I - O recurso de revisão é abrangido pelas garantias de defesa, constitucionalmente consagrado, no art. 29.º, n.º 6, da CRP ao dispor que os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão de sentença e à indemnização pelos danos sofridos
II - Em casos de injustiça notória, as legislações contemporâneas não tornam perene o caso julgado, sendo certo, por outro lado, que face à razão de ser do instituto do caso julgado, também não aceitam ad libitum a revisão de sentença transitada, outrossim, acolhendo as legislações “uma solução de compromisso entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, solução que se revê na consagrada possibilidade limitada de revisão de sentenças penais” (Maia Gonçalves in CPP Anotado – Legislação Complementar, 17ª edição, págs. 159 e 160).
III - Em processo penal não existe um verdadeiro ónus da prova em sentido formal; nele vigora o princípio da aquisição da prova ligado ao princípio da investigação, donde resulta que são boas as provas validamente trazidas ao processo, sem importar a sua origem, devendo o tribunal, em último caso, investigar e esclarecer os factos na procura da verdade material.
IV - Perante as provas admissíveis, é dos princípios gerais da produção da prova que o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, sem prejuízo do contraditório.
V -O CPP não enumera taxativamente as provas proibidas, mas aponta limites à produção de provas e à sua valoração. Assim, considera métodos proibidos de prova os indicados no art. 126.º do CPP.
VI - Quanto à proibição de valoração de provas, como resulta do art. 355.º do CPP, não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, ressalvando-se apenas as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas.
VII - E, como se sabe, não são inconstitucionais os normativos do art. 355.º do CPP, interpretados no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida. (Ac. do TC 87/99 de 10-02, Proc. n.º 444/98, in DR II-A, de 01-07-99).
VIII - O recurso de revisão não se destina a ajuizar dos termos de produção de um determinado meio de prova efectivado na altura própria no decurso da audiência e julgamento e da forma como foi valorada a prova, para isso servem os recursos ordinários, mas a descobrir que serviram de fundamento à revisão provas proibidas nos termos dos n.º s 1 a 3 do art. 126.º.
IX - O recurso de revisão como recurso extraordinário não é um recurso ordinário, nem sucedâneo deste, pelo que perante provas legalmente permitidas e valoradas que serviram de suporte a determinada decisão, e que veio a transitar em julgado, não pode infirmar-se essa decisão com fundamento nessas provas, em sede de recurso extraordinário de revisão, nem alegar-se a inconstitucionalidade das mesmas, se o caso julgado não se encontra posto em causa por decisão vinculativa do TC, nos termos dos art. 282.º n.º s 1 e 2 da CRP, nem se posteriormente à mesma decisão não existiu qualquer descoberta de que as provas produzidas foram obtidas de forma legalmente proibida.
A) Como se vê, apesar de se dizer na fundamentação da sentença recorrida não ter sido possível o reconhecimento, o facto é que se baseia a condenação do Arguido essencialmente no reconhecimento que dele terá feito o ofendido através da descrição que dele fez e das fotografias constantes dos autos, valorado livremente pelo Juiz. nos termos do disposto no art. 127° do CPP (ainda que, na sentença, não se mencione expressamente esse dispositivo).
B) A "declaração de reconhecer" não obedeceu a nenhum dos requisitos previstos no art. 147° do CPP.
C) Não se perguntou ao ofendido, autor da "declaração de reconhecer" e subscritor do "auto de reconhecimento" constante dos autos por quaisquer circunstâncias que pudessem influir na credibilidade da identificação, não tendo a identificação sido cabal, não se chamaram duas pessoas que apresentassem semelhanças com a pessoa a identificar, nem se colocou essa, presencialmente, junta com elas, e tendo o reconhecimento sido feito por fotografia, não foi seguido dessa outra forma de reconhecimento, como o exigem os n°s 1, 2 e 5 do art. 147° do CPP.
D) E se, no caso, o "reconhecimento" ou "declaração de reconhecer" não obedece a qualquer desses requisitos, nos termos do disposto no n° 7 da mesma disposição legal, não pode valer como prova, seja qual for a fase do processo, em que haja ocorrido.
E) É inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, consagradas no n° 1 do artigo 32° da Constituição, a norma constante do artigo 127° do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo artigo 147° do Código de Processo Penal".
F) A reserva da vida privada das pessoas, garantida constitucionalmente no art. 26°, n° 1 da Lei Fundamental compreende o direito à imagem, aí também expressamente referido, e com este se protege, além do mais, a utilização de fotografias das pessoas sem o seu consentimento - cfr. ainda arts. 79° e 80° do CC.
G) No caso, aquando da prestação de declarações do Arguido, em 6 de Maio de 1997, não lhe foram tiradas quaisquer fotografias, e, na sequência do pedido do Digno Magistrado do Ministério Público, no sentido de que fossem tiradas fotografias ao Arguido com vista ao seu reconhecimento, quando lhe foram as mesmas tiradas, antes de 6 de Fevereiro de 1998, não lhe disseram para que eram, e, nesse dia-, também nada lhe informaram, nem nada foi por este dito, e, muito menos, expressado o seu consentimento fosse por que forma fosse e, menos ainda, no sentido de que as fotografias colhidas se destinassem ao seu reconhecimento no âmbito do processo.
H) Apesar disso, em 15 de Março de 1999, foram as fotografias assim retiradas; ao Arguido, e só estas exibidas ao ofendido com vista a permitir o seu reconhecimento por esse.
I) Note-se que a descrição que o ofendido faz do Arguido aquando da exibição das fotografias é uma descrição absolutamente vaga, que assentaria bem a cerca de 50% dos homens portugueses, e, também, que a coincidência de afirmar o ofendido que o Arguido, no dia dos factos, quase 3 anos antes, estava vestido da mesma maneira que aparece nas fotografias, apenas, de acordo com a normalidade das coisas, pode significar que lhe foram primeiramente exibidas as fotografias e que foi influenciado por estas na descrição e "reconhecimento" do Arguido".
J) Pelo que, naturalmente, por essas fotografias há-de ter sido influenciado nas declarações que terá prestado perante o Digno Tribunal em audiência de julgamento, em que lhe foram as mesmas exibidas.
K) Assim, a prova proibida do "auto de reconhecimento", sem as formalidades legais, influenciou directa e decisivamente a "declaração de reconhecimento" prestada em audiência de julgamento, a qual, aliás, é, em si, e igualmente, prova proibida por, de novo, constituir reconhecimento sem as formalidades legais.
L) Representam, pois, as fotografias tiradas ao Arguido, sem o seu consentimento, com vista ao seu reconhecimento no âmbito do inquérito que precedeu o presente processo, e a sua efectiva utilização para esse fim, em sede de inquérito e, depois, em audiência de julgamento, uma intromissão na vida privada daquele.
M) E nem se diga que o Arguido, pelo facto de como tal ter sido constituído, está sujeito à recolha de provas fotográficas, nos termos do disposto no art. 61°, n° 3, al. d), do CPP, e, por isso, não teria que dar o seu consentimento para que lhe fossem tiradas as fotografias em causa para o fim acima referido e para que nesse fossem utilizadas.
N) É que, por um lado, sempre teria de ser informado dos direitos que lhe assistiam, no caso, o de exigir ser reconhecido em painel nos termos do disposto no art. 147° do CPP, cfr. n° 1, ai. h), daquele art. 61° do CPP e direito esse que lhe foi coarctado e, por outro lado, a verdade é que está o Arguido, pelo facto de o ser, apenas sujeito à recolha de provas especificadas na lei, e esse não é o caso da prova por reconhecimento fora do âmbito imperativamente determinado pelo art. 147° do CPP.
O) Assim, é inconstitucional o "reconhecimento" efectuado em sede de inquérito, como o feito em sede de julgamento, e como a decisão recorrida que o valorou de fornia absolutamente essencial, por violação das garantias de defesa 'do Arguido asseguradas no n° 1 do art. 32° da Lei Fundamental, mas, também, no n° 6 da mesma disposição.
P) E, ainda por violação do art. 11°, n° 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 6o, n° 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que consagram a presunção de inocência até a prova legal da culpabilidade e que assumem foros de constitucionalidade por força do disposto nos arts. 8° e 16° da CRP.
Q) Assenta, pois, a decisão recorrida numa prova proibida e, logo, nula, nos termos do disposto no art. 126°, n°s 1 e 3, do CPP.
R) Pelo que se verifica o fundamento para o recurso de revisão previsto no art. 449°,n°l,al. e), do CPP.
S) E pelo que, a final, atenta a influência decisiva que a prova proibida e nula teve no processo e o facto de o ter decisivamente contaminado, não poderá o Arguido deixar de ser absolvido.
TERMOS EM QUE DEVE REVER-SE A DECISÃO RECORRIDA, DETERMINANDO-SE A IMEDIATA SUPENSÃO DA PENA APLICADA AO ARGUIDO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 457°, N° 2, DO CPP,
E, A FINAL, ANULAR-SE AQUELA DECISÃO, DETERMINANDO-SE A RESTITUIÇÃO DO ARGUIDO Á SITUAÇÃO JURÍDICA ANTERIOR Á CONDENAÇÃO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 461°, N° 1, DO CPP,
E COMO O IMPÕE O DIREITO E A
JUSTIÇA.
Respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público à motivação do recurso, formulando as seguintes conclusões:
1º)- O ora recorrente/arguido, AA, alegou, no presente recurso «...prova proibida e, logo, nula, nos termos do disposto no art. 126°, n°s 1 e 3, do CPP...», o que seria «...fundamento para o recurso de revisão previsto no art. 449°, n°l, ai. e), do CPP», posto que a sua condenação, no processo comum tribunal colectivo n°520/00.7TBABT, se teria baseado, «...essencialmente no reconhecimento que dele terá feito o ofendido através da descrição que dele fez e das fotografias constantes dos autos, valorado livremente pelo Juiz, nos termos do disposto no art. 127° do CPP ...».
2º)- Contudo, a 05-06-2008, foi proferido o acórdão no processo comum tribunal colectivo n°520/00.7TBABT, transitado em julgado, sem que tivesse sido, então, interposto e motivado recurso ordinário, pelo ora recorrente, v. g. com base na ora alegada nulidade.
3º)- Atentas as anotações à ai. e) do n° 1 do art. 449° do CPP, por PAULO PINTO de ALBUQUERQUE, Comentário do Código de Processo Penal, 3ª edição, Universidade Católica Editora, Abril, 2009, desde logo, podemos concluir pela inconstitucionalidade daquele normativo legal, da norma legal, ora invocada pelo recorrente, para o seu recurso de revisão.
4ª)- Mas, mesmo que a norma da ai. e) do n° 1 do art. 449° do CPP, invocada pelo recorrente, não fosse inconstitucional, sempre deveríamos concluir pela sua não aplicação ao caso concreto.
5ª)- Na verdade, estatui o art. 449°, n°1, al.e) do CPP que: «A revisão da sentença transitada em julgado é admissível quando: 5e descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n°s 1 a 3 do artigo 126º » (sublinhado nosso).
6ª)- Ora, a alegada «...prova proibida e, logo, nula, nos termos do disposto no art. 126°, n°s 1 e 3, do CPP...», que seria «...fundamento para o recurso de revisão previsto no art. 449°, n°l, ai. e), do CPP», posto que a condenação do arguido se teria baseado, «...essencialmente no reconhecimento que dele terá feito o ofendido através da descrição que dele fez e das fotografias constantes dos autos, valorado livremente pelo Juiz, nos termos do disposto no art. 127° do CPP ...»; prova em "declaração de reconhecer" que não teria obedecido «...a nenhum dos requisitos previstos no art. 147° do CPP», não se descobriu, agora, pois o arguido já, então, na data da publicação da decisão que "deixou" transitar em julgado, conhecia aqueles fundamentos da sua condenação, as alegadas «...provas proibidas nos termos dos n°s 1 a 3 do artigo 126º ».
7ª )- Deveria, então, por isso, o arguido, ora recorrente, no prazo legal, em apropriado recurso ordinário, ter impugnado aquela decisão, o que não fez.
Pelo exposto, indeferindo-se o pretendido recurso extraordinário de revisão, se fará JUSTIÇA.
Nos termos do artº 454º do CPP, o Senhor Juiz prestou a seguinte informação:
“o arguido AA interpôs o presente recurso extraordinário de revisão, nos termos do artigo 449°, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Penal, alegando, em síntese, terem servido de fundamento à condenação provas proibidas nos termos do artigo 126°, n.o 1 a 3 do Código Penal.
O Ministério Público respondeu, pugnando pelo indeferimento do recurso extraordinário de revisão interposto pelo arguido.
Cumpre proferir despacho com informação acerca do mérito da revisão, nos termos do disposto no artigo 4540 do Código de Processo Penal.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, o recurso de revisão em apreço carece de mérito, porquanto não resulta inequívoco dos autos que o respectivo fundamento invocado pelo arguido resulte de qualquer conhecimento superveniente de factos.
O arguido, podendo fazê-lo, não interpôs em momento próprio recurso ordinário do acórdão proferido nos autos, o qual veio, por isso, a transitar em julgado, pelo que se encontra assim precludida a possibilidade de o mesmo vir agora sindicar os meios de prova que serviram de fundamento à sua condenação nos autos.
O recurso de revisão não deve ser mais uma instância de recurso ordinário, pelo que falecem por completo os pressupostos do presente recurso.
Termos em que se emite informação acerca do mérito do pedido, consignando-se a falta do mesmo. “
"A nulidade da prova proibida prejudica a sentença (... ) se a prova proibida tiver sido utilizada na fundamentação da decisão (".). A sentença fundada em provas nulas ( ... ) é, também ela, nula, nos termos do artigo 122.°, n.°l. ( ... ) O fundamento do recurso da sentença ou do despacho para conhecimento de uma nulidade da prova proibida reside no artigo 410.°, n,03, do CPP ( ... ) (Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 3.a ed., pág. 321). Assim, deveria o recorrente ter optado pela via normal de recurso, estando esta já precludida pelo decurso do prazo, não podendo agora alegar a "descoberta" de que serviu de fundamento à condenação prova proibida, de forma a socorrer-se do disposto pela alínea e) do n.º 1do artigo 449.° do Código de Processo Penal.
«O efeito de caso julgado, decorrente da apreciação do mérito do recurso de fiscalização concreta, está, pois, circunscrito ao âmbito do "processo-base" em que se enxertou o recurso para o Tribunal Constitucional» (CarIos Lopes do Rego, in Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, pág. 299).
Assim, não pode o recurso extraordinário de revisão, também nesta parte, proceder, por falta de fundamento legal.
Neste Supremo, a Digma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer onde, além do mais, refere:
“O arguido/recorrente AA interpõe recurso de revisão ao abrigo do disposto no art. 449°, n° 1 e) do CPP, fundamentando o seu pedido em ser prova proibida a reconhecida como fundamentação da sentença -
declarações do ofendido que o identificou porque as diligências no inquérito o terão influenciado, embora o disposto nos arts. 147° do CPP viole o n° 1 do art. 32° da Constituição, o art. 11° n° 1 dos Direitos do Homem e 6°, n° 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
O arguido/recorrente defende, essencialmente que o auto de reconhecimento sem as formalidades legais influenciou directa e decisivamente "a declaração de reconhecimento" prestada em audiência de julgamento a qual, aliás, é em si e igualmente prova proibida, por de novo, constituir reconhecimento sem formalidades.
O arguido/recorrente foi julgado tendo aceite a sua condenação, pois dela não recorreu não tendo, atempadamente e enquanto teve esse direito, posto em causa nem as provas obtidas no inquérito, nem as provas apresentadas em julgamento, quando beneficiou do princípio do contraditório.
Só agora depois de não ter cumprido a condição que lhe foi estabelecida para a medida da pena não se tomar efectiva no seu cumprimento é que parece apresentar um verdadeiro recurso ordinário e não um recurso extraordinário de revisão.
1. - O recurso extraordinário de revisão, direito também reconhecido constitucionalmente entre no n° 6 do art. 29° da Constituição, apresenta-se com o um ensaio legislativo com vista ao estabelecimento do equilíbrio entre a imutabilidade da sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de respeito perla verdade material (In recursos em Processo Penal, Simas Santos e Leal Henriques, 163), visando «a averiguar em que medida é que, no caso, os novos factos ou as novas provas apresentadas são susceptíveis de abalar a convicção do tribunal, em matéria de facto, sem perder de vista, obviamente, os factos já dados por provados na decisão condenatória e a prova em que se basearam» (ac. do STJ de 27.11.2008, p. 1131/08).
Os fundamentos do recurso de revisão p. no art. 449°, n° 1 agora em vigor, abrangem a descoberta de novos factos ou meios de prova que de per si ou combinados com os que constam na decisão, suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação (aI. d) e ainda as provas proibidas que serviram de fundamento à condenação (aI. e).
O arguido/recorrente vem tentar pôr em causa ou criar dúvidas sobre as diligências instrutórias que não foram directamente considerados fundamentos da prova no acórdão e que levaram à sua condenação por autoria do crime de roubo na forma tentada.
"Só se pode considerar verificado o fundamento da ai. e) do n° 1 do art. 449º do CPP se a "descoberta" de que serviram de fundamento à condenação provas proibidas tiver ocorrido num momento em que o vicio já não podia ser considerado na decisão condenatória. Só nesse caso é que se torna necessário o uso do recurso de revisão, pois, se essa "descoberta" é anterior à decisão condenatória e nela podia conhecer-se do vício, a superação deste podia ser feita pelas vias normais. O recurso de revisão, como meio extraordinário que sacrifica o valor servido pelo caso julgado, constitucionalmente garantido, não pode ter lugar quando houve oportunidade de, por outras vias, afastar a alegada injustiça da condenação. De outro modo, seria mais um recurso e não um recurso extraordinário" (cf. neste sentido, acs. do STJ de 28.10.2009, p. n" 109/94.8TBEPS e de 12.05.2010, p. 6319/01.6 5" sec).
"O arguido AA esteve em julgamento e não interpôs recurso do acórdão condenatório tendo tentado impugnar a prova e os meios de prova, como já atrás referimos.
Os factos provados supra indicados resultaram da apreciação livre, global e critica da indicada prova.
Destacam-se as declarações da vítima, o qual relatou de forma convincente a forma como foi abordado pelo arguido. Foi convincente pelos pormenores e isenção que patenteou. É certo que não foi possível proceder à prova por reconhecimento mas a vitima referiu reconhecer o arguido AA pelas características físicas que enunciou previamente e pelo confronto com a fotografia dos autos, como sendo o autor dos factos levados à acusação. Fê-lo de forma pormenorizada, isenta e segura, pelo que o Tribunal valorou tal relato livremente, convencendo-se com toda a segurança de que o arguido foi um dos protagonistas dos actos levados à acusação ( fls 14v).
Os métodos proibidos de prova previsto no n° I do art. 126°do CPP considera nulas, sem poderem ser utilizadas as provas obtidas mediante mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa à integridade física ou moral das pessoas.
E depois, no número seguinte, estas são enumeradas e consideradas ofensivas mesmo que obtidas com o consentimento das mesmas.
O seu nº 3 que o arguido/recorrente invoca, também considera nulas, ressalvados os casos previstos na lei, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada sem consentimento do respectivo titular
Por um lado uma fotografia tirada quando um arguido está detido e a ela não se opôs, não viola a sua privacidade por não ser tornada pública ficando a fazer parte do processo, pois foi tirada a pedido do MºPº, titular do inquérito e nem foi uma intromissão na sua vida privada.
Depois e ainda que quisesse reagir a esse acto ocorrido durante a investigação, tê-lo-ia de invocar quer fosse uma nulidade sanável ou insanável, até ao trânsito em julgado da sentença para poder ser conhecida.
É que a fotografia além de não ter sido utilizada directamente como meio de prova também não foi obtida, mediante tortura, coacção ou ofendendo a integridade física ou moral do arguido recorrente e por isso parecendo ser sanável, só em recurso o arguido/recorrente teria de demonstrar que violou a sua vida privada, quando então a admitiu.
Ora, como muita vez se tem dito no Supremo Tribunal de Justiça, não se deve confundir a nulidade dos actos processuais, prevista nos art.s 118° a 123º do CPP, com nulidade por uso de métodos proibidos de prova, que consta dos artOs 125° e segs, pois o próprio artº 118°, n° 3, estabelece que as disposições do presente título (nulidades) não prejudicam as normas desse Código relativas às proibições de prova ( Ac. do STJ de /2/2011, p.121100.0B.O.L.L.B.S.l)
Não vemos, pois, que haja qualquer prova obtida por métodos proibidos conforme o n° 8 do art. 32° da Constituição também prevê expressamente considerando-as nulas - "obtidas mediante tortura, coação, ofensa à integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão da vida privada, no domicilio, na correspondência ou nas telecomunicações", não tendo havido qualquer violação dos direitos constitucionais.
Acompanhamos, ainda, a bem fundamentada resposta do M°P' na 1ª instância quanto à ausência de nulidade da prova e fundamentos para o recurso de revisão.
Por tudo isto parece-nos que o arguido/recorrente não suscita nem pode suscitar dúvidas sobre a justiça da sua condenação por não apresentar novos factos nesse sentido nem prova proibida que tenha determinado a decisão condenatória.
Assim somos do parecer que, sendo de indeferir, deve ser negado provimento ao recurso de revisão de sentença interposto pelo arguido AA. “
Foi o processo a vistos, após o que seguiu para conferência, nos termos do artigo 455º nºs 1 e 2 do CPP.
Cumpre apreciar e decidir:
O recurso de revisão é abrangido pelas garantias de defesa, constitucionalmente consagrado, no artigo 29º nº 6, da Constituição da República Portuguesa ao dispor que os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão de sentença e à indemnização pelos danos sofridos
Em casos de injustiça notória, as legislações contemporâneas não tornam perene o caso julgado, sendo certo, por outro lado, que face à razão de ser do instituto do caso julgado, também não aceitam ad libitum a revisão de sentença transitada, outrossim, acolhendo as legislações “uma solução de compromisso entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, solução que se revê na consagrada possibilidade limitada de revisão de sentenças penais.” (Maia Gonçalves in Código de Processo Penal Anotado – Legislação Complementar, 17ª edição, p. 159 e 160)
Nos termos do artigo 449º nº 1 do Código de Processo Penal:
A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:
a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos os meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;
b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado relacionado com o exercício da sua função no processo,
c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação,
d) Se se descobrirem novos factos ou meios de prova que de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.
e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação novas provas proibidas nos termos dos nºs 1 a 3 do artigo 126º:
f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;
g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.
As alíneas e) a g) foram aditadas pela Lei 48/2007 de 29 de Agosto.
A revisão é admissível ainda que o procedimento se encontre extinto ou a pena prescrita ou cumprida. - artº 449º nº 4 do CPP.
O requerente alega que assenta a decisão recorrida numa prova proibida e, logo, nula, nos termos do disposto no art. 126°, n°s 1 e 3, do CPP, pelo que se verifica o fundamento para o recurso de revisão previsto no art. 449°, n°1, al. e), do CPP.
O fundamento do pedido de revisão constante do disposto na alínea e) do citado normativo, concretiza-se: Se descobrir que serviram de fundamento à condenação novas provas proibidas nos termos dos nºs 1 a 3 do artigo 126º.
Como se sabe, o princípio da legalidade da prova perfilhado pelo artº 125º do CPP considera “admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.”
Como já referia, por ex. o acórdão deste Supremo e desta Secção, de 23 de Julho de 1999, proc. nº 650/98, in SASTJ, nº 32,. 87) Em processo penal não existe um verdadeiro ónus da prova em sentido formal; nele vigora o princípio da aquisição da prova ligado ao princípio da investigação, donde resulta que são boas as provas validamente trazidas ao processo, sem importar a sua origem, devendo o tribunal, em último caso, investigar e esclarecer os factos na procura da verdade material.
Perante as provas admissíveis, é dos princípios gerais da produção da prova que o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa – v. artº 340º nº 1 do CPP – sem prejuízo do contraditório (v. nº 2 do preceito)
Vigora, por outro lado, o princípio da livre apreciação da prova, conforme artº 127º do CPP, que dispõe: - Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
O Código de Processo Penal não enumera taxativamente as provas proibidas, mas aponta limites à produção de provas e à sua valoração.
Assim, considera métodos proibidos de prova os indicados no artº 126º considerando “nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas.” nº 1, descrevendo as que são ofensivas da integridade física ou moral das pessoas, mesmo que com consentimento delas” (nº2) e, ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas as provas obtidas nos termos do nº 3 do mesmo preceito.
Quanto á proibição de valoração de provas, como resulta do artº 355º do CPP, não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, ressalvando-se apenas as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas,
E, como se sabe, não são inconstitucionais os normativos do artº 355º do CPP, interpretados no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida. (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 87/99, de 10 de Fevereiro, proc. nº 444/98 in DR II série, de 1 de Julho de 1999.)
Por outro lado, como já salientava o Acórdão deste Supremo e Secção de 27 de Janeiro de 1999, proc, 350/98 in SASTJ, nº 27, 83, a observância do disposto no artº 355º nº 1, do CPP, não exige a leitura em audiência dos documentos constantes dos autos, bastando a existência dos mesmos e a possibilidade de relativamente a eles poder exercer-se o contraditório.
Com referência à alínea e) do artº 449º do CPP, refere Maia Gonçalves, Código Penal Português anotado e comentado, 17ª edição, 2009, p 1062: “Trata-se aqui, manifestamente, de provas que não tinham sido apreciadas no julgamento, coerentemente com o que se dispõe na al. d) e como resulta também da locução se descobrirem, no início desta alínea.
Da conjugação desta alínea com o que se dispõe no artº 465º não resulta a impossibilidade de haver nova revisão com fundamento nesta al. e). E assim, se for negada a revisão pedida com fundamento no uso de tortura física, poderá ser pedida nova revisão com fundamento em promessa de vantagem legalmente inadmissível, posteriormente descoberta por ter sido encontrada correspondência extraviada.”
Volvendo ao caso concreto:
O recorrente foi julgado pelo Tribunal Colectivo.
E, da motivação do acórdão condenatório impetrado, consta que:
“A convicção do Tribunal baseou-se na apreciação crítica e global dos seguintes meios de prova:
a) Nas declarações do demandante cível BB, o qual apesar do interesse no desfecho da demanda se revelou isento e imparcial, relatando os factos de que foi vítima com segurança e convicção, referindo reconhecer o arguido AA, pelas características físicas que enunciou e pelo confronto com a fotografia dos autos, como sendo o autor dos factos levados à acusação;
b) No depoimento das testemunhas CC (dono das bombas de gasolina, referiu que foi alertado do assalto telefonicamente, foi logo ao local tendo ainda visto o seu empregado BB com sinais evidentes de ter sido agredido com um "spray" apimentado e irritante, designadamente a roupa suja por ter caído no chão, a procura dos óculos, o cheiro irritante que era perceptível no local, bem como as diligências realizadas para identificar o veículo e os arguidos na sequência da utilização do cartão de pagamento) e DD (militar da GNR que acorreu ao local, referindo os estragos nos óculos e do relógio do BB, as queixas deste em sofrimento pela irritação e ferimentos nos olhos) que depuseram revelando conhecer os factos directa e pormenorizadamente,, manifestando coerência e isenção e se revelaram convincentes;
c) No relatório pericial de fls. 87; e,
d) Nos documentos de fls. 92 a 105;
2.4. Breve apreciação crítica da prova.
Os factos provados supra indicados resultaram da apreciação livre, global e crítica já indicada prova.
Destacam-se as declarações da vítima, o qual relatou de forma convincente a forma como foi abordado pelo arguido. Foi convincente pelos pormenores e isenção que atentou. É certo que não foi possível proceder à prova por reconhecimento, mas a vítima referiu reconhecer o arguido AA, pelas características físicas que enunciou previamente e pelo confronto com a fotografia dos autos, como sendo o autor dos factos levados à acusação. Fê-lo de forma pormenorizada, isenta e segura, pelo que o Tribunal valorou tal relato livremente, convencendo-se com toda a segurança de que o arguido foi um dos protagonistas dos actos levados à acusação.”
Com os fundamentos do presente recurso o recorrente pretende impugnar a livre apreciação da prova, a valoração das provas produzidas como foi efectuada pelo tribunal da condenação, divergindo da forma como a mesma foi feita quanto ao modo de prestação das declarações da vítima na identificação do arguido, pois que segundo alega não foi possível proceder à prova por reconhecimento, que não obedeceu a nenhum dos requisitos previstos no artº 147º do CPP, e que “se no caso, o “reconhecimento” ou “declaração de reconhecer” – queira-se ou não, é a mesma coisa – não obedece a qualquer desses requisitos, nos expressos e inequívocos termos do disposto no nº 7, ainda da mesma disposição legal, não pode valer como prova, seja qual for a fase do processo, em que haja ocorrido.”
Considera que: “É inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, consagradas no n° 1 do artigo 32° da Constituição, a norma constante do artigo 127° do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo artigo 147° do Código de Processo Penal e que a reserva da vida privada das pessoas, garantida constitucionalmente no art. 26°, n° 1 da Lei Fundamental compreende o direito à imagem, aí também expressamente referido, e com este se protege, além do mais, a utilização de fotografias das pessoas sem o seu consentimento - cfr. ainda artºs. 79° e 80° do CC. No caso, aquando da prestação de declarações do Arguido, em 6 de Maio de 1997, não lhe foram tiradas quaisquer fotografias, e, na sequência do pedido do Digno Magistrado do Ministério Público, no sentido de que fossem tiradas fotografias ao Arguido com vista ao seu reconhecimento, quando lhe foram as mesmas tiradas, antes de 6 de Fevereiro de 1998, não lhe disseram para que eram, e, nesse dia -, também nada lhe informaram, nem nada foi por este dito, e, muito menos, expressado o seu consentimento fosse por que forma fosse e, menos ainda, no sentido de que as fotografias colhidas se destinassem ao seu reconhecimento no âmbito do processo. Apesar disso, em 15 de Março de 1999, foram as fotografias assim retiradas; ao Arguido, e só estas exibidas ao ofendido com vista a permitir o seu reconhecimento por esse.(…). Representam, pois, as fotografias tiradas ao Arguido, sem o seu consentimento, com vista ao seu reconhecimento no âmbito do inquérito que precedeu o presente processo, e a sua efectiva utilização para esse fim, em sede de inquérito e, depois, em audiência de julgamento, uma intromissão na vida privada daquele. (…) Assim, é inconstitucional o "reconhecimento" efectuado em sede de inquérito, como o feito em sede de julgamento, e como a decisão recorrida que o valorou de forma absolutamente essencial, por violação das garantias de defesa do Arguido asseguradas no n° 1 do art. 32° da Lei Fundamental, mas, também, no n° 6 da mesma disposição.
E, ainda por violação do art. 11°, n° 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 6º, n° 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que consagram a presunção de inocência até a prova legal da culpabilidade e que assumem foros de constitucionalidade por força do disposto nos arts. 8° e 16° da CRP.
Ora, como bem salienta a Dig,ma Magistrada do Ministério Público junto deste Supremo:
“O arguido AA esteve em julgamento e não interpôs recurso do acórdão condenatório tendo tentado impugnar a prova e os meios de prova, como já atrás referimos.
(…)
Os métodos proibidos de prova previsto no n° I do art. 126°do CPP considera nulas, sem poderem ser utilizadas as provas obtidas mediante mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa à integridade física ou moral das pessoas.
E depois, no número seguinte, estas são enumeradas e consideradas ofensivas mesmo que obtidas com o consentimento das mesmas.
O seu nº 3 que o arguido/recorrente invoca, também considera nulas, ressalvados os casos previstos na lei, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada sem consentimento do respectivo titular
Por um lado uma fotografia tirada quando um arguido está detido e a ela não se opôs, não viola a sua privacidade por não ser tornada pública ficando a fazer parte do processo, pois foi tirada a pedido do MºPº, titular do inquérito e nem foi uma intromissão na sua vida privada.
Depois e ainda que quisesse reagir a esse acto ocorrido durante a investigação, tê-lo-ia de invocar quer fosse uma nulidade sanável ou insanável, até ao trânsito em julgado da sentença para poder ser conhecida.
É que a fotografia além de não ter sido utilizada directamente como meio de prova também não foi obtida, mediante tortura, coacção ou ofendendo a integridade física ou moral do arguido recorrente e por isso parecendo ser sanável, só em recurso o arguido/recorrente teria de demonstrar que violou a sua vida privada, quando então a admitiu. “
Sobre a alegada violação do direito á imagem, nas fotografias exibidas tiradas ao arguido, e sem o seu consentimento, não consta que tivesse havido violação do disposto no artº 61º nº 2 al d) do CPP.
É certo que o acórdão nº 137/2001 de 28 de Março, do Tribunal Constitucional, veio na verdade dizer que “é claramente lesivo do direito de defesa do arguido, consagrado no nº 1 do artigo 32º da Constituição, interpretar o artigo 127º do Código de Processo Penal no sentido de que o princípio da livre apreciação da prova permite valorar, em julgamento, um acto de reconhecimento realizado sem a observância de nenhuma das regras previstas no artigo 147º do mesmo diploma.” e, decidiu “Julgar inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, consagradas no nº 1 do artigo 32º da Constituição, a norma constante do artigo 127º do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo artigo 147º do Código de Processo Penal;”
Mas é sabido que, de harmonia com o artº 82º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, só quando, ou como diz a lei, sempre que a mesma norma tiver sido julgada inconstitucional ou ilegal em 3 casos concretos, pode o Tribunal Constitucional, por iniciativa de qualquer dos seus juízes ou do Ministério Público, promover a organização de um processo com as copias das correspondentes decisões, o qual é concluso ao presidente, seguindo-se os termos do processo de fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade ou da ilegalidade previstos na presente lei.
Só então a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade com força obrigatória geral tem os efeitos previstos no artigo 282º da Constituição – artigo 66º da mesma Lei, sendo certo que conforme o nº 3 do artº 282º da CRP: - Ficam ressalvados os casos julgados, salvo decisão em contrário do Tribunal Constitucional quando a norma respeitar a matéria penal, disciplinar ou de ilícito de mera ordenação social e for de conteúdo menos favorável
Ora o acórdão invocado foi apenas para a situação concreta que versou, e não de força obrigatória geral.
Por outro lado, como salienta o citado acórdão do Tribunal Constitucional, “dada a relevância que na prática assume para a formação da convicção do tribunal, e os perigos que a sua utilização acarreta, um reconhecimento tem necessariamente que obedecer, para que possa valer como meio de prova em sede de julgamento, a um mínimo de regras que assegurem a autenticidade e a fiabilidade do acto.”
Os procedimentos seguidos em audiência sobre o “reconhecimento” do arguido obedeceram ao disposto no nº 1 do artº 147º,
Se não foi cumprido o nº 2 de harmonia com o nº 5 do preceito, e as declarações da vítima não pudessem servir como meio de prova sobre a identificação do arguido, o certo é que as declarações da vítima também não foram exclusivas para a convicção do Tribunal, atenta a valoração também de outros meios de prova sendo que, todos os meios de prova produzidos e examinados não ficaram arredados do exercício do contraditório, e o tribunal pode conhecer de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.” Conforme artº 340º ns 1 do CPP.
Aliás, como resulta do acórdão deste Supremo de 16 de Junho de 2005, proc. nº 553/05-5ª. SASTJ, nº 92, 114, as regras de reconhecimento pessoal prescritas pelo artº 147º do CPP não se aplicam em julgamento, mas antes à fase de inquérito e de instrução. O reconhecimento feito em audiência integra-se num conjunto probatório que lhe retira não só autonomia como meio de prova especificamente previsto no atº 147º. Como lhe dá sobretudo um cariz de instrumento, entre outros, para avaliar a credibilidade de determinado depoimento, inserindo-se assim numa estrutura de verificação do discurso produzido pela testemunha. Nesta perspectiva, tal reconhecimento feito em audiência, a avaliar segundo as regras próprias do artº 127º do CPP, não carece, para ser válido, de ser precedido do reconhecimento propriamente dito – realizado na fase de investigação – o inquérito e a instrução.
Por outro lado, como se referiu no mesmo acórdão do Tribunal Constitucional, “Não cabe ao Tribunal Constitucional, (…, pronunciar-se sobre o modo como a prova foi produzida ou apreciada pela decisão da 1ª Instância, ou a forma como veio a ser analisada pelo Tribunal de recurso. Do mesmo modo, não lhe compete apreciar a coerência interna das decisões, ou a consistência destas relativamente à prova produzida.”
O recurso de revisão não se destina a ajuizar dos termos de produção de um determinado meio de prova efectivado na altura própria no decurso da audiência e julgamento e da forma como foi valorada a prova – para isso servem os recursos ordinários -, mas a “descobrir que serviram de fundamento à revisão provas proibidas nos termos dos nºs 1 a 3 do artigo 126º”,
Ora, como bem observa o Senhor Juiz na informação sobre o mérito do pedido, “não resulta inequívoco nos autos que o respectivo fundamento invocado pelo arguido resulte de qualquer conhecimento superveniente dos factos.
O arguido podendo fazê-lo, não interpôs em momento próprio recurso ordinário do acórdão proferido nos autos, o qual veio, por isso, a transitar em julgado, pelo que se encontra assim precludida a possibilidade de o mesmo vir agora sindicar os meios de prova que serviram de fundamento à sua condenação nos autos.”
O recurso de revisão como recurso extraordinário não é um recurso ordinário, nem sucedâneo deste, pelo que perante provas legalmente permitidas e valoradas que serviram de suporte a determinada decisão, e que veio a transitar em julgado, não pode infirmar-se essa decisão com fundamento nessas provas, em sede de recurso extraordinário de revisão, nem alegar-se a inconstitucionalidade das mesmas, se o caso julgado não se encontra posto em causa por decisão vinculativa do Tribunal Constitucional nos termos dos artigo 282º nºs 1 e 2 da Constituição da República, nem se posteriormente à mesma decisão não existiu qualquer descoberta de que as provas produzidas foram obtidas de forma legalmente proibida.
Parafraseando o Ac. de 26 de Novembro de 2009, proc103/01.4TBBRG-G.S1 - 5ª secção, inwww.dhsi.pt , podemos dizer que: “ A revisão da sentença condenatória, transitada em julgado, com tal fundamento, só é possível quando se «descobrir» que serviram de fundamento à condenação provas proibidas. Ora, o uso do verbo «descobrir» significa que se está perante algo que na altura da audiência de julgamento não seria possível reconhecer, ou por ser então totalmente desconhecido que a prova fora obtida por método proibido ou por ter mudado a lei, passando a considerar proibido certo método de obtenção de prova que na altura era lícito.”
No presente caso, porém, o recorrente tinha conhecimento, na altura do julgamento, das provas produzidas e sobre elas pôde exercer o seu direito de defesa e o contraditório
Assim, não se «descobriu» nenhum método proibido de prova que tenha servido para fundamentar a condenação do recorrente.
A motivação da convicção do tribunal demonstra, por outro lado, que não estamos colocados perante dúvidas graves na justiça da sua condenação. É, pois, de não autorizar a revisão da sentença condenatória.
Como se disse no Ac. deste Supremo e desta 3ª Secção, de 10-09-2008, in Proc. n.º 2154/08
É imperioso que o recurso não se transforme em «uma apelação disfarçada (appeal in disguise)», num recurso penal encapotado, degradando o valor do caso julgado e permitindo a «eternização da discussão de uma mesma causa» (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, págs. 1209 e 1215), não podendo ver-se nele um recurso contra os recursos ou o recurso dos recursos, de que se lança mão em desespero de causa, quando todos os demais já redundaram em fracasso.
Esse novo julgamento, decorrente de recurso de revisão, apenas se justifica quando procedem, os pressupostos do recurso de revisão, nos termos estritos legalmente previstos.
O presente recurso de revisão não procede, e é pelo exposto, manifestamente infundado.
Termos em que decidindo:
Acordam os deste Supremo – 3ª Secção – em negar a revisão pedida pelo condenado AA.
Tributam o recorrente em 3 UC, nos termos do artigo 8º, n.º 5 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
Condenam o requerente na quantia de 8 UC por o pedido ser manifestamente infundado, nos termos do artigo 456º do CPP.
Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Março de 2011
Elaborado e revisto pelo relator
Pires da Graça (Relator)
Raul Borges
Pereira Madeira