LETRA DE CÂMBIO
DESTRUIÇÃO
Sumário

I - A conservação da generalidade dos documentos dos comerciantes deve observar a regra do art. 40º do Cód. Comercial que permite a sua destruição decorrido que seja o prazo de dez anos.
II - Porém, os documentos bancários previstos no art. 2º do Decreto-lei nº 279/2000 de 10/11 – letras, livranças, cheques, avisos ou ordens de pagamento ou de transferência pagos, e talões de depósitos – têm um regime legal especial previsto no mesmo decreto-lei que permite que os mesmos sejam destruídos decorridos seis meses, desde que previamente tenham sido microfilmados ou incorporados em disco óptico.
III - Nada tendo o legislador previsto no mesmo regime especial sobre a duração da obrigação de conservar esses microfilmes ou discos ópticos, mas não se aplicando a regra do art. 40º por se tratar de situações diversas em que as razões subjacentes à adopção da solução legal – falta ou onerosidade de espaço ou de guarda, no caso do art 40º - não relevam no caso dos microfilmes ou discos ópticos – onde as necessidades de espaço e de guarda são muito menos significativos, até porque se referem a uma parte muito pequena da generalidade dos documentos dos comerciantes bancários.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

A Massa Falida da Sociedade de Construções AA, S.A., representada pelo seu liquidatário nomeado, intentou, em 20-05-2004, na 17ª Vara Cível de Lisboa – passando posteriormente para a 2ª Vara Cível da mesma comarca - a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, contra:

Banco BB, S.A.,

Banco CC,

B... – Banco DD, S.A.,

Banco EE, S.A.,

Banco FF, S.A.,

Banco GG, S.A.,

Banco HH, S.A.,

II, S.A.

Alegando, em síntese:

- A 11.12.1993, a Sociedade de Construções AA, S.A., e as empresas suas participadas, JJ – Empreendimentos Turísticos, S.A., e KK – Empreendimentos Turísticos e Imobiliários do ..., Lda., por um lado, e 16 instituições bancárias, designadamente as ora Rés, celebraram um acordo tendo como objectivo o saneamento financeiro da AA, pela concessão de novos financiamentos e pela extinção dos créditos dos bancos subscritores, obrigando-se em contrapartida a AA a ceder-lhes participações sociais em sociedades por si detidas, no valor que as partes acordaram  de 7.500 milhões de contos;

- Em tal contrato, cada um dos bancos signatários obrigou-se ainda a enviar à AA nota discriminativa rigorosa, completa e exacta dos créditos extintos, obrigação que os ora RR. não cumpriram;

- Após a declaração de insolvência da AA, veio-se a constatar que os ora RR. não extinguiram os créditos que diziam ter sobre a AA e a que se comprometeram: os sacadores de algumas letras consideradas extintas por bancos signatários e como tal incluídas nas suas respectivas comunicações, reclamaram posteriormente o respectivo pagamento nos autos de falência da AA, em 1996, com junção dos respectivos títulos de que eram portadores;

- Desde  Dezembro de 1993 que a AA e desde 1996 que a A., insistiram por variadas vezes junto dos RR. para esclarecerem e quantificarem as divergências e irregularidades verificadas nos valores e descrição dos créditos que declararam deter no contrato;

- Na ausência de colaboração por parte dos RR. para o esclarecimento da situação, a A. não sabe em concreto, ainda hoje, qual o valor da diferença entre os créditos que foram declarados e efectivamente extintos.

Conclui, pedindo:

I - Os Réus BB, DD, EE, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM, NN, OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, devem ser condenados no cumprimento da sua obrigação de discriminação rigorosa, completa e exacta à Autora dos créditos extintos por efeito do contrato que celebraram com a AA em 12.11.1993.

II - Os Réus BB, DD, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM e OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, devem ser condenados a restituir à Autora os títulos – letras de câmbio – que declararam ou vierem a declarar extintas por efeito do contrato que celebraram com a AA em 12.11.1993.

III - A - Deve determinar-se a modificação do contrato celebrado, na parte que se refere às relações entre a AA e os Réus BB, DD, EE, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM, NN, OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, no sentido de constituir obrigação destes a entrega à AA, a quem sucedeu a Autora, de quantias correspondentes à diferença entre os créditos que declararam ser titulares e aqueles que efectivamente extinguiram;

       B – Devem ser condenados os Réus BB, DD, EE, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM, NN, OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, a pagar à Autora, por efeito da falência da AA, as quantias correspondentes à diferença entre os créditos que declararam ser titulares e aqueles que efectivamente extinguiram, a liquidar em execução de sentença.

Subsidiariamente, e na situação da improcedência do pedido em III,

IV - Devem os Réus BB, DD, EE, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM, NN, OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, ser condenados a pagar à Autora, por efeito da falência da AA, a quantia com que cada um respectivamente enriqueceu sem causa para o efeito, correspondente ao valor das participações e créditos sobre as respectivas sociedades que indevidamente receberam da AA, correspondente à diferença entre os créditos que declararam ser titulares e aqueles que efectivamente extinguiram, que esta lhes entregou na errónea convicção de estar a cumprir prestação efectivamente devida, a liquidar em execução de sentença.

Cumulativamente com o pedido em III/A e III/B ou com o pedido em IV,

V- Devem ser condenados os Réus BB, DD, EE, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM, NN, OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, a pagar à Autora, por efeito da falência da AA, juros à taxa aplicável aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, actualmente de 12% ao ano, calculados sobre as quantias que vierem a ser condenados a pagar-lhe ou restituir-lhe, correspondentes à diferença entre os créditos que declararam ser titulares e aqueles que efectivamente extinguiram, estes a liquidar em execução de sentença, desde 13.11.1993, até integral pagamento.

Citados, contestaram:

- Os Réus BB, S.A., e FF, S.A, a fls. 398 e ss.;

- Os Réus EE, S.A, Banco GG e II, S.A., a fls. 410 e ss.,

- O CC, S.A. a fls. 444 e ss.,

- O HH; a fls. 490, e ss.,

- O DD, a fls. 516 e ss.

O A. responde às contestações dos RR., tendo nesse articulado alterado o pedido formulado sob o ponto II, para passar a ter a redacção seguinte:

II - Os Réus BB, DD, FF, LL, II e CC, por si e relativamente aos bancos MM e OO que incorporou e o Réu HH, relativamente ao PP, que incorporou, devem ser condenados a restituir à Autora os títulos – letras de câmbio – que declararam ou vierem a declarar extintas por efeito do contrato que celebraram com a AA em 12.11.1993 ou a sua cópia com força probatória de original, quando estes tenham sido destruídos nos termos legais.

Por despacho de fls. 715 foi admitida a alteração do pedido.

Pelo juiz a quo foi proferido despacho saneador que:

A. julgou improcedente:

1. A excepção de falta de poderes do Sr. Liquidatário para, em representação da falida, instaurar a presente acção;

2. A excepção de ilegitimidade do liquidatário judicial para instaurar a presente acção;

3. A excepção de coligação ilegal de pedidos;

4. A excepção de prescrição dos direitos de crédito invocados pela A. quanto aos pedidos formulados sob os pontos I, II e III, relegando para momento oportuno a apreciação de tal prescrição quanto ao pedido subsidiário.

Conhecendo do pedido, julgou a acção improcedente, por não provada, julgando ainda improcedente a prescrição do direito de crédito respeitante ao pedido formulado sob o ponto IV, absolvendo os RR. do pedido.

A Autora interpôs recurso de apelação, que veio a ser julgada da seguinte forma:

“ Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a presente apelação:

- mantendo-se a improcedência da acção quanto aos pedidos formulados sob os pontos I e II,

- revogando-se parcialmente a decisão recorrida, determinando-se o prosseguimento da presente acção unicamente quanto ao pedido formulado sob os pontos III e IV, devendo proceder-se à fixação da base instrutória.” 

Mais uma vez inconformada, veio a autora interpor a presente revista, tendo nas suas alegações formulado conclusões que, por falta de concisão não serão aqui transcritas e das quais se deduz que aquela, para conhecer neste recurso, levanta apenas a seguinte questão:

Deve ser revogada a improcedência do pedido formulado sob o ponto II da petição inicial, devendo os autos prosseguirem para conhecimento do mesmo pedido ?

Contra-alegou  o recorrido Banco CC defendendo a manutenção do decidido.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Como é  sabido – arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. de Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-lei nº 303/2007 de 24/08, aqui aplicável, atenta a data da instauração da presente acção e o disposto nos arts. 11º e 12º do mesmo decreto-lei, redacção essa a que se referirão todas as disposições a citar sem indicação de origem – o âmbito dos recursos é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.

Já vimos acima a concreta questão que a aqui recorrente levantou.

Mas antes de mais há que especificar a matéria de facto que a Relação deu por provada e que é a seguinte:

 1. A Autora é constituída pelo património resultante da falência da Sociedade de Construções AA, S.A., NIPC ..., sociedade comercial anónima, com o capital social integralmente realizado de Esc. 2.134.073.000$00, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º ..., com sede na Rua ..., ... em Lisboa, declarada em estado de falência por sentença proferida em 22/11/95, transitada em julgado em 11/01/96.

2. A AA, antes de ser declarada em estado de falência, dedicava-se à actividade da construção civil e obras públicas e à promoção imobiliária, directamente ou através de sociedades que dominava.

3. Desde 1990/1991, que a AA vinha sentido, de forma crescente, dificuldades de ordem financeira, em consequência das graves crises simultâneas, que de forma abrupta, atingiram os sectores das obras públicas e da construção civil, verificando-se, no campo das obras públicas uma concorrência desenfreada e no campo das obras particulares, uma recessão económica generalizada.

4. Por forma a ultrapassar os problemas financeiros que sentiu no período 1990/1992, a AA recorreu a elevado número de operações de financiamento, quer directamente junto de instituições bancárias, quer através da emissão e aceite de letras de câmbio a seus fornecedores e ainda através da emissão de obrigações, gerando globalmente um passivo correspondente, na ordem dos 16,5 milhões de contos, hoje 82,3 milhões de euros.

5. A generalidade das letras de câmbio aceites pela AA e sacadas pelos seus fornecedores, constituíam dívidas de natureza bancária, por normalmente os seus portadores as transmitirem em operações de desconto bancário àquelas mesmas instituições.

6. As emissões de obrigações foram tomadas por instituições bancárias, fundos de investimento por elas geridos, ou por seus clientes cujos interesses também representavam.

7. Desde o início de 1993 que a AA passou a ter grande dificuldade em recorrer a credito e a operações bancárias, pois as instituições respectivas recusavam as operações que lhe eram propostas.

8. Desde o início do 2º trimestre de 1993 a AA deixou de contar com o apoio de qualquer banco, pois aqueles com que habitualmente se relacionava recusaram-lhe sistematicamente todas as operações que então propôs.

9. Desde o início do 2º trimestre de 1993 a AA passou a ser devedora de quantias de vários milhões de contos aos seus fornecedores, salários aos seus trabalhadores no valor aproximado de 150.000.000$00, impostos ao Estado no valor aproximado de 180.000.000$00, contribuições à Segurança Social no valor aproximado de 120.000.000$00 e em valor de cerca de 5.500.000.000$00, às instituições bancárias que antes a haviam financiado.

10. Em Setembro / Outubro de 1993 a AA tinha aceite e encontravam-se em vigor e em circulação comercial 1.457 letras de câmbio por si aceites e entregues a seus fornecedores, no valor total de Esc.: 2.394.379.810$10 correspondente a 11.943.116,14 €.

11. A AA era dona de património imobiliário, detido por si e pelas empresas que dominava.

12. Desde Março/Abril de 1993 que a AA e o conjunto de instituições bancárias suas credoras vinham negociando a celebração de acordo que permitisse o saneamento financeiro da empresa e lhe proporcionasse meios para voltar a laborar normalmente.

13. No âmbito das negociações que vinha desenvolvendo desde meados de 1993, em 31.08.1993, 16 instituições bancárias, incluindo todos os Réus, declararam ser titulares de créditos por financiamentos, respectivos juros e por letras de câmbio aceites da AA, no valor de 5.673.187 contos, referidos a 31.08.1993, com a seguinte discriminação:

BANCOS
EMPRÉSTIMOS
JUROS
ACEITES
TOTAL
CC
453.600
36.737
395.660
885.997
QQ
733.775
57.703
0
791.478
BB
320.200

27.510
343.687
691.397
MM
400.427
35.316
216.078
651.821
XX
450.000
41.301
0
491.301
DD
164.899

13.459
168.667
347.025
EE
100.639
9.432
225.483
335.554
NN
18.915
0
228.613
247.528
ZZ
221.535
20.370
0
241.905
AA
200.000
16.792
0
216.792
FF
        170.389

15.990
883
187.262
BBB
151.862
13.947
0
165.809
LL
135.283
14.192
25.615
175.090
OO
0
0
94.088
94.088
PP
         18.000

0
58.698
76.698
II
52.854
771
19.817
73.442
TOTAL
3.592.378
303.520
1.777.289
5.673.187

14. No apuramento da divida da AA às 16 instituições bancárias em 31.08.1993, o valor das letras de câmbio aceites foi determinado por declaração destas, de serem possuidoras dos títulos respectivos, obtidos em operações bancárias (de desconto ou outras) celebradas com os respectivos sacadores ou portadores.

15. No apuramento da divida da AA às 16 instituições bancárias em 31.08.1993, o valor de juros e despesas e financiamentos por descobertos em conta, foi determinado por declaração destas.

16. Em 1993, a AA, directamente e por intermédio das suas participadas JJ –Empreendimentos Turísticos, S.A. e KK – Empreendimentos Turísticos do ... e ..., Lda., era titular da totalidade do capital social das seguintes sociedades, donas de património destinado ao desenvolvimento de empreendimentos imobiliários, avaliadas nos montantes indicados:

Sociedade detida
Valor líquido
RR, S.A.
5.900.000 contos
SS, Sociedade de Construção, Gestão e Turismo, Lda.
1.500.000 contos
Total Equivalente a
7.400.000 contos (36.911.044,38 €).

17. Tendo em vista o seu saneamento financeiro a AA equacionou a celebração de acordo com essa finalidade com o conjunto de instituições bancárias suas credoras, tendo como elementos fundamentais:

- A titularidade de património liberto, com valor líquido de 7.400.000 contos (cláusula 1ª, n.º 4);

- A possibilidade de alienar o seu património liberto por valores aceitáveis, em termos de mercado;

- A necessidade de satisfazer as suas obrigações para com os seus credores bancários, que reclamavam o pagamento da quantia total de 5.673.187 contos (doc. 3, anexo A);

- A necessidade de satisfazer as suas obrigações perante outros credores, sendo que as suas dividas prioritárias, perante os seus trabalhadores por salários, o Estado por impostos, a Segurança Social por contribuições, os titulares de obrigações emitidas por juros e reembolsos de capital, outras instituições de crédito por rendas de contratos de locação financeira e por letras descontadas, seguradoras por prémios de seguro, fornecedores com créditos titulados por letras reclamadas judicialmente, no valor aproximado de 1.193.000 contos (cláusula 2ª, nº2, § 2.1. a § 2.9.);

- A necessidade de reconstituir o seu fundo de maneio, pelo valor que pudesse realizar (cláusula 2ª, nº1).

18. Em 12.11.1993, a AA e as empresas suas participadas JJ – Empreendimentos Turísticos, S.A. e KK – Empreendimentos Turísticos e Imobiliários do ... e ..., Lda., por um lado e 16 instituições bancárias por outro lado, designadamente os Réus BB, CC, DD, EE, FF, LL, II e ainda os bancos MM, NN, OO, PP, MG, XX, ZZ, AA e BBB, celebraram acordo tendo como objectivo o saneamento financeiro da AA, pela concessão de novos financiamentos e pela extinção dos créditos dos bancos subscritores, nos seguintes termos:

- Na concessão à AA de novos financiamentos no valor global de Esc.: 1.727.000.000$00 (452.000.000$00 + 1.275.000.000$00) (doc. 3 cláusula 2ª, nºs. 1 e 2);

- Na extinção dos créditos dos bancos signatários sobre a AA, resultantes dos financiamentos concedidos nesse acto (Esc.: 1.727.000.000$00), bem como os anteriores que declararam deter, por mútuos e aberturas de crédito (Esc.: 3.592.378.000$00) e respectivos juros (Esc.: 303.520.000$00) e letras de câmbio aceites pela AA e descontadas por outras empresas nos bancos signatários (Esc.: 1.777.289.000$00), no total de Esc.: 7.400.187.000$00;

- Na entrega pela AA e pelas suas associadas, aos bancos signatários, da totalidade das acções e quotas representativas de todo o capital social das empresas RR, S.A. e SS, Sociedade de Construção, Gestão e Turismo, Lda., e créditos por suprimentos sobre esta última, no valor de Esc.: 7.400.000.000$00.

19. No acordo que celebraram em 12.11.1993, os Réus BB, CC, DD, EE, FF, LL, II e os bancos MM, NN, OO incorporados no Réu CC e o PP, incorporado no Réu HH, declararam ser possuidores de créditos por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, nos valores indicados, em contos, que foram incluídos no cálculo das responsabilidades daquela, a extinguir:

BANCOS
EMPRÉSTIMOS
JUROS
ACEITES
TOTAL

CC
453.600
36.737
395.660
       885.997
BB
320.200
27.510
343.687
691.397
MM
400.427
35.316
216.078
651.821
DD
164.899
13.459
168.667
347.025
EE
100.639
9.432
225.483
335.554
NN
18.915
0
228.613
247.528
FF
170.389
15.990
883
187.262
LL
135.283
14.192
25.615
175.090
OO
0
0
94.088
94.088
PP
18.000
0
58.698
76.698
II
52.854
771
19.817
73.442

20. Em 12.11.2003 a AA e as empresas suas associadas JJ, S.A. e KK, Lda., entregaram aos bancos subscritores e estes receberam, a totalidade das quotas e acções representativas de todo o capital social das empresas RR, S.A. e SS, Sociedade de Construção, Gestão e Turismo, Lda. e créditos por suprimentos sobre esta última, no valor de Esc.: 7.400.000.000$00, cabendo aos réus e bancos neles incorporados a parte discriminada no art.30º da p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzida.

21. Os créditos dos bancos signatários do contrato sobre a AA, a extinguir por seu efeito, eram aqueles de que fossem titulares na data da respectiva celebração, em 12.11.1993, tendo como limite o valor determinado por referência a 31.08.1993.

22. Previa-se que o valor dos créditos dos bancos signatários sobre a AA fosse aumentando entre 31.08.1993 e a data da celebração do contrato, em função do aumento da contagem de juros que ia ocorrendo com o decurso do tempo, do vencimento periódico de despesas bancárias que iam sendo debitadas nas suas contas e da falta de pagamento de quaisquer obrigações perante os bancos por parte da empresa.

23. Nos termos do acordo celebrado, incumbia a cada um dos bancos signatários a emissão e envio à AA de nota escrita com a respectiva discriminação dos créditos extintos (cláusula 2ª, nº. 5).

24. Em 1996, a empresa TT, Lda., sacadora de duas letras de câmbio aceites pela AA, com os valores de 1.718.000$00 e de 2.148.000$00, reclamou os respectivos créditos nos autos de falência da AA.

25. As duas letras de câmbio com os valores de 1.718.000$00 e de 2.148.000$00, cujo pagamento foi reclamado pela TT, Lda., nos autos de falência da AA, haviam sido incluídas pelo PP, incorporado no Réu HH, na sua relação de créditos extintos por efeito do contrato, enviada por este à AA em 21.02.1994 e 25.02.1994.

26. Em 1996, a empresa UU, Lda., sacadora de letra de câmbio aceite pela AA, com o valor de 1.575.000$00, reclamou o respectivo crédito nos autos de falência da AA.

27. A letra de câmbio cujo pagamento foi reclamado pela UU, Lda., nos autos de falência da AA, havia sido incluída pelo PP, incorporado no Réu HH, na sua relação de créditos extintos por efeito do contrato, enviada por este à AA em 21.02.1994 e 25.02.1994.

28. Em 1996, a empresa VV, Lda., sacadora de letra de câmbio aceite pela AA, com o valor de 271.000$00, reclamou o respectivo crédito nos autos de falência da AA.

29. A letra de câmbio cujo pagamento foi reclamado pela VV, Lda., nos autos de falência da AA, havia sido incluída pelo Réu BB, na sua relação de créditos extintos por efeito do contrato, enviada por este à AA em 28.12.1993.

30. No contrato foi designado “banco-agente” o BB, tendo-lhe sido conferidos pelos restantes bancos signatários, o poder de representar todos e cada um dos bancos nas suas relações com a AA atinentes ao mesmo contrato, nomeadamente o de receber comunicações que esta dirigisse a qualquer dos bancos (cláusulas 16ª e 17ª).

31. Em 12.10.1998 e em 30.09.1999, a Autora, por intermédio do seu liquidatário judicial, pediu por escrito ao BB, na qualidade de banco-agente do contrato, que esclarecesse qual o valor de créditos efectivamente extinto e facultou-lhe os seus elementos de conferência.

32. Em 02.11.2000, a Autora pediu a apreciação do BB relativamente à existência de reclamações nos autos de falência da AA de créditos que os Réus BB, CC e os bancos signatários PP e MM haviam declarado extintos por efeito do contrato e facultou-lhe os documentos comprovativos respectivos.

33. O BB, banco-agente no contrato, não comunicou à Autora a posição dos bancos signatários do contrato relativamente aos elementos de conferência que esta lhe entregou em 12.10.1998 e 02.11.2000, nem lhe comunicou qual o valor de créditos que considerava efectivamente extinto.

34. Por comunicação escrita de 09.03.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu II para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

35. Por comunicação escrita de 02.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu HH, relativamente à posição do PP, nele incorporado, para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

36. Por comunicação escrita de 02.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu GG para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato.

37. O Réu GG, por comunicação de 26.06.2002, respondeu à interpelação da Autora de 02.04.2002 mas não apresentou os títulos – letras de câmbio – correspondentes ao saldo então alegado.

38. Por comunicação escrita de 02.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu DD para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

39. Por comunicação escrita de 02.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu FF para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

40. Por comunicação escrita de 02.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu CC, relativamente à sua posição no contrato e à que detinha a MM, banco que entretanto incorporou, para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

41. Por comunicação escrita de 12.04.2002, a Autora, por intermédio do seu mandatário judicial, interpelou o Réu BB para pagar as diferenças verificadas na conferência dos valores de créditos declarados extintos em resultado do contrato e este nada lhe respondeu.

42. Após celebração do acordo, em 28.12.1993, o BB comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, a quantia de 690.821 contos, equivalente a 3.445.800,62 € (doc. 4, anexo I, alínea A)).

43. Na sua comunicação de extinção de créditos em 28.12.1993, o BB comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 343.110 contos, equivalente a 1.711.425,46 €, correspondente a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portador.

44. Após celebração do acordo, em 04.01.1994, o Réu CC, por intermédio do BB comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, a quantia de 866.134 contos, equivalente a 4.320.258,18 €.

45. Na sua comunicação de extinção de créditos de 04.01.1994, o CC comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 374.540 contos, equivalente a 1.868.197,64 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portador.

46. Após celebração do acordo, em 07.01.1994, a MM, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, a quantia de 651.002 contos, equivalente a 3.247.184,29 €.

47. Na sua comunicação de extinção de créditos em 07.01.1994, a MM comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 213.153.654$40, equivalente a 1.063.205,95 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portadora.

48. Após celebração do acordo, em 07.01.1994, o NN, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA e descontadas a seus clientes, a quantia de 244.321 contos, equivalente a 1.218.668,01 €.

49. Após celebração do acordo, em 10.01.1994, o OO, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, letras de câmbio aceites pela AA e descontadas a seus clientes e respectivas despesas, a quantia de 68.690 contos, equivalente a 342.624,28 €.

50. Após celebração do acordo, em 11.01.1994, o DD, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA e descontadas, a quantia de 347.025 contos, equivalente a 1.730.953,40 €.

51. Na sua comunicação de extinção de créditos em 11.01.1994, o DD comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 168.666.605$00, equivalente a 841.305,48 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portador.

52. O DD, na sua comunicação de 11.01.1994, declarou à AA ser portador de títulos cuja entrega fez posteriormente, no montante total de 32.906.123$00.

53. Após celebração do acordo, em 11.01.1994, o EE, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA e descontadas a seus clientes, a quantia de 333.655 contos, equivalente a 1.664.264,12 €.

54. Após celebração do acordo, em 06.01.1994, o Réu FF, por intermédio do

BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, na quantia de 187.262 contos, equivalente a 934.058,92 €.

55. Na sua comunicação de extinção de créditos em 06.01.1994, o FF comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 883 contos, equivalente a 4.404,39 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portador.

56. Após celebração do acordo, em 06.01.1994, o Réu LL, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, na quantia de 175.084 contos, equivalente a 873.317,42 €.

57. Em aditamento de 12.01.1994 à sua comunicação de extinção de créditos de 06.01.1994, suscitado por pedido da AA de 11.01.1994, o FF, por intermédio do BB, comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de Esc.: 25.614.900$00, equivalente a 127.766,58 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portador.

58. Após celebração do acordo, em 06.01.1994, o II, por intermédio do BB, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, a quantia de Esc.:73.408.796$40, equivalente a 366.161,53 €.

59. Na sua comunicação de extinção de créditos em 06.01.1994, o II comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de 587.000$00, equivalente a 2.927,94 €, correspondente a letra de câmbio aceite por esta, saque da “MAQUI 200”, com vencimento em 15.11.1993, que declarou dela ser portador.

60. Após celebração do acordo, em 21.02.1994, o PP, comunicou por escrito à AA ter extinto, por efeito do contrato, créditos que detinha anteriores à sua assinatura, por empréstimos, juros e letras de câmbio aceites pela AA, a quantia de Esc.: 67.085.015$50, equivalente a 334.618,65 €.

61. Na sua comunicação de extinção de créditos em 21.02.1994, o PP comunicou à AA ter extinto, por efeito do contrato, a quantia de Esc.: 48.182.000$00, equivalente a 240.330,80 €, correspondentes a letras de câmbio aceites por esta, que declarou ter descontado e delas ser portadora.

Vejamos agora  o objecto do presente recurso.

Trata-se aqui da questão de saber se se deve manter a declaração de improcedência do pedido formulado sob o ponto II da petição inicial, na versão decorrente da alteração do mesmo pedido requerida na réplica.

O acórdão recorrido manteve a improcedência do mesmo pedido que a sentença de 1ª instância havia decidido apontando os seguintes fundamentos argumentos:

Prescrevendo o art. 40º do Cód. Comercial que os comerciantes são obrigados a arquivar a correspondência e telegramas que receberem, os documentos que provarem pagamentos e os livros da sua contabilidade mercantil, devendo conservar tudo pelo espaço de dez anos, e tendo decorrido esse lapso de tempo antes da propositura da presente acção, já não estão obrigados à restituição peticionada naquele pedido. Isto foi decidido, apesar de o acórdão recorrido ter entendido que o citado art. 40º não estabeleceu qualquer prazo de prescrição.

Defende a recorrente que o regime do art. 40º apontado é afastado pela norma especial aplicável aos bancos prevista no Decreto-Lei nº 279/2000 de 10-11 que prevendo a possibilidade de aqueles procederem à destruição de documentos bancários, como as letras, decorrido que seja o prazo de seis meses, condiciona essa possibilidade à prévia recolha de imagem em microfilme ou de disco óptico de forma a permitir a extracção de cópia fiel e legível que terá a força legal probatória do original.

Há, assim, aqui, um problema de interpretação de normas legais, o que terá de ser efectuada observando o disposto no art. 9º do Cód. Civil.

O art. 40º do Cód. Comercial tem a redacção seguinte:

“Todo o comerciante é obrigado a arquivar a correspodência e telegramas que receber, os documentos que provarem pagamentos e os livros da sua escrituração mercantil, devendo conservar tudo pelo espaço de dez anos.”

Esta disposição está integrada no título IV do Cód. Comercial que trata da escrituração, título esse pertencente ao Livro Primeiro que trata do “Comércio em Geral”.

Quer desta inserção quer do teor do citado art. 40º se deduz que o mesmo tem natureza de norma geral aplicável à generalidade dos comerciantes.

Dessa forma seria aplicável também aos estabelecimentos bancários, como os recorridos. E da referência naquele dispositivo aos documentos que provem pagamentos, ter-se-á de entender que se aplica aos documentos objecto do pedido em apreço.

Porém, a actividade bancária tem natureza muito específica que justificou uma regulamentação mais adequada às necessidades próprias do comércio bancário e, por isso, o legislador começou a regular a conservação dos documentos bancários mais sensíveis, como os cheques, de forma especial em relação à norma geral do art. 40º.

É preciso lembrar que a norma do art. 40º visou dentro do contexto em que foi elaborada – no final do século XIX – conciliar os interesses dos comerciantes em não terem de conservar um arquivo durante muito anos, com todos os inconvenientes de ocupação de espaço cada vez mais escasso, e de proceder à sua competente guarda e conservação, com os interesses dos cidadãos em poderem recorrer a esse arquivo, sempre que se levante uma questão de que os elementos daquele arquivo possam servir de meio de prova de factos atinentes àquela questão, mesmo que o respectivo comerciante não tenha interesse naquela.

Por isso, e dentro do contexto do século dezanove, foi elabrado o preceito do apontado art. 40º onde se estabeleceu a obrigatoriedade de o comerciante arquivar os seus documentos comerciais, apenas durante dez anos – pese embora o prazo referido tenha resultado da alteração operada pelo Decreto-Lei nº 41/72 de 4/02 que se limitou a reduzir o  prazo inicial de vinte anos para aquele de dez anos.

Porém, as condições do comércio em geral alteraram-se de forma impensável naquela data, com o incremento do comércio em geral e, muito em especial e nas últimas décadas, do comércio bancário.

Assim, o legislador foi sensível à necessidade de agilizar a conservação e arquivo dos documentos bancários mais sensíveis – cada vez mais numerosos -, sem esquecer as necessidades de defender os cidadãos que recorrem aos bancos e que carecem de obter certidões extraídas daqueles documentos, dada a delicadeza das actividades que os bancos desenvolvem, lidando com somas ou valores, frequentemente, muito elevados.

Por outro lado, o legislador também foi sensível às potencialidades das novas tecnologias para permitir uma conservação eficiente e praticável dos documentos em causa.

Por isso, o legislador promulgou inicialmente o Decreto-Lei nº 110/89 de 13/04, onde veio permitir que os cheques apresentados a pagamento, com excepção aos que forem devolvidos, possam ser destruídos decorrido o curto prazo de cento e oitenta dias, devendo previamente serem microfilmados, valendo as respectivas fotocópias como o original.

Posteriormente saiu o Decreto-Lei nº 279/2000, de 10-11 - que veio substituir o Decreto-Lei nº 110/89 - que em relação aquele contém duas novidades:

- Por um lado, estendeu a possibilidade de destruição dos cheques depois de microfilmados aos outros documentos bancários: letras, livranças, avisos ou ordens de pagamento ou de transferência pagos e os talões de depósito de valores;

- Por outro lado, veio permitir que a conservação dos documentos pudesse ser efectuada através de disco óptico, além de microfilme que já se previra no anterior diploma legal.

Quer num diploma quer noutro, não se previu prazo de duração da obrigação de conservação dos microfilmes ou dos discos ópticos contendo os documentos destruídos.

Daqui poderia levar a concluir que se aplicava o prazo de dez anos previstos no art. 40º apontado pelo recorrido CC, findo o qual terminaria a obrigação dos comerciantes bancários conservarem os microfilmes ou discos ópticos.

Mas também se poderia dizer que as características específicas próprias do comércio bancário que lida com documentos, em geral, de maior delicadeza por se referirem, frequentemente, a valores monetários muito elevados, apontarem para a desadequação da norma do art. 40º referido pensado para um comércio muito mais incipiente próprio do século dezanove que nada tem a ver com o actual comércio bancário.

Além disso, as razões de falta ou de onerosidade de espaço para um arquivo cada vez mais volumoso impunham a adopção da regra do art. 40º para a generalidade dos documentos dos comerciantes, mas já não justificavam a adopção da mesma regra para a conservação daqueles específicos documentos em microfilme ou disco rígido, onde as apontadas razões de falta de espaço já não relevam da mesma forma.

Finalmente, tendo o legislador entendido que as especificidades do comércio bancário exigiam a adopção de um regime diverso do previsto no art. 40º mencionado para a generalidade dos comerciantes e para todos os documentos comerciais, onde se incluem os livros de escrituração mercantil, não fazia sentido deixar o novo regime repartido em dois diplomas, fixando o prazo de seis meses para a microfilmagem ou a passagem para o disco óptico no novo diloma e continuando a aplicar o prazo de dez anos para a conservação dos microfilmes ou dos discos ópticos, prazo esse previsto apenas para o original dos documentos em geral e não para a reprodução de alguns mais sensíveis pelos sofisticados meios técnicos apontados .

Assim, o art. 40º citado aplica-se aos documentos ali previstos – livros, correspondência e outros documentos - da generalidade dos comerciantes, possibilitando a sua destruição no prazo de dez anos.

Já tratando-se de comerciantes bancários, o Decreto-Lei nº 279/2000 veio permitir que os documentos bancários referidos – letras, livranças, cheques, avisos ou ordens de pagamento ou de transferência pagos, e talões de depósitos  - possam ser destruídos decorrido o prazo de seis messes, desde que previamente à destruição sejam incorporados em microfilme ou em disco óptico cuja guarda e conservação o legislador entendeu não fixar prazo, pelo que se terá de entender que o deve fazer, pelo menos, de molde a respeitar o prazo geral de prescrição do art. 309º do Cód. Civil.

Assim e em conclusão diremos:

- A conservação da generalidade dos documentos dos comerciantes deve observar a regra do art. 40º do Cód. Comercial que permite a sua destruição decorrido que seja o prazo de dez anos.

- Porém, os documentos bancários previstos no art. 2º do Decreto-lei nº 279/2000 de 10/11 – letras, livranças, cheques, avisos ou ordens de pagamento ou de transferência pagos, e talões de depósitos – têm um regime legal especial previsto no mesmo decreto-lei que permite que os mesmos sejam destruídos decorridos seis meses, desde que previamente tenham sido microfilmados ou incorporados em disco óptico, nada tendo o legislador previsto no mesmo regime especial sobre a duração da obrigação de conservar esses microfilmes ou discos ópticos, mas não se aplicando a regra do art. 40º por se tratar de situações diversas em que as razões subjacentes à adopção da solução legal – falta ou onerosidade de espaço ou de guarda, no caso do art 40º - não relevam no caso dos microfilmes ou discos ópticos – onde as necessidades de espaço e de guarda são muito menos significativos, até porque se referem a uma parte muito pequena da generalidade dos documentos dos comerciantes bancários.

Desta forma, procede o fundamento do recurso.   

Pelo exposto, concede-se a revista pedida e, por isso, se revoga a decisão recorrida na parte impugnada, ou seja, ordenando-se o prosseguimento do processo, também para conhecimento do pedido formulado sob o ponto II da petição inicial, na versão que resultou da alteração do pedido formulada na réplica.

Custas pelos recorridos – art. 446º. 

Lisboa, 4 de Outubro de 2011

João Camilo ( Relator )

Fonseca Ramos

Salazar Casanova