I - O recurso extraordinário de revisão, consagrado no art. 449.º e ss. do CPP, apresenta-se como uma válvula de segurança do sistema, modo de reparar o erro judiciário cometido, sempre que, numa reponderação do decidido, possa ser posta em causa, através da consideração de factos-índice, taxativamente enumerados naquele normativo, seriamente a justiça da decisão ou do despacho que ponha termo ao processo.
II - Entre os fundamentos taxativamente indicados no n.º 1 do art. 449.º do CPP, que permitem a revisão de decisões transitadas, conta-se a descoberta de «novos factos ou meios de prova» que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (al. d), não podendo ter como único fim a correcção da medida concreta da sanção aplicada (n.º 3 do mesmo preceito).
III - Sobre o conceito de «facto novo» ou «elemento novo de prova» para efeitos de revisão, entende-se que não é necessário o desconhecimento por parte do recorrente, bastando que os factos ou meios de prova não tenham sido tidos em conta no julgamento que levara à condenação, para serem considerados novos.
IV - Todavia, esta orientação tem a seguinte limitação: os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia representá-los, serão invocáveis em sede de revisão, desde que seja dada uma explicação suficiente para a omissão antes da sua apresentação (o recorrente terá de justificar essa omissão, explicando porque é que não pôde e, eventualmente, até porque entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal).
V - No que tange à «dúvida grave» sobre a justiça da condenação, exige-se que se trate de uma dúvida qualificada, isto é, que se eleve do patamar da mera existência, para atingir a vertente da «gravidade», tendo os novos factos e/ou provas de assumir qualificativo da «gravidade» da dúvida.
VI - Desta forma, os «novos factos» ou as «novas provas» deverão revelar-se tão seguros e (ou) relevantes – pela patente oportunidade e originalidade na invocação, pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas ou pelo significado inequívoco dos novos factos – que o juízo rescidente que neles venha a apoiar não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, o que reclama do requerente do pedido a invocação e prova de um quadro de facto «novo» ou a exibição de «novas» provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comprovem, pelo menos, em bastante menor grau do que aquela em que se fundamentou a decisão a rever.
VII - Se o recorrente sustenta não lhe pertencer e nunca ter utilizado no telemóvel identificado, nunca ter tido a alcunha de P, as gravações telefónicas efectuadas não foram ouvidas em audiência (afirmando que das vozes constantes das mesmas nenhuma é a sua), se questiona o depoimento das testemunhas A, a quem na busca domiciliária coube a coordenação/sinalização e anotação, e J, se impugna a veracidade do que se contém no auto de busca e apreensão e se indica novas provas a produzir (obtenção de elementos junto de operadora telefónica e inquirição de testemunhas), coloca ao STJ questões que já foram apreciadas e decididas pelo Tribunal da Relação no âmbito do recurso ordinário, mas que não se mostram compatíveis com o carácter especialíssimo do meio processual que agora usa.
VIII - Efectivamente, os fundamentos invocados não preenchem os requisitos previstos na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP para a revisão da decisão proferida.
IX - Do mesmo modo, a alegação do recorrente não integra a previsão da al. a) do n.º 1 do mesmo preceito – falsidade de meios de prova que tenham sido determinantes para a condenação –, que pressupõe que a falsidade do meio de prova conste de decisão final, isto é, que seja reconhecida por uma sentença transitada em julgado, o que não sucedeu no caso em apreço.
Por acórdão do Colectivo competente, datado de 25-06-2008, constante de fls. 8053 a 8136 do processo principal, pela autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, e de um crime de condução sem habilitação legal, p. p. pelo artigo 3.º, n.º s 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3-01, foi o arguido condenado nas penas de 5 anos e 6 meses de prisão e de nove meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 6 anos de prisão.
O condenado interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que por acórdão de 17-06-2009, constante de fls. 9248 a 9414, reduziu as penas parcelares para 5 anos e 2 meses de prisão e 7 meses de prisão, sendo a pena única reduzida para 5 anos e 4 meses de prisão.
O acórdão transitou em julgado em 15 de Julho de 2010 – fls. 14.
O arguido interpôs o presente recurso extraordinário de revisão, em 06-06-2011, com base nos fundamentos constantes de fls. 2 a 13 (e em original de fls. 251 a 262), expondo a sua posição ao longo da motivação, que se poderá resumir aos seguintes pontos:
1 – O objecto de análise: os factos constantes dos n.ºs 12 e 13 – factualidade contra si considerada apurada, mas erradamente, e que terá tido como fundamento o depoimento do arguido, quanto aos factos de 12, e o conteúdo de folhas 1297, 1298, 2515, 2716 e oficio da operadora «...que deu entrada em 24 de Junho deste ano e constante das últimas folhas do processo....» (folhas 48 do aludido) e ainda o depoimento das testemunhas BB (folhas 53 e 54), quanto ao demais, à excepção do que terá ocorrido com CC que, afirma-se, «...confirmou ter comprado haxixe ao arguido AA nos termos referidos sob o n° 12;....» (folhas 59).
2 – Os factos essenciais e como decorreram historicamente
1. Nunca teve a alcunha de Pescocinho.
2. Nunca utilizou o número no seu telemóvel o n° 9xxxxxxxx.
3. No seu telemóvel estava, em 11 de Junho (rectificado para Julho) de 2006, o telefone n° 9xxxxxxx.
4. Nunca comprou nem vendeu droga ao DD. Nunca sequer o contactou de nenhuma forma.
5. Nunca residiu no B… de S. L… V…, casa xx, em Vila Nova de Gaia.
6. A droga que se encontrava em sua casa, em 11 de Junho (rectificado para Julho) de 2006, era para seu consumo.
7. Os negócios de haxixe que teve com o CC foram nos precisos termos do seu depoimento de 24 de Outubro de 2007
8. Não conduziu a viatura NQ-xx-xx depois da condenação que teve, em 2004, sendo que inexiste qualquer prova desse facto, nem a utilizou para deslocações relacionadas com droga.
9. As gravações das escutas telefónicas do 9xxxxxxxx não foram ouvidas em audiência.
10. Das vozes constantes das mesmas nenhuma é a sua.
3 – As provas dos autos a considerar para demonstração do sem sentido do decidido
1) - Os documentos de folhas 1297 a 1302, 2515, 2716 e o junto com o recurso da decisão de 1.ª instância;
2) - Os depoimentos em audiência do recorrente e das testemunhas BB e CC.
Pretende ainda que seja considerada a prova oral produzida em julgamento, como o depoimento do arguido em 24-10-2007, o depoimento da testemunha BB em 12-11-2007 e de CC, em 30-01-2008, apresentando excertos da transcrição de declarações prestadas em audiência.
Indica como provas a produzir
1. A solicitação à Vodafone, remetendo-lhe o SIM CARD inserto no telemóvel (número com doze algarismo, conforme se constata de similar, a folhas 1297) informação sobre o número de telefone que lhe corresponde.
2. A audição da testemunha BB para que esclareça onde, como e quando soube da alcunha Pescocinho, porque razões a atribui ao recorrente e das razões pelas quais liga o telemóvel encontrado ao número 9xxxxxxxx e em que se sustenta para afirmar que uma das vozes intervenientes nas conversas do aludido é a do recorrente.
3. Depoimento complementar do recorrente se, após produzidas as provas antes indicadas, restar alguma dúvida sobre a verdade histórica.
Pretende o recorrente como diz a fls. 12 (no original fls. 261) a demonstração dos erros do julgamento, dizendo no essencial que nunca utilizou o número de telefone n.º 9xxxxxxxx e o mesmo nunca esteve inserto em telemóvel que usasse e que nunca foi conhecido pela alcunha de Pescocinho.
Três dias depois, veio o recorrente, a fls. 248/9, rectificar lapsos de escrita em 3 pontos (rectificação de 11 de Junho de 2006 para 11 de Julho de 2006), mas acrescentando:
«4. Já agora, aproveita para dizer, após a análise dos documentos de flhas 8044 a 8046, que o signatário não conhecia antes de 6 de Junho, que:
O recorrente sabe que, em 11 de Julho de 2006, no aparelho de telemóvel que lhe foi apreendido funcionava o n.º de telemóvel 9xx xxx xxx. Naturalmente, que não sabe qual era o IMEI de tal aparelho. No entanto, visto o teor de folhas 8044 a 8046, pode, hoje, garantir que:
- está demonstrado nos autos que não é verdade que, em 11 de Julho de 2006, ao contrário do que se afirma a folhas 1298, que, no IMEI xxxxxxxxxx funcionasse o n.º 9xxxxxxxx (folhas 8046)
- está demonstrado nos autos que o número de telefone que a polícia queria ter-lhe apreendido, o 9xxxxxxxx, apesar da busca ter sido efectuada, em 11 de Julho de 2006, e o mesmo apreendido, continuou activo até 16 de Março seguinte (folhas 8045)
5. O que significa que a informação de folhas 1298 é errada quer quanto ao número inserto quer quanto ao IMEI do telemóvel que utilizava, sendo, pois, mais que nunca premente saber como, quando, onde, porquê e por quem foram inventados».
O Ministério Público junto do Tribunal a quo apresentou cuidada resposta, nos termos constantes de fls. 263 a 267, incidindo a atenção sobre os pontos cruciais, dizendo que o recorrente não apresenta factos ou meios de prova novos, no sentido de factos que fossem por si ignorados ao tempo do julgamento ou não puderam ser apresentados antes do julgamento e que a sua pretensão se reconduz à reapreciação da prova produzida e considerada no acórdão condenatório, do qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que o alterou apenas quanto à medida da pena, tecendo considerações sobre a questão do telemóvel, morada constante do registo do telemóvel na Vodafone e sobre o alcance do atestado junto a fls. 8300, datado de 7-07-2008, emitido pela Junta de Freguesia de Santa Marinha, Vila Nova de Gaia, onde consta que o recorrente residia há dez anos em Santa Marinha, afirmando não beliscar a força probatória do auto de busca e apreensão, do teor das escutas e do depoimento da testemunha BB, de onde resulta que o recorrente usava o referido telemóvel com o n.º 9xxxxxxxx que lhe foi apreendido, apesar de o registo na Vodafone constar outra morada, sabido que a residência declarada na compra de um telemóvel não carece de ser comprovada e concluindo que deve ser indeferido o pedido de revisão.
*****
Por despacho de 21-06-2011, constante de fls. 295 a 298, o Exmo. Juiz junto do Tribunal “a quo” lavrou informação, nos termos do artigo 454.º do Código de Processo Penal, nos termos seguintes:
«O arguido AA interpôs o presente recurso extraordinário de revisão ao abrigo do disposto no art. 449.°, n.° 1 al. d) do CPP, manifestando a sua discordância relativamente à condenação de que foi alvo nos autos principais e requerendo, em suma, a realização das seguintes diligências probatórias:
- remessa à Vodafone do SIM CARD que se encontrava inserto no telemóvel que lhe foi apreendido a fls. 1297 e ss., com solicitação de que seja informado qual o n.° de telemóvel que lhe corresponde;
- reinquirição da testemunha BB, para que esclareça: onde, como e quando soube da alcunha de Pescocinho; porque razões a atribuiu ao recorrente; porque razões liga o telemóvel que apreendido ao mesmo ao n.° 9xxxxxxxx; e, por fim, em que se sustenta para afirmar que uma das vozes intervenientes nas conversas do aludido número de telemóvel é a do recorrente; e, por fim,
se duvidas restarem quanto à verdade histórica dos factos;
- o depoimento complementar do recorrente.
Respondendo ao recurso, o Ministério Público, pugnou pelo indeferimento do pedido de revisão, por considerar que não se verificam os respectivos pressupostos legais, nos termos constantes de fls. 263 e ss. deste apenso.
Visto o disposto nos art. 453.°, n.° 1 e 454.° do CP, cumpre agora a este Tribunal pronunciar-se sobre a admissibilidade/necessidade da realização das aludidas diligências probatórias e, por fim, prestar a informação sobre o mérito do pedido de revisão.
Vejamos:
Nos termos do art. 449.°, n.° 1 al. d) do CPP, a revisão da sentença transitada em julgado é admissível quando se descobrirem de novos factos ou meios de prova que de “per si” ou combinados com os que forem apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.
Como bem refere o Exmo. Conselheiro Dr. Maia Costa (cf. AC.STJ de 23/11/2010, acessível in www.dgsi.pt), “o recurso de revisão, previsto no art. 449. ° do CPP, assenta num compromisso entre, por um lado, a salvaguarda do caso julgado, que assegura a certeza e a segurança do direito e é, portanto, condição essencial da manutenção da paz jurídica, e, por outro, as exigências da justiça material. Trata-se de um remédio excepcional contra decisões (transitadas) notoriamente injustas, permitindo a sua revisão naqueles casos em que subsistência da decisão (injusta) seria insuportável para o sentimento de justiça da comunidade.
Por isso mesmo, tem constituído jurisprudência praticamente unânime do STJ nos últimos anos, que esses novos factos ou meios de prova devem não só ser novos para o Tribunal, como inclusivamente, para o arguido recorrente, pois esta a única interpretação que se harmoniza com o carácter excepcional do recurso de revisão.
Defende-se, no fundo, que esta “excepcionalidade não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa, ou a adopção de uma estratégia de defesa incompatível com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais”, não podendo o mesmo “beneficiar da sua «deslealdade» (ocultação de meios de prova) quando essa estratégia de defesa fracassa” (Exmo. Conselheiro Dr. Maia Costa (cf. AC.STJ supra citado).
Ora, se bem compreendemos o teor das alegações recursivas, o arguido requereu as aludidas diligências probatórias visando provar, essencialmente:
- que o cartão de telemóvel com n.° 9xxxxxxxx - que esteve envolvido nas escutas telefónicas valoradas pelo Colectivo de Juízes para concluir pela sua condenação - nunca foi utilizado no telemóvel que lhe foi apreendido, que está identificado a fls. 1298 e fotografado a fls. 1302 e cujo o n.° de IMEI não questionou, inicialmente, que fosse o indicado a fls. 1298 (xxxxxxxxxxxxxxx);
- que nunca teve a alcunha de Pescocinho porque foi identificado nos autos; e, por fim,
- que não era a sua a voz ouvida nas aludidas escutas telefónicas ao referido número de telemóvel.
Uns dias mais tarde, porém e com o fundamento de que só tardiamente tinha analisado os documentos de fls. 8044 e 8046 (cf. fls. 71 a 73 destes autos), - cuja junção a este apenso, contudo, já havia requerido aquando da apresentação das alegações - veio, no intitulado aditamento de fls. 248, dar a entender, afinal, que aquele IMEI não correspondia ao telemóvel que lhe foi apreendido.
Ora, sendo manifesto não estão em causa quaisquer factos novos na sobredita acepção do conceito, pois é evidente que o arguido visa apenas fazer vingar a versão inversa dos factos acessórios em que o Tribunal Colectivo se fundamentou para julgar como provados os factos principais que lhe são imputados no acórdão condenatório, a única hipótese que restaria para se concluir pela admissibilidade do presente recurso seria a de estarmos perante a descoberta novos meios de prova sobre tais factos, que pudessem vir a suscitar graves dúvidas sobre a justiça daquela decisão e que não tivessem sido valorados, pelo Tribunal, na mesma, por serem de si e do arguido desconhecidos.
Sucede, porém, que compulsados os autos, logo se constata que assim não é.
No que concerne à informação ora requerida à Vodafone, porque o arguido, visto o teor do auto de busca e apreensão de fls. 1297 e ss. (cf. fls. 63 a 68 deste apenso) e visto, outrossim, o teor da informação prestada pela Vodafone a fls. 8044 (fls. 71 deste apenso), já a poderia ter requerido ao Tribunal, aquando da apresentação da sua defesa ou mesmo durante o julgamento, o que nunca fez.
Quanto à inquirição da testemunha BB, porque a mesma foi ouvida como tal em julgamento, tendo o seu depoimento abordado as questões que o requerente, agora lhe pretende agora recolocar.
E quanto às suas próprias declarações, porque o arguido já as prestou, nos termos que entendeu por convenientes, na audiência de julgamento, tendo sido valoradas pelo Tribunal Colectivo que proferiu o acórdão que agora pretende rever.
Mais do que isto, contudo e para demonstrar a total falta de razão do recorrente, sempre se dirá o seguinte:
O facto do IMEI xxxxxxxxxxxxxx pertencer ao telemóvel apreendido ao arguido decorre do auto de busca e apreensão de fls. 1297 e ss., sendo consabido que este número consta de todos os telemóveis, identifica-os individualmente e é observável através da mera remoção da bateria dos mesmos.
E, por fim, facto do cartão n.° 9xxxxxxxx ter sido utilizado naquele telemóvel e nele estar inserto aquando da sua apreensão, resulta quer do aludido auto de apreensão e busca, quer, sobretudo, da informação da Vodafone de fls. 8044 e 8046 (fls. 71 e 73 destes autos), de onde decorre que tal cartão esteve associado ao IMEI desse telemóvel entre 13/09/2005 e 23/06/2006 e, portanto, aquando da apreensão (11/06/2006).
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Tudo visto e salvo devido respeito pela superior consideração dos Venerandos Srs. Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça
- julga-se inadmissível e desnecessária para a descoberta da verdade material, a realização de qualquer uma das diligências de prova requeridas; e, simultaneamente,
- informa-se, nos termos do art. 454.° do CPP que, na modesta opinião deste Tribunal, o recurso de revisão deve ser indeferido por não se verificaram os pressupostos legais previstos no art. 449.°, n.° 1, al. d) do CPP em que se pretendia escorar (…)».
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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça emitiu douto parecer, constante de fls. 305 a 311, onde considera não se mostrarem reunidos os fundamentos para considerar o caso “sub judice” abrangido pela previsão normativa do artigo 449.º, n.º 1, d), do CPP, defendendo que se impõe a negação da pretendida revisão.
Justifica, concluindo: «In casu, e vista a argumentação esgrimida pelo recorrente à luz da sobredita acepção do conceito, não vêm invocados novos meios de prova sobre os factos principais que levaram à sua condenação – os indicados nos pontos n.º 12 e 13 do acórdão de 1.ª instância. O que o recorrente visa, isso sim, é por em causa a forma como, na sua perspectiva inadequadamente, foram apreciados e valorados os meios de prova de que o tribunal de 1.ª instância, e também o tribunal da Relação, em sede de recurso, se serviram para dar como provados os sobreditos factos. O mesmo é dizer, pois, que o que visa é continuar a discutir, agora pela via do recurso de revisão, as mesmas questões de que lançou mão, ingloriamente, no recurso ordinário que interpôs, mas que foi, nesta parte, julgado improcedente».
Entretanto, foi junto expediente vindo da Comarca - fls. 315 - contendo um requerimento do recorrente ali entrado em 05-07-2001 e formulado na sequência da notificação da informação prestada na Comarca, nos termos do artigo 454.º do CPP, onde o recorrente requer o acesso ao aparelho de telefone que lhe foi apreendido, em ordem a saber que cartão Sim Card está nele instalado e qual o IMEI do mesmo, requerendo ainda cópia das gravações telefónicas que dizem conter a sua voz.
Com tal requerimento veio junta igualmente cópia de um requerimento de interposição de recurso, a subir em separado, e relacionado com recurso interposto do despacho que determinara o pagamento de taxa de justiça pela interposição deste recurso de revisão.
O Exmo. PGA pronunciou-se no sentido de que o requerimento em causa mais não era do que a repetição do pedido formulado em sede de motivação do recurso de revisão interposto, pedido esse apreciado e indeferido pelo despacho judicial de fls. 295 e seguintes, nada mais se oferecendo dizer para além do que já dissera.
Promoveu que o processo baixasse à primeira instância para pronúncia sobre admissão do recurso para a Relação, o que foi deferido.
Realizada a tramitação necessária na Comarca respeitante a tal recurso, voltou o processo, vindo o recorrente apresentar novo requerimento em 3 de Agosto, contendo uma exposição de fls. 330 a 334, tendo em conta a resposta do M.º P.º e informação do juiz, sobre a qual o recorrente já se pronunciara, como vimos, a fls. 315, e sobre o parecer do M.º P.º neste Supremo Tribunal.
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Colhidos os vistos, realizou-se a conferência a que alude o artigo 455.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.
O objecto do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas da motivação apresentada pelo recorrente, não havendo neste recurso extraordinário lugar, por razões óbvias (em causa está apenas a fixação da matéria de facto), a qualquer conhecimento oficioso.
Por outro lado, a apresentação de posteriores requerimentos ou exposições suscitadas pelo teor da resposta do M.º P.º na Comarca, ou do despacho judicial proferido ao abrigo do artigo 454.º do CPP, ou ainda do parecer do M.º P.º neste Supremo Tribunal não têm por efeito o alargamento do âmbito do presente recurso, que é extraordinário, não compatível com sucessivos aditamentos de tomadas de posição sobre o valor das provas, nem com uma espécie de “articulados supervenientes”, admissíveis apenas no plano do adjectivo cível.
Questão a resolver.
A única questão a apreciar prende-se com a aferição da verificação do fundamento de admissibilidade da revisão de sentença previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal – novo meio de prova.
Efectivamente, o requerente fundamenta o pedido no conjunto normativo dos artigos 449.º, n.º 1, alínea d), 451.º e 466.º do Código de Processo Penal.
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Vejamos a matéria de facto dada por provada, bem com a motivação da decisão sobre a matéria de facto, tal como emerge do acórdão condenatório.
Constitui passo imprescindível para a apreciação de recurso de revisão com este fundamento o conhecimento do núcleo essencial da decisão revidenda, ao nível da fixação da matéria de facto, pois que como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/2000, de 13-07-2000, processo n.º 379/99 - 1.ª Secção, publicado in BMJ n.º 499, pág. 88, uma vez que a revisão solicitada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal implica apreciação de matéria de facto, a decisão a rever deverá ser aquela que tiver apreciado os factos provados e não provados, sendo essa a decisão a submeter a recurso de revisão.
Como dizia Luís Osório, Comentário ao Código de Processo Penal, volume VI, pág. 403, versando a revisão sempre sobre a questão de facto, visa-se pela mesma não um reexame nem uma reapreciação de anterior julgado, mas, sim e antes, uma nova decisão assente em novo julgamento do facto com apoio em novos dados de facto, “um julgado novo sobre novos elementos”.
Matéria de facto e convicção
Na indicação que se segue procedeu-se a uma extracção do que releva em exclusivo ao ora recorrente, tendo em atenção que foram julgados dezoito arguidos, indicando-se as folhas do acórdão de primeira instância.
Factos Provados
No ponto n.º 8 – cfr. fls. 21 deste apenso (fls. 8065 do principal) - descrevendo a conduta do co-arguido DD concretiza-se a fls. 24 verso (fls. 8072 do processo principal), em relação ao ora recorrente:
“- ao arguido AA vendeu meio quilo de haxixe em Junho de 2006, por quantia não apurada;”
Nos pontos de factos provados n.º s 12 e 13, a fls. 25 verso deste (fls. 8074 do principal), n.º 34, a fls. 30 verso (fls. 8084 do principal), n.ºs 55 e 56, a fls. 33 deste apenso (fls. 8089 do principal), n.ºs 58 e 62, a fls. 33 verso (fls. 8090 do principal), consta:
12 - O arguido AA, entre data não apurada de meados de 2004 e meados de 2005, vendeu haxixe cerca de 6 vezes a CC, em quantidades não apuradas e por 2,5 a 5 euros de cada vez; além disso, em Maio e Junho de 2006 tal arguido vendeu aquele mesmo produto ao arguido DD - sendo o contacto através do telemóvel n°9xxxxxxxx - pois variadas vezes mas em número em concreto não apurado, em quantidades que ascenderam aos 2, 4, 5 e 10 quilos e por quantias não apuradas; ainda em Junho, este mesmo arguido comprou ao arguido DD meio quilo de tal produto estupefaciente;
13 - O arguido AA deslocava-se durante aquele período de tempo, por diversas artérias desta comarca conduzindo o veículo automóvel de matrícula NQ-xx-xx, sem que fosse titular de carta de condução ou de qualquer título que o habilitasse a tal condução;
(...)
34 - No dia 11 de Julho de 2006, o arguido AA foi detido, tendo-lhe sido encontrado em sua casa e apreendido o seguinte:
- 2,6 gramas de canabis-resina (l,910g + 0,690g);
- um telemóvel de marca Nokia com o cartão n° 9xxxxxxxx, um cartão da Vodafone com a referência n.° 700546985229, que o arguido utilizava para proceder aos vários contactos nomeadamente com o arguido DD, para combinar a compra e venda de produtos estupefacientes;
- 56,00 € (cinquenta e seis euros) em notas do Banco Central Europeu, que o arguido consigo transportava;
(…)
55 – Os arguidos agiram sabendo que a detenção, transporte, cedência ou venda daqueles produtos estupefacientes é proibida e punida por lei;
56 - Os arguidos DD e AA sabiam que não é permitida a condução de veículos automóveis ou de motociclos na via pública sem carta de condução;
(…)
58 - Todos os arguidos agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, sabendo proibidas e punidas as suas condutas;
(…)
62 – O arguido AA já sofreu condenações em 2004 (por crime de condução sem habilitação legal – pena de multa que veio a cumprir), em 2005 (por crime de condução sem habilitação legal - pena de 5 meses de prisão suspensa por 2 anos, a qual entretanto já foi declarada extinta por decisão de 11/7/2007) e em 2007 (por crimes de de condução sem habilitação legal e de condução perigosa de veículo rodoviário – na pena única de 16 meses de prisão suspensa por 16 meses); disse ser consumidor de haxixe; é solteiro e vive com os seus pais; tem a profissão de empregado fabril numa fábrica de garrafas, no que disse auferir cerca de 600 euros mensais;).
No segmento dos Factos não provados ficou consignado (fls. 35 verso e 36 deste e fls. 8094 e 8095, do processo principal):
s) - que os restantes arguidos vendessem ecstasy a consumidores finais;
t) - que o arguido AA tenha comprado produtos estupefacientes ao arguido EE;
u) - que, no âmbito da factualidade apurada sob o número 12, o arguido AA tivesse comprado outras quantidades e tivesse procedido à actividade de venda ali aludida em outro período de tempo, em diferentes quantidades, com outras periodicidades e a outras pessoas identificadas que não as ali referidas;
v) - que o arguido AA vendeu em média semanal cerca de 305 g de haxixe pelo preço de 305 euros;.
E quanto a fundamentação da decisão sobre a fixação da matéria de facto provada consta o seguinte, a fls. 8100:
«A convicção do tribunal, relativamente aos factos provados, baseou-se na conjugação e apreciação crítica dos elementos probatórios e nas considerações que a seguir se indicam :
a)…………………………………………………………………………………………
b)- nas declarações do arguido AA, que confessou os factos referidos sob o número 13 [já quanto aos restantes factos a si imputados, negou a sua prática e referiu mesmo que o telemóvel com o número 9xxxxxxxx, referido sob a número 12 e identificado nas transcrições das escutas telefónicas (que mais à frente se referirão) não é seu - o que porém, desde já se refere, não corresponde à verdade e é desde logo contrariado pelo facto de lhe ter sido apreendido o telemóvel com tal número (conforme consta do auto de busca e apreensão constante de fls. 1297 e 1298, confirmado pela testemunha BB, que mais adiante também se referirá) e pela informação da operadora de telemóveis "Vodafone" constante de fls. 2515 e 2716 (de onde consta que tal telemóvel está registado em nome de tal arguido desde 13/9/2005), informação esta confirmada de novo (na sequência de solicitação nesse sentido já efectuada na parte final do julgamento) pela mesma operadora por ofício que deu entrada em 24 de Junho deste ano e constante das últimas folhas do processo (reportadas a este momento), na qual se refere que tal telemóvel esteve registado em nome do arguido em referência de 13/9/2005 a 16/3/2007, só tendo sido desactivado de tal registo nesta última data];» (destaques no original)
E a fls. 8105/6:
1) - no depoimento da testemunha BB, cabo da GNR pertencente ao NICD de S. João da Madeira, que participou nas investigações (em vigilâncias, em transcrições de escutas telefónicas e na busca ao arguido AA) e que, como as anteriores testemunhas, confirmou o teor dos autos de vigilância e busca em que participou, dando conta da movimentação de diversos arguidos e, especialmente, das escutas referentes a conversas telefónicas entre o arguido AA e o arguido DD [neste âmbito, referiu: ter visto vendas de estupefaciente do arguido DD ao arguido FF na Zona Industrial de Argoncilhe, seguidas de deslocações do arguido FF para a zona do edifício do tribunal em Sta. Maria da Feira onde passava a vender a consumidores que ali acorriam; ter visto o arguido DD a vender estupefaciente a um consumidor (a GG, indicado sob o número 8) junto ao "Café B… D…", na Vergada; ter visto este mesmo arguido a vender estupefaciente à arguida HH e ao arguido II e depois também ao arguido JJ; ter procedido à escuta e transcrição de conversas telefónicas efectuadas entre os arguidos AA e DD, confirmando que o arguido AA utilizava o telemóvel com o número 9XXXXXXXX, referido sob o número 12 (estava registado em seu nome, como referiu, em consonância com a informação da "Vodafone" a fls. 2716, e a voz era a dele)];
E a fls. 8111:
dd) – no depoimento da testemunha CC, que confirmou ter comprado haxixe ao arguido AA nos termos referidos sob o número 12;
Ainda a fls. 8113/4:
tt) - nos relatórios de vigilâncias, já referidos anteriormente e constantes de fls. 58 e 59, 66, 104, 108 e 109, 110, 111 a 113, 114, 134, 136 e 137, 138, 139 e 140, 142 e 143, 144 e 145, 146 a 150,151 a 155,156 a 164,165 a 171,172 a 177,178 a 184, 216 e 217, 303 e 304,400,402 a 405, 504 e 505, 664 e 665, 666 a 668, 682 e 683, 704 e 705, 773 e 774,775 e 776,777 a 780, 781 e 782, 816 e 817, 818 e 819, 820 e 821, 822 a 824, 877 e 878, 879 a 881,882 e 883, 884 a 886, 1151 a 1153, 1154, 1155 e 1156 e 1198 a 1201, cujo conteúdo foi confirmado pelos agentes da GNR que nelas tomaram parte e em articulação com a prova testemunhal por estes produzida em audiência, em que foi dada conta da movimentação dos diversos arguidos, dos veículos em que se deslocavam, dos seus encontros com consumidores e dos locais onde tal acontecia;
uu) - nos autos de busca e apreensão de objectos constantes de fls. 1235 a 1257, 1276 a 1285, 1297 a 1302, 1311 a 1315, 1324 a 1329, 1350 a 1358, 1360 a 1362, 1377 a 1381, 1391 a 1393, 1415 a 1425, 1437 a 1439, 1463 a 1466, 1473 a 1480, 1502 a 1504, 1506 a 1507, 1526 a 1530, 1538 a 1542 e 1560, cujo conteúdo foi confirmado pelos agentes da GNR que nelas tomaram parte e em articulação com a prova testemunhal por estes produzida em audiência;
vv) - nos autos de transcrição de escutas telefónicas constantes de fls. 345 a 358, 372 a 395,407 a 412, 443 a 455, 549 a 584, 706 a 707, 585 a 605, 646 a 662, 735 a 750,759 a 762, 805 a 812, 833 a 842, 862 a 869, 873 a 876, 1115 a 1140, 1141 a 1144, 1190 a 1192 e 1193 a 1197, cujo teor foi na maior parte das vezes lido e também aflorado em julgamento em ligação com a produção de prova testemunhal e de cuja amplitude e conteúdo claramente resultam encomendas (…).
Apreciando.
Questão única – Do fundamento de revisão previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal - Novo meio de prova
Como nota introdutória, dir-se-á que a presente pretensão recursiva reporta-se a condenação transitada em julgado, alegadamente injusta, por factos ocorridos entre meados do ano de 2004 e meados de 2005 (factos provados n.º s 12 e 13), em Junho de 2006 (facto provado n.º 8, a fls. 24 verso) e 11-07-2006 (facto provado n.º 34).
Estabelece o artigo 453.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, a propósito da produção de prova no caso de ter sido invocado o fundamento previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º, que «O requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor».
O normativo em causa “sucede” ao disposto no artigo 678.º do Código de Processo Penal de 1929, que se reportava ao fundamento da revisão previsto no n.º 4 do artigo 673.º, o qual dizia:
“Uma sentença com trânsito em julgado só poderá ser revista:
(…)
4.º. Se, no caso de condenação, se descobrirem novos factos ou elementos de prova que, de per si ou combinados com os factos ou provas apreciados no processo, constituam graves presunções da inocência do acusado”.
O referido artigo 678.º, versando sobre “Produção de prova sobre os novos factos ou elementos de prova”, relativamente ao caso de o fundamento da revisão ser o do n.º 4 do artigo 673.º, dispunha no § 1.º que “O requerente só poderá indicar novas testemunhas quando justifique que ignorava a sua existência ao tempo da decisão, ou que estiveram impossibilitadas de depor, e não poderá exceder o número das que lhe era lícito apresentar na audiência de julgamento”.
O tribunal da condenação entendeu não ser de produzir a prova requerida.
Vejamos se no caso concreto se justifica a invocação do fundamento de revisão previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal.
Na exposição introdutória que se fará, seguir-se-á de muito perto o que se contém nos acórdãos de 02-04-2008, 14-05-2008, 03-09-2008, 10-12-2008, 11-02-2009, 01-07-2009, 17-09-2009, de 24-02-2010, de 10-03-2010, de 19-05-2010, de 10-03-2011, de 07-09-2011 (três), por nós relatados nos recursos de revisão n.º s 3182/07, 700/08, 1661/08, 3069/08, 3930/08, 319/04.1GBTMR-B.S1, 1566/03.9PALGS-A.S1,90/08.8SJLSB-A.S1, 06/04.7TATNV.C1.S1, 281/03.8GTCTB.S1, 482/91.0GBVRM-A.S1.,17/04.0TABRG-A.S2, 22/05.5ZRFAR-B. E1.S1 e 286/06.7PAPTM-C.E1.S1.
Com o presente recurso pretende o recorrente se autorize a revisão do acórdão condenatório, transitado em julgado, proferido no processo principal.
Consiste a revisão num meio extraordinário que visa a impugnação de uma sentença transitada em julgado e a obtenção de uma nova decisão, mediante a repetição do julgamento.
Como se assinala no supra citado acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/2000, de 13-07-2000, proferido no processo n.º 379/99-1.ª secção, publicado in BMJ n.º 499, pág. 88, trata-se de recurso com uma natureza específica, que no próprio plano da Lei Fundamental se autonomiza do genérico direito ao recurso garantido no processo penal pelo artigo 32.º, n.º 1.
O direito à revisão de sentença encontra consagração constitucional no artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, versando em concreto sobre «Aplicação da lei criminal», no domínio dos direitos, liberdades e garantias, exactamente inserido no Título II, subordinado à epígrafe “Direitos, liberdades e garantias”, e a partir da primeira revisão constitucional - Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de Setembro -, no Capítulo I, sob a epígrafe “Direitos, liberdades e garantias pessoais”.
Trata-se de preceito que contém o essencial do “regime constitucional” da lei criminal.
Releva para o nosso caso, o n.º 6 deste preceito, que reconhecendo e garantindo o direito a revisão, estabelece: “Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos”.
Este n.º 6, acrescentado ao artigo 29.º pela Lei Constitucional n.º 1/82, mais não é do que a reprodução do n.º 2 do primitivo artigo 21.º da Constituição da República, inserto então em norma que versava sobre “Responsabilidade civil do Estado”, procurando responder a reparação de caso de erro judiciário, fora do plano da prisão preventiva ilegal ou injustificada, e constante já do artigo 2403.º do Código Civil de 1867 e do artigo 690.º do Código de Processo Penal de 1929, no que respeita ao plano específico da “indemnização ao réu absolvido” (a revisão era então versada nos artigos 673.º a 700.º).
O aludido n.º 6 reconhece e garante: (a) o direito à revisão de sentença; e b) o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos no caso de condenações injustas.
Como se pode ler em Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira, 2007, volume I, pág. 498, «É um caso tradicional de responsabilidade do Estado pelo facto da função jurisdicional o ressarcimento dos danos por condenações injustas provadas em revisão de sentença».
Através do mecanismo processual da revisão de sentença, procura-se alcançar a justiça da decisão: “Entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse contraposto de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e, através dela, a justiça, o legislador tem que escolher. O grau em que sobrepõe um ao outro é questão de política criminal. Variam as soluções nas diferentes legislações. Mas o que pode afirmar-se resolutamente é que em nenhuma se adoptou o dogma absoluto do caso julgado frente à injustiça patente, nem a revisão incondicional de qualquer decisão transitada. Se aceitamos pois, como postulado, que a possibilidade de rever as sentenças penais deve limitar-se, a questão que doutrinalmente se nos coloca é onde colocar o limite” – Emílio Gomez Orbaneja e Vicente Herce Quemada, Derecho Procesal Penal, 10.ª Edição, Madrid, 1984, pág. 317 (a autoria do capítulo respeitante aos recursos é do 1.º Autor).
Mais do que meros interesses individuais, são ponderosas razões de interesse público que ditam a existência desta última garantia, cuja teleologia se reconduz em fazer prevalecer a justiça (material, real ou extraprocessual), sobre a segurança jurídica – José Maria Rifá Soler e José Francisco Valls Gombau, Derecho Procesal Penal, Madrid, Iurgium Editores, pág. 310.
Admitindo que a sentença judicial não tem o alcance de modificar a realidade do direito substantivo, transformando por misericordiosa ficção o injusto em justo, deverá tirar-se a consequência de que nenhuma decisão judicial seria definitiva e irrevogável.
Contra esta consequência se move, porém, a necessidade de segurança jurídica que, em largo limite, assim é chamada a restringir a justiça – Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, III, Lisboa, 1958, pág. 36; de modo concordante, Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1.ª Edição, 1974 – Reimpressão, Coimbra Editora, 2004, págs. 42 a 45.
A reparação da decisão, condenatória ou absolutória, reputada de materialmente injusta, pressupõe que a certeza, a paz e a segurança jurídicas que o caso julgado encerra (a justiça formal, traduzida em sentença transitada em julgado), devem ceder perante a verdade material; por esta razão, trata-se de um recurso marcadamente excepcional e com fundamentos taxativos – Vicente Gimeno Sendra, Derecho Procesal Penal, Editorial Colex, 1.ª Edição, 2004, pág. 769.
Conforme escreveu Eduardo Correia, in A Teoria do Concurso em Direito Criminal, Almedina, 1983, pág. 302, “o fundamento central do caso julgado radica-se numa concessão prática às necessidades de garantir a certeza e a segurança do direito. Ainda mesmo com possível sacrifício da justiça material, quer-se assegurar através dele aos cidadãos a sua paz jurídica, quer-se afastar definitivamente o perigo de decisões contraditórias. Uma adesão à segurança com um eventual detrimento da verdade, eis assim o que está na base do instituto” (em registo semelhante ver, do mesmo Autor, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, pág. 7).
Figueiredo Dias (loc. cit., pág. 44) afirma que a segurança é um dos fins prosseguidos pelo processo penal, “o que não impede que institutos como o do recurso de revisão contenham na sua própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce que só dificilmente se poderia erigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e, prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser, só, no fundo, a força da tirania”.
Nas palavras de Luís Osório de Oliveira Batista, no Comentário ao Código de Processo Penal Português, Coimbra Editora, 1934, 6.º volume, págs. 402-403: “O princípio da res judicata pro veritate habetur é um princípio de utilidade e não de justiça e assim não pode impedir a revisão da sentença quando haja fortes elementos de convicção de que a decisão proferida não corresponde em matéria de facto à verdade histórica que o processo penal quer e precisa em todos os casos de alcançar. (…) A revisão tem a natureza de um recurso. (…) A revisão é um exame do caso quando surgem novos e importantes elementos de facto. Pode assim dizer-se que se não trata de uma revisão do julgado, mas de um julgado novo sobre novos elementos”.
Para Simas Santos/Leal-Henriques, in Recursos em Processo Penal, Rei dos Livros, 2.ª edição, pág. 129, o legislador, “com vista ao estabelecimento do equilíbrio entre a imutabilidade da sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de respeito pela verdade material”, consagrou a possibilidade de revisão das sentenças penais, limitando a respectiva admissibilidade aos fundamentos taxativamente enunciados no art. 449.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.
Segundo os mesmos Autores, in Código de Processo Penal Anotado, II volume, págs. 1042/3, “O recurso extraordinário de revisão apresenta-se como um ensaio legislativo com vista ao estabelecimento do equilíbrio entre a imutabilidade da sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de respeito pela verdade material”.
Nas palavras do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-04-2005, processo n.º 135/05-3.ª, publicado in CJSTJ, 2005, tomo 2, pág. 179, o recurso extraordinário de revisão consagrado no artigo 449.º e seguintes do CPP apresenta-se como uma válvula de segurança do sistema, modo de reparar o erro judiciário cometido, sempre que, numa reponderação do decidido, possa ser posta em causa, através da consideração de factos-índice, taxativamente enumerados naquele normativo, seriamente a justiça da decisão ou do despacho que ponha termo ao processo.
*
Nos termos do referido artigo 449.º do Código de Processo Penal, na redacção anterior à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto:
“1 - A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:
a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;
b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;
c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;
d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação”.
A Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, entrada em vigor em 15 de Setembro de 2007, introduziu três novas alíneas ao n.º 1 do referido artigo 449.º, com a redacção seguinte:
e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 126.º;
f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;
g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça”.
(O preceito em causa tem-se mantido inalterado nas subsequentes modificações do Código de Processo Penal operadas pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, pela Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, pela Lei n.º 115/09, de 12 de Outubro e pela Lei n.º 26/2010, de 30 de Agosto).
******
O recorrente invoca, como fundamento da pretendida revisão, a alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal, sustentando a necessidade de audição de uma testemunha já ouvida e de declarações a si próprio para além da requisição de certos documentos.
Cumpre aferir se o caso presente integra o fundamento de revisão de sentença assinalado, indagando se estamos perante novos meios de prova e se os mesmos concitam o surgimento de graves dúvidas sobre a justiça da condenação.
Nos termos do artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal, a revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando “se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação”.
Como se extrai do citado acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/2000, o núcleo essencial da ideia que preside à instituição do recurso de revisão, precipitada na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal, reside na necessidade de apreciação de novos factos ou de novos meios de prova que não foram trazidos ao julgamento anterior.
No novo processo não se procura a correcção de erros eventualmente cometidos no anterior e que culminou na decisão revidenda, porque para a correcção desses vícios terão bastado e servido as instâncias de recurso ordinário, se acaso tiverem sido necessárias.
Refere-se o referido acórdão às novas provas como sendo aquelas que não puderam ser apresentadas e apreciadas antes, na decisão que transitou em julgado.
O fundamento de revisão previsto na citada alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal importa a verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, a descoberta de novos factos ou meios de prova e, por outro lado, que tais novos factos ou meios de prova suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, não podendo ter como único fim a correcção da medida concreta da sanção aplicada (n.º 3 do mesmo preceito).
Segundo Cavaleiro de Ferreira (Revisão Penal, Scientia Iuridica, Tomo XIV, n.ºs 75/76, pág. 522, citado por Simas Santos / Leal-Henriques, ob. cit., pág. 137 e no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-01-2007, processo n.º 2042/06 - 5.ª): “Factos são os factos probandos; elementos de prova, as provas relativas a factos probandos.
Factos probandos em processo penal são ainda de duas espécies, para esquematicamente os compreender. Em primeiro lugar, os factos constitutivos do próprio crime, os seus elementos essenciais; em segundo lugar, os factos, dos quais, uma vez provados, se infere a existência ou inexistência de elementos essenciais do crime. (…) Quer dizer, por factos há que entender todos os factos que devem ou deveriam constituir “tema” da prova.
Elementos de prova, são as provas destinadas a demonstrar a verdade de quaisquer factos probandos, quer dos que constituem o próprio crime, quer dos que são indiciantes de existência ou inexistência do crime ou seus elementos”.
Como se extrai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2007, processo n.º 2431/07 - 3.ª (com argumentário repetido no acórdão de 11-02-2009, no processo n.º 4215/04, do mesmo relator) “o fundamento de revisão previsto na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP reporta-se exclusivamente à factualidade do crime, ou seja, às circunstâncias históricas, ao episódio ou evento, circunscrito no tempo e no espaço, que foi considerado na sentença condenatória como integrante de uma determinada infracção. A lei admite a revisão se a descoberta de novos factos ou novos meios de prova (de factos) vier a alterar ou pôr em crise a matéria de facto fixada na sentença condenatória, modificando-a ou invalidando-a, de tal forma que fique seriamente em dúvida a justiça da condenação, isto é, que resulte muito provável, dos novos factos ou meios de prova, que o condenado não cometeu a infracção, devendo assim ser absolvido. (...) É o chamado «erro judiciário», a incompleta ou incorrecta averiguação da verdade material, que determinou a subsunção dos factos a um certo tipo legal, e consequentemente a condenação, que o legislador pretende remediar com a aludida al. d). Só um erro deste tipo pode caracterizar como injusta a decisão condenatória. A injustiça, no contexto daquela alínea, está efectivamente conexa com a descoberta de um erro na fixação dos factos que levaram à condenação”.
Quanto ao primeiro dos indicados pressupostos do fundamento de revisão previsto na alínea d), não é pacífico o entendimento quanto à questão de saber se a “novidade” do facto ou do meio de prova deve reportar-se ao julgador, ou ao apresentante da fonte de prova.
Na doutrina, Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, reimpressão 2004, volume I, pág. 99, a propósito da função integrante de lacuna do direito processual penal por norma de processo civil, refere que, colocando-se o problema de saber para quem devem ser novos os factos que fundamentam a revisão: se para quem os apresenta, que era a solução processual civil (artigo 771.º, n.º 1, alínea c), do CPC), conferindo-lhe então função integrante, ou se apenas para o processo, que era a tomada de posição acolhida por jurisprudência pacífica, é esta a solução aceitável, e já defendida, à luz do artigo 673.º do Código de Processo Penal de 1929, por Eduardo Correia, in separata da RDES, 6/381.
No mesmo sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Verbo, volume III, pág. 388.
Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 16.ª edição, 2007, Almedina, pág. 982 (e 17.ª, de 2009, pág. 1062), reeditando posição da 4.ª edição de Janeiro de 1980, pág. 717, em anotação ao artigo 673.º do CPP de 1929, esclarece que deve “entender-se que os factos ou meios de prova devem ser novos, no sentido de não terem sido apresentados e apreciados no processo que conduziu à condenação, embora não fossem ignorados pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar”.
Em sentido diverso, Paulo Pinto de Albuquerque no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2007, em anotação ao artigo 449.°, nota 12, pág. 1212 (e a págs. 1207/8, na 4.ª edição actualizada de 2011), expende: “factos ou meios de prova novos são aqueles que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e não puderam ser apresentados antes deste, não bastando que os factos sejam desconhecidos do tribunal, só esta interpretação fazendo jus à natureza excepcional do remédio da revisão e, portanto, aos princípios constitucionais da segurança jurídica, da lealdade processual e da protecção do caso julgado”.
No domínio do anterior CPP, Luís Osório, Comentário ao Código de Processo Penal, 1934, volume VI, pág. 416, ao comentar o artigo 673.º, entendia que os factos ou os elementos de prova deviam ser novos, isto é, não deviam ser conhecidos de quem os devia apresentar na data em que a apresentação devia ter lugar. E num outro registo: “Os factos devem ter sido desconhecidos do requerente da revisão ao tempo em que foi proferida a sentença a rever não bastando que sejam desconhecidos do Tribunal”.
A esse tempo, a disposição do já citado § 1.º do artigo 678.º “O requerente só poderá indicar novas testemunhas quando justifique que ignorava a sua existência ao tempo da decisão, ou que estiveram impossibilitadas de depor…” era invocada para fundamentar justamente a corrente que defendia que os factos ou elementos de prova deviam ser novos no sentido de desconhecidos por quem os devia apresentar no julgamento.
Na jurisprudência deste Supremo Tribunal, na controvérsia presente, foi durante muito tempo largamente maioritário o entendimento de que a “novidade” dos factos deve existir para o julgador, ainda que o recorrente os conhecesse já, podendo ver-se, i. a., os acórdãos de 2-11-1966, BMJ n.º 101, pág. 491; de 20-03-1968, BMJ n.º 175, pág. 220; de 15-11-1989, AJ, n.º 3; de 09-07-1997, BMJ n.º 469, pág. 334; de 24-11-1999, processo n.º 911/99 - 3.ª; de 16-02-2000, processo n.º 713/99 - 3.ª; de 15-03-2000, processo n.º 92/00 - 3.ª; de 06-07-2000, processo n.º 99/00 - 5.ª; de 25-10-2000, processo n.º 2537/00 - 3.ª; de 05-04-2001, CJSTJ 2001, tomo 2, pág. 173; de 10-01-2002, processo n.º 4005/01 - 5.ª, CJSTJ 2002, tomo 1, pág. 163; de 20-06-2002, processo n.º 1261/02; de 04-12-2002, processo n.º 2694/02 - 3.ª; de 28-05-2003, processo n.º 872/03 – 3.ª, CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 202; de 04-06-2003, processo n.º 1503/03 – 3.ª, CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 208; de 06-11-2003, processo n.º 3368/03 - 5.ª e, do mesmo relator, de 20-11-2003, processo n.º 3468/03 – 5.ª, ambos in CJSTJ 2003, tomo 3, págs. 229 e 233; de 01-07-2004, processo n.º 2038/04 - 5.ª, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 242; de 25-11-2004, processo n.º 3192/04 - 5.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 232; de 03-02-2005, processo n.º 4309/04 – 5.ª, CJSTJ 2005, tomo 1, pág. 191; de 09-02-2005, processo n.º 4003/04 - 3.ª; de 03-03-2005, processo n.º 764/05 – 3.ª; de 20-04-2005, processo n.º 135/05 – 3.ª, CJSTJ 2005, tomo 2, pág. 179; de 20-06-2007, processo n.º 1575/07 - 3.ª; de 21-06-2007, processo n.º 1767/07 – 5.ª; de 05-12-2007, processo n.º 3397/07 - 3.ª; de 14-05-2008, processo n.º 1417/08 – 3.ª; de 25-06-2008, processo n.° 2031/08 - 3.ª e processo n.º 441/08 - 5.ª.
Mais recentemente, no acórdão de 21-10-2009, processo n.º 12124/04.0TDLSB-A.S1-5.ª, afirma-se que para efeitos do art. 449.º, n.º 1, al. d) do CPP, factos ou meios de prova novos são aqueles que não foram trazidos ao julgamento anterior e no de 26-11-2009, processo n.º 13154/94.4TBVNG-B.S1-5.ª, refere-se «Este Supremo Tribunal entende por “factos novos”, ou “novos meios de prova”, aqueles que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, por serem desconhecidos da jurisdição no acto do julgamento e que possam ter reflexos na culpabilidade do condenado – cf. Ac. de 24-09-2003, Proc. n.º 2413/03».
No acórdão de 12-11-2009, processo n.º 851/99.7JGLSB-E.S1-3.ª, afirma-se que “Quanto à novidade dos factos e/ou elementos de prova, tem o STJ entendido, de forma pacífica, que os factos ou meios devem ter-se por novos quando não tenham sido apresentados no processo, embora não fossem ignorados pelo arguido no momento em que foi julgado”.
Da mesma data, o acórdão lavrado no processo n.º 228/07.2GAACB-A.S1, com orientação seguida no acórdão de 17-12-2009, processo n.º 330/04.2JAPTM-B.S1, bem como no acórdão de 07-01-2010, processo n.º 837/03.9TABCL-A.S1, todos da 5.ª Secção e do mesmo relator, onde se defende que mais recentemente e praticamente sem discrepância, para a corrente largamente maioritária neste Supremo, não é necessário o desconhecimento por parte do recorrente, bastando que os factos ou meios de prova não tenham sido tidos em conta no julgamento que levara à condenação, para serem considerados novos.
Defendendo que esta orientação deve ser perfilhada, mas com uma limitação, que expressa nos seguintes termos: os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia apresentá-los, serão invocáveis em sede de recurso de revisão, desde que seja dada uma explicação suficiente, para a omissão, antes, da sua apresentação. O recorrente terá que justificar essa omissão, explicando porque é que não pôde, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal.
No sentido de que os factos novos não abrangem aqueles que o recorrente já podia conhecer e de que tinha, ou devia ter, plena noção da sua relevância jurídica, incluindo apenas os que advieram ao conhecimento do apresentante em data posterior, pronunciou-se o acórdão de 14-06-2006, processo n.º 764/06 – 3.ª, CJSTJ 2006, tomo 2, pág. 217 (invocando acórdãos de 16-03-1999 e de 11-03-1993, este no processo n.º 43772), nos seguintes termos: “No fundo, mesmo um arguido, não pode ter o direito de beneficiar duma situação extremamente violenta sob o ponto de vista jurídico que é o ataque ao caso julgado, com fundamentos por si criados com dolo ou grave negligência ... a revisão de sentença não é um trunfo que os intervenientes processuais possam guardar do momento da discussão da decisão revidenda para ulterior fase em que pedem a revisão se tal não lhes agradar. O que não significa que não possam ser atendidos factos que já conhecesse, mas desde que conhecendo-os, desconhecesse a sua relevância para o julgamento ou, por outro motivo atendível, tê-los desprezado quando eram importantes ou, ainda ter estado impossibilitado de os apresentar”.
Nesta linha, que tem vindo a ganhar sucessivas adesões, podem ver-se os acórdãos de:
25-10-2007, processo n.º 3875/07-5.ª – Apurando-se que ao tempo da condenação o recorrente sabia bem quem eram as testemunhas que agora indica e que tinham presenciado os factos, só não as tendo chamado a depor porque assim o entendeu, não constituem as mesmas «novos meios de prova» para o recurso de revisão, pois o art. 453.º, n.º 2, do CPP, proíbe expressamente esta situação. A razão de ser desta norma reside na excepcionalidade do recurso de revisão, pois as provas devem ser examinadas no local próprio, isto é, na audiência da 1.ª instância. O recurso de revisão não é uma segunda oportunidade de defesa para o arguido, mas uma defesa absolutamente excepcional, para casos residuais não previstos na normalidade das situações;
03-04-2008, processo n.º 422/08-5.ª, onde se pondera: Um facto já investigado pela decisão revidenda não é um facto novo, ainda que tenha sido respondido desfavoravelmente ao recorrente. O arguido não podia deixar de alegar no julgamento as circunstâncias que conhecia, para vir só invocá-las no recurso de revisão.
09-04-2008, no processo n.º 675/08, de 17-04-2008, processo n.º 4840/07 e de 10-09-2008, processo n.º 1617/08, todos desta secção, e do mesmo relator, onde se defende que é condição de procedência do recurso a novidade dos factos ou meios de prova, o que implica que eles fossem ignorados pelo arguido ou não pudessem ser apresentados ao tempo do julgamento; o recurso é inadmissível quando os factos novos alegados sejam já do conhecimento do requerente ao tempo do julgamento; “os factos têm de ser novos também para ele”;
17-04-2008, processo n.º 4840/07-3.ª, afirmando: São novos apenas os factos que fossem ignorados ou não pudessem ser apresentados ao tempo do julgamento, quer pelo tribunal, quer pelas partes;
10-09-2008, processo n.º 2154/08 – 3.ª, donde se extrai “A novidade de factos que, concatenada com os demais elementos dos autos, fazem suscitar graves dúvidas sobre a justiça da condenação, nos termos do art. 449.º, n.º 1, al. d), do CPP, há-de respeitar tanto a factos anteriores à condenação que o arguido desconhecia e não pôde apresentar como aos posteriores a esta, sob pena de se tornar o recurso em novo julgamento, beneficiando a inércia do arguido, que podia apresentar e requerer a sua ponderação, nos termos do art. 340.º, n.º 2, do CPP, não se podendo consentir, contrariando a ratio do recurso, que aquela inacção sirva para fundar um meio extraordinário de defesa. O recurso não se adequa a corrigir erros decisórios, de que se teve conhecimento e para o que basta o uso dos recursos normais”;
25-09-2008, processo n.º 1149/08 – 5.ª, onde se lê que a lei não permite que a inércia voluntária do arguido em fazer actuar os meios ordinários de defesa seja compensada pela atribuição de meios extraordinários de defesa;
20-11-2008, processo n.º 3543/08 – 5.ª, aí se referindo que os factos novos, para efeitos de revisão, têm de ser novos também para o requerente; novos, porque os ignorava de todo, ou porque estava impossibilitado de fazer prova sobre eles, sendo a interpretação a fazer a partir do n.º 2 do artigo 453.º, sendo a que se harmoniza com o carácter excepcional do recurso de revisão, que não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa ou estratégias de defesa incompatíveis de defesa incompatíveis com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais. E conclui: Se o arguido se “esquece” de apresentar certos meios de prova em julgamento ou os negligencia, ou se por qualquer outra razão opta por ocultá-los, no prosseguimento de uma certa estratégia de defesa, escamoteando-os ao tribunal, caso venha a sofrer uma condenação, não deve obviamente ser compensado com o “prémio” de um recurso excepcional, que se destinaria afinal a suprir deficiências, voluntárias ou involuntárias, da sua defesa em julgamento, sendo de ter por inadmissível o recurso de revisão interposto ao abrigo da al. d) do n.º 1 do art. 449º do CPP quando os factos novos alegados sejam já do conhecimento do requerente ao tempo do julgamento;
20-11-2008, processo n.º 1311/08 – 5.ª, aí se referindo que “Atento o carácter excepcional do recurso de revisão, ao seu requerente só é permitido indicar testemunhas “novas”, isto é, que não tenham sido já ouvidas no processo, se demonstrar que a sua própria existência era por si ignorada no momento em que foi realizada a audiência ou, se conhecendo embora já nessa altura a relevância da sua intervenção, esse novo “depoente” não tenha podido efectivamente depor.
E os factos “novos”, para efeitos de revisão, têm de ser “novos” também, verdadeiramente, para os seus peticionantes: ou porque os ignoravam de todo ou porque, conhecendo-os embora, tenham estado efectivamente impossibilitados de fazer prova dos mesmos”;
18-12-2008, processo n.º 2880/08 – 5.ª, onde se conclui: Atento o carácter excepcional do recurso de revisão, ao seu requerente só é permitido indicar novos meios de prova, isto é, que não tenham sido já exercitados no processo, se demonstrar que a sua própria existência era por si ignorada no momento em que teve lugar a audiência, ou se, conhecendo embora já nessa altura a declarada relevância de tal contributo, esse novo meio de prova não tenha podido ser produzido, por razões então incontornáveis, estranhas à sua vontade;
29-04-2009, processo n.º 372/99.8TASNT – 3.ª, onde se pode ler: Em sede de recurso de revisão, novos factos são aqueles que eram ignorados pelo tribunal e pelo arguido ao tempo do julgamento e, por isso, não puderam ser apresentados antes do julgamento e neste apreciados. A “novidade” dos factos deve existir não só para o julgador como para o próprio recorrente, pois consubstanciaria uma afronta a princípios fundamentais, como sejam o da verdade material e o da lealdade processual, admitir que o requerente da revisão apresentasse, de acordo com um juízo de oportunidade, como novos, factos de cuja existência tinha inteiro conhecimento no momento do julgamento;
27-01-2010, processo n.º 543/08.8GBSSB-A.S1-5.ª, in CJSTJ 2010, tomo 1, pág. 203, donde se extrai: [A “novidade” dos factos deve existir para o julgador (novos são os factos ou elementos de prova que não foram apreciados no processo) e, ainda, para o próprio recorrente; é insuficiente que os factos sejam desconhecidos do tribunal, devendo exigir-se que tal situação se verifique, paralelamente, em relação ao requerente].
10-11-2010, processo n.º 25/06.2GALRA-A.S1-3.ª – Factos ou meios de prova novos são aqueles que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e não puderam ser apresentados antes deste. Consequentemente, é insuficiente que os factos sejam desconhecidos do tribunal, devendo exigir-se que tal situação se verifique, paralelamente, em relação ao requerente.
17-11-2010, processo n.º 134/09.6GTLRA-A.S1-3.ª – Novos factos são aqueles que são processualmente novos, ou seja, que não foram referidos e avaliados no processo da condenação. Se já foram apresentados no processo da condenação não são novos, no sentido de “novidade”, que está subjacente na definição da al. d) do n.º 1 do art.º 449.º do CPP. A novidade, neste sentido, refere-se ao conhecimento ou à existência de um facto - existência anterior ou contemporânea do julgamento, que pudesse, se fosse conhecido, ter sido avaliado, apreciado e eventualmente considerado.
23-11-2010, processo n.º 1359/10.7GBBCL-A.S1 - 3.ª - Um dos fundamentos da revisão é a descoberta de factos novos, que suscitarem graves dúvidas (não apenas quaisquer “dúvidas”) sobre a justiça da condenação (al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP). Tem este Supremo Tribunal vindo a decidir que esses factos devem não só ser novos para o tribunal, como inclusivamente para o arguido recorrente.
É esta a única interpretação que se harmoniza com o carácter excepcional do recurso de revisão. Na verdade, essa excepcionalidade não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa, ou a adopção de uma estratégia de defesa incompatível com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais. É certo que o princípio da lealdade se reveste, quanto ao arguido, de contornos específicos, pois ele não é obrigado a colaborar na descoberta da verdade, sendo aliás o seu direito ao silêncio elemento integrante do princípio do processo equitativo.
Mas, em contrapartida, não pode beneficiar da sua “deslealdade” (ocultação de meios de prova) quando essa estratégia de defesa fracassa. Assim, se o arguido, por inércia ou negligência, não apresenta certos meios de prova em julgamento, ou se por qualquer outra razão opta por ocultá-los, no prosseguimento de uma certa estratégia de defesa, escamoteando-os deliberadamente ao tribunal, para seu proveito, ou seja, com o objectivo de beneficiar processualmente dessa ocultação, não deve obviamente poder valer-se, caso venha a sofrer uma condenação, de um recurso excepcional, que se destinaria afinal, nesse caso, a permitir o suprimento de deficiências, a ele exclusivamente imputáveis, da sua defesa em julgamento. (Do mesmo dia 23-11-2010, os acórdãos proferidos no processo n.º 1236/05.3TDLSB-A.S1-3.ª e no processo n.º 342/02.0JALRA-N.S1-3.ª).
05-01-2011, processo n.º 968/06.3TAVLG.S1 - 3.ª - Apenas são novos os factos e os meios de prova desconhecidos pelo recorrente ao tempo do julgamento e que não tenham podido ser apresentados e apreciados na decisão. Se, ao invés, o recorrente conhecia os factos e os meios de prova ao tempo do julgamento e os podia apresentar, tais factos e meios de prova não relevam para efeitos de revisão de sentença.
Deste modo, se o recorrente, entende apresentar, para fundamentar o pedido de revisão, dois documentos – um cheque e um extracto de conta bancária – a que já havia aludido na motivação de recurso interposto para a Relação e que fez juntar aos autos com aquela peça processual, é de concluir que os factos ou meios de prova eram já do seu conhecimento, verificando-se, consequentemente, a manifesta falta de fundamento do pedido de revisão.
27-01-2011, processo n.º 1531/98.6TACSC-E.S1 - 5.ª - Segundo o mais recente entendimento deste Supremo Tribunal, a inércia do arguido na dedução da sua defesa ou as estratégias de defesa incompatíveis com a lealdade processual não são susceptíveis de servir de fundamento ao recurso extraordinário de revisão, cumprindo ao condenado alegar que desconhecia os factos ou os novos elementos de prova ou que estava impossibilitado de fazer prova sobre eles.
24-02-2011, processo n.º 595/07.8PAPTM-B.S1-5.ª - A orientação que sustenta que basta que os factos ou meios de prova não tenham sido tidos em conta no julgamento que levou à condenação, para serem considerados novos, deve ser perfilhada com uma limitação: os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia apresentá-los, serão invocáveis em sede de recurso de revisão desde que seja dada uma explicação suficiente para a omissão, antes, da sua apresentação. Por outras palavras, o recorrente terá que justificar essa omissão, explicando porque é que não pôde, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal. Há um elemento sistemático de interpretação que não pode ser ignorado a este propósito e que resulta do art. 453.º, n.º 2, do CPP: o legislador revelou claramente, com este preceito, que não terá querido abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, nem dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais. Tal teria por consequência a transformação do recurso de revisão, que é um recurso extraordinário, num expediente que se poderia banalizar e, assim se prejudicaria, para além de toda a razoabilidade, o interesse na estabilidade do caso julgado e também se facilitariam faltas à lealdade processual.
10-03-2011, processo n.º 451/09.5JAPRT-B.S1-5.ª - Deve interpretar-se a expressão “factos ou meios de prova novos” no sentido de serem aqueles que eram ignorados pelo tribunal e pelo requerente ao tempo do julgamento e, por isso, não puderam, então, ser apresentados e produzidos, de modo a serem apreciados e valorados na decisão.
Com efeito, só esta interpretação observa a natureza excepcional do recurso de revisão e os princípios constitucionais de segurança jurídica, da lealdade processual e da protecção do caso julgado.
14-04-2011, processo n.º 100/08.9SHLSB-A.S1 - 5.ª - A al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, ao exigir que se descubram novos factos ou meios de prova, pressupõe o desconhecimento, à data da sentença, desses mesmos factos ou meios de prova, apresentados como fundamento do pedido de revisão.
A questão que se tem debatido é a de saber se o desconhecimento, relevante para efeitos de revisão, é apenas o do tribunal, porque se trata de factos ou meios de prova não revelados aquando do julgamento, ou se o desconhecimento a considerar é também o do próprio arguido, no momento em que o julgamento se realizou.
E tem-se entendido que se deve interpretar a expressão “factos ou meios de prova novos” no sentido de serem aqueles que eram ignorados pelo tribunal e pelo requerente ao tempo do julgamento e, por isso, não puderam, então, ser apresentados e produzidos, de modo a serem apreciados e valorados na decisão. Com efeito, só esta interpretação observa a natureza excepcional do recurso de revisão e os princípios constitucionais da segurança jurídica, da lealdade processual e da protecção do caso julgado.
Para além de os factos ou meios de prova deverem ser novos, no sentido apontado, é, ainda, necessário que eles, por si ou em conjugação com os já apreciados no processo, sejam de molde a criar dúvidas fundadas sobre a justiça da condenação.
27-04-2011, processo n.º 323/06.5GAPFR-A.S1 - 3.ª - Na situação coberta pela alínea d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, exige a lei que se descubram novos factos ou novos meios de prova e que estes sejam de molde a suscitar graves dúvidas sobre a justiça da condenação.
Quanto à novidade dos factos e/ou dos meios de prova, o STJ entendeu, durante anos e de forma pode dizer-se pacífica, que os factos ou meios de prova deviam ter-se por novos quando não tivessem sido apreciados no processo, ainda que não fossem ignorados pelo arguido no momento em que foi julgado.
Porém, nos últimos tempos essa jurisprudência foi sendo abandonada e hoje em dia pode considerar-se solidificada ou, pelo menos, maioritária, uma interpretação mais restritiva do preceito, mais adequada, do nosso ponto de vista, à natureza extraordinária do recurso de revisão e, ao fim e ao cabo, à busca da verdade material e ao consequente dever de lealdade processual que impende sobre todos os sujeitos processuais. Assim, “novos” são tão só os factos e/ou os meios de prova que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e, porque aí não apresentados, não puderam ser considerados pelo tribunal.
Algumas decisões, no entanto, admitiram a revisão quando, sendo embora o facto e/ou o meio de prova conhecido do recorrente no momento do julgamento, ele justifique suficientemente a sua não apresentação, explicando porque é que não pode, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, não dever apresentá-los.
Não releva pois o facto e/ou o meio de prova capaz de lançar alguma dúvida sobre a justiça da condenação. A lei exige que a dúvida tenha tal consistência que aponte seriamente para a absolvição do recorrente como a decisão mais provável.
18-05-2011, processo n.º 140/05.0JELSB-N.S1 - 3.ª - São factos novos e novos os meios de prova, os que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, e que, sendo desconhecidos da jurisdição no acto do julgamento, permitam suscitar graves dúvidas acerca da culpabilidade do condenado; para efeito de fundamentar o pedido de revisão de decisões penais, os meios de prova são novos quando não foram administrados e valorados no processo que conduziu à condenação, e não fossem conhecidos ou não pudessem razoavelmente ser ignorados pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar.
Novos meios de prova são aqueles que são processualmente novos, ou seja, que não foram apresentados ou não poderiam ser apresentados por desconhecimento, no processo da condenação. Se foram apresentados no processo da condenação, ou poderiam tê-lo sido, não são novos no sentido da “novidade” que está subjacente na definição da al. d), no n.º 1 do art. 449.º do CPP.
A novidade, neste sentido, refere-se a meio de prova, seja pessoal, documental ou outro, e não ao resultado da administração do meio de prova; no caso de provas pessoais, a “novidade” refere-se à testemunha na sua identidade e individualidade e não ao resultado da prova efectivamente produzida.
Se os meios de prova eram conhecidos, ou não poderiam razoavelmente ser desconhecidos do arguido na ocasião do julgamento, e se, consequentemente, poderiam ter sido apresentados, não podem ser considerados, neste sentido, «novos meios de prova». De outro modo, criar-se-iam disfunções sérias contra a estabilidade e segurança do caso julgado, abrindo caminho a possíveis estratégias probatórias moldáveis numa atitude própria da influência da “teoria dos jogos” no processo.
Se, o recorrente invoca como fundamento do recurso a existência/descoberta de factos novos, que fazem supor a «injustiça da condenação» e oferece um meio de prova – a existência e a identificação da testemunha – que não lhe era desconhecido no momento adequado para a produção de prova no processo, os motivos invocados não assumem a consistência pressuposta como fundamento do recurso extraordinário de revisão.
Vejam-se ainda os acórdãos de 06-11-2008, processo n.º 3178/08-5.ª, in CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 218; de 18-02-2009, processo n.º 109/09-3.ª; de 12-03-2009, processo n.º 316/09-5.ª; de 25-03-2009, processo n.º 470/04.8GAPVL-A. S1 – 5.ª (desde que justifique a ignorância ou a impossibilidade); de 23-04-2009, processo n.º 280/04.2GFVFX-C.S1-5.ª; e de 29-04-2009, processo n.º 15189/02.6TDLSB.S1 – 3.ª, in CJSTJ 2009, tomo 1, pág. 240; de 01-10-2009, processo n.º 275/06.3GBAND-A.S1-3.ª; de 28-10-2009, processo n.º 109/94.8TBEPS-A.S1-3.ª e processo n.º 40/03.8TELSB.C.S1-3.ª; de 04-11-2009, processo n.º 1571/01.0GFSNT-A.S1-3.ª (uma das situações tipo previstas na lei é a da posterior descoberta de novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação); de 05-11-2009, processo n.º 775/06.3JFLSB-E.S1-5.ª, onde se afirma que “Factos ou meios de prova novos são aqueles que não foram trazidos ao julgamento anterior; porém, não são quaisquer factos ou meios de prova novos que podem servir de fundamento ao recurso de revisão, mas apenas aqueles que, sendo novos, sejam susceptíveis de criar dúvidas fundadas sobre a justiça da condenação”; de 25-11-2009, processo n.º 497/00.9TAPCV-B.S1 - 3.ª; de 03-12-2009, processo n.º 3/03.3TAMGR-A.S1-3.ª (São novos apenas os factos e os meios de prova desconhecidos pelo recorrente ao tempo do julgamento e que não tenham podido ser apresentados e apreciados na decisão); de 17-12-2009, processo n.º 693/05.2TAFIG.-B.S1-3.ª; de 25-02-2010, processo n.º 1766/06.0JAPRT-A.S1-5.ª; de 11-03-2010, processo n.º 10/07.7GDLRA-B.S1-5.ª; de 17-03-2010, processo n.º 728/04.6SILSB-A.S1-3.ª (a novidade dos factos deve existir para o julgador e ainda, para o próprio recorrente); de 17-03-2010, processo n.º 706/04.5GNPRT-A.S1-3.ª, in CJSTJ 2010, tomo 1, pág. 224 [em caso em que o facto (titularidade de carta de condução) é novo para o recorrente Ministério Público]; de 21-04-2010, processo n.º 65/00.5GFLLE-A.S1-3.ª; de 05-05-2010, processo n.º 407/99.4TBBGC-D.S1-3.ª; de 16-06-2010, processo n.º 837/08.2JAPRT-B.S1-3.ª; de 30-06-2010, processo n.º 169/07.3GAOLH-A.S1-3.ª, in CJSTJ 2010, tomo 2, pág. 215; de 07-07-2010, processo n.º 479/05.4GCVNG-A.S1-5.ª; de 14-07-2010, processo n.º 129/02.0GDEVR-I.S1- 5.ª e n.º 487/03.0TASNT-F.S1-5.ª; de 06-10-2010, processo n.º 1106/02.7PBBRG-E.S1-3.ª; de 09-12-2010, processo n.º 346/02.3TAVCD-B.P1.S1-5.ª; de 24-02-2011, processo n.º 595/07.8PAPTM-B.S1-5.ª; e ainda os casos dos acórdãos de 17-02-2011, processo n.º 66/06.0PJAMD-A.S1-5.ª e de 14-04-2011, processo n.º 40/08.1PJCSC-A.S1-5.ª (ambos com distinção de facto superveniente e facto novo).
Atente-se num caso de particular superveniência de factos novos no acórdão de 20-01-2010, processo n.º 1536/03.7TAGMR-A.S1-5.ª.
No que tange ao segundo pressuposto e sobre o que deverá entender-se por dúvidas graves sobre a justiça da condenação, dizia-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-03-2003, processo n.º 4407/02-5.ª, in CJSTJ 2003, tomo 1, pág. 231, que os novos factos ou meios de prova têm que suscitar graves dúvidas sobre a justiça da condenação, mas nesse caso, desde que suscitem possibilidade de absolvição e já não de mera correcção da medida concreta da sanção aplicada; tudo terá de decorrer sob a égide da alternativa condenação/absolvição, que afinal plasma e condensa o binómio condenação justa (a manter-se) condenação injusta (a rever-se).
Como se extrai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-12-2006, processo n.º 4541/06, a estabilidade do julgado sobrepõe-se à existência de uma mera dúvida sobre a justiça da condenação. Pode haver essa dúvida sem que se imponha a revisão. A dúvida sobre esse ponto pode, assim, coexistir, e coexistirá muitas vezes com o julgado, por imperativo de respeito daquele valor de certeza e estabilidade.
A dúvida relevante para a revisão tem de ser qualificada; há-de elevar-se do patamar da mera existência, para atingir a vertente da “gravidade” que baste, tendo os novos factos e/ou provas de assumir qualificativo correlativo da “gravidade” da dúvida.
Retomando argumentação constante do supra citado acórdão de 01-07-2004, processo n.º 2038/04 – 5.ª, in CJSTJ, tomo 2, pág. 242, refere-se no aludido acórdão que não será uma indiferenciada “nova prova” ou um inconsequente “facto novo” que, por si só, terão virtualidade para abalar a estabilidade resultante de uma decisão judicial transitada.
Os “novos factos” ou as “novas provas” deverão revelar-se tão seguros e (ou) relevantes – pela patente oportunidade e originalidade na invocação, pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas ou pelo significado inequívoco dos novos factos ou por outros motivos aceitáveis – que o juízo rescidente que neles se venha a apoiar não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, o que reclama do requerente do pedido a invocação e prova de um quadro de facto “novo” ou a exibição de “novas” provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comportem, pelo menos, em bastante menor grau do que aquela em que se fundamentou a decisão a rever - cfr. neste sentido, os acórdãos de 12-05-2005, processo n.° 1260/05 – 5.ª; de 23-11-2006, processo n.° 3147/06 – 5.ª; de 20-06-2007, processo n.º 1575/07 – 3.ª; de 26-03-2008, processo n.º 683/08 - 3.ª.
Consta do referido acórdão do STJ de 25-01-2007, processo n.º 2042/06 - 5.ª, que “essas dúvidas (...), porque graves têm de ser de molde a pôr em causa, de forma séria, a condenação de determinada pessoa, que não a simples medida da pena imposta. As dúvidas têm de incidir sobre a condenação enquanto tal, a ponto de se colocar fundadamente o problema de o arguido dever ter sido absolvido”.
No dizer do citado acórdão de 09-04-2008, os novos factos ou meios de prova deverão provocar graves dúvidas (não apenas quaisquer dúvidas) sobre a justiça da condenação, o que significa que essas dúvidas devem ser de grau superior ao que é normalmente requerido para absolvição do arguido em julgamento - cfr. ainda a este propósito, os acórdãos de 03-04-2008, processo n.º 422/08-5.ª (se os elementos invocados no recurso de revisão não põem em causa a justiça da condenação, não abalando sequer a matéria de facto provada, relevante para tal condenação, deve a mesma ser negada); de 08-05-2008, processo n.º 1004/08 – 5.ª; de 19-06-2008, processo n.º 207/08 – 5.ª; de 20-11-2008, processos n.ºs 3179/08 e 3543/08, ambos da 5.ª Secção; de 04-12-2008, processo n.º 3928/07 – 5.ª; de 07-05-2009, processo n.º 690/02.0PASJM-A – 3.ª; de 01-07-2009, processo n.º 319/04.1GBTMR-B.S1 3.ª; de 14-10-2009, processo n.º 176/09.6PCLRS.-D.S1-3.ª; de 21-10-2009, processo n.º 12124/04.0TDLSB-A.S1-5.ª; de 28-10-2009, processo n.º 40/03.8TELSB.C.S1-3.ª; de 25-11-2009, processo n.º 497/00-9TAPCV-B.S1-3.ª; de 20-01-2010, processo n.º 1536/03.7TAGMR-A.S1-5.ª; de 03-03-2010, processo n.º 2576/05.7TAPTM-A.S1-3.ª; de 21-04-2010, processo n.º 17/00.5IDSTR-A.S1-5.ª; de 10-03-2011, processo n.º 153/04.9TAFIG-D.S1-3.ª; de 10-03-2011, processo n.º 19/04.2JALRA-B.S1 - 3.ª (O recurso de revisão de sentença é um meio de impugnação extraordinário das decisões judiciais, que visa a realização de um novo julgamento, por a justiça do julgamento efectuado estar seriamente posta em causa, devido a facto ou meio de prova posteriormente conhecido, razão pela qual só perante facto verdadeiramente relevante ou face a novo meio de prova de reconhecida credibilidade é admissível a revisão da sentença).
Revertendo ao caso concreto.
Fundamenta o recorrente a pretendida revisão de sentença no facto de não lhe pertencer e nunca ter utilizado no telemóvel o cartão com o n.º 9XXXXXXXXX, apreendido em 11-07-2006, estando em seu lugar o n.º 9XX XXX XXX e nunca ter tido a alcunha de Pescocinho.
Coloca em causa procedimentos da audiência de julgamento, invocando que as gravações das escutas telefónicas do 9XXXXXXXX não foram ouvidas em audiência, afirmando que das vozes constantes das mesmas nenhuma é a sua.
No mais impugna a matéria dada por provada relativa ao tráfico e condução ilegal – cfr. ponto C) da motivação a fls. 5 deste e 264 no original.
Lida a motivação do recurso facilmente se constata, por da mesma ressaltar de imediato, que o objectivo final do recorrente é impugnar o que foi decidido ao nível da matéria de facto dada por provada, maxime, o que consta dos pontos de facto n.ºs 12, 13 e 34, respeitantes ao crime de tráfico de estupefacientes por que foi condenado.
Afirma o recorrente estar-se “perante caso onde não existe prova directa do considerado provado, à excepção, e mesmo assim só parcialmente, do constante de folhas 1297/8, mas não se respeitaram minimamente as regras da prova indirecta”.
No ponto “B) O que tem de se analisar” o recorrente, ao referir a factualidade contra si considerada, mas erradamente apurada, apenas menciona o que consta dos pontos 12 e 13, não referenciando o n.º 34, o que se deverá certamente a mero lapso, uma vez que nesse n.º 34 está dado por provado que no dia 11-07-2006 se encontrava em sua casa (do recorrente) e foi apreendido um telemóvel com o cartão n.º 9XXXXXXXX, o que é questionado nos pontos 2 e 3 da alínea seguinte.
O recorrente questiona o depoimento das testemunhas BB, a quem na busca domiciliária realizada em 11-07-2006 coube a coordenação/sinalização e anotação e de CC e alega a valia probatória de um documento junto com o recurso da decisão de 1.ª instância, demonstrativo de que o recorrente nunca residiu na morada que se diz ser a de quem activou o n.º 9XXXXXXXX.
Os meios de prova não são novos no sentido de serem desconhecidos do recorrente ao tempo do julgamento.
Na verdade, o recorrente indica como provas a produzir as seguintes:
1. A solicitação à Vodafone, remetendo-lhe o SIM CARD inserto no telemóvel de informação sobre o número de telefone que lhe corresponde.
2. A audição da testemunha BB para que esclareça onde, como e quando soube da alcunha Pescocinho, porque razões a atribui ao recorrente e das razões pelas quais liga o telemóvel encontrado ao número 9XXXXXXXX e em que se sustenta para afirmar que uma das vozes intervenientes nas conversas do aludido é a do recorrente.
3. Depoimento complementar do recorrente se, após produzidas as provas antes indicadas, restar alguma dúvida sobre a verdade histórica.
O que o recorrente ora pede, incluindo a insistência feita no requerimento/aditamento de fls. 248/9, é algo que poderia ter feito desde logo, sendo certo que a informação que a Vodafone deu e junta aos autos em 24-06-2008 podia ter sido discutida no recurso (o documento foi junto a fls. 8044/6 e a motivação de recurso é de fls. 8275 – 8288) e a informação ora solicitada poderia tê-lo sido há muito.
A questão não é nova e foi já colocada no recurso para o Tribunal da Relação do Porto, conforme o acórdão de fls. 9393/7 (225/9 deste).
Como se alcança de fls. 156, a nível de matéria de facto foi suscitada pelo ora recorrente a reapreciação do seguinte:
- Não foi feita prova em julgamento de que o arguido traficou
- Vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP
- Violação do princípio in dubio pro reo
A tais questões o Tribunal da Relação do Porto pronunciou-se nestes termos:
«18. Recurso do arguido AA:
18.1. Começa o arguido por referir [(conclusão a)] que “dos autos não consta qualquer elemento probatório, quer documental, capaz de demonstrar que o Arguido traficou as ditas drogas e muito menos ter confessado factos que o tribunal não especificou, conforme se alcança dos documentos referenciados na douta sentença”.
Se o seu intento era impugnar a decisão da matéria de facto, é por demais evidente a si inconsequência.
De todo o modo sempre se dirá que o tribunal especificou os factos que confessou, basta a simples leitura do ponto b) da fundamentação - são os referidos no ponto 13 da matéria de facto provada, ou seja, a condução do veículo automóvel de matrícula NQ-XX-XX, sem que fosse titular de carta de condução ou de qualquer outro título que o habilitasse a tal condução. É também por isso, que não se compreende, de todo, o constante do ponto 22° da sua alegação com o seguinte teor: “contudo e sem prescindir, se assim se não entender e considerar-se o Arguido culpado pela prática de crime de condução sem habilitação legal, p e p nos termos do n"1 e 2 do art." 3 do Decreto-Lei n" 2/98 de 3 de Janeiro (o que não se admite), tendo o facto de ser primário e ter sempre colaborado com a justiça, neste caso”.
No mais, e como resulta claro e cristalino dessa mesma fundamentação tem suporte no depoimento da testemunha referida no ponto dd), bem como refere o Ilustre Magistrado do MP em 1ª instância no “depoimento da testemunha LL, que relatou a existência de escutas de conversações telefónicas a evidenciar a venda de haxixe, aos quilogramas, pelo ora recorrente ao co-arguido DD, mas resultou também do teor das referidas conversações telefónicas constantes dos autos, transcritas a fls. 839, 840, 862 e 1115, que ora recorrente fez, através do telemóvel com o número 9XXXXXXXX, que lhe foi apreendido aquando das buscas realizadas na sua residência (factos de 34), que se encontrava registado em seu nome desde 13.9.2005 e assim permaneceu até 16.3.2007, como consta dos autos e é salientado no acórdão recorrido, a fls. 48, e que o ora recorrente utilizava, como foi referido pela testemunha BB, que procedeu à escuta e transcrição das conversações telefónicas entre o recorrente e o co-arguido DD, e é mencionado no acórdão recorrido, a fls. 53.”, não colhendo de todo a repetida e infirmada invocação de que o telemóvel com o numero 9XXXXXXXX, não é seu.(realce nosso).
18.2 No iter da sua motivação traz a colação, sem qualquer esforço mínimo de concretização, e portanto também de modo inconsequente, os vícios de “manifesta insuficiência, para a decisão, da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação e mesmo erro notório na apreciação da prova”.
Por isso e também telegraficamente se dirá que o acórdão recorrido não enferma dos vícios que genericamente lhe imputa, pois os factos dados como provados são claros, precisos e encontram-se em consonância com a suficiente e lógica motivação.
18.3 Argui ainda o arguido violação do princípio in dúbio pró reo.
O funcionamento do princípio pressupõe sempre um non liquet na questão da prova. Uma situação em que o tribunal esteja perante uma dúvida inultrapassável relativamente a determinada questão relevante para a decisão da causa.
No presente caso, a alusão à violação do principio não tem pertinência, visto não se verificar da leitura do acórdão nenhuma «dúvida razoável» a respeito da responsabilidade do recorrente.».
Fundamental na perspectiva do recorrente é o que se contém no auto de busca e apreensão realizada em 11-07-2006, constante de fls. 1297/8, aqui fazendo fls. 63/4.
Nesse auto assinado pelo coordenador da diligência Cabo BB, relata-se o que se passou na busca domiciliária “na residência de AA, conhecido pela alcunha de PESCOÇINHO, sita na rua C... C... B..., XX, R/C Esqº - V. N. Gaia”.
Consta, a fls. 1298:
Na posse do visado foi ainda apreendido: um telemóvel de marca NOKIA, com o IMEI N.º xxxxxxxxxxxxx e cartão n.º 9XXXXXXXX, e duas notas de vinte euros uma nota de dez Euros, uma nota de cinco Euros e uma moeda de um Euro no total de cinquenta e seis Euros.
. A7 (Foto 7) – telemóvel n.º 9XXXXXXX com o IMEI N.º xxxxxxxxxxxxxxxx de marca NOKIA de cor cinzento.
A foto 7 encontra-se a fls. 1302, aqui fls. 68.
Todos estes elementos já constavam dos autos e o recorrente podia em devido tempo ter suscitado as questões e formulado as pretensões que entendesse, bem como em sede de julgamento indagar junto do Cabo BB a razão porque fez constar do auto a alcunha de Pescocinho, esclarecer as razões porque a atribuiu ao recorrente e ainda as razões pelas quais ligou o telemóvel encontrado ao número 9XXXXXXXX e em que se sustentou para afirmar que uma das vozes intervenientes nas conversas era a do recorrente.
No aditamento de fls. 248/9 disse o recorrente:
«O recorrente sabe que, em 11 de Julho de 2006, no aparelho de telemóvel que lhe foi apreendido funcionava o n.º de telemóvel 9XX XXX XXX. Naturalmente, que não sabe qual era o IMEI de tal aparelho. No entanto, visto o teor de folhas 8044 a 8046, pode, hoje, garantir que:
- está demonstrado nos autos que não é verdade que, em 11 de Julho de 2006, ao contrário do que se afirma a folhas 1298, que, no IMEI xxxxxxxxxxxxxx funcionasse o n.º 9XXXXXXXX (folhas 8046)
- está demonstrado nos autos que o número de telefone que a polícia queria ter-lhe apreendido, o 9XXXXXXXX, apesar da busca ter sido efectuada, em 11 de Julho de 2006, e o mesmo apreendido, continuou activo até 16 de Março seguinte (folhas 8045)
5. O que significa que a informação de folhas 1298 é errada quer quanto ao número inserto quer quanto ao IMEI do telemóvel que utilizava, sendo, pois, mais que nunca premente saber como, quando, onde, porquê e por quem foram inventados».
Ora, no fundo o que se pretende é impugnar a veracidade do que se contém no auto de busca e apreensão, adjectivando-se a informação como errada e objecto de invenção, o que se reconduz a alegação de falsidade de tal meio de prova.
A falsidade de meio de prova pode constituir fundamento de revisão, conforme a alínea a) do n.º 1 do artigo 449.º do CPP, sendo imprescindível que a falsidade conste de decisão final, seja reconhecida por uma sentença passada em julgado - cfr. acórdãos de 07-07-2009, processo n.º 60/02.0TAMBRA.S1, de 17-09-2009, processo n.º 1566/03.9PALGS-A.S1 e de 10-03-2011, processo n.º 482/91.0GBVRM-A.S1, todos desta secção.
O recurso de revisão fundamentado na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do CPP exige que se descubram novos factos ou meios de prova, descoberta essa que pressupõe, obviamente, um desconhecimento anterior de certos factos ou meios probatórios, agora apresentados. Atendíveis serão apenas os factos e meios que advieram ao conhecimento do apresentante em data posterior, não estando o recorrente dispensado da alegação do conhecimento superveniente.
Conclui-se que nenhum dos meios de prova ora apresentados é novo na concepção da jurisprudência maioritária supra citada, que adoptamos, não se mostrando que com tal entendimento se viole ou postergue qualquer direito de defesa, incluído o direito a este recurso extraordinário, uma vez que em tempo oportuno o arguido teve a possibilidade de esgrimir todos estes argumentos, que nada têm de novo, não se ferindo qualquer garantia constitucional de defesa.
Como é referido no acórdão de 25-11-2009, processo n.º 497/00-9TAPCV-B.S1-3.ª, estamos perante um recurso extraordinário, um “remédio” excepcional a aplicar nas situações em que a manutenção, com fundamento no caso julgado, de uma situação manifestamente injusta seria de tal forma chocante e intolerável para o sentimento de justiça da comunidade que a própria paz jurídica, que o caso julgado visa assegurar, ficaria posta em crise.
Assim sendo, evidente é que se imporá ao nível da apreciação da admissibilidade do presente recurso um grau de exigência compatível com o carácter especialíssimo, extraordinário, excepcional do meio processual usado.
Nesta conformidade, cumpre concluir que não se verifica, no caso presente, o fundamento de revisão de sentença previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal.
E assim sendo, cumpre negar a pretendida revisão de sentença, com base neste fundamento, certo sendo que pela via da alegação de falsidade do auto de fls. 1297/8, igualmente se impõe a negação.
Decisão
Pelo exposto, acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso interposto pelo condenado AA, denegando a pretendida revisão.
Custas pelo recorrente, nos termos dos artigos 456.º, 513.º, n.ºs 1, 2 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, fixando-se a taxa de justiça, de acordo com os artigos 8.º, n.º 5 e 13.º, n.º 1 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pela Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (objecto de rectificação pela Declaração n.º 22/2008, de 24 de Abril, e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Suplemento), pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril e artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril), o qual aprovou – artigo 18.º - o Regulamento das Custas Processuais, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, fixando-se a taxa de justiça em 3 unidades de conta.
Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Lisboa, 12 de Outubro de 2011
Raul Borges (relator)
Armindo Monteiro
Pereira Madeira