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).

X - Impende sobre o julgador um especial ónus de determinar e justificar quais os factores relevantes de cada operação de formação de pena conjunta, quer no que respeita à culpa em relação ao conjunto dos factos, quer no que respeita à prevenção, quer, ainda, no que concerne à personalidade e factos considerados no seu significado conjunto.

XI - A nível de culpa, numa perspectiva global dos factos, há que determinar a intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais.

XII - Importa também determinar os motivos e objectivos do agente constitutivos de denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.

XIII - As qualidades da personalidade do agente manifestada no facto devem ser comparadas com as supostas pela ordem jurídica, emitindo-se a partir daí, juízos, mais fortes ou mais acentuados, de valor ou desvalor.

XIV – A decisão recorrida mostra-se legalmente fundamentada, e por isso, não incorre em nulidade, se além de referir os ilícitos, as penas aplicadas, datas das decisões e respectivo trânsito, faz uma síntese dos factos dados como provados quer quanto à gravidade das ilicitudes, quer quanto à personalidade do arguido, e correlaciona conjuntamente os factos e personalidade do mesmo, explicando em que termos a natureza e a gravidade dos factos reflecte a personalidade do respectivo agente ou a influenciou, de forma a obter-se uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, ou revela mera pluriocasionalidade, bem como a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
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No processo comum em referência, foi realizada audiência de julgamento nos termos do artº 472º do CPP respeitante ao arguido AA, solteiro, sem profissão, nascido em 17 de Junho de 1984; natural de Torres Vedras; filho de BB e de CC; residente, antes de preso, na Rua C... M..., nº ..., 2º F..., em N... O..., actualmente recluso no Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, tendo o Tribunal Colectivo do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Oeiras, em obediência ao acórdão do S.T.J. proferido nos presentes autos em 13 de Janeiro de 2010,, proferido novo acórdão em 16 de Março de 2010, que decidiu :
“a) condenar o arguido AA, na pena conjunta de seis anos e seis meses de prisão, operado o cúmulo jurídico entre as penas impostas nos processos 819/02.9 PBOER, 907/02.3 PBOER, 1605/01.8 PBOER, 1786/00.8 PBOER e 330/02.7 PFCSC
b) condenar o arguido AA na pena conjunta de cinco anos e seis meses de prisão, operado cúmulo das penas aplicadas nos processos 12/04.5 PECSC, 24/05.1 PFOER, 2044/04.4 PBOER, 95/05.0 PECSC, 311/04.6 PFCSC e nos presentes autos nº 1022/04.8 PBOER.
O arguido cumprirá as penas conjuntas ora aplicadas de forma sucessiva e no seu cômputo será descontada toda a prisão ou detenção sofrida, nos termos do disposto no artº 80 e ss. do C.P..
Sem custas.
Notifique e deposite.
Após trânsito, remeta boletim à D.S.I.C. e extraia certidão desta decisão e remeta aos processos supra identificados e ainda ao T.E.P. e ao E.P. onde se encontra detido o arguido, solicitando ao processo à ordem do qual se encontra preso a emissão de mandados de desligamento/ligamento, afim de o arguido passar a cumprir à ordem destes autos, a pena única em que ora foi condenado.
Cumpra o disposto no art.º.477º do CPP.”

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Inconformado, recorre o arguido, apresentando as seguintes conclusões na motivação do recurso:

1. Realizados os cúmulos jurídicos foi o arguido condenado nas penas conjuntas de 6 anos e 6 meses e 5 anos e 6 meses de prisão, totalizando 12 anos de prisão, pena de que se recorre.
2. O Acórdão sofre de falta de fundamentação.
3. Entende o recorrente que o acórdão que se limita a referir os ilícitos, as penas aplicadas e os factos dados como provados não referindo as circunstâncias em que os mesmos foram cometidos, a gravidade dos mesmos e personalidade e postura do agente pelo que carece de fundamentação.
4. Ao não ter fundamentado, ainda que sucintamente, o acórdão o Tribunal "a quo" violou o art. 77º n° 1 do C.P. e o art. 374º n° 2 do CPP, pelo que, salvo opinião contrária, é nulo acórdão por força do art. 379 nº1 al. a) do CPP.
5. Quanto aos cúmulos jurídicos realizados que fixaram em duas penas conjuntas de 6 anos e 6 meses e 5 anos e 6 meses respectivamente totalizando 12 anos de pena de prisão, o arguido considera-a pouco criteriosa e desequilibradamente doseada, face à factualidade dada como provada em juízo e ao direito concretamente aplicável.
6. O Tribunal "a quo" não fez uma actualização da personalidade do recorrente e das necessidades de prevenção geral e especial a serem tidas em conta na ponderação das penas a aplicar.
7. O Tribunal "a quo" não ponderou o facto do arguido ser bastante jovem quando praticou os crimes e ter apenas 20 anos à data da prática do último crime.
8. O Tribunal “a quo" omitiu o facto de estarmos perante um conjunto de crimes de gravidade mediana, praticados num mesmo quadro pessoal muito característico, quando tal é reconhecido nas sentenças e acórdãos constantes dos processos que abrangem os dois cúmulos elaborados, tudo isto em claro desfavor do ora recorrente;
9. O Tribunal "a quo" não teve em conta o facto de não existirem registos de ofensas físicas graves praticadas pêlo recorrente, tratando-se pois de crimes de pequena Indústria e de gravidade média.
10. O relatório social junto aos autos de 6 de Abril de 2009 para efeitos da elaboração do cúmulo jurídico é uma cópia quase integral do realizado em 26 de Novembro de 2007, não plasmando urna evolução do impacto da situação jurídico-penal actual.
11. A reinserção social do arguido na sociedade não foi tida em conta.
12. Este foi o primeiro contacto do recorrente com o sistema prisional.
13. Até à presente data o arguido não teve possibilidade de demonstrar perante a sociedade a sua reabilitação uma vez que nunca mais esteve em liberdade.
14. O recorrente tem 25 anos de idade e encontra-se em reclusão desde os 20 anos.
15. Não existe mais nenhum processo contra o recorrente.
16. O arguido está arrependido e já interiorizou o seu comportamento do qual não se orgulha revelando juízo de censura sobre o mesmo.
17. O arguido frequenta o ensino escolar, em meio prisional e apresenta motivação para a sua valorização pessoal.
18. O recorrente pugna pela redução das duas penas conjuntas para 5 anos e 3 meses relativamente ao Primeiro Cúmulo e para 4 anos e 3 meses no que se refere ao Segundo Cúmulo, perfazendo um total de 9 anos e 6 meses de prisão.
19. Ao não ter valorado na sua decisão do cúmulo jurídico todos os elementos invocados pelo recorrente na motivação violou o Tribunal "a quo" o disposto nos artºs. 71° e 77° do Código Penal.
20. Ao não se entender desta forma está o Tribunal "a quo" a fazer uma errada interpretação do principais ínsitos nos arts. 70 e 71° do Código Penal.
Nestes termos,
E, nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso merecer provimento e as duas penas cumulatórias a aplicar ao arguido deverão ser reduzidas respectivamente para 5 anos e 3 meses relativamente ao Primeiro Cúmulo 9, para 4 anos e 3 meses, no que se refere ao Segundo Cúmulo.
Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
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Respondeu o Ministério Público à motivação de recurso concluindo:

1 - A fundamentação exigível em actos decisórios como a decisão ora impugnada prende-se no essencial com os factos e a personalidade do agente como elementos a considerar, em conjunto, na fixação da pena, tal como o define o art.° 77°, n.º 1, do Código Penal.
2 - O acórdão recorrido identifica concretamente a espécie e número de crimes, os tempos da suas práticas e das respectivas condenações, as penas aplicadas, a história e as condições sócio-económicas, familiar e profissional do agente, os pressupostos do concurso em presença e a moldura penal abstracta aplicável, o que satisfaz plenamente as exigências de fundamentação.
3 - O recorrente foi condenado na pena conjunta de seis anos e seis meses de prisão, operado o cúmulo jurídico entre as penas impostas nos processos 819/02.9 PBOER, 907/02.3 PBOER, 1605101.8 PBOER, 1786/00.8 PBOER e 330102.7 PFCSC e na pena conjunta de cinco anos e seis meses de prisão, operado cúmulo das penas aplicadas nos processos 12/04.5 PECSC, 24/05.1 PFOER, 2044/04.4 PBOER, 95/05.0 PECSC, 311/04.6 PFCSC e nos presentes autos nº 1022/04.8 PBOER.
4 - Estando exemplarmente apreciado o conjunto dos factos, o prolongado decurso temporal, a personalidade do arguido e a sua propensão para a prática do tipo de ilícitos em apreço, conforme fls. 607/608 do douto acórdão recorrido e contrariamente ao pretendido pelo recorrente, é bom de ver pelas molduras penais aplicáveis que não se configuram como absolutamente nada excessivas as penas conjuntas aplicadas.
5 – Pelo que deverá ser mantido o douto acórdão recorrido,
Vossas Excelências decidirão como for de JUSTIÇA.
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Neste Supremo o Dig.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto Parecer “no sentido da improcedência do presente recurso.” onde, além do mais, assinala:

“1. Emitindo parecer sobre o mérito do recurso dir-se-á que o recurso tal como vem configurado e resulta das respectivas conclusões coloca à apreciação deste Supremo Tribunal as questões referentes à nulidade do acórdão (arts. 379.°, n.º 1 a) e 374.°. n.º 2, ambos do CPP) e à medida das penas únicas aplicadas que o recorrente quer ver reduzidas
O acórdão recorrido foi proferido após acórdão anterior ter sido anulado por este Supremo Tribunal, corrigindo cabalmente, a meu ver, as deficiências que lhe tinham sido apontadas.
No meu parecer anterior. tomei posição (fls. 534 a 544) detalhada sobre as questões que então se suscitavam também relacionadas com a fundamentação do acórdão e medida da pena.
No que se refere à fundamentação do acórdão e à nulidade que o recorrente continua a invocar. mantêm toda a validade as considerações que então formulei, tanto mais que o novo acórdão não deixou de fazer um resumo sucinto dos factos relacionados com as penas parcelares e mais não lhe era exigível I .[ I ACSTJ de 5.02.09 - Rec. n.º ] 07/09-5º]
Daí que, remetendo para o parecer anterior, se tenha a fundamentação utilizada no acórdão recorrido como suficiente com o consequente afastamento da nulidade invocada pelo arguido/recorrente.
2. Em relação, á medidas das penas e ao modo de determinação dos respectivos cúmulos tal como efectuados pelo acórdão recorrido, é bom de ver que entendo nenhuma censura se lhe deve dirigir.
A única objecção que anteriormente colocara ao desfazer do cúmulo inicial, prendia-se com o respeito do princípio da reformatio in pejus, o qual, contudo, foi assegurado no presente acórdão.
Por isso, resta-me, mais uma vez, remeter para as considerações que a esse respeito já formulei e defender a manutenção da decisão recorrida, já que as penas aplicadas, a cumprir sucessivamente, se mostram perfeitamente adequadas ás circunstâncias, não justificando de forma alguma as críticas do recorrente.”
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No douto Parecer anterior aludido, considerou o mesmo Dig.mo Magistrado:

“ 2. No que se refere à nulidade invocada entende o recorrente que o acórdão se limita a referir os ilícitos, bem como a penas aplicadas, sem caracterizar, ainda que de forma sucinta, as características essenciais desses factos, e as circunstâncias em que foram cometidos, o que levaria à aludida nulidade.
A este propósito, a jurisprudência deste Supremo Tribunal vem tomando posição no sentido de que:
I - Não é necessário, nem desejável, que a decisão que efectua um cúmulo jurídico de penas, todas já transitadas em julgado, venha enumerar os factos provados em cada uma das sentenças onde as penas parcelares foram aplicadas. Isso seria um trabalho inútil e que não levaria a uma melhor compreensão do processo lógico que conduziu à pena única.
II - Mas, será desejável que o tribunal faça um resumo sucinto desses factos, por forma a habilitar os destinatários da sentença, incluindo o Tribunal Superior, a perceber qual a realidade concreta dos crimes anteriormente cometidos, cujo mero enunciado legal, em abstracto, não é em regra bastante. Como também deve descrever, ou ao menos resumir, os factos anteriormente provados e os que se provem na audiência do cúmulo que demonstrem qual a personalidade, modo de vida e inserção social do agente, principalmente na actualidade” - ACSTJ de 5.02.09 – Rec. n.º 107/09-5ª.
E, por isso, são frequentes as decisões, como no ACSTJ de 21.05.09 – Rec. n.º 2218/05.0GBABF.S1-3ª, que em relação a tais anomalias se decide pela anulação:
Tendo em consideração que:
- o acórdão cumulatório recorrido não contém, como deveria, uma referência sintética aos factos que motivaram as diversas condenações do recorrente, já que apenas refere os tipos legais cometidos, as respectivas penas, e as datas da prática das infracções;
- sem o conhecimento de como se manifestou a personalidade do arguido na prática daquelas infracções, impossível se torna avaliar qual o grau de conexão entre os diversos crimes, e consequentemente determinar em que medida poderemos falar de pluriocasionalidade ou antes de tendência para o crime por parte do arguido;
- também quanto à personalidade do arguido o acórdão recorrido é manifestamente insuficiente, pois apenas alude ao período pós-prisional, desconhecendo-se completamente o historial de vida que consta do relatório social, bem como se existem ou não antecedentes criminais;
- só a inclusão no acórdão dos elementos de facto, ainda que em súmula, referentes aos crimes incluídos no concurso e à personalidade do arguido, permitirá ao tribunal a consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente que será o fundamento da determinação da medida da pena do concurso, conforme dispõe o n.º 1 do art. 77.º do CP;
é de concluir que, não constando da decisão recorrida a respectiva fundamentação de facto, a mesma é nula, por omissão de pronúncia, nos termos dos arts. 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. a), do CPP”.

3. No caso, se é óbvio que o acórdão recorrido se limitou à descrição das condenações (qualificações, penas, datas das infracções e datas das decisões), também não deixou de acrescentar os factos relativos às condições pessoais do arguido que permitem caracterizar a sua personalidade e respectiva evolução.
E, para além disso, não deixou de em apreciação do conjunto fáctico apurado salientar que:
“A prática das infracções num período que vai dos anos de 2000 a 2005, todas reportadas a crimes de furto qualificado e roubo, as necessidades de prevenção especial e a sua personalidade (a ausência de hábitos laborais, a sua jovem idade), apontando para uma propensão para a prática reiterada deste tipo de ilícito criminal, bem como as necessidades de prevenção geral, atenta a frequência com que ocorrem factos semelhantes, e a gravidade mediana dos factos”.
Logo, ainda que de forma sintética, estão reunidos os pressupostos que permitem aquilatar, como impõe a lei, se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente a uma “carreira”) criminosa, ou tão só uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, em ordem a determinar a pena única.
Daí que, no seguimento da posição de que, “A fundamentação no caso de concurso de infracções, afasta-se da fundamentação geral prevista no art. 374.º, n.º 2 do CPP, tudo se resumindo a uma especial e imprescindível fundamentação onde avultam, na fixação da pena unitária, a valoração em conjunto, dos factos enquanto “guia” e a personalidade do agente, mas sem o rigor e a extensão pressuposta nos factos de fixação da pena prevista no art. 71.º do C. Penal” ACSTJ de 09.04.08 - Rec. n.º 1125/08/5ª., se entenda que no caso a fundamentação concretamente expendida pelo colectivo deve ter-se como suficiente, tanto mais que a este Supremo Tribunal não estará vedado o conhecimento dos elementos constantes das certidões que consubstanciam as várias condenações do arguido.
É certo que se pode apontar ao acórdão recorrido a não indicação da data dos trânsitos das condenações tidas em conta, elemento indispensável, ao contrário da data da condenação, à consideração da pluralidade de crimes para efeito de aplicação de uma pena única.
O trânsito em julgado da condenação que primeiramente tiver ocorrido por qualquer dos crimes praticados anteriormente é o limite determinante e intransponível, conforme jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal desde 1997.
De todo o modo, também esses elementos podem ser colhidos das certidões juntas aos autos e estão devidamente indicados no quadro que a seguir se indica.
4. Finalmente, temos o pedido de redução da pena única que o recorrente fundamenta colocando a tónica da sua argumentação no facto de não terem sido devidamente valorados determinados aspectos, tais como a actualização da personalidade do agente, a sua reinserção social, a sua idade, tem 24 anos e encontra-se em reclusão desde os 20, sem outros processos pendentes contra ele e o estar arrependido com interiorização do seu comportamento do qual se não orgulha.

4.1. Caberia, assim, tomar posição sobre a pena única em questão e verificar se na sua determinação foi violado o disposto no art. 77.º do CP.
Nessa determinação são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, e a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (n.ºs 1 e 2 do art. 77.º).

4.2. É o seguinte o quadro das penas a considerar:
ProcessoCrimesData trânsitoPenasData infracção
819/02Roubo21.10.03 – certidão de fls. 198 a 20614 meses susp06.05.02
907/02Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qualific.
Furto qual tent.
Furto qual tent.
Furto qual tent.
9.05.05 certidão de fls. 349 a 3752 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
2 anos e 6 meses
1 ano e 6 meses
1 ano e 6 meses
1 ano e 6 meses
5 anos em cúmulo
Entre 9/10-5-02 e 3-2-03
12/04Furto qualific.19.09.05 – certidão de fls. 425 a 434 e 4482 anos e 6 meses05.01.04
1605/01Furto qualific. 4.11.05 – certidão de fls. 162 a 1751 ano e 7 meses 30.11.01
24/05Roubo 8.11.05 – certidão de fls. 147 a 1591 ano e 6 meses16.01.05
2044/04Roubo
Roubo
14.03.06 – certidão de fls. 178 a 1911 ano e 6 meses
1 ano e 6 meses
2 anos em cúmulo
17.12.04

95/05Roubo. 7.02.07 – certidão de fls. 415 a 42418 meses
Em cúmulo de todas as penas anteriores – 9 anos
14.02.05
1786/00Roubo20.12.07 – certidão de fls. 340 a 34718 meses23.12.00
311/04Furto qual tent
Roubo
4.09.07 – certidão de fls. 450 a 46318 meses
3 anos e 6 meses
Em cúmulo – 4 anos
22.04.04
1022/04Roubo
Furto
24.01.08 – acórdão dos presentes autos 1 ano e 3 meses
6 meses
Em cúmulo – 1 ano e 6 meses
16.06.04
15.06.04



4.3. Perante tal quadro, deve, antes de mais, retomar-se a ideia de que o trânsito em julgado da condenação que primeiramente tiver ocorrido por qualquer dos crimes praticados anteriormente é o limite determinante e intransponível para efeitos de punição do concurso de crimes com uma pena única.
Ou seja, todos os crimes praticados antes de transitar em julgado a condenação por um deles devem determinar a aplicação de uma pena única, independentemente do momento em que seja conhecida a situação de concurso, que poderá ocorrer supervenientemente por razões de contingências processuais.
E, a isto, deve acrescentar-se que o chamado “cúmulo por arrastamento” – que abrangeria crimes anteriores às condenações (transitadas em julgado) de cada um dos processos em concurso – é solução hoje abandonada pelo Supremo Tribunal de Justiça.
Ora, perante tal quadro e a consideração daquilo que deve ser entendido como concurso ou sucessão de crimes, temos que a primeira condenação do arguido transitada em julgado foi proferida no Proc. n.º 819/02, em 21.10.03.
Por isso, em situação de concurso com essa condenação estão apenas as condenações proferidas nos Procs. 907/02, 1605/01 e 1786/00, referentes a factos ilícitos praticados antes dessa data.
Depois disso, verifica-se que do conjunto de crimes cometidos pelo arguido/recorrente e não incluídos nesse primeiro concurso surge como decisão transitada em julgado em 1º lugar, em 19.09.05, a proferida no Proc. n.º 12/04 e que todas as infracções das restantes condenações ocorreram antes dessa data.
Dito isto, significa que o arguido cometeu dois grupos de infracções separadas pela condenação (transitada em julgado) de uma delas - limite determinante e intransponível para efeitos de punição -, pelo que não estando todas em situação de concurso, devem realizar-se dois cúmulos com as penas a cumprir sucessivamente nos termos do disposto no art. 63.º do CP.
Daí que se deva considerar um primeiro cúmulo, com referência ao primeiro trânsito - em 21.10.03 (Proc. n.º 819/02) - que abrange as penas seguintes:
14 m + 2 a e 6 m + 2 a e 6 m+2 a e 6 m + 2 a e 6 m + 2 a e 6 m + 2 a e 6 m + 2 a e 6 m + 2 a e 6 m + 1 a e 6 m + 1 a e 6 m + 1 a e 6 m + 18 m = 27 anos e 11 meses.
Para um moldura penal: entre 2 anos e 6 meses a 27 anos 11 meses, sem que a pena possa ultrapassar os 25 anos.
E um segundo cúmulo, com referência às infracções cometidas após aquela data, todas abrangidas pela segunda decisão transitada em julgado, em 19.09.05, (Proc. n.º 12/04) e englobando as seguintes condenações/penas:
2 a e 6 m + 1 a e 6 m +1 a e 6 m + 18 m + 18 m + 3 a e 6 m + 1 a e 3 m + 9 m = 15 anos e 2 meses.
Para um moldura penal: entre 3 anos e 6 meses a 15 anos 2 meses.

4.4. Haveria assim a ponderar os factos e a personalidade do arguido, designadamente que, adoptado aos 4 anos de idade teve um percurso escolar marcado por dificuldades comportamentais e menor aproveitamento; iniciou o consumo de haxixe com cerca de 11 anos; habilitado com o 7.º ano de escolaridade iniciou actividade laboral caracterizada pela indiferenciação, inconstância e elevada mobilidade entre postos de trabalho; a degradação das referências familiares, apesar dos esforços dos familiares, foi-se acentuando, persistindo a sua vontade em permanecer na rua sem nenhum tipo de regras e supervisão, culminando na sua saída definitiva de casa, em Abril de 2001.
À data da reclusão, o arguido subsistia há cerca de 4/5 anos num quadro existencial de mera sobrevivência, caracterizado pelo desenquadramento socio-familiar e laboral pela precariedade generalizada e pela ausência de estruturas de supervisão ou de monitorização do seu comportamento. Recorria a expedientes para assegurar as despesas necessárias à sua manutenção quotidiana e mantinha hábitos de consumo regular de haxixe.
Num plano mais pessoal apresenta características de imaturidade e impulsividade, revelando baixa auto-estima, fraca capacidade de resistência a situações de frustração emocional e baixo índice de persistência face à prossecução dos seus objectivos. Denota uma deficiente interiorização dos mecanismos de interacção social convencionalmente aceites, que facilmente negligencia, especialmente quando em contextos de maior vulnerabilidade.
Vindo a revelar, na globalidade, um percurso prisional marcado por alguns episódios de desadequação às normas, ainda que pouco expressivos em termos de gravidade e frequência, verificou-se um agravamento recente da sua conduta, o que justificou a actual transferência institucional cumprindo pena em regime de separação da restante população prisional. Frequentou, com subsequente desistência, o ensino escolar em meio prisional revelando actualmente motivação pela frequência de actividades formativas ou laborais, que não lhe foram ainda proporcionadas por razões comportamentais.
A isto acresce que a conduta delituosa tida em conta decorreu entre 23 de Outubro de 2000 e 14 de Fevereiro de 2005, e está toda relacionada com a prática de crimes de furto, qualificados ou não, e roubos.

4.5. Com esse enquadramento factual o tribunal recorrido, ainda que sinteticamente, relevou especialmente o conjunto dos factos, o prolongado decurso temporal, a personalidade do arguido patenteada nas decisões proferidas e a apontar para uma propensão para a prática reiterada deste tipo de ilícitos para, no contexto global de todas as condenações que pressupunha uma moldura penal entre os 3 anos e 6 meses a 43 anos e 1 mês, sempre com o limite dos 25 anos, aplicar uma pena única de 12 anos de prisão que, no fundo, traduz a adição à pena mínima de praticamente 1/5 do remanescente.
E é com este quadro em perspectiva que se deve perguntar se tem o recorrente razão ao pretender a valorização das circunstâncias já aludidas nas quais pretende ver uma melhoria do seu processo de ressocialização, onde foi acompanhado pelo Ministério Público ou, pelo contrário, a razão está do lado do acórdão recorrido ao considerar que esses sinais não são ainda consistentes ou colocar toda a ênfase na elevada necessidade de prevenção especial.
Sem embargo de se reconhecer algum progresso no comportamento assumido do arguido, a verdade é que dificilmente se pode apelidar o tempo de reclusão sofrido como exemplar em face do provado “percurso prisional marcado por alguns episódios de desadequação às normas”, com agravamento recente e que de alguma forma está expresso nas suas “características de imaturidade e impulsividade, com baixa auto-estima, fraca capacidade de resistência a situações de frustração emocional e baixo índice de persistência face à prossecução dos seus objectivos
Ou seja, a visão optimista do recorrente não tem grande suporte na matéria de facto tida por relevante, sendo certo que a referência que é feita à figura do “consumidor problemático de drogas” na excelente resposta do Ministério Público junto da 1ª instância, não colhe total apoio na mesma matéria de facto, que se fica pela menção de que o arguido se iniciou no consumo de haxixe com cerca de 11 anos e que à data da reclusão mantinha hábitos de consumo regular de haxixe.
Este Supremo Tribunal, sempre sem prescindir das circunstâncias do caso concreto, tem lançado mão de um factor de compressão das penas parcelares que se adicionam a pena parcelar mais elevada, que, no comum dos casos, aponta para a redução a 1/3 dessas penas adicionáveis, embora sem prescindir da necessária adequação a outros em que ela juridicamente se justifique Cfr. ACSTJ de 9.02.06 – Rec. n.º 109/06-5ª..
No caso, tendo em conta os factos já realçados e em particular a gravidade dos crimes praticados e o já longo período de tempo em que decorreram, o comportamento anterior e posterior este também de carácter disciplinar ocorrido ainda no interior dos Estabelecimentos Prisionais, e em sentido mais positivo alguns indícios de recuperação e a idade ainda jovem do recorrente, parece poder concluir-se, sem grandes dúvidas, que o colectivo foi sensível aos elementos positivos neles referenciados, apontando para a necessária e desejada reinserção do condenado em face do circunstancialismo concreto dos factos, mas sem esquecer o seu passado criminal, reduzindo por isso mesmo a pena única para quantitativo que revela um factor de compressão superior ao critério indicado, o que, a meu ver, traduzindo um benefício razoável para o arguido em função da esperada inflexão de conduta, se mostra perfeitamente adequado ás circunstâncias do caso e ainda capaz de permitir a reinserção do recorrente, não justificando de forma alguma as suas críticas.

4.6. É altura de retomar as considerações que se fizeram a propósito da realização do cúmulo e de como no caso, a meu ver, erradamente se consideraram englobadas no concurso uma série de condenações que deveriam levar à realização de dois cúmulos, nos termos acima apontados.
Acontece que o recurso foi interposto apenas pelo arguido e a aplicação do critério que se tem como correcto na determinação dos dois cúmulos, a cumprir sucessivamente, levaria na prática a que o arguido viesse prejudicada a sua situação em virtude de recurso por ele interposto.
Em circunstâncias idênticas este Supremo Tribunal já decidiu da seguinte forma:
I - Tem entendido o STJ, sem discrepância, que resulta directa e claramente dos art.°s 77.° e 78.° do CP de 1995 que, para a verificação de uma situação de concurso de infracções a punir por uma única pena, se exige, desde logo, que as várias infracções tenham, todas elas, sido cometidas antes de ter transitado em julgado a condenação imposta por qualquer uma delas, isto é, o trânsito em julgado da condenação imposta por uma dada infracção obsta a que, com essa infracções ou com outras cometidas até esse trânsito, se cumulem infracções que venham a ser praticadas em momento posterior a esse mesmo trânsito. O trânsito em julgado de uma condenação penal é um limite temporal intransponível, no âmbito do concurso de crimes, à determinação de uma pena única, excluindo desta os crimes cometidos depois.
II - Consequentemente, tem também entendido o STJ que o cúmulo dito "por arrastamento", não só contraria os pressupostos substantivos previstos no art. 77.°, n.° 1, do CP, como também ignora a relevância de uma condenação transitada em julgado como solene advertência ao arguido, quando relativamente aos crimes que se pretende abranger nesse cúmulo, uns são anteriores e outros posteriores a essa condenação, pelo que como tal, não deve ser aceite.
III - Importaria esta tomada de posição, que se mantém firme, a revogação do acórdão recorrido, porventura a sua anulação, uma vez que se imporia, para o acatamento desta jurisprudência, a precisão das datas do trânsito de todas e cada uma das condenações parcelares, com vista a determinação da extensão exacta do cumulo jurídico em causa, dele se havendo então de excluir as penas que, «por arrastamento», indevidamente, o tribunal a quo, contra legem, ali decidiu englobar, de resto, sem fundamentação ou arrimado numa fundamentação irrelevante, porque, afinal pouco menos que «voluntarista».
IV - Porém, tratar-se-ia de acto inútil, a anulação ou mesmo a sua revogação nessa vertente. Com efeito, estando em causa, como está, apenas o recurso do arguido, uma vez que o Ministério Público se satisfez com a decisão proferida, importa respeitar o princípio da proibição da reformatio in pejus imposto pelo art. 409.°, n.° 1, do CPP.
V - E o afastamento in casu do indevido arrastamento das penas aplicadas por crimes cometidos depois do trânsito em julgado de uma ou mais condenações, implicando concomitantemente, cúmulos materiais das respectivas penas sucessivas, claramente redundaria em modificação para mais da medida da pena de prisão, o que o falado princípio não permite” Cfr. ACSTJ de 19.04.07 – Rec. n.º 901/07-5ª..
A clareza expositiva e o bem fundado da douta decisão dispensam outros comentários que não a adesão plena a tal doutrina, com todas as suas consequências, ou seja, ainda que por razões não totalmente coincidentes com o acórdão recorrido, a defesa da sua manutenção.

5. Termos em que se emite parecer no sentido da improcedência do presente recurso.”
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Cumpriu-se o disposto no artigo 417º nº 2 do CPP.
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Não tendo sido requerida audiência, seguiu o processo para conferência, após os vistos legais.
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Consta do acórdão recorrido com referência ao arguido:

“Foi julgado e condenado (por decisões transitadas em julgado) no âmbito dos seguintes processos:

1) Por Acórdão de 06.10.2003, transitado em 21/10/03 (Processo n.º 819/02.8PBOER, do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., cometido em 06.05.2002, na pena de 14 (catorze) meses de prisão, cuja execução foi declarada suspensa pelo período de 2 anos e que foi objecto de revogação por decisão proferida em 30.05.2006, determinando-se o cumprimento da mesma. Provou-se, além do mais, que o arguido empurrou de encontro a uma parede o ofendido, fazendo-o cair ao solo, após o que lhe arrancou do bolso das calças um telemóvel no valor de €150,00.

2) Por Acórdão de 22.04.2005, transitado em 09/05/05 (Processo n.º 907/02.0PBOER, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática de oito crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 203º nº 1 e 204º nº 2 al e) do C.P., na pena de 2 (dois) anos e 6 meses de prisão por cada um deles e de três crimes de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 203º n.º 1 e 204º nº 2 al e), do C.P, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão por cada um deles, todos praticados entre 9-10/05/2002 e 03/02/2003; operado cúmulo jurídico destas penas parcelares foi o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido em onze ocasiões distintas, se dirigiu à Estação Agronómica de Oeiras, saltou o muro de vedação, introduziu-se em vários edifícios, partindo vidros de janelas, forçando portas e janelas, trepando a janelas de casas de banho, retirando em oito das vezes do seu interior diverso material. Mais concretamente retirou : cinco computadores (sendo 3 portáteis), 4 monitores, 4 impressoras, 1 mesa de digitalização, 1 fax, 1, balança, 2 ventoinhas, 1 par de colunas, 1 máquina de café, 2 drives, 1 transferidor, 1 fotocopiadora, 1 máquina fotográfica, 1 modem, 1 lupa,, diversos CD’s e ferramentas – tudo no valor global de € 13.981,71. Alguns dos referidos objectos foram recuperados.

3) Por sentença de 04.07.2005, transitado em 19/09/05 (Processo n.º 12/04.5PECSC, do 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais), pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203º nº 1 e 204 nº 1 al a) e nº 2 al e), com referência ao art. 202º al a) e e) todos do CP., praticado no dia 05.01.2004, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido se dirigiu a um consultório, partiu a janela e introduziu-se neste, retirando do seu interior 1 máquina fotográfica 1 computador portátil, 1 monitor, 1 palm pilot, chave, tudo no valor de € 5.294,30 e ainda € 147,00 em dinheiro.

4) Por sentença de 20.10.2005, transitado em 4/11/05 (Processo nº 1605/01.8PBOER, do 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais), pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo arts. 203º nº 1 e 204º nº 1, al f), ambos do CP, praticado no dia 30.11.2001, na pena de 1 (um) ano e 7 (sete) meses de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido, acompanhado de dois indivíduos, introduziu-se na residência da ofendida, através do portão da garagem que estava fechado no trinco e retirou do interior daquela 3 telemóveis avariados, 1 discman, 1 máquina fotográfica, diversos documentos e várias jóias, tudo de valor não apurado.

5) Por Acórdão de 24.10.2005, transitado em 08/11/05 (Processo n.º 24/05.1PFOER, do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., praticado a 16.01.2005, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido retirou ao ofendido 1 telemóvel no valor de € 75,00, € 5,00 em dinheiro, 1 discman com CD no valor de € 75,00 e uma bicicleta no valor de € 175,00.

6) Por Acórdão de 27.02.2006, transitado em 14/03/06 (Processo n.º 2044/04.4PBOER, do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática de dois crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., praticados a 17.12.2004, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão por cada um deles e, em cúmulo jurídico, na pena única de 2 (dois) anos de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido juntamente com três indivíduos, abordaram dois ofendidos, revistaram-lhes os bolsos e retiraram a um deles 1 relógio, 2 telemóveis e dinheiro, tudo no valor de € 220,00 e ao outro ofendido retiraram € 12,00 em dinheiro.

7) Por Acórdão de 23.01.2007, transitado em 07/02/07 (Processo nº 95/05.0PECSC, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., praticado a 14.02.2005, na pena de 18 meses de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido retirou do bolso do ofendido um telemóvel no valor de € 90,00.

8) Por Acórdão de 25.09.07 (Proc. 95/05, melhor identificado em 7), foi o arguido condenado na pena única de nove anos de prisão (englobadas as penas aplicadas nos processos supra identificados de 1 a 7).

9) Por sentença de 26.06.2007, transitada em 11/07/07 (Processo nº 330/02.7 PFCSC do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais), pela prática de dois crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., praticados em 27.03.2002 e 22/04/2002, na pena de 14 meses de prisão por cada um e em cúmulo na pena única de 19 meses de prisão. Provou-se, além do mais, que no dia 27/03/02 o arguido retirou ao ofendido, menor de idade, um telemóvel no valor de € 175,00 e no dia 22/04/02 retirou a outro ofendido, no interior de uma escola, um telemóvel no valor de € 550,00.

10) Por sentença de 11.01.2007, transitada em 20/12/07 (Processo nº 1786/00.8 PBOER do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras), pela prática, em 23/12/2000, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 do C.P., na pena de 18 meses de prisão. Provou-se, além do mais, que o arguido, acompanhado de mais dois indivíduos, desferiu vários socos e pontapés em várias partes do corpo do ofendido, determinantes de 7 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho, tendo-lhe retirado 1 telemóvel no valor de esc. 24.900$00, dinheiro e 1 maço de tabaco. Um dos companheiros do arguido exibiu uma faca ao ofendido, tendo também agredido este com socos e pontapés.

11) Por sentença de 20.07.2007, transitada em 04/09/07 (Processo nº 311/04.6 PFCSC do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais), pela prática, em 22/04/2004, de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 203º, nº1, 204º, nº 2, al. e), 22º, 23º e 73º, todos do C.P. na pena de dezoito meses de prisão; de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º n.º 1 e 2, al. b) do C.P., na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão; em cúmulo, na pena única de 4 anos de prisão. Provou-se, além do mais, que no dia 22/04/04 o arguido partiu o vidro da montra de um estabelecimento comercial, nele se introduziu e retirou 1 câmara digital e 1 monitor de computador, no valor global superior a € 1.000, tendo sido surpreendido pelo guarda-nocturno. No dia 21/10/04, o arguido, acompanhado de outro indivíduo, agarrou o ofendido pelos braços e atirou-o ao chão, enquanto o seu companheiro apontava uma faca ao pescoço do ofendido. Assim, retirou-lhe 1 telemóvel no valor de € 100,00 e € 25,00 em dinheiro.

12) Por sentença de 12.12.2007, proferida no âmbito do presente Processo nº 1022/04.8 PBOER do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, transitada em 24/01/08, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelos arts. 210º n.º 1, 73º e 74º do C.P. ex vi do artº 4º do D.L. 401/82, de 23/09, praticado em 16.06.2004, na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão; de um crime de furto, praticado em 15/06/04, p. e p. pelos artºs. 203º, nº 1, 73º e 74º do C.P. ex vi do artº 4º do D.L. 401/82, de 23/09, na pena de 6 (seis) meses de prisão; em cúmulo na pena única de um ano e seis meses de prisão. Provou-se, além do mais, que em cada um dos dias 15/06/04 e 16/06/04 o arguido abordou um ofendido, de 13 e 15 anos de idade, respectivamente, e retirou a cada um telemóvel, respectivamente no valor de € 400,00 e € 220,00, tendo exibido a um deles um ferro.
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13) O arguido foi adoptado com cerca de 4 anos de idade.
14) O seu percurso escolar foi marcado por dificuldades comportamentais e fraco envolvimento nas tarefas lectivas, contexto agravado, durante a frequência do 2. ° Ciclo, por absentismo. Aderiu a grupo de pares com o mesmo tipo de condutas, iniciando-se, neste contexto, no consumo de haxixe, com cerca de 11 anos de idade. Aos 13 anos, após a frequência de vários estabelecimentos de ensino, ingressou na Casa Pia de Lisboa, onde frequentou um curso de relojoaria.
15) Contrariando a vontade familiar, abandonou aquela instituição aos 16 anos, estando habilitado com o 7.°Ano de escolaridade. Iniciou então actividade laboral, caracterizando-se pela indiferenciação, inconstância e elevada mobilidade entre postos de trabalho.
16) A comunicação com as suas referências familiares foi-se degradando e o arguido passou a frequentar a casa de forma intermitente, regressando ao agregado apenas para efeitos de satisfação de necessidades pessoais prementes. Apesar dos esforços dos familiares, a vontade do mesmo em permanecer na rua, sem nenhum tipo de regras e supervisão, inviabilizaram qualquer mudança do seu estilo de vida, culminando na sua saída definitiva de casa, em Abril de 2001.
17) À data da reclusão, o arguido subsistia há cerca de 4/5 anos num quadro existencial de mera sobrevivência, caracterizado pelo desenquadramento sócio-familiar e laboral pela precariedade generalizada e pela ausência de estruturas de supervisão ou de monitorização do seu comportamento. Recorria a expedientes para assegurar as despesas necessárias à sua manutenção quotidiana e mantinha hábitos de consumo regular de haxixe.
18) Num plano mais pessoal apresenta características de imaturidade e impulsividade, revelando baixa auto-estima, fraca capacidade de resistência a situações de frustração emocional e baixo índice de persistência face à prossecução dos seus objectivos. Denota uma deficiente interiorização dos mecanismos de interacção social convencionalmente aceites, que facilmente negligencia, especialmente quando em contextos de maior vulnerabilidade.
19) Vindo a revelar, na globalidade, um percurso prisional marcado por alguns episódios de desadequação às normas, ainda que pouco expressivos em termos de gravidade e frequência, verificou-se um agravamento recente da sua conduta, o que justificou a actual transferência institucional cumprindo pena em regime de separação da restante população prisional. Frequentou, com subsequente desistência, o ensino escolar em meio prisional, revelando actualmente motivação pela frequência de actividades formativas ou laborais, que não lhe foram ainda proporcionadas por razões comportamentais.
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Cumpre apreciar e decidir:

Inexistem vícios de que cumpra conhecer nos termos do nº 2 do artº 410º do CPP.

Invoca o recorrente a nulidade do acórdão nos termos dos arts. 374º n° 2 e 379 nº1 al. a) do CPP alegando que sofre de falta de fundamentação, porque se limita a referir os ilícitos, as penas aplicadas e os factos dados como provados não referindo as circunstâncias em que os mesmos foram cometidos, a gravidade dos mesmos e personalidade e postura do agente.
Todavia não tem razão.
Como se sabe, o artigo 77º nº 1 do Código Penal, estabelece as regras da punição do concurso, dispondo: “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.”
E o artigo 71º nº 3 do mesmo diploma determina que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena.
Este critério especial, da determinação da medida da pena conjunta do concurso – que é feita em função das exigências gerais da culpa e da prevenção – impõe que do teor da decisão conste uma especial fundamentação, em função de tal critério. Só assim se evita que a medida da pena do concurso surja consequente de um acto intuitivo, da apregoada e, ultrapassada arte de julgar, puramente mecânico e, por isso arbitrário.
Embora não seja exigível o rigor e a extensão nos termos do nº 2 do mesmo artº 72º, nem por isso tal dever de fundamentação deixa de ser obrigatório, quer do ponto de vista legal, quer do ponto de vista material, e, sem prejuízo de que os factores enumerados no citado nº 2, podem servir de orientação na determinação da medida da pena do concurso. (Figueiredo dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 291).
Como salienta Maia Gonçalves (Código Penal Português Anotado e comentado 18ª ed, pág. 295, nota 5) “na fixação da pena correspondente ao concurso entra como factor a personalidade do agente, a qual deve ser objecto de especial fundamentação na sentença.
A decisão recorrida ao determinar a medida concreta da pena do cúmulo em relação a cada condenado – objecto de audiência especificamente para esse efeito –, há-de correlacionar conjuntamente os factos e a personalidade de cada um deles no domínio do ilícito, de modo a caracterizar a dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, na valoração do ilícito global perpetrado.
Deve descrever um resumo ou síntese dos factos, identificando os crimes e as datas da sua prática, bem como das decisões condenatórias e respectivo trânsito em julgado, além das circunstâncias sobre a condição pessoal e económica de cada condenado, bem como dos seus antecedentes criminais, e em que termos a natureza e a gravidade dos factos reflecte a personalidade do respectivo agente ou a influenciou, para que se possa obter uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, ou revela pluriocasionalidade, com vista à fixação da medida concreta da pena conjunta dentro da moldura penal do concurso, bem com ainda a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
Ora, a decisão recorrida obedece à fundamentação necessária imposta por lei, não se limitando a referir os ilícitos, as penas aplicadas, datas das decisões e respectivo trânsito, pois que faz uma síntese dos factos dados como provados quer quanto à gravidade das ilicitudes, quer quanto à personalidade do arguido, e de forma a concluir se os ilícitos resultaram de actuação pluriocasional ou de tendência criminosa, descrevendo o necessário para a valoração do ilícito global perpetrado, na ponderação conjunta dos factos e personalidade,
Inexiste, assim, a nulidade invocada, nem outras se afiguram de que cumpra conhecer nos termos do artº 410º nº 3 do CPP.
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O recorrente não discute as regras metodológicas, ou a operação de realização dos cúmulos, que pelas razões constantes da decisão recorrida, se afiguram legalmente correctas.
Apenas questiona a determinação da medida concreta da pena conjunta, pugna pela redução das duas penas conjuntas para 5 anos e 3 meses relativamente ao Primeiro Cúmulo e para 4 anos e 3 meses no que se refere ao Segundo Cúmulo, perfazendo um total de 9 anos e 6 meses de prisão, alegando que o Tribunal “a quo” ao não ter valorado na sua decisão do cúmulo jurídico todos os elementos invocados pelo recorrente na motivação, referidos nas conclusões 8 a 17ª da motivação, violou o disposto nos artºs. 71° e 77° do Código Penal.
Mas também aqui não tem razão.
Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema da acumulação material, é forçoso concluir que com a fixação da pena unitária pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda que se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente.(v. artºs 77º nº 1 e, 78º nº1, ambos do CP)
O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes.
Afastada a possibilidade de aplicação de um critério abstracto, que se reconduz a um mero enunciar matemático de premissas, impende sobre o juiz um especial ónus de determinar e justificar quais os factores relevantes de cada operação de formação de pena conjunta, quer no que respeita à culpa em relação ao conjunto dos factos, quer no que respeita à prevenção, quer, ainda, no que concerne à personalidade e factos considerados no seu significado conjunto.
Um dos critérios fundamentais em sede deste sentido de culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais. Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.
As qualidades da personalidade do agente manifestada no facto devem ser comparadas com as supostas pela ordem jurídica e a partir daí se emitam juízos, mais fortes ou mais acentuados, de valor ou desvalor.

Ora, a decisão recorrida explica em que termos a natureza e a gravidade dos factos reflecte a personalidade do respectivo agente ou a influenciou, de forma a obter-se uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, ou revela mera pluriocasionalidade, bem como a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).

A decisão que efectua o cúmulo jurídico de penas, demonstra a relação de proporcionalidade que existe entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação – conjunta - dos factos e da personalidade, e , sem prejuízo de que os factores enumerados no citado nº 2, do artº 71º do CP, podem servir de orientação na determinação da medida da pena do concurso.
Na verdade como consta da decisão recorrida:
“Assim, a pena mínima aplicável no primeiro cúmulo é de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, por ser a mais elevada das penas parcelares a cumular e a pena máxima é de 25 (vinte e cinco) anos, correspondente ao limite máximo da pena de prisão, já que a soma aritmética das penas a cumular excede o mesmo.

No cúmulo subsequente a pena mínima é de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, por ser a mais elevada das penas parcelares a incluir no cúmulo, e a pena máxima aplicável é de 15 (quinze) anos e 3 (três) meses, correspondente à soma aritmética das penas em concurso.

Na determinação da pena única a aplicar ao arguido há que ponderar o conjunto de todos os factos, o grau de ilicitude dos mesmos, o grau de culpa, as exigências de prevenção especial, a personalidade do agente, as necessidades de prevenção geral, atenta a natureza, o número de crimes cometidos.

Primeiro cúmulo
Os crimes em causa foram praticados de Dezembro de 2000 a Fevereiro de 2003, reportam-se a 4 crimes de roubo (dois deles mediante violência – proc. 819/02 e 1786/00, ascendendo o valor dos bens subtraídos a € 999,00) e 12 crimes de furto qualificado, sendo três deles na forma tentada (um dos crimes ocorreu numa residência e os restantes onze em instalações da Estação Agronómica, ascendendo o valor dos bens subtraídos a € 13.981,71). Á data dos factos o arguido tinha entre 16 a 19 anos de idade, verificando-se ausência de hábitos laborais, apontando já para uma propensão para a prática reiterada dos tipos de ilícitos criminais de furto e de roubo. O arguido iniciou o consumo de haxixe com 11 anos de idade, revelando absentismo escolar. Após conclusão do 7º ano de escolaridade abandonou a escola e iniciou actividade laboral, de forma inconstante. Acabou por abandonar o agregado familiar definitivamente em Abril de 2001, permanecendo na rua. Nos últimos 4-5 anos antes da reclusão o arguido vivia num quadro de mera sobrevivência, mantendo o consumo de haxixe. No meio prisional o arguido tem tido comportamentos desadequados, tendo sofrido sanções, sendo que nos últimos tempos manifestou interesse nas actividades formativas ou laborais.
As necessidades de prevenção especial são muito fortes.
São também elevadas as necessidades de prevenção geral, atenta a frequência com que ocorrem factos semelhantes.
Afigura-se, assim, adequada a pena conjunta de seis anos e seis meses de prisão.”
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Segundo Cúmulo
As infracções em concurso foram praticadas no período de Janeiro de 2004 a Fevereiro de 2005 e constituem seis crimes de roubo (actuando em conjunto com terceiros em duas situações – proc. 2044/04 e 311/04, usando de violência neste último, e exibindo um ferro ao ofendido no proc. 1022/04, ascendendo o valor dos bens subtraídos a € 1.397,00), dois crimes de furto qualificado, sendo um deles na forma tentada e um crime de furto simples (tendo por objecto um estabelecimento comercial e um consultório, sendo os bens em causa no valor de € 6.411,30).
À data da prática dos factos o arguido tinha 20-21 anos de idade.
Atendendo, ainda, ao demais circunstancialismo acima descrito e às considerações acima feitas, entende-se adequada a aplicação da pena unitária de cinco anos e seis meses de prisão”.
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Na verdade, o arguido que nasceu em 17 de Junho de 1984 foi adoptado com cerca de 4 anos de idade, tendo o seu percurso escolar sido marcado por dificuldades comportamentais e fraco envolvimento nas tarefas lectivas, (contexto agravado, durante a frequência do 2. ° Ciclo, por absentismo.)
Aderiu a grupo de pares com o mesmo tipo de condutas, ( iniciando-se, neste contexto, no consumo de haxixe, com cerca de 11 anos de idade. Aos 13 anos, após a frequência de vários estabelecimentos de ensino, ingressou na Casa Pia de Lisboa, onde frequentou um curso de relojoaria.)
Contrariando a vontade familiar, abandonou aquela instituição aos 16 anos, estando habilitado com o 7. ° Ano de escolaridade.
Iniciou então actividade laboral, caracterizando-se pela indiferenciação, inconstância e elevada mobilidade entre postos de trabalho.
A comunicação com as suas referências familiares foi-se degradando e o arguido passou a frequentar a casa de forma intermitente, regressando ao agregado apenas para efeitos de satisfação de necessidades pessoais prementes.
Apesar dos esforços dos familiares, a vontade do mesmo em permanecer na rua, sem nenhum tipo de regras e supervisão, inviabilizaram qualquer mudança do seu estilo de vida, culminando na sua saída definitiva de casa, em Abril de 2001.
À data da reclusão, o arguido subsistia há cerca de 4/5 anos num quadro existencial de mera sobrevivência, caracterizado pelo desenquadramento sócio-familiar e laboral, pela precariedade generalizada e pela ausência de estruturas de supervisão ou de monitorização do seu comportamento. (Recorria a expedientes para assegurar as despesas necessárias à sua manutenção quotidiana e mantinha hábitos de consumo regular de haxixe.)
Num plano mais pessoal apresenta características de imaturidade e impulsividade, revelando baixa auto-estima, fraca capacidade de resistência a situações de frustração emocional e baixo índice de persistência face à prossecução dos seus objectivos. Denota uma deficiente interiorização dos mecanismos de interacção social convencionalmente aceites, que facilmente negligencia, especialmente quando em contextos de maior vulnerabilidade, vindo a revelar, na globalidade, um percurso prisional marcado por alguns episódios de desadequação às normas, ainda que pouco expressivos em termos de gravidade e frequência.
Verificou-se um agravamento recente da sua conduta, o que justificou a actual transferência institucional cumprindo pena em regime de separação da restante população prisional.
Frequentou, com subsequente desistência, o ensino escolar em meio prisional, revelando actualmente motivação pela frequência de actividades formativas ou laborais, que não lhe foram ainda proporcionadas por razões comportamentais.

É evidente a carência de ressocialização do arguido com tendência delituosa, e padrões de comportamento desajustados e rebeldes integração comunitária, tendo praticado os factos na orla temporal de 2001 a 2005.
Os crimes praticados, pela sua natureza, variedade, e persistência, denotam gravidade acentuada na violação do bem jurídico atingido, e a personalidade do arguido projectada nos factos e revelada por estes, denota que o arguido manifesta propensão para o crime, sem propósito manifestado de socialização, apesar de se encontrar em cumprimento de pena, o que reclama maior acuidade na ponderação do efeito previsível da pena no comportamento futuro do agente, uma vez que na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado. (v.Ac. deste Supremo e desta 3ª Secção, de 09-01-2008 in Proc. n.º 3177/07 .)

Tendo em conta o exposto, as exigências de prevenção geral e os limites legais das penas aplicáveis, e intensidade da culpa do arguido, conclui-se que não são excessivas, e não se mostram desproporcionadas as penas aplicadas em cúmulo, que por isso são de manter.
O recurso não merece provimento.
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Termos em que, decidindo:

Acordam os deste Supremo – 3ª Secção -, em negar provimento ao recurso, e, confirmam, o acórdão recorrido

Tributam o recorrente em 5 Ucs de taxa de justiça.



Supremo Tribunal de Justiça, 30 de Junho de 2010

Pires da Graça ( Relator)
Raúl Borges