HOMICÍDIO
TENTATIVA
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
JUÍZO DE PROGNOSE
REINSERÇÃO SOCIAL
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CRIME CONTINUADO
CULPA
CO-AUTORIA
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
IMPUTABILIDADE DIMINUIDA
TOXICODEPENDÊNCIA
ALCOOLISMO
PREVENÇÃO GERAL
Sumário

I - O art. 4.º do DL 401/82, de 23-09, prevê uma atenuação especial da pena relativa aos jovens, a operar nos termos dos arts. 72.º e 73.º do CP. Trata-se de um poder-dever que implica que a aplicação dessa atenuação depende da existência de sérias razões para pensar que dela resultem vantagens para a reinserção social do jovem delinquente.
II - Tal juízo de prognose favorável ou desfavorável tem de se alicerçar em factos concretos, ponderando, designadamente a conduta do arguido, anterior ou posterior ao crime, as condições pessoais, familiares e profissionais para avaliar da sua inserção familiar e ainda a sua personalidade para se poder aferir além do mais se é sensível à aceitação dos valores dominantes e tutelados pelo direito penal, ou seja se é ou não dotado de capacidade de auto-censura.
III -Aquele regime, conforme estabelece o n.º 2 do art. 1.º do referido diploma legal, apenas é aplicável aos arguidos que, à data da prática do crime, tenham completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos.
IV -Enquanto no n.º 1 do art. 30.º do CP se estabelecem critérios relativos à problemática do concurso de crimes tout court, no n.º 2 pretende-se regular situações que também têm a ver com a pluralidade de crimes, mas que o legislador juridicamente unifica em um só crime. Neste último caso estamos perante o chamado crime continuado, bem como face a outros casos de unificação jurídica (crime único com pluralidade de actos ou acções).
V - Em ambas as situações previstas no n.º 1 do art. 30.º o comportamento do agente tanto se pode consubstanciar num só facto ou numa só acção, como em vários factos (naturais) ou várias acções. Com efeito, a partir de um só facto ou de uma só acção podem realizar-se diversos crimes, por violação (simultânea) de diversas normas incriminadoras, bem como o mesmo crime plúrimas vezes, por violação da mesma norma incriminadora, tal como a partir de vários factos ou de várias acções pode realizar-se o mesmo crime plúrimas vezes, por violação (repetida) da mesma norma incriminadora, bem como diversos crimes, por violação de diversas normas incriminadoras.
VI -No n.º 2 do art. 30.º do CP exige-se que o concurso de crimes (realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime) seja executado por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua sensivelmente a culpa do agente. São, pois, fundamentalmente, razões atinentes à culpa do agente que justificam o instituto do crime continuado. É a diminuição considerável desta, radicada em solicitações de uma mesma situação exterior e não em razões de carácter endógeno.
VII - Da hermenêutica do art. 26.º do CP resulta que co-autor é o que executa o facto, toma parte directa na sua realização, por acordo ou juntamente com outro ou outros, ou determina outrem à prática do mesmo, suposta, obviamente, a ocorrência de execução ou início de execução. Certo é que o acordo tanto pode ser expresso como tácito, como pode ser firmado antes da realização do facto ou entre o seu início e o seu término (co-autoria sucessiva), sendo que à decisão conjunta basta a existência e a vontade de colaboração de duas ou mais pessoas na realização do tipo de crime. Por outro lado, havendo cooperação na execução do crime não se torna necessária a existência de acordo, no entanto, na ausência de acordo é essencial que os comparticipantes tenham consciência de cooperarem na acção comum.
VIII - E deve ser considerado co-autor aquele que realiza uma parte da execução do plano criminoso, ainda que com a sua conduta apenas contribua com um acto não típico em sentido literal, no entanto, essencial para a realização da decisão comum; na co-autoria cabe, pois, a actividade, mesmo parcelar, na realização do objectivo acordado – concerto criminoso –, ainda que não entre formalmente no arco da acção típica, desde que essencial à execução daquele objectivo.
IX -Assim sendo, são de imputar a cada um dos co-autores, como próprios, os contributos do outro ou dos outros para o facto, como se todos os tivessem prestado.
X - Pressuposto material da atenuação especial da pena é a ocorrência de acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção, sendo certo que tal só se deve ter por verificado quando a imagem global do facto, resultante das circunstâncias atenuantes, se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo. Por isso, a atenuação especial da pena só em casos extraordinários ou excepcionais pode ter lugar.
XI -O instituto da atenuação especial da pena só é susceptível de aplicação aos arguidos com base na sua imputabilidade diminuída caso se conclua que, à data dos factos, por via daquela circunstância, as suas capacidades cognitivas e/ou volitivas se encontravam de tal modo afectadas que se deva considerar que agiram com culpa acentuadamente diminuída, posto que a diminuição da imputabilidade não interfere directamente com a ilicitude do facto nem com a necessidade de pena.
XII - Do factualismo apurado decorre que na base da imputabilidade diminuída do arguido D se encontra o consumo de substâncias psicoactivas, consumo que, no limite, poderá ter influenciado o seu comportamento relativamente a alguns dos factos delituosos, sem que, contudo, haja afectado a sua consciência e a sua capacidade de determinação. No que diz respeito ao arguido C, pese embora padecesse à data dos factos de perturbação da personalidade, com traços anti-sociais, instabilidade emocional e impulsividade, características estas agravadas pelo consumo de estupefacientes e de álcool, certo é que aquela anomia não afectou a sua consciência nem a sua capacidade de auto-determinação. Nesta conformidade, não se verifica uma situação em que a culpa se mostre acentuadamente diminuída.
XIII - Por outro lado, pese embora a idade dos arguidos à data dos factos (18 e 21 anos), a gravidade destes, com destaque para o crime tentado de homicídio, impondo firme reprovação e censura, não se coaduna com uma punição especialmente atenuada, punição incompatível com as exigências de prevenção geral, razão pela qual não merece reparo o acórdão recorrido ao não aplicar o instituto da atenuação especial, quer por via do afastamento do regime penal especial para jovens quer por via da não atribuição de relevo bastante à imputabilidade diminuída dos arguidos.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 21/10.5GATVR, do Tribunal Judicial de Tavira, após contraditório foi proferida a seguinte decisão[1]:

«A.  Absolver o arguido AA da prática de dois crimes de furto qualificado (NUIPC 308/10 e 398/10) de que vinha pronunciado;

B.    Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão (caso a casa BB - NUIPC 113/10);

C.    Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.°, todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão (caso NUIPC 111/10);

D.    Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.°, todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão (caso NUIPC 80/10);

E.    Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.°, todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos de prisão (caso NUIPC 73/10);

F.    Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), e 204.°, n° 4, todos do Código Penal na pena de 6 (seis) meses de prisão (caso NUIPC 74/10);

G.   Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), 22.° e 23.° todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano de prisão (NUIPC 76/10);

H. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), 22.° e 23.° todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano de prisão (NUIPC 162/10);

I. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) de prisão (caso NUIPC 325/10);

J. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos de prisão (caso NUIPC 408/10);

K. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (caso NUIPC 407/10);

L. Absolver o arguido AA pela prática do crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 132.°, n°s 1 e 2, alínea g), 22.° e 23.°, todos do Código Penal sem prejuízo de qualificar a sua conduta como integrando a prática do crime de um crime de homicídio na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 22.°, 23.°, 73.° e 131.° do Código Penal, agravado nos termos do artigo 86.°, n° 3, da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 5 (cinco) anos de prisão;

M. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de detenção ilegal de arma, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 86.°, n° 1, alínea c), ex vi artigo 3.°, n° 4, alínea a), ambos da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão;

N. Procedendo ao cúmulo jurídico das aludidas penas - de B) a M) -condenar o arguido AA na pena conjunta de 11 (onze) anos de prisão, descontando-se o tempo em que o arguido esteve detido e em situação de prisão preventiva (art. 80.°, n° 1, do C.P.);

O. Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.°, todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos de prisão (caso NUIPC 73/10);

P. Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), e 204.°, n° 4, todos do Código Penal na pena de 6 (seis) meses de prisão (caso NUIPC 74/10);

Q.   Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), 22.° e 23.° todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano de prisão (NUIPC 76/10);

R.   Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), 22.° e 23.° todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano de prisão (NUIPC 162/10);

S.    Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arís. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos de prisão (caso NUIPC 408/10);

T.   Condenar o arguido CC pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.°, n° 1, e 204.°, n° 2, al. e), todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (caso NUIPC 407/10);

U.  Absolver o arguido CC pela prática do crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 132.°, n°s 1 e 2, alínea g), 22.° e 23.°, todos do Código Penal sem prejuízo de qualificar a sua conduta como integrando a prática do crime de um crime de homicídio na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 22.°, 23.°, 73.° e 131.° do Código Penal, agravado nos termos do artigo 86.°, n° 3, da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 5 (cinco) anos de prisão;

V. Condenar o arguido CC pela prática de um crime de detenção ilegal de arma, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 86.°, n° 1, alínea c), ex vi artigo 3.°, n° 4, alínea a), ambos da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão;

W. Procedendo ao cúmulo jurídico das aludidas penas - de O) a V) -condenar o arguido CC na pena conjunta de 8 (oito) anos de prisão, descontando-se o tempo em que o arguido esteve detido e em situação de prisão preventiva (art. 80.°, n° 1, do C.P).

Os arguidos interpuseram recurso.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da motivação apresentada:


1. O Tribunal não ponderou a imputabilidade diminuída nos arguidos conforme ficou provado no ponto 89, 97 e 102 relativamente a CC, e 79 relativamente a AA.

2. Nos termos do artigo 72º n.º 1 do CP o Tribunal atenua especialmente a pena onde existam circunstâncias que diminuam de forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, conforme ensina o acórdão do STJ de 26/09/2007 proferido no processo 07P2429 do Relator Santos Cabral.

3. Foi violado o artigo 72º n.º 1 do CP.

4. Nos termos do artigo 410º do CPP, o Tribunal devia de ter interpretado o estatuído no artigo 20º nº 2 do CP, no sentido de que a imputabilidade atenuada determina a atenuação especial da pena nos termos do art.º 72º do CP.

5. O Tribunal considerou que os arguidos praticaram diversos crimes de furto mediante a compreensão dos ditos crimes no concurso real de infracções.

6. Os arguidos praticaram os crimes de furto mediante uma só resolução criminosa, pelo que estamos perante um crime continuado por força do art.º 30º do CP, constitui um só crime a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime fundamentalmente protejam um mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.

7. Foi violado o artigo 30º do CP.

8. Por força do princípio non bis in idem deverá ser aplicada aos arguidos a pena correspondente a um crime de furto qualificado.

9. O Tribunal condenou os arguidos respectivamente a 8 anos e a 11 anos de prisão, em cúmulo jurídico, não tendo ponderado aplicar aos arguidos penas de multa.

10. O Tribunal violou o artigo 40º do CP que estipula que a aplicação de penas e de medidas de segurança visam a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

11. O arguido CC tinha à data da prática dos factos 22 anos e o arguido AA tinha 18 anos.

12. Por força da filosofia jurídica de tratamento especial de jovens delinquentes e prevista no Dec Lei 401/82 de 23 de Setembro, o Tribunal deveria ter procedido a uma atenuação especial da pena em conformidade do art.º  72º do CP  e Dec Lei 401/82 de 23 de Setembro que foram violados.

13. O Tribunal condenou o arguido CC pela prática de um crime de homicídio numa forma tentada.

14. Autor é, no entendimento da doutrina e da jurisprudência aquele que tem o domínio do facto; aquele que pode fazer parar a execução criminosa.

15. Foi violado o artigo 26º do CP.

16. Ficou provado que o arguido AA entregou 450,00€ para que fossem entregues ao queixoso no processo 11/10.4GAVRS; 600,00€ destinados a serem entregues ao queixoso no processo 80/10.0GCABF; que ambos os arguidos entregaram 502,00€ destinados a serem entregues à queixosa no processo 74/10.6GDFAR; que os artigos furtados no processo 408/10.3GBTVR foram restituídos integralmente.

17. Por força do artigo 206º n.º 1 do CP, 72º n.º 2 al. c) do CP, a reparação integral do dano obriga à atenuação especial da pena funcionando de forma automática a disposição legal prevista no art.º 206º n.º 1 e 2.

18. Foram violados os artigos 206 e 72º n.º 2 al. c) do CP.

Na contra-motivação apresentada o Ministério Público pugna pela improcedência do recurso, com integral confirmação do acórdão impugnado.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual suscita questão prévia atinente à incompetência deste Supremo Tribunal para conhecimento do recurso, sob a alegação de que, situando-se todas as penas singulares cominadas aos arguidos em medida não superior a 5 anos de prisão, conquanto as penas únicas sejam superiores a 5 anos de prisão, a competência para o julgamento do recurso cabe ao Tribunal da Relação. Relativamente ao mérito do recurso pronuncia-se no sentido da confirmação da decisão recorrida no que respeita à qualificação jurídica dos factos, participação dos arguidos nestes e à determinação das penas singulares, penas que a seu ver não devem ser objecto de atenuação especial, no entanto, no que concerne à medida das penas conjuntas defende a sua redução para 9 e 7 anos de prisão, atenta a ponderação do ilícito global, com destaque para a idade dos arguidos, o valor dos bens subtraídos e a medida das penas singulares.

Não foi apresentada resposta.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir.

                                          *

Questão que cumpre decidir antes de entrar no conhecimento do mérito do recurso interposto por ambos os arguidos é a suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto respeitante à eventual incompetência do Supremo Tribunal para conhecimento do recurso.

Apreciando, dir-se-á que a lei adjectiva penal estabelece a obrigatoriedade de recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito – artigo 432º, n.ºs 1, alínea c) e 2, do Código de Processo Penal[2].

É o que sucede no caso dos autos em que qualquer um dos arguidos foi condenado em pena única superior a 5 anos de prisão e o recurso interposto por ambos visa exclusivamente o reexame da matéria de direito.

Deste modo, estabelecendo a lei que o recurso de acórdão que aplique pena de prisão superior a 5 anos e vise exclusivamente o reexame da matéria de direito é interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, não sendo admissível a interposição de recurso prévio para o Tribunal da Relação, há que concluir ser o Supremo Tribunal de Justiça o competente para conhecer o recurso interposto pelos arguidos AA e CC.

                                         *

Delimitando o objecto dos recursos verificamos serem as seguintes as questões submetidas à apreciação deste Supremo Tribunal:

- Nulidade do acórdão por não ter sido equacionada a eventual aplicação ao arguido CC do regime penal especial para jovens;

- Incorrecta qualificação jurídica dos factos por os arguidos haverem praticado todas as subtracções de forma essencialmente homogénea, no quadro da mesma solicitação exterior consideravelmente diminuidora da sua culpa e mediante uma só resolução, circunstância que conduz a que aqueles factos devam ser qualificado como integrantes de um só crime na forma continuada;

- Incorrecta qualificação dos factos no que respeita à participação do arguido CC no crime de homicídio tentado, uma vez que o mesmo nada teve a ver com a execução daqueles factos, não tendo sobre eles qualquer domínio;

- Incorrecta subsunção dos factos relativos aos processos n.ºs 113/10. 4GAVRS, 74/10.6GDFAR e 408/10.3GBTVR, por não haver sido considerada a restituição e a reparação integral verificada, circunstância que impunha a aplicação do disposto no artigo 206º, com automática atenuação especial da pena;

- Desajustada dosimetria das penas aplicadas por não haver sido considerada a imputabilidade diminuída dos arguidos, circunstância que justifica a atenuação especial das penas, atenuação especial que também se impõe por aplicação do regime penal especial para jovens previsto no DL 401/82, de 23 de Setembro, penas que, em todo o caso, não se mostram consonantes com os fins que visam prosseguir nem com a limitação resultante da culpa.

O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos[3]:

1. No dia 31 de Março de 2010, no período compreendido entre as 10 horas e as 12 horas, o arguido AA deslocou-se à residência B......., localizada em ......., freguesia de Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António, com o propósito de se apoderar de bens e valores que aí encontrasse.

2. Na execução de tal intento, por forma não concretamente apurada, o arguido destruiu a porta de alumínio da referida residência que dá acesso à piscina, introduzindo-se dessa forma no interior da referida habitação.

3. Seguidamente, o arguido retirou do interior de tal residência os seguintes objectos, pertença de BB:

     a.           2 (dois) computadores, portáteis, com o valor de duzentos e cinquenta euros cada um ;

     b.           1 (uma) televisão, de 38 polegadas, adquirida por trezentas libras;

      c.         uns óculos de visão nocturna, com o valor de cem libras.

4. Logo após, e com os objectos supra descritos na sua posse, o arguido ausentou-se do local, integrando tais objectos no seu património, logrando fazê-los seus, contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo proprietário.

5. BB despendeu para reparar a porta cerca de duzentos euros.

6. O arguido procedeu, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de quatrocentos e cinquenta euros montante destinado a ser entregue ao queixoso.

NUIPC 111/10.4 GAVRS

7. Ainda no dia 31 de Março de 2010, no período compreendido entre

as 10 horas e 30 minutos e as 12 horas, o arguido AA deslocou-se à residência localizada no Sítio da ........., apartado....., ......., freguesia de Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António, com o propósito de se apoderar de bens e valores que aí encontrasse.

8. Na execução de tal intento, por forma não concretamente apurada, o

arguido destruiu a fechadura da porta que dá acesso à dita propriedade, assim como o vidro da janela traseira da residência, que transpôs, introduzindo-se dessa forma no interior da referida habitação.

9.  Seguidamente, o arguido AA retirou do interior de tal residência, os seguintes objectos, pertença de DD e de EE:

a.       1 (um) computador portátil, de marca "Asus", no valor de €1070,00 (mil e setenta euros);

b.    1 (uma) máquina fotográfica, de marca "Sony", no valor de € 300 euros;

c.     2 (dois) cartões de memória para máquina fotográfica, no valor de €30,00 (trinta euros);

d.    1 (um) relógio, de marca "Calvin Klein", no valor de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros);

  e.   1  (um) frasco de perfume, de marca  "Carolina Herrera", no valor de € 70,00 (setenta euros);

    f.      1 (um) par de botas, de marca "Nike Jordan", no valor de €120,00 (cento e vinte euros);

    g.      3 (três) pares de óculos de sol, de marca não identificada no valor total de pelo menos 100 euros;

    h.   1 (uma) fotocópia do bilhete de identidade de EE.

10. Logo após, e com os objectos supra descritos na sua posse, o arguido ausentou-se do local, integrando tais objectos no seu património, logrando fazê-los seus, contra a vontade e em prejuízo dos seus legítimos proprietários.

11. Para proceder à reparação da janela os demandantes despenderam a quantia de vinte e cinco euros.

NUIPC 80/10.0 GCABF

12. No dia 2 de Abril de 2010, no período compreendido entre as 12horas e 30 minutos e as 14 horas, o arguido AA deslocou-se à residência localizada no Sítio do Montinho, freguesia de Paderne, concelho de Albufeira, com o propósito de se apoderar de bens e valores que aí encontrasse.

13. Na execução de tal intento, por forma não concretamente apurada, o arguido destruiu o vidro da janela da sala de estar da referida residência, a qual transpôs, introduzindo-se na habitação por esse local.

14. Seguidamente, o arguido retirou do interior de tal residência, dinheiro, pertencente a FF, em valor não concretamente apurado, mas de cerca de trezentos euros, o qual se encontrava dentro de um mealheiro.

15. Logo após, e com o dinheiro na sua posse, o arguido ausentou-se do local, integrando tal objecto no seu património, logrando fazê-lo seu, contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo proprietário.

16. O queixoso despendeu cerca de seiscentos euros na reparação da persiana eléctrica.

17. O arguido procedeu no dia 30 de Novembro de 2011 ao depósito da quantia de seiscentos euros montante destinado a ser entregue ao queixoso.

NUIPC 73/10.8 GDFAR

18. Nó dia 8 de Abril de 2010, entre as lOhOOm e as 10h30m, os arguidos AA e CC, acompanhados de um indivíduo do sexo feminino, cuja identidade não foi concretamente apurada, deslocaram-se à residência sita no Sítio dos ........., freguesia de São Brás de Alportel, concelho de Faro, com o propósito de se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

19. Nesse local e de acordo com um plano previamente gizado entre todos, em conjugação de esforços e de intentos, por forma não concretamente apurada, destruíram a fechadura da porta/janela da sala de estar da referida residência, a qual transpuseram, penetrando na mesma por esse local.

20. Seguidamente, ambos os arguidos retiraram do interior daquela residência, os seguintes objectos, pertença de GG:

a.   1 (um) fio de ouro, no valor de € 450,00 (quatrocentos e cinquentaeuros);

b.    1 (uma) libra de ouro, no valor de €400,00 (quatrocentos euros);

c.     1 (um) fio de ouro, no valor de €250,00 (duzentos e cinquenta euros);

d.    1 (um) fio de ouro, no valor de €200,00 (duzentos euros);

e.     1 (uma) gargantilha de ouro, no valor de €400,00 (quatrocentos euros);

f.     1 (uma) pulseira de ouro, no valor de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros);

g.   2 (duas) argolas de ouro, no valor de €300,00 (trezentos euros);

h.  2 (duas) argolas de ouro, no valor de €125,00 (cento e vinte e cinco euros);

i.    2 (duas) argolas de ouro, no valor de €185,00 (cento e oitenta e cinco euros);

j.   2 (dois) brincos de ouro, no valor de €150,00 (cento e cinquenta euros); k.  2 (dois) brincos de ouro, no valor de €180,00 (cento e oitenta euros);

1.   2 (dois) brincos de ouro, no valor de €150,00 (cento e cinquenta euros);

m.    2 (dois) brincos de ouro, no valor de €300,00 (trezentos euros);

n.     2 (dois) brincos de ouro, no valor de €175,00 (cento e setenta e cinco euros);

o.   2 (dois) brincos de ouro, no valor de €150,00 (cento e cinquenta euros);

p.   1 (uma) medalha oval de ouro, no valor de €180,00 (cento e oitenta euros);

q.   3 (três) anéis de ouro, no valor de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros);

r.   2 (duas) libras de ouro, no valor de €700,00 (setecentos euros).

21.  Logo após, os arguidos abandonaram o local, com os objectos acima descritos na sua posse, que fizeram seus, integrando-os no seu património, contra a vontade eem prejuízo da sua legítima proprietária.

NUIPC 74/10.6 GDFAR

22.  Ainda no dia 8 de Abril de 2010, igualmente no período compreendido entre lOhOOm  e  as   10h30,   os  arguidos  AA CC, acompanhados de um indivíduo do sexo feminino, cuja identidade não foi concretamente apurada, deslocaram-se à residência pertencente a HH, sita na Sítio dos ........., número 0000, freguesia de São Brás de Alportel, concelho de Faro, com o propósito de se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

23. Assim, em conjugação de esforços e de intentos e na execução de plano que haviam gizado entre si, os arguidos, por forma não concretamente apurada, destruíram a persiana da janela do quarto, e introduziram-se, por essa forma, no interior de tal residência.

24. Do interior retiraram um saco de desporto de marca e valor não concretamente apurados mas inferior a cinquenta e dois euros e dois sumos de fruta da marca Compal de valor não concretamente apurado mas inferior a dois euros.

25. Para reparação da persiana HH despendeu montante não apurado.
26. Os arguidos procederam, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de cinquenta e dois euros montante destinado a ser entregue à queixosa.

NUIPC 76/10.2 GDFAR

27.  Ainda no dia 8 de Abril de 2010, no período compreendido entre as 1 lh25m e as llh30, os arguidos AA e CC, acompanhados de um indivíduo do sexo feminino, cuja identidade não foi concretamente apurada, deslocaram-se à residência pertencente a II, sita na Urbanização .........., Lote ...., freguesia de São Brás de Alportel, concelho de Faro, com o propósito de se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

28. Assim, em conjugação de esforços e de intentos e na execução de plano que haviam gizado entre si, os arguidos, por forma não concretamente apurada, destruíram uma das portas da residência, e introduziram-se, por essa forma, no interior da mesma.

29. No entanto, ao aperceberem-se da presença de JJ na residência, os arguidos colocaram-se, de imediato, em fuga, ausentando-se do local, sem que lograssem alcançar os seus intentos, por razões alheias à sua vontade.

NUIPC 162/10.9GBVRS

30. No dia 6 de Agosto de 2010, no período compreendido entre as 14h00 e as 14hl5m, os arguidos AA e CC, acompanhados de um indivíduo do sexo feminino, cuja identidade não foi concretamente apurada, deslocaram-se à residência pertencente a KK, sita na Rua ......., Lote....., Urbanização ........... em Altura, Castro Marim, fazendo-se transportar no veículo ligeiro de passageiros, de cor cinzenta, de marca "Ford", modelo "Mondeo", de matrícula espanhola 0000000 com o propósito de se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

31. Assim, em conjugação de esforços e de intentos e na execução de plano que haviam gizado entre si, por forma não concretamente apurada, destruíram a fechadura da porta das traseiras da referida residência assim como uma janela, com o intuito de se introduzirem, por essa forma, no interior da mesma.

32. No entanto, ao aperceberem-se da presença de vizinhos nas imediações, os arguidos colocaram-se, de imediato, em fuga, introduzindo-se no veículo de matrícula "0000000", ausentando-se do local, sem que lograssem alcançar os seus intentos, por razões alheias à sua vontade.

33. Despendeu entre € 425,00 a € 475,00 na reparação, montante que foi suportado pela Companhia de Seguros.

NUIPC 308/10.7GA VRS

34. No dia 9 de Agosto de 2010, pelas lhh l5m, dois indivíduos, um do sexo feminino e outro do sexo masculino, cujas identidades não se lograram apurar, deslocaram-se à Urbanização P........, concelho de Vila Real de Santo António, com o propósito de aí se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

35. Nesse local e de acordo com um plano previamente gizado, em conjugação de esforços e de intentos, os referidos indivíduos introduziram-se no interior do veículo de matrícula "00000000", que se encontrava estacionado junto ao Lote 19, e retiraram do respectivo interior os seguintes objectos, pertença de LL:

a.     1 (uma) mala de senhora, no valor de cem euros;

b.     1 (um) molho de chaves;

c.     1 (uma) chave de uma caixa registadora;

d.    1 (um) envelope que continha a quantia de €500,00 (quinhentos euros);

e.     1 (um) bilhete de identidade;

f.     1 (uma) carta de condução;

22 Reportagem fotográfica de fls. 356 a 366.

g.   1 (um) cartão de contribuinte;

h.   1 (um) cartão de utente do Serviço Nacional de Saúde.

36.  Seguidamente, abandonaram o local, com os objectos acima descritos na suaposse, que fizeram seus, integrando-os no seu património, contra a vontade e emprejuízo da sua legítima proprietária.

NUIPC325/10. 7GAVRS

37. No dia 20 de Agosto de 2010, no período compreendido entre as 14 horas e as 16 horas e 30 minutos, o arguido AA deslocou-se à residência sita no Sítio da Laranjeira, ......., freguesia de Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António24, com o propósito de se apoderar de bens e valores que aí encontrasse.

38. Na execução de tal intento, por forma não concretamente apurada, o arguido partiu o vidro da janela da cozinha, ao nível do rés-do-chão, que permitia o acesso ao interior da referida residência, janela que transpôs, introduzindo-se na mesma por esse local.

39. Seguidamente, o arguido retirou do respectivo interior os seguintes objectos, pertença de MM:

a.    1 (uma) televisão, de marca "Sony", no valor de € 600,00 (seiscentos euros);

b.    1 (um) relógio, de marca "Breitling", no valor de €5000,00 (cinco mil euros);

c.     francos   suíços,   em  número  não   determinado,   no   valor  de  €500,00 (quinhentos euros);

d.    1 (uma) máquina fotográfica digital, de marca "Canon", modelo "Ixus 970", no valor de €100,00 (cem euros);

e.     1 (um) par de binóculos, de marca "Carena", no valor de €100,00 (cem euros);

f.     1 (um) colar em ouro, no valor de €1000,00 (mil euros);

g.     1 (um) relógio em ouro, no valor de €600,00 (seiscentos euros);

 h.  2 (duas) pulseiras em ouro, no valor de €1000,00 (mil euros);

i.    1 (um) telemóvel, de marca "Nokia ", no valor de €50,00 (cinquenta euros);

j.     1 (um) leitor de mp3, no valor de €100,00 cem euros);

k.   1 (um) par óculos de sol, de marca "Julbo", no valor de €175,00 (cento e setenta e cinco euros);

1. 1 (uma) caneta, de marca "Montblanc", no valor de €200,00 (duzentos euros);

m. 1 (um) par óculos, de marca  "Chopard", no valor de €1200,00 (mil e duzentos euros);

n.   1 (uma) aliança em ouro, no valor de €200,00 (duzentos euros);

o.   1 (um) anel em ouro, no valor de €300,00 (trezentos euros);

p.   1 (um) relógio, de marca "Tissot", no valor de €300,00 (trezentos euros);

q.   1 (um) relógio, de marca "Frave Lenda ", no valor de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros) e

r.   2 (dois) envelopes com a quantia, cada um deles, de cento e cinquenta euros.

40. Logo após, e com os objectos supra descritos na sua posse, o arguido ausentou-se do local, integrando tais objectos no seu património, logrando fazê-los seus, contra a vontade e em prejuízo da sua legítima proprietária.

NUIPC 408/10.3GBTVR

41. Em data não concretamente apurada, mas que se situa no período compreendido entre as 17 horas do dia 29 de Agosto de 2010 e as 12 horas do dia 30 de Agosto de 2010, os arguidos AA25 e CC, fazendo-se transportar no veículo de matrícula espanhola "0000000", dirigiram-se à residência sita no Sítio da ........, Perogil, Caixa Postal 492 - X26, freguesia de Santiago, concelho de Tavira, com o propósito de se apoderarem de bens e valores que ali encontrassem.

42. Nesse local, em conjugação de esforços e intentos e na execução de um plano que haviam gizado entre ambos, os arguidos, por forma não concretamente apurada, destruíram a fechadura do portão que dá acesso à dita propriedade, assim como uma janela da residência, que transpuseram, introduzindo-se desta forma no interior da referida habitação.

43. Seguidamente, ambos os arguidos retiraram do interior daquela residência os seguintes objectos, pertença de NN e de OO:

a..  1 (uma) pistola, de marca "Tanfoglio Giuseppe", com o n° de série 0000000, calibre 6,35, registada em nome de NN;

b. 1 (um) relógio em ouro, de marca "Chandor", com a inscrição "Alda - 25/12/2006";

c.   7 (sete) pulseiras em ouro, designadas por escravas;

d.   1 (um) cinto salmão em ouro;

 e.    1 (uma) medalha em ouro;

 f.    1 (uma) pulseira com um pendente Singapur em ouro;

g.   1 (uma) pulseira em malha de friso em ouro;

h.   1 (um) colar de argolas;

i.    1 (um) colar entrançado;

 j.   2 (duas) gargantilhas em forma de folha;

k.   1 (uma) gargantilha "Cartié";

 l.    1 (uma) pulseira "Cartié";

 m. 1 (uma) gargantilha com flores vermelhas;

 n.   1 (uma) gargantilha com pedras brancas;

o.   1 (um) coração com desenhos de flores;

p.   1 (um) coração com desenhos em relevo;

q.   1 (um) relógio, de marca "Stanless Steel".

44. Os queixosos mandaram reparar o portão e a janela no que despenderam cerca de seiscentos euros.

45. Os arguidos procederam, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de cem euros montante destinado a ser entregue aos queixosos.

46. Logo após, e com os objectos supra descritos na sua posse, que transportaram para o veículo supra identificado, os arguidos abandonaram o local, integrando tais objectos no seu património, logrando fazê-los seus, contra a vontade e em prejuízo dos seus legítimos proprietários.

NUIPC 407/10.5 GBTVR

47.  No dia 30 de Agosto de 2010, no período compreendido entre as 10h30 e as 12 horas os arguidos AA e CC, dirigiram-se, ainda, à residência sita no Sítio da ..........., Caixa Postal 310 -X, freguesia de Santo Estevão, concelho de Tavira,  com  o  propósito  de   se  apoderarem  de  bens   e  valores  que  ali encontrassem.

48. Nesse local, em conjugação de esforços e intentos e na execução de um plano que haviam gizado entre ambos, os arguidos, por forma não concretamente apurada, assim como uma janela do quarto da residência, que transpuseram, introduzindo-se desta forma no interior da referida habitação.

49. Seguidamente, ambos os arguidos retiraram do interior daquela residência os seguintes objectos, pertença de PP:

                           a..   1 (um) computador portátil, de marca "Acer", modelo "One 150", no valor de €299,00 (duzentos e noventa e nove euros);

b. 4 (quatro) anéis em ouro, no valor de €1300,00 (mil e trezentos euros);

c.  2 (dois) fios em ouro, no valor de €400,00 (quatrocentos euros);

d. 3 (três) pulseiras em ouro, no valor de €1000,00 (mil euros);

e.  2 (duas) alianças em ouro, no valor de €200,00 (duzentos euros);

f.  1 (um) anel, de criança, em ouro, no valor de €100,00 (cem euros);

g.    1 (uma) câmara fotográfica e de filmar, de marca "Nikon", no valor de €300,00 (trezentos euros).

50.  Logo após, e com os objectos supra descritos na sua posse, que transportaram para o veículo supra identificado, os arguidos abandonaram o local, integrando tais objectos no seu património, logrando fazê-los seus, contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo proprietário.

NUIPC21/10.0GATVR

51. No referido dia 30 de Agosto de 2010, cerca das 12 horas, os arguidos AA e CC e o veículo supra descrito foram avistados por QQ, nas imediações do Sítio do Malhão.

52. Por suspeitar que os mesmos poderiam ser os autores de um furto a residência cometido dias antes nas proximidades, o referido QQ decidiu seguir os mesmos por forma a obter mais elementos que permitissem conduzir à sua identificação.

53. Na sequência, QQ veio a localizar o veículo em que os arguidos se faziam transportar no Sítio de Quatro Estradas, imobilizado no caminho de acesso a uma residência pertencente a um amigo seu holandês.

54. Nesse local, QQ abordou ambos os arguidos questionando-os acerca do que ali faziam, ao que estes responderam que procuravam uma casa para alugar quando, anteriormente, haviam informado uma amiga daquele, que haviam abordado momentos antes na sua residência, que andavam a procurar trabalho.

55. Na sequência da conversação mantida QQ solicitou a identificação ao arguido CC que lha forneceu e extraiu fotografias do documento entregue e dos arguidos, tendo solicitado ao arguido CC para tirar os óculos ao que o mesmo anuiu.

56. Logo após o referido QQ ter extraído fotografias à matrícula do veículo, o arguido CC saiu do interior do veículo, no qual ocupava o lugar do condutor e dirigiu-se na direcção de BB.

57. Este, temendo pela sua segurança, iniciou a marcha do seu veículo ligeiro de passageiros, vermelho, marca "Fiat", modelo "Punto", com a matrícula "00-00-00", primeiro subindo o caminho em que se encontrava por forma a inverter a marcha, o que fez, logrando passar pelo veículo conduzido pelo arguido CC.

58. E tomando a direcção de Tavira, percorrendo a E.N. 270, na localidade de Santa Margarida.

59. Os arguidos, fazendo-se transportar no veículo automóvel de marca "Ford", modelo "Mondeo", supra identificado, seguiram no encalço de QQ.

60. O veículo era conduzido pelo arguido CC.

61. Ao circularem no entroncamento entre E.N. 270 e a Estrada Municipal que dá acesso ao Sítio do Barranco do Nora, o arguido AA disparou um tiro, com a pistola de marca "Tanfoglio Giuseppe", com o n° de série "000000", calibre "6,35", a qual haviam subtraído anteriormente ao seu proprietário, em direcção do veículo onde seguia o ofendido.

62. Logo após, no percurso encetado entre a localidade de Santa Margarida e a rotunda de acesso à zona industrial de Tavira, o arguido AA disparou, com a referida arma de fogo, um segundo tiro em direcção ao veículo conduzido por QQ, atingindo a parte traseira do mesmo, na bagageira, local em cujo interior veio a ser recuperado um projéctil.

63. Seguidamente, o arguido AA disparou novamente em direcção ao veículo onde seguia QQ, tendo atingido a respectiva roda traseira direita, onde se alojou o respectivo projéctil.

64. No entanto, como QQ se descolou para as imediações do Quartel da G.N.R., sito em Tavira, os arguidos, ao aperceberem-se desse facto, abandonaram o local dirigindo-se para a rotunda de acesso à A22, que percorreram em direcção a Espanha.

65. Encetada perseguição policial no sentido de localizar os arguidos e a viatura conduzida pelos mesmos, cerca das 15h00, do dia 30 de Agosto de 2010, logrou-se proceder à sua intercepção, na A22, no Parque da Praça da Fronteira do Guadiana, junto ao CCPA de Castro Marim /Ayamonte.

66. No interior do veículo automóvel utilizado pelos arguidos, de marca "Ford", modelo "Mondeo", matrícula "0000000", foram detectados e apreendidos, os seguintes objectos:

a.    1 (um) relógio em ouro, da marca "CHANDOR", com as iniciais "Alda" e a data "00-00-00", na retaguarda, no valor de €1200,00 (mil e duzentos euros);

b.    1 (uma) pulseira, com bicos em ouro, no valor de €500,00 (quinhentos euros);

c.     7 (sete) pulseiras, designadas por escravas, em ouro, no valor de €732,00 (setecentos e trinta e dois euros);

d.    1 (uma) pulseira, com malha friso, em ouro, no valor de €299,00 (duzentos e noventa e nove euros);

e.     1 (uma) libra, com cercadura em ouro, no valor de €300,00 (trezentos euros);

f.     1 (um) fio, designado por três mais um, com a letra "S" em ouro, no valor de € 120,00 (cento e vinte euros);

g.     1 (uma) pulseira, com pendente Singapur em ouro, no valor de €138,00 (cento e trinta e oito euros);

h.   1 (um) cinto salmão, em ouro, no valor de €20,00 (vinte euros);

i.    1 (uma) medalha, com a Santa Teresinha em ouro, no valor de €64 (sessenta e quatro euros);

j.    1 (uma) aliança em ouro, no valor de €50,00 (cinquenta euros); k.   1 (um) anel quatro folhas em ouro e pedra branca, no valor de €146,00 (cento e quarenta e seis euros);

1.   2 (duas) alianças partidas em ouro, no valor de €48,00 (quarenta e oito euros);

m.   1 (um) anel de criança, em prata e ouro, no valor de €5,00 (cinco euros);

n.   1 (um) anel de criança em ouro com pedra azul, no valor de €12,00 (doze euros);

o.    1 (um) anel, em ouro e pedra vermelha, no valor de €44,00 (quarenta e quatro euros);

p.   1 (uma) bolota em ouro, no valor de €28,00 (vinte e oito euros); q.   1 (um) berloque, com a letra "E", em ouro, no valor de €10,00 (dez euros);

r.   1 (um) berloque, sem identificação, em ouro, no valor de €14,00 (catorze euros);

s.  1 (uma) medalha madre pérola, em ouro, no valor de €20,00 (vinte euros);

t.    1 (uma) argola em ouro, no valor de €6,00 (seis euros);

u.   1 (um) colar de argolas (bijutaria), sem valor venal;

v.   1 (um) colar entrançado (bijutaria), sem valor venal;

w. 2 (duas) gargantilhas em forma de folha (bijutaria), sem valor venal;

x.   1 (uma) gargantilha cartié (bijutaria), sem valor venal;

y.   1 (uma) pulseira cartié (bijutaria), sem valor venal;

z.   1 (uma) gargantilha com flores vermelhas (bijutaria), sem valor venal;

aa. 1 (uma) gargantilha com pedras brancas (bijutaria), sem valor venal;

bb. 1 (um) coração com desenhos de flores (bijutaria), sem valor venal;

cc. 1 (um) coração com desenhos em relevo (bijutaria), sem valor venal;

dd. 1 (um) relógio, da marca "STANLESS STELL" (bijutaria), sem valor venal;

ee. 2 (duas) chaves de fendas, com 39,5 cm de comprimento e com a palavra  "PALMERA" inscrita no cabo, ambas em tons de verde-escuro e verde alface, no valor unitário de €12,00 (doze euros);

ff. 1 (uma) maceta preta, com o cabo castanho e preto, com a inscrição "DNI" 6475 1000", no valor de €5,00 (cinco euros);

gg. 1 (uma) luva em tecido branco, da marca "GOOD TEAR ART. 0524 TG.9", sem valor venal;

hh. 1 (um) escopo, da marca "BELLOTA", de cor azul, no valor de €6,00 (seis euros);

ii. 1 (uma) peúga branca, com dois desenhos de vacas, e com o número 9855, sem valor comercial.

67. Alguns dos objectos supra descritos foram subtraídos da residência sita no Sítio da Asseca, Perogil, Caixa Postal 492 -X, freguesia de Santiago, concelho de Tavira, propriedade de NN e de OO e outros destinavam-se a serem utilizados na prática de ilícitos relacionados com o furto a residências.

68. Posteriormente, foi ainda apreendida a arma de fogo de marca "Tanfoglio Giuseppe", pertencente ao queixoso NN, e com o n.° de série "D 38747", de calibre "6,35mm", respectivo carregador e uma munição, junto à E.M., na zona da localidade de Santa Margarida-Tavira, local onde os arguidos moveram perseguição a QQ.

69.   No dia 31 de Agosto de 2010, foi, ainda, detectado pela G.N.R., na berma da E.N. 270, no sentido de marcha Santa Margarida Tavira, a cerca de 13 metros da placa indicadora do nome da cidade de Tavira, e a cerca de 200 metros do local onde havia sido encontrada a arma supra descrita, um invólucro calibre 6.35 mm.

70. Nenhum dos arguidos possuía qualquer licença de uso e porte de arma de defesa, que lhes permitisse deter e utilizar a arma acima descrita.

71. Agindo do modo descrito, na execução do plano que haviam gizado entre si, na comunhão de esforços e intentos, os arguidos quiseram subtrair e fazer seus objectos alheios, bem sabendo que estes não eram seus e que assim se comportavam contra a vontade e em prejuízo dos respectivos proprietários, o que lograram ou não fazer, segundo acima se descreveu.

72. Os arguidos decidiram apropriar-se dos bens referidos, como forma de subsistir e obter lucros, com vista a assegurarem as suas despesas e necessidades básicas e lúdicas.

73. Agindo do modo descrito, na execução do plano que haviam gizado entre si, na comunhão de esforços e intentos, os arguidos quiseram e lograram transportar, deter e usar a arma de fogo supra identificada, sem que estivessem legalmente autorizados a fazê-lo, pois não eram titulares de licença de uso e porte de arma de fogo.

74. Para além disso, agindo do modo descrito, na execução do plano que haviam gizado entre si, na comunhão de esforços e intentos, os arguidos, de molde a tentar recuperar o telemóvel de QQ onde se encontravam fotografias dos arguidos, quiseram atingir o corpo de QQ com projécteis de arma de fogo e, assim, causar-lhe a morte, o que não lograram alcançar por motivos alheios à sua vontade, por QQ se ter dirigido em direcção ao Quartel da Guarda Nacional Republicana.

75. Os arguidos bem sabiam que essas suas condutas eram criminalmente proibidas e punidas por lei e, não obstante, agiram sempre de forma livre, deliberada e consciente.

76. À data da prática dos factos o arguido AA não apresentava quadro psicopatológico compatível com um diagnóstico do eixo 1, nomeadamente psicose esquizofrénica ou outras psicoses crónicas.

77. Em Março e Abril de 2010 consumia substâncias psicoactivas.

78. Mesmo que estivesse sob forte influência de substâncias psicoactivas e condicionado por elas em relação à determinação e consciência da ilicitude dos actos que estava a cometer, o arguido não é inimputável.

79. Esta situação, no limite e em relação a alguns dos crimes que o arguido cometeu pode configurar uma situação de imputabilidade diminuída.

80. As estratégias e competências do arguido AA são escassas e imaturas.

81.   O arguido AA refere que o seu desejo é ser ajudado a ter uma vida normal.

                                       *

82. À data da prática dos factos o arguido CC possuía hábitos de abuso / dependência de estupefacientes e álcool, com períodos de abstinência.

83. Em 2009, o arguido CC esteve internado num Serviço de Psiquiatria de Huelva por Psicose Induzida por Drogas.

84. O abuso / dependência / abstinência de drogas, fez sobressair os traços anti-sociais e limite da sua personalidade, predispondo-o à delinquência, por défice de controlo da vontade, mesmo sabendo a sua ilicitude.

85. Os actos praticados pelo arguido visaram manter os hábitos toxicofílicos e ultrapassar as carências materiais da sua família.

86. O arguido sofria (à data da prática dos factos) e sofre de Perturbação da Personalidade, com traços anti-sociais e limite (instabilidade emocional e impulsividade), e sofria de abuso/dependência/abstinência de estupefacientes.

87. Estas anomalias psíquicas, em geral e neste caso concreto, não são determinantes de perturbação da consciência da ilicitude e da capacidade de autodeterminação em conformidade com os valores jurídico - criminais.

88. O arguido CC podia avaliar a ilicitude dos factos a que se reporta a acusação, apesar do défice relativo de controlo da vontade / impulsividade, consequentemente, não deve ser considerado inimputável.

89. As referidas anomalias psíquicas são determinantes de imputabilidade diminuída.

90. O arguido CC revela capacidade para ser influenciado pela pena aplicada ao caso concreto.

Das condições pessoais do arguido CC

91. O arguido, natural da Colômbia, deslocou-se com o seu agregado de origem, inicialmente para Portugal e posteriormente para Espanha, onde reside há cerca de sete anos.

92. Em Portugal viveram entre 2001 e 2004, tendo ido para Espanha por não terem conseguido ser acolhidos em situação de asilo político, como pretendiam.

93. Frequentou a escola em Portugal, tendo completado o 7.° ano de escolaridade.

94. A nível profissional trabalhou no sector da hotelaria, em negócio familiar.

95. Com cerca de 17 anos iniciou uma situação de união de facto, na sequência da gravidez da namorada, tendo actualmente dois filhos de 4 e 5 anos de idade.

96. À data dos factos residia em Espanha, com a companheira e os filhos. Após a sua detenção o casal ter-se-á separado, deixando a sua companheira de o visitar.

97. Esteve sujeito a internamento para tratamento psiquiátrico.

98. Trabalhou sempre de forma esporádica na área da hotelaria, para o pai e outros patrões.

99. A família mostra-se preocupada com ele, estando disposta a apoiá-lo no que for preciso.

100. Os seus projectos de vida passam pela permanência em Espanha onde dispõe do apoio da família de origem.

101. Tem mantido no Estabelecimento Prisional de Olhão um comportamento adequado às normas institucionais, apesar de ser notória alguma ansiedade e instabilidade emocional.

102. É seguido em psiquiatria e encontra-se medicado.

103. Tem recebido visitas dos pais.

Das condições pessoais do arguido AA

104. É natural de Huelva, Espanha, e o segundo de três filhos de um casal profundamente disfuncional, ele consumidor de estupefacientes, ela com comportamentos aditivos em jogos de casino.

105. O pai nunca teve ocupação organizada, permanecendo a maior parte da sua vida preso.

106. A mãe ocupava-se na comercialização de bivalves, mas de forma irregular, e chegou a cumprir também uma pena de prisão de três anos por crime de tráfico de estupefacientes.

107. Quando o arguido tinha seis anos (a irmã sete e o irmão três) todas as crianças foram retiradas pelos serviços sociais da Junta de Andalucia e internadas num centro para menores, onde o arguido permaneceu seis anos.

108. De regresso a casa dos pais, deixou de frequentar a escola, começou a consumir haxixe, álcool e ecstasy.

109. Dois anos mais tarde foi-lhe imposta medida de internamento em Centros de Menores do Ministério da Justiça, primeiro no de Los Alcores em Sevilha e de seguida no de Sierra Morena em Córdoba.

110. Ao entrar nestes centros e apesar de formalmente habilitado com o 6.° ano, AA mal sabia ler ou escrever e foi ali que acabou por terminar o 8.° ano.

111. Depois de 13 meses de permanência o arguido evadiu-se e sete meses depois foi reconduzido ao estabelecimento de menores para cumprir os três meses que faltavam para o termo da medida.

112. No período em que não se manteve internado inseriu-se inicialmente no agregado de uma tia materna e sua família, de onde saiu passado pouco tempo por não querer acatar qualquer orientação.

113. Como de experiência laboral apenas regista um emprego de cerca de um mês como entregador de comida ao domicílio.

114. Por falecimento da mãe, em 2007, e por o pai se encontrar de novo em cumprimento de pena, o arguido, tal como o irmão, foi colocado à responsabilidade da tia materna, RR, de onde depressa ambos saíram para integrar o agregado da irmã, de 20 anos, que habita na casa que antes era a morada do agregado de origem.

115. Ali, encontrava-se também o co-arguido, e os dois filhos do casal, de 5 e 4 anos.

116. O arguido refere que estava a isolar-se em casa porque o seu relacionamento com o exterior era marcado por sentimentos de hostilidade e desconfiança.

117. O seu comportamento institucional surge como globalmente adequado no que concerne ao cumprimento de regras.

118. Por se encontrar num Estabelecimento Prisional de Lisboa e não no de Olhão, como o companheiro da irmã, não conta com qualquer apoio familiar, situação que lhe causa uma acrescida angústia.

119. O consulado do seu país tem vindo a apoiá-lo materialmente, depositando na sua conta do EP, trimestralmente, a quantia de cento e trinta euros.

Dos antecedentes criminais dos arguidos

120. Os arguidos não têm antecedentes criminais em Portugal.

Nulidade do Acórdão

Vem arguida a nulidade do acórdão com o fundamento de que não foi equacionada a eventual aplicação ao arguido CC do regime penal especial para jovens previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

Do exame do acórdão impugnado verifica-se que no segmento relativo à fundamentação consta, a propósito da eventual aplicação aos arguidos do regime penal especial para jovens, o seguinte:

«À data da prática dos factos:  

-o arguido CC tinha 21 e 22 anos idade (nasceu em 2 de Julho de 1988;

- o arguido AA tinha 18 anos de idade (nasceu em 10 de Fevereiro de 1992);

Antes de mais, deve-se ter em atenção que o legislador criou um regime legal especial para jovens delinquentes, cuja idade se situa entre os 16 e os 21 anos.

Tal regime encontra-se previsto no artigo 9.° do Código Penal e no Decreto-Lei n° 401/82, de 23/09, fundando-se na ideia que, no direito penal dos jovens imputáveis, se deve dar prioridade aos princípios e modelos protectívos e reeducadores, visto que existe nos jovens uma maior capacidade de ressocialização, importando prevenir os efeitos estigmatizantes que neles, com maior facilidade, desencadeiam uma longa pena privativa da liberdade.

É neste contexto que o artigo 4.° do DL 401/82, de 23/09, prevê uma atenuação especial relativa aos jovens, a operar nos termos dos artigos 72.° e 73.° do Código Penal.

Trata-se de um poder-dever que implica que a aplicação dessa atenuação depende da existência de sérias razões para pensar que dela resultem vantagens para a reinserção social do jovem delinquente.

Com efeito, a delinquência juvenil é um fenómeno social das sociedades modernas, urbanas, industrializadas "(•••) obrigando, desde logo o legislador a procurar respostas e reacções que melhor parecem adequar-se à prática por jovens adultos de crimes, que visem um ciclo de vida que corresponde a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório" (in Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Outubro de 2007 - in wvvov.dgsi.pt/jstj). No mesmo sentido vide Acórdão da Relação do Porto de 12 de Setembro de 2007 (vvovw.dgsi.pt/jstj).

Ora, tal juízo de prognose favorável ou desfavorável tem de ser alicerçado em factos concretos, ponderando, designadamente a conduta do arguido, anterior e posterior ao crime, as condições pessoais, familiares e profissionais para a avaliar da sua inserção familiar e ainda a sua personalidade para se poder aferir além do mais se é sensível à aceitação dos valores dominantes e tutelados pelo direito penal, ou seja se é ou não dotado de capacidade de auto-censura.

No caso em apreço, os factos provados são de molde a obstaculizar o funcionamento da mencionada atenuação especial em relação aos dois arguidos, tendo em conta que o percurso de vida dos mesmos (em grau próximo, não existindo quaisquer razões que suportem fazer no caso uma distinção) denota inconsistência e imaturidade na estruturação de um projecto de vida.

Com efeito, no caso dos arguidos o seu percurso laboral é pautado pela instabilidade, como já o foi o percurso escolar na sequência da manutenção de uma atitude de irresponsabilidade e/ou dificuldades no cumprimento de regras.

Do que resulta, de forma evidente personalidades mal estruturadas, sem estável integração, no meio social, relevando ainda dificuldades de relacionamento com os outros, bem como que estão pouco sedimentados os valores sociais.

Deste modo, tem-se por evidente que não existem sérias razões para crer que, da atenuação especial no referido artigo 4.° do D.L. n° 401/82, resultem vantagens para a reinserção social dos arguidos.

Razão pela qual se afasta a aplicação do referido regime».

Conquanto o tribunal recorrido, ao contrário do alegado, haja emitido pronúncia expressa sobre a eventual aplicação a ambos os arguidos do regime penal especial para jovens constante do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, o que excluiria a ocorrência da nulidade arguida, a verdade é que aquele regime, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 1º daquele diploma legal, apenas é aplicável aos arguidos que, à data da prática do crime, tenham completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos. Certo é que o arguido CC, à data da prática dos factos delituosos (2010), já havia completado 21 anos, razão pela qual a arguição de nulidade do acórdão se mostra totalmente desprovida de fundamento.

Improcede pois o recurso nesta parte.

Incorrecta Qualificação Jurídica das Subtracções

Os arguidos AA e CC, sob a alegação de que todas as subtracções foram perpetradas de forma essencialmente homogénea, no quadro da mesma solicitação exterior consideravelmente diminuidora da sua culpa e mediante uma só resolução, entendem que os factos delituosos que se lhes encontram subjacentes devem ser qualificados como integrantes de um só crime na forma continuada.

A lei substantiva penal vigente regula a problemática do concurso de crimes, do crime continuado e do crime único constituído por uma pluralidade de actos ou acções no último artigo do Capítulo II, do Título II, do Livro I, sob a epígrafe de «Concurso de Crimes e Crime Continuado» (artigo 30º), traduzindo o pensamento desde há muito expresso pelo Professor Eduardo Correia, na sua obra Unidade e Pluralidade de Infracções – Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz.

Do exame sumário do referido preceito, na sua globalidade, verifica-se, no entanto, que o mesmo não regula esta matéria de forma «abrangente e esgotante», na medida em que as soluções ali indicadas se limitam a estabelecer um critério mínimo de distinção entre unidade e pluralidade de infracções.

Trata-se pois de um ponto de partida estabelecido pelo legislador, a partir do qual à doutrina e à jurisprudência caberá, em última análise, encontrar as soluções mais adequadas, tendo em vista a multiplicidade de situações que se prefiguram.

Certo é que enquanto no nº 1 do artigo 30º se estabelecem critérios relativos à problemática do concurso de crimes «tout court», no n.º 2 pretendem-se regular situações que também têm a ver com a pluralidade de crimes, mas que o legislador juridicamente unifica em um só crime. Neste último caso estamos perante o chamado crime continuado, bem como face a outros casos de unificação jurídica (crime único com pluralidade de actos ou acções).

Vejamos pois se no caso ora submetido à nossa apreciação e julgamento estamos perante uma pluralidade de crimes subsumível ao conceito constante do n.º 1 do artigo 30º (concurso de crimes) ou, ao invés, estamos face a uma pluralidade de crimes subsumível ao conceito constante do n.º 2 daquele artigo (crime continuado).

Deste modo, comecemos por analisar o texto do n.º 1 do art.30º.

É o seguinte o seu teor textual:

«O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente».

Do exame e análise do texto transcrito decorre que o mesmo contém duas partes, ambas se referindo a situações de pluralidade de crimes cometidos pelo mesmo agente.

Na primeira parte, estatui-se que o número de crimes se determina pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos (... pela conduta do agente); na segunda parte, declara-se que o número de crimes (também) se determina pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.

Na primeira situação estamos face ao apelidado «concurso heterogéneo» (realização de diversos crimes - violação de diversas normas incriminadoras). Na segunda estamos perante o chamado «concurso homogéneo» (realização plúrima do mesmo crime - violações da mesma norma incriminadora).

Certo é que, quer na primeira situação, quer na segunda, o comportamento do agente tanto se pode consubstanciar num só facto ou numa só acção, como em vários factos (naturais) ou várias acções. Com efeito, a partir de um só facto ou de uma só acção podem realizar-se diversos crimes, por violação (simultânea) de diversas normas incriminadoras, bem como o mesmo crime plúrimas vezes, por violação da mesma norma incriminadora[4], tal como a partir de vários factos ou várias acções pode realizar-se o mesmo crime plúrimas vezes, por violação (repetida) da mesma norma incriminadora, bem como diversos crimes, por violação de diversas normas incriminadoras.

Em qualquer dos casos, estamos, no entanto, perante concurso de crimes, já que este ocorre sempre desde que o agente cometa mais do que um crime, quer mediante o mesmo facto, quer através de vários factos.

Não basta, porém, a ocorrência deste concreto condicionalismo (objectivo) para que se conclua, sem mais, estar-se perante «concurso de crimes».

Vejamos.

Como é sabido, o crime é um facto humano, tipicamente ilícito e culpável. O mesmo facto ou a mesma acção, como já vimos, pode simultaneamente realizar um ou mais «tipos de crime». Mas o «tipo de crime» realizado abarca o conteúdo global da norma incriminadora, isto é, o tipo legal, objectivo e subjectivo. Toda e qualquer infracção criminal é constituída por três elementos, quais sejam, o facto típico, a culpabilidade e a punibilidade.

Deste modo, não basta produzir pelo modo previsto na mesma ou em várias disposições legais o evento jurídico de cada uma. É indispensável que relativamente a cada crime concorrente se verifique vontade culpável. É preciso que cada crime seja doloso ou culposo, e como tal punível - nulla poena sine culpa - (artigo 13º, do Código Penal).

Assim sendo, certo é que a expressão «tipos de crime» utilizada no n.º 1 do artigo 30º tem o significado de «tipo legal objectivo e subjectivo», a significar que a vontade culpável, como dolo ou como negligência, por um só acto de vontade ou por actos plúrimos da vontade, deve ter por objecto todos os crimes concorrentes, que serão dolosos ou culposos, consoante a vontade tomar quanto a cada um deles a forma de dolo ou de negligência[5].

Fixado o sentido da norma do n.º 1 do artigo 30º passemos ao exame e análise do seu n.º 2.

É o seguinte o seu teor textual:

«Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente».

Como já se referiu e claramente decorre do respectivo texto, pretendem-se aqui regular as diversas situações em que, ocorrendo uma pluralidade de crimes cometidos pelo mesmo agente, quer por violação repetida do mesmo tipo legal, quer por violação plúrima de vários tipos legais de crime, o legislador procede a uma unificação jurídica, de forma a considerá-las como se um só crime houvesse ocorrido.

Na base do instituto do crime continuado, como revela a primeira parte do respectivo dispositivo, encontra-se assim um concurso de crimes, pois que aquele se traduz objectivamente na «realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico (...)». No entanto, uma diferença desde logo se salienta. A diferença está em que, no caso de «concurso heterogéneo» se limita o campo próprio do crime continuado à violação de várias normas incriminadoras que protejam essencialmente o mesmo bem jurídico, o que equivale a dizer que, por outro lado, se alarga a noção de «concurso homogéneo» consoante resultaria da distinção feita nas 1ª e 2ª partes do n.º 1 do artigo 30º.

Na realidade, o «concurso homogéneo», para efeitos do n.º 2 do artigo 30º, compreende não só a plúrima violação da mesma norma incriminadora mas também a violação de diversas normas incriminadoras, desde que sejam da mesma espécie, isto é, protejam fundamentalmente o mesmo bem jurídico[6].

Certo é, porém, que o instituto do crime continuado exige, obviamente, algo mais, para além da ocorrência de um concurso de crimes, com o âmbito e conteúdo já referidos.

Como se vê da segunda parte do n.º 2 do artigo 30º, exige-se que aquele concurso (realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crimes) seja executado por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.

Deste modo, verifica-se que, fundamentalmente, são razões atinentes à culpa do agente que justificam o instituto do crime continuado. É a diminuição considerável desta, a qual segundo o texto legal deve radicar em solicitações de uma mesma situação exterior que arrastam aquele para o crime, e não em razões de carácter endógeno[7].

Perante culpa significativamente diminuída entende o legislador apenas ser admissível um só juízo de censura, e não vários, como seria de fazer, o que alcança precisamente mediante a unificação jurídica em um só crime (continuado) de comportamento ou comportamentos que violam diversas normas incriminadoras ou a mesma norma incriminadora por mais de uma vez.

Analisado o preceito na sua estrita literalidade ou gramaticalidade, não podemos prescindir, no entanto, do recurso à sua interpretação histórica e teleológica.

Como é sabido, o artigo 30º, do Código Penal, teve por fonte principal o artigo 33º do Projecto da Parte Geral do Código Penal de 1963, e, como já se disse, traduz o pensamento de Eduardo Correia, primeiramente expresso na sua dissertação de doutoramento já citada.

Tal artigo do Projecto foi discutido na 13ª sessão da Comissão Revisora, em 8 de Fevereiro de 1964, sendo que aí foi aprovado, por maioria, um último período para o n.º 2, que seria o seguinte: «A continuação não se verifica, porém, quando são violados bens jurídicos inerentes à pessoa, salvo tratando-se da mesma vítima. Referiu então Eduardo Correia que esse acrescentamento podia realmente ser consagrado, embora não fosse de reputar de todo indispensável, uma vez que a conclusão que ele contém já se retiraria da expressão «o mesmo bem jurídico»[8].

Certo é que tal acrescentamento, conquanto haja sido suprimido não significa, porém, que outra solução deva ser adoptada, mas tão só que o legislador considerou a afirmação desnecessária, por resultar já do preceito, bem como por constituir orientação pacífica, quer da doutrina, quer da jurisprudência.

Com efeito, partindo dos ensinamentos e pontos de vista expressos por Eduardo Correia[9], quer a demais doutrina quer a jurisprudência, vinham desde há muito entendendo que, quando tratando-se de bens jurídicos eminentemente pessoais, são ofendidos vários indivíduos, a possibilidade da continuação fica logo excluída porque são diversos os bens jurídicos violados, e correspondentemente, numa adequada interpretação das normas, porque são preenchidos vários tipos legais[10].

Sucede que a Lei n.º 59/07, de 4 de Setembro, veio aditar ao artigo 30º, do Código Penal, o actual n.º 3, vertendo no texto legal aquele entendimento.

Deste modo, à luz do que fica dito, certo é ser condição prévia da possibilidade de se pôr o problema da continuação criminosa relativamente aos factos ilícitos típicos que visam tutelar bens eminentemente pessoais, a ofensa de uma só pessoa.

No caso vertente, porém, certo é que os factos ilícitos típicos objecto do processo que os arguidos pretendem sejam qualificados como integrantes de um só crime na forma continuada – furtos qualificados e simples – não visam proteger bens pessoais.

Apreciando o concreto dos autos, primeira observação a fazer é a de que os factos não foram executados de forma homogénea. Com efeito, enquanto seis deles foram perpetrados pelos dois arguidos, em co-autoria, quatro foram cometidos pelo arguido AA agindo sozinho.

Por outro lado, foram praticados em locais distintos. Quatro em São Brás de Alportel, três em Vila Real de Santo António, dois em Tavira e um em Castro Marim.

Por outro lado, ainda, inexiste qualquer elemento factual através do qual se possa extrair a conclusão de que se verifica situação exterior que haja facilitado a conduta delituosa repetida dos arguidos, algo que os tenha incentivado ou aconselhado à repetição ou que os tenha convencido de que a sua actividade, à medida que iam praticando os factos, era menos censurável ou, sequer, menos arriscada. Tal como inexiste qualquer elemento factual que permita concluir que os diversos comportamentos delituosos sejam resultado da mesma resolução, tanto mais que parte dos factos, como já sublinhámos, foram perpetrados por ambos os arguidos, outra parte pelo arguido AA agindo sozinho.

Deste modo, bem andou o tribunal recorrido ao não qualificar os factos como integrantes de um crime continuado.

Incorrecta Qualificação da Participação do Arguido CC no Crime Tentado de Homicídio

Alega o arguido CC que a co-autoria requer, no aspecto subjectivo, que os intervenientes se vinculem entre si mediante uma resolução comum sobre o facto, assumindo cada um, dentro do plano conjunto, uma tarefa parcial, mas essencial, que os apresente como co-titulares da responsabilidade pela execução de todo o processo, requerendo no aspecto objectivo que a contribuição de cada co-autor alcance uma determinada importância funcional, de modo que a cooperação de cada um no papel que lhe corresponde constitua uma peça essencial na realização do plano conjunto (domínio funcional do acto), sendo que no caso vertente tal não se verifica, uma vez que os arguidos não pretendiam a morte do ofendido QQ e nada concertaram para o fazer parar após o mesmo ter obtido fotografias deles susceptíveis de os incriminar, para além de que da sua parte nem sequer hipoteticamente idealizou que poderia existir perigo para a vida daquele.

Estabelece o artigo 26º, do Código Penal: «É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução»[11].

Da hermenêutica deste preceito resulta que co-autor é o que executa o facto, toma parte directa na sua realização, por acordo ou juntamente com outro ou outros, ou determina outrem à prática do mesmo, suposta, obviamente, a ocorrência de execução ou início de execução. Certo é que o acordo tanto pode ser expresso como tácito, como pode ser firmado antes da realização do facto ou entre o seu início e o seu término (co-autoria sucessiva), sendo que à decisão conjunta basta a existência e a vontade de colaboração de duas ou mais pessoas na realização do tipo de crime[12]. Por outro lado, havendo cooperação na execução do crime não se torna necessária a existência de acordo, no entanto, na ausência de acordo é essencial que os comparticipantes tenham consciência de cooperarem na acção comum[13].

Como refere Jescheck, sintetizando as consequências da assunção da teoria do domínio do facto[14], será autor:

- Quem executa por si próprio todos os elementos do tipo;

- Quem executa o facto utilizando outro como instrumento;

- Quem realiza uma parte necessária da execução do plano global, ainda que não seja um acto típico em sentido estrito, desde que o acto protagonizado se integre na decisão comum.

Daqui que deva ser considerado co-autor aquele que realiza uma parte da execução do plano criminoso, ainda que com a sua conduta apenas contribua com um acto não típico em sentido literal, no entanto, essencial para a realização da decisão comum; na co-autoria cabe pois a actividade, mesmo parcelar, na realização do objectivo acordado – concerto criminoso –, ainda que não entre formalmente no arco da acção típica, desde que essencial à execução daquele objectivo[15].

Assim sendo, são de imputar a cada um dos co-autores, como próprios, os contributos do outro ou dos outros para o facto, como se todos os tivessem prestado[16].

Por outro lado, do ponto de vista subjectivo, como já se deixou exarado, à comparticipação como co-autor subjaz a existência de acordo, expresso ou tácito, para a realização do facto, ou, nos casos de cooperação, a consciência de cooperação na acção comum.

Da decisão proferida sobre a matéria de facto resulta, entre outro factualismo, que:

«51. No referido dia 30 de Agosto de 2010, cerca das 12 horas, os arguidos AA e CC e o veículo supra descrito foram avistados por QQ, nas imediações do Sítio do Malhão.

58. Por suspeitar que os mesmos poderiam ser os autores de um furto a residência cometido dias antes nas proximidades, o referido QQ decidiu seguir os mesmos por forma a obter mais elementos que permitissem conduzir à sua identificação.

59. Na sequência, QQ veio a localizar o veículo em que os arguidos se faziam transportar no Sítio de Quatro Estradas, imobilizado no caminho de acesso a uma residência pertencente a um amigo seu holandês.

60. Nesse local, QQ abordou ambos os arguidos questionando-os acerca do que ali faziam, ao que estes responderam que procuravam uma casa para alugar quando, anteriormente, haviam informado uma amiga daquele, que haviam abordado momentos antes na sua residência, que andavam a procurar trabalho.

61. Na sequência da conversação mantida QQ solicitou a identificação ao arguido CC que lha forneceu e extraiu fotografias do documento entregue e dos arguidos, tendo solicitado ao arguido CC para tirar os óculos ao que o mesmo anuiu.

62. Logo após o referido QQ ter extraído fotografias à matrícula do veículo, o arguido CC saiu do interior do veículo, no qual ocupava o lugar do condutor e dirigiu-se na direcção de QQ.

63. Este, temendo pela sua segurança, iniciou a marcha do seu veículo ligeiro de passageiros, vermelho, marca "Fiat", modelo "Punto", com a matrícula "00-00-00", primeiro subindo o caminho em que se encontrava por forma a inverter a marcha, o que fez, logrando passar pelo veículo conduzido pelo arguido CC.

65. E tomando a direcção de Tavira, percorrendo a E.N. 270, na localidade de Santa Margarida.

66. Os arguidos, fazendo-se transportar no veículo automóvel de marca "Ford", modelo "Mondeo", supra identificado, seguiram no encalço de QQ.

67. O veículo era conduzido pelo arguido CC.

68. Ao circularem no entroncamento entre E.N. 270 e a Estrada Municipal que dá acesso ao Sítio do Barranco do Nora, o arguido AA disparou um tiro, com a pistola de marca "Tanfoglio Giuseppe", com o n° de série "D-38 747", calibre "6,35", a qual haviam subtraído anteriormente ao seu proprietário, em direcção do veículo onde seguia o ofendido.

69. Logo após, no percurso encetado entre a localidade de Santa Margarida e a rotunda de acesso à zona industrial de Tavira, o arguido AA disparou, com a referida arma de fogo, um segundo tiro em direcção ao veículo conduzido por QQ, atingindo a parte traseira do mesmo, na bagageira, local em cujo interior veio a ser recuperado um projéctil.

70. Seguidamente, o arguido AA disparou novamente em direcção ao veículo onde seguia QQ, tendo atingido a respectiva roda traseira direita, onde se alojou o respectivo projéctil.

71. No entanto, como QQ se descolou para as imediações do Quartel da G.N.R., sito em Tavira, os arguidos, ao aperceberem-se desse facto, abandonaram o local dirigindo-se para a rotunda de acesso à A22, que percorreram em direcção a Espanha».

Mais resulta que:

«74. Para além disso, agindo do modo descrito, na execução do plano que haviam gizado entre si, na comunhão de esforços e intentos, os arguidos, de molde a tentar recuperar o telemóvel de QQ onde se encontravam fotografias dos arguidos, quiseram atingir o corpo de QQ com projécteis de arma de fogo e, assim, causar-lhe a morte, o que não lograram alcançar por motivos alheios à sua vontade, por QQ se ter dirigido em direcção ao Quartel da Guarda Nacional Republicana».

Como bem se consignou na decisão recorrida a propósito da qualificação jurídica destes factos, é evidente que ambos os arguidos neles colaboraram activamente, de forma voluntária e consciente, na medida em que o arguido CC, sendo o condutor do veículo em que seguiam em direcção ao veículo conduzido pelo ofendido QQ, poderia ter mudado de direcção ou ter imobilizado o veículo após a produção do primeiro disparo pelo arguido AA, no entanto, manteve a perseguição, na sequência da qual foram efectuados mais dois disparos, perseguição da qual só desistiu ao aperceber-se que QQ se deslocou para as imediações do quartel da G.N.R. em Tavira, o que significa ter o arguido CC participado naqueles factos como co-autor.

Improcede pois o recurso nesta parte.

Incorrecta Subsunção Jurídica de Alguns Factos

Sob a alegação de que procederam à restituição ou reparação integral dos bens e valores subtraídos objecto dos processos n.ºs 11/10.4GAVRS, 80/10. 0GCABF, 74/10.6GDFAR e 408/10.3GBTVR, entendem os arguidos que os factos que ali lhes são imputados deviam ter sido censurados com pena especialmente atenuada, atento o disposto no artigo 206º, do Código Penal.

Examinando a decisão proferida sobre a matéria de facto verificamos que a propósito das restituições e reparações efectuadas pelos arguidos consta o seguinte:

«6. O arguido procedeu, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de quatrocentos e cinquenta euros montante destinado a ser entregue ao queixoso.

…     18. O arguido procedeu no dia 30 de Novembro de 2011 ao depósito da quantia de seiscentos euros montante destinado a ser entregue ao queixoso.


        26. Os arguidos procederam, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de cinquenta e dois euros montante destinado a ser entregue à queixosa.
                      …

          45. Os arguidos procederam, no dia 30 de Novembro de 2011, ao depósito da quantia de cem euros montante destinado a ser entregue aos queixosos».

Ao contrário do que vem alegado, não se pode afirmar que os depósitos efectuados correspondem a restituições ou reparações integrais, sem dano ilegítimo de terceiro.

Por essa razão o tribunal recorrido, fundamentadamente, baseando-se na gravidade dos factos e na reiteração, entendeu não fazer uso da possibilidade prevista no n.º 3 do artigo 206º do Código Penal[17], sem embargo de, na determinação da medida das penas, serem tomadas em consideração as restituições e reparações verificadas.

Sucede, porém, que em caso algum o tribunal poderia ter lançado mão do disposto no artigo 206º, do Código Penal, mais concretamente do que preceitua o seu n.º 2, conforme pretendem os arguidos[18]. Com efeito, do exame dos autos verifica-se que a audiência de julgamento teve início em 16 de Setembro de 2011, com continuação noutras datas, sendo o acórdão recorrido prolatado em 30 de Novembro de 2011, data esta em que, segundo consta da decisão proferida sobre a matéria de facto, se processaram as restituições e reparações efectuadas, ou seja, muito depois do prazo previsto na lei como condição da atenuação especial da pena.

Medida das Penas

Alegam os arguidos que as penas que lhes foram impostas se mostram desajustadas por não haver sido considerada a sua imputabilidade diminuída, circunstância que justifica o uso do instituto da atenuação especial da pena, atenuação especial que também se impõe por aplicação do regime penal especial para jovens previsto no DL 401/82, de 23 de Setembro, penas que, em todo o caso, não se mostram consonantes com os fins que visam prosseguir nem com a limitação resultante da culpa.

O instituto da atenuação especial da pena, como o próprio denominativo sugere, tem em vista casos especiais expressamente previstos na lei, bem como, em geral, situações em que ocorrem circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores ao crime que diminuem de forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade de pena – artigo 72º, n.º1, do Código Penal[19].

Pressuposto material da atenuação especial da pena é, pois, a ocorrência de acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção, sendo certo que tal só se deve ter por verificado quando a imagem global do facto, resultante das circunstâncias atenuantes, se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo[20].

Por isso, como defende aquele insigne penalista, a atenuação especial da pena só em casos extraordinários ou excepcionais pode ter lugar.

Relativamente ao regime penal especial para jovens previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, certo é que a possibilidade de atenuação especial da pena de prisão, como estabelece o seu artigo 4º, só deve concretizar-se quando o tribunal tiver razões sérias para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo que a adequada reinserção social do jovem condenado, ou seja, a sua correcta reintegração na sociedade, depende de considerações de natureza preventiva especial, cuja avaliação deve ter presente, em particular, a gravidade do facto ou factos perpetrados e as suas consequências, o tipo e a intensidade do dolo, os fins que subjazem ao ilícito, o comportamento anterior e posterior e a personalidade do condenado à luz dos factos, isto é, neles manifestada e reflectida, para além das condições de vida daquele.
Como se consignou no acórdão deste Supremo Tribunal de 07.10.17, proferido no Recurso n.º 3495/07, a avaliação das vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção do jovem delinquente tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida do arguido, e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade[21].
 Se a partir da avaliação feita for de formular um prognóstico favorável à ressocialização do condenado será, em princípio, de considerar positiva a aplicação do regime previsto no artigo 4º, do DL n.º 401/82, sendo pois de atenuar especialmente a pena; caso contrário, isto é, caso não seja possível formular aquele juízo positivo ou o juízo de prognose for desfavorável, obviamente que se terá de excluir a aplicação daquele regime[22].
Em matéria de imputabilidade dos arguidos vem provado:
«À data da prática dos factos o arguido AA não apresentava quadro psicopatológico compatível com um diagnóstico do eixo 1, nomeadamente psicose esquizofrénica ou outras psicoses crónicas.
Em Março e Abril de 2010 consumia substâncias psicoactivas.

Mesmo que estivesse sob forte influência de substâncias psicoactivas e condicionado por elas em relação à determinação e consciência da ilicitude dos actos que estava a cometer, o arguido não é inimputável.

Esta situação, no limite e em relação a alguns dos crimes que o arguido cometeu pode configurar uma situação de imputabilidade diminuída.

As estratégias e competências do arguido AA são escassas e imaturas.

O arguido AA refere que o seu desejo é ser ajudado a ter uma vida normal.

À data da prática dos factos o arguido CC possuía hábitos de abuso / dependência de estupefacientes e álcool, com períodos de abstinência.

Em 2009, o arguido CC esteve internado num Serviço de Psiquiatria de Huelva por Psicose Induzida por Drogas.

O abuso / dependência / abstinência de drogas, fez sobressair os traços anti-sociais e limite da sua personalidade, predispondo-o à delinquência, por défice de controlo da vontade, mesmo sabendo a sua ilicitude.

Os actos praticados pelo arguido visaram manter os hábitos toxicofílicos e ultrapassar as carências materiais da sua família.

O arguido sofria (à data da prática dos factos) e sofre de Perturbação da Personalidade, com traços anti-sociais e limite (instabilidade emocional e impulsividade), e sofria de abuso/dependência/abstinência de estupefacientes.

Estas anomalias psíquicas, em geral e neste caso concreto, não são determinantes de perturbação da consciência da ilicitude e da capacidade de autodeterminação em conformidade com os valores jurídico - criminais.

O arguido CC podia avaliar a ilicitude dos factos a que se reporta a acusação, apesar do défice relativo de controlo da vontade / impulsividade, consequentemente, não deve ser considerado inimputável.

As referidas anomalias psíquicas são determinantes de imputabilidade diminuída.

O arguido CC revela capacidade para ser influenciado pela pena aplicada ao caso concreto»

Certo é que o instituto da atenuação especial da pena só é susceptível de aplicação aos arguidos com base na sua imputabilidade diminuída caso se conclua que, à data dos factos, por via daquela circunstância, as suas capacidades cognitivas e/ou volitivas se encontravam de tal modo afectadas que se deva considerar que agiram com culpa acentuadamente diminuída, posto que a diminuição da imputabilidade não interfere directamente com a ilicitude do facto nem como a necessidade de pena.

Do factualismo apurado decorre que na base da imputabilidade diminuída do arguido AA se encontra o consumo de substâncias psicoactivas, consumo que, no limite, poderá ter influenciado o seu comportamento relativamente a alguns dos factos delituosos, sem que, contudo, haja afectado a sua consciência e a sua capacidade de determinação. No que diz respeito ao arguido CC, pese embora padecesse à data dos factos de perturbação da personalidade, com traços anti-sociais, instabilidade emocional e impulsividade, características estas agravadas pelo consumo de estupefacientes e de álcool, certo é que aquela anomia não afectou a sua consciência nem a sua capacidade de auto-determinação.

Nesta conformidade entendemos não se verificar situação em que a culpa se mostre acentuadamente diminuída.

Por outro lado, pese embora a idade dos arguidos à data dos factos, a gravidade destes, com destaque para o crime tentado de homicídio, impondo firme reprovação e censura, não se coaduna com uma punição especialmente atenuada, punição incompatível com as exigências de prevenção geral, razão pela qual não merece reparo o acórdão recorrido ao não aplicar o instituto da atenuação especial, quer por via do afastamento do regime penal especial para jovens quer por via da não atribuição de relevo bastante à imputabilidade diminuída dos arguidos.

                                         *

Passando à sindicação das penas singulares impostas, dir-se-á que culpa e prevenção constituem o binómio que o julgador terá de utilizar na determinação da medida da pena, a qual visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – artigos 71º, n.º 1 e 40º, n.º 1, do Código Penal.

A culpa como expressão da responsabilidade individual do agente pelo facto e como realidade da consciência social e moral, fundada na existência de liberdade de decisão do ser humano e na vinculação da pessoa aos valores juridicamente protegidos (dever de observância da norma jurídica), é o fundamento ético da pena e, como tal, seu limite inultrapassável – artigo 40º, n.º 2, do Código Penal[23].                                                                                                                                                                                                                                                            

Dentro deste limite a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial, pelo que dentro da moldura de prevenção geral de integração, a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.

É este o critério da lei fundamental – artigo 18º, n.º 2 – e foi assumido pelo legislador penal de 1995[24], ao eleger como finalidades da punição a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, e ao impor como limite da pena a culpa.

O arguido AA pela co-autoria de um crime tentado de homicídio foi condenado na pena de 5 anos de prisão. Por cada um dos nove crimes de furto qualificado que cometeu, dois na forma tentada, foi condenado nas penas de 2 anos e 3 meses de prisão, 2 anos 8 meses de prisão, 2 anos e 3 meses de prisão, 3 anos de prisão, 1 ano de prisão, 1 ano de prisão, 3 anos e 9 meses de prisão, 3 anos de prisão e 2 anos e 6 meses de prisão. Pela prática de um crime de furto simples e de um crime de detenção ilegal de arma foi condenado nas penas de 6 meses de prisão e 1 ano e 2 meses de prisão.

O arguido CC pela co-autoria de um crime tentado de homicídio foi condenado na pena de 5 anos de prisão. Por cada um dos cinco crimes de furto qualificado que cometeu, dois na forma tentada, foi condenado nas penas de 3 anos de prisão, 1 ano de prisão, 1 ano de prisão, 3 anos de prisão e 2 anos e 6 meses de prisão. Pela prática de um crime de furto simples e de um crime de detenção ilegal de arma foi condenado nas penas de 6 meses de prisão e 1 ano e 2 meses de prisão.
Ao crime de homicídio tentado, por força da agravação estabelecida no artigo 86º, n.º 3, da Lei das Armas, cabe a pena de 2 anos, 1 mês e 18 dias a 14 anos, 2 meses e 20 dias de prisão.
Aos crimes de furto qualificado corresponde a pena de 2 a 8 anos de prisão.
Ao crime de furto simples cabe a pena de 1 mês a 3 anos de prisão.
Ao crime de detenção ilegal de arma corresponde a pena de 1 a 5 anos de prisão[25].
O doseamento das penas em patamares bem distantes dos limites máximos das molduras aplicáveis, no caso dos furtos e do crime de detenção ilegal de arma em patamares situados muito próximo dos respectivos limites mínimos, contraria frontalmente a alegação dos arguidos AA e CC segundo a qual a medida das penas excede a medida da culpa e não se mostra consentânea com as finalidades da punição. Ao invés, as penas singulares impostas mostram-se correctamente determinadas não merecendo reparo algum, incluindo a pena aplicada ao crime tentado de homicídio, crime este que os arguidos perpetraram por o ofendido os ter fotografado e os poder vir a denunciar às autoridades policiais.
Cumpre, finalmente, sindicar as penas conjuntas impostas.

De acordo com o artigo 77º, n.º 2, do Código Penal, a pena conjunta, através da qual se pune o concurso de crimes, tem a sua moldura abstracta definida entre a pena mais elevada das penas parcelares e a soma de todas as penas em concurso, não podendo ultrapassar 25 anos, o que equivale por dizer que no caso vertente a respectiva moldura varia entre o mínimo de 5 anos e o máximo de 25 anos de prisão relativamente ao arguido AA e o mínimo de 5 anos e o máximo de 17 anos e 2 meses de prisão no que respeita ao arguido CC.

Por outro lado, segundo preceitua o n.º 1 daquele artigo, na medida da pena são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas.

Primeira observação a fazer face ao regime legal da punição do concurso de crimes é a de que o nosso legislador penal não adoptou o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem o sistema da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e os singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), tendo mantido todas as opções possíveis em aberto, desde a absorção – aplicação da pena mais grave – ao cúmulo material, passando pela exasperação.

Segunda observação a fazer é a de que a lei elegeu como elementos determinadores da pena conjunta os factos e a personalidade do agente, elementos que devem ser considerados em conjunto.

Perscrutando o sentido da lei no que tange à determinação concreta da pena conjunta, começar-se-á por consignar que o autor do Projecto do Código Penal, no seio da respectiva Comissão Revisora, de forma algo ambígua, referiu que, em princípio, o sistema mais adequado para a punição do concurso é o da acumulação, desde que através dele se não ultrapasse o limite legal da espécie da pena considerada[26].

Mais esclareceu que a razão pela qual se manda atender na determinação concreta da pena unitária, em conjunto, aos factos e à personalidade do delinquente, é de todos conhecida e reside em que o elemento aglutinador da pena aplicável aos vários crimes é, justamente, a personalidade do delinquente, a qual tem, por força das coisas, carácter unitário.

A este esclarecimento opôs o Conselheiro Osório que o sentido do texto legal não estava de todo claro, uma vez que a personalidade do agente entra já na graduação das penas parcelares, pelo que se a ideia era a de atribuir supremacia ao critério da personalidade sobre os demais critérios legais de determinação da medida das penas, ele não se justifica, sendo que se justificará, porém, a entender-se que serve apenas para graduar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso.

Explicitou o Professor Eduardo Correia que: «Quanto ao § 1º ele procura, na medida em que é possível e conveniente, trazer a ideia da chamada “pena unitária” para dentro do sistema da acumulação».

Certo é que, tendo sido proposto pelo Conselheiro Osório se acrescentasse ao § 1º a expressão: «de harmonia com os critérios estabelecidos pelo artigo 86º», tal proposta foi rejeitada por maioria[27].

Debruçando-se sobre esta problemática diz-nos Figueiredo Dias[28] que a pena conjunta deve ser encontrada em função do critério geral consignado no artigo 71º e do critério especial previsto no artigo 77º, n.º1, ambos do Código Penal, «como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique», relevando, na avaliação da personalidade do agente «sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade», sem esquecer o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente, sendo que só no caso de tendência criminosa se deverá atribuir à pluriocasionalidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura da pena conjunta.

Adverte no entanto que, em princípio, os factores de medida das penas singulares não podem voltar a ser considerados na medida da pena conjunta (dupla valoração), muito embora, “aquilo que à primeira vista possa parecer o mesmo factor concreto, verdadeiramente não o será consoante seja referido a um dos factos singulares ou ao conjunto deles: nesta medida não haverá razão para invocar a proibição de dupla valoração”.

Para Cavaleiro de Ferreira[29] e Germano Marques da Silva[30], a operação de determinação da medida concreta de cada pena e a operação de fixação da pena conjunta assumem a mesma base, critério geral do artigo 71º, do Código Penal – a consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente seria um modo sincopado de exprimir aquilo que já resulta da disposição em matéria de determinação da medida da pena.

Por sua vez, Maia Gonçalves[31] e Rodrigues Maximiano[32]defendem que se trata de duas operações distintas, a determinação da medida da pena correspondente a cada crime e a determinação da medida da pena conjunta; a primeira operação rege-se pelas regras gerais dos artigos 71º e seguintes, a segunda, tendo por limites os estabelecidos no artigo 77º, faz-se pelo critério ali referido no n.º 1 in fine: a consideração, em conjunto, dos factos e da personalidade do agente.

Quanto a Lobo Moutinho[33] o espírito último da formação da pena conjunta e, com ela, do concurso de crimes é o de não deixar influir negativamente na determinação das consequências dos crimes perpetrados pelo arguido o facto (que, num Estado de direito, por força do nemo tenetur se detegere, nunca lhe será sequer imputável) de não ter sido atempada e separadamente punido por cada crime cometido. A formação da pena conjunta é, assim, como que a tentativa de, na medida do possível, não deixar alterar (se se quiser, de repor) a situação que teria existido se tivesse havido um conhecimento, condenação e punição dos crimes à medida que o agente os foi cometendo. É como que um “conhecimento superveniente” do ou dos crimes perpetrados antes do último crime.

Assim, na fixação da pena conjunta não se deve atender às circunstâncias concretas dos vários crimes (que já foram exaustivamente ponderadas) e, bem assim, em si e por si, ao número, espécie e gravidade dos factos criminosos (por intermédio das penas aplicadas).

A fixação da pena conjunta há-de depender de momentos diferentes daqueles que estão na base da determinação das penas aplicadas a cada crime.

O eixo da problemática da fixação da pena conjunta reside na procura de coordenação ou conjugação entre os vários crimes e penas respectivas, sendo esse o sentido da disposição (que, aliás, hoje em dia, descreve todo o processo de fixação da pena a aplicar ao concurso, a começar pela aplicação concreta das penas a cada crime concorrente) que estabelece que devem ser ponderados em conjunto (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente – artigo 77º, n.º 1, in fine do Código Penal.

Assim, deve procurar-se manter a proporção entre a pena singular de cada crime e a soma de todas as penas. Tendencialmente, quanto maior for a diferença entre a pena singular de cada crime e a soma das penas, mais a medida da pena conjunta se deve afastar do cúmulo (material).

Por outro lado, deve-se ter em atenção um juízo de proporção entre os crimes do concurso e as penas que lhe são aplicáveis (máximo das respectivas molduras), de modo a que a pena conjunta, em princípio, não ultrapasse o limite máximo mais elevado dos tipos de pena aplicáveis aos crimes em concurso; sendo de operar cúmulo material sempre que a soma das penas se mantiver dentro do limite máximo menos elevado dos tipos de pena aplicáveis aos crimes em concurso.

Para Pinto de Albuquerque[34]: «O sistema penal português consagra um regime de pena conjunta (Gesamtstrafe), referida a cada crime imputado ao agente, e rejeita um regime de pena unitária, referida à imagem global dos crimes imputados e da personalidade do agente. Com efeito, apesar do artigo 77º, n.º 1 se referir a uma “pena única” e à consideração “em conjunto” dos factos e da personalidade do agente, logo no n.º 2 supõe a distinção das penas concretas dos crimes em concurso. A moldura do concurso de crimes é construída, não de acordo com o princípio da absorção puto (punição do concurso com a pena concreta do crime mais grave), nem com o princípio da exasperação ou agravação (punição do concurso com a moldura do crime mais grave, devendo a pena concreta ser agravada em virtude do concurso de crimes), mas antes com o princípio da acumulação, de acordo com o qual se procede à punição do concurso com uma pena conjunta determinada no âmbito de uma moldura cujo limite máximo resulta da soma das penas concretas aplicadas a cada crime imputado, mas cuja medida concreta é decidida em função da imagem global dos crimes imputados e da personalidade do agente, procurando, nas palavras de Eduardo Correia, “na medida em que é possível e conveniente, trazer a ideia da chamada «pena unitária» para dentro do sistema da acumulação” (Actas CP/Eduardo Correia, 1965 a: 155). Trata-se, pois, de um sistema de cumulação, mas na forma de um cúmulo jurídico.

Em regra, a ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade é feita nos seguintes termos: tratando-se de uma personalidade mais gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave metade (ou, em casos excepcionais, dois terços) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso; tratando-se de uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito, o tribunal determina a pena conjunta somando à pena concreta mais grave um terço (ou, em casos excepcionais, um quarto) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso».

Tomando posição, começar-se-á por assinalar que o concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado, ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes.

Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente. Como doutamente diz Figueiredo Dias, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado.

Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos[35], tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso[36].

Analisando os factos verifica-se que, relativamente a ambos os arguidos, os crimes em concurso revelam alguma conexão, a qual decorre da circunstância de a quase todos eles, com excepção dos crimes tentado de homicídio e de detenção ilegal de arma, se encontrar subjacente a subtracção de bens.

Trata-se de factos de gravidade acima da média, reflectida na medida das penas aplicáveis, com destaque para o crime tentado de homicídio, cuja perpetração evidencia personalidades desprovidas de valores éticos.

Os ilícitos globais, pese embora o número de crimes em concurso – doze no caso do arguido AA e oito no caso do arguido CC –, atenta a ausência de antecedente criminais conhecidos, não podem, por ora, ser considerados como reveladores de propensão criminosa.

Tudo ponderado, com especial destaque para a moldura das penas singulares, a mais grave fixada em 5 anos de prisão, bem como para a personalidade de cada um dos arguidos, personalidade bem reflectida no crime tentado de homicídio, designadamente no respectivo móbil, nada há a censurar à decisão recorrida.

                                        

Termos em que se acorda negar provimento aos recursos.

Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça devida por cada um deles em 6 UC.

                                      

Dê-se conhecimento desta decisão à 1ª instância, tendo em vista o disposto no n.º 6 do artigo 215º do Código de Processo Penal.

                                       

Lisboa, 30 de Maio de 20121

Oliveira Mendes (Relator)
Maia Costa

_____________________


[1] - O texto que a seguir se transcreve corresponde integralmente ao do acórdão proferido.
[2] - É do seguinte teor o artigo 432º, do Código de Processo Penal:
«1. Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:
a) De decisões das relações proferidas em 1ª instância;
b) De decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400º;
c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal de júri ou pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito;
d) …
2. Nos casos da alínea c) do número anterior não é admissível recurso prévio para a relação, sem prejuízo do disposto no n.º 8 do artigo 414º».
[3] - O texto que a seguir se transcreve corresponde integralmente ao do acórdão recorrido.
[4]  - Que assim é dúvidas não há, como doutamente demonstra Eduardo Correia, ibidem, 121 e sgs. .  Segundo refere aquele saudoso Mestre, um só comportamento, uma só «expressão da vida», tanto pode preencher um só crime como vários crimes. Por outro lado, como refere também, nem sempre se pode fazer derivar a afirmação de que só um tipo de crime é aplicável a uma dada situação concreta, da circunstância de um só preceito, uma só norma ou artigo de lei lhe corresponder na parte especial dos códigos ou, de maneira geral, nas leis criminais. É que certas disposições legais descrevendo aparentemente um só tipo, descrevem efectivamente um número indeterminável de figuras de crime, na medida em que um dos seus elementos constitutivos tem de se considerar tomado pela lei concreta e individualmente. Este é seguramente o caso das disposições que visam proteger bens jurídicos eminentemente pessoais, como a vida, a honra, a integridade física, a liberdade, uma vez que se trata de bens jurídicos que se não podem desligar da personalidade, que apenas podem ser violados na pessoa que os cria com o só existir. Quando a lei pune de certa maneira aquele que voluntariamente mata outrem ou sujeita a cativeiro algum homem livre, tudo se deve passar e entender como se tais disposições dissessem: aquele que voluntariamente matar ou sujeitar a cativeiro A, B, C... . Com tais normas deve-se considerar visada a protecção da vida e da liberdade, não como valores comuns, mas como valores encarnados nas pessoa de A, B, C, etc. . Se tal especificação não é feita expressamente... isso deve-se tão só a razões de economia e viabilidade técnico-legislativa, que de nenhuma maneira podem impedir, mas até justamente exigir, que se faça a interpretação de que estes preceitos carecem.
Os tipos legais descritos em tais disposições desdobram-se, assim, em tantos outros quantos os possíveis indivíduos aos quais se estende a protecção da lei. Só uma apressada visão das coisas pode, pois, levar a dizer que quem matou A, B, C e D praticou um mesmo crime, porque só preenche com a sua actividade (mesmo que única) um tipo legal.
[5]  - Cf. Cavaleiro de Ferreira, Lições de Direito Penal, Parte Geral, I, 1992, 537/538, obra que, aliás, temos vindo a seguir de perto na abordagem de toda esta problemática.
[6]  - Cf. Cavaleiro de Ferreira, ibidem, 541/542.

[7] - Em sentido contrário, porém, sentido com o qual não concordamos, pronuncia-se Lobo Moutinho, Da unidade à pluralidade dos crimes no Direito Penal Português, 1224 e ss., ao defender que:
«Conclui-se, assim, que não é de admitir que, no actual Direito penal português, seja a ideia duma diminuição da culpa propriamente dita que norteia ou está na origem do crime continuado.

A ideia rectora da continuação criminosa é, pois, a seguinte: a prática do ou dos factos anteriores constitui, relativamente aos sucessivos, preparação ou facilitação subjectiva ou (para usar a terminologia legal relativa à cumplicidade) moral».

[8]  - Cf. B.M.J., 144, 58.
[9]  - Cf. ibidem, 256.

[10]  - Tenha-se em atenção a este propósito o que já se consignou em rodapé (nota 5).
[11] - Segundo a doutrina e a jurisprudência nacionais dominantes, a nosso lei substantiva penal, em matéria de autoria, perfilha a denominada teoria do domínio funcional do facto, doutrina que, porém, não corresponde ao domínio do acto ou ao domínio da realização do tipo legal. Como refere Figueiredo Dias a propósito do domínio do facto – Direito Penal – Sumários e Notas das Lições ao 1º ano do Curso Complementar de Ciências Jurídicas da Faculdade de Direito de 1975-1976 –, conquanto a co-autoria exija uma contribuição objectiva conjunta para a realização típica, é muito duvidoso, porém, relativamente a certas acções saber se elas fazem ou não parte da “execução” do facto (caso do condutor do automóvel onde se deslocam os assaltantes do banco).
Sendo exigível que o co-autor contribua objectivamente para a realização típica, não é exigível um domínio efectivo e pleno do facto, antes e tão só um domínio do processo que conduz à realização do tipo, ou seja, um “domínio funcional do facto” ou “domínio finalístico do acto”, que existirá quando o contributo do agente – segundo o plano conjunto – “põe, no estádio da execução, um pressuposto indispensável à realização do evento intentado”. 
Trata-se de posição com origem no finalismo (teoria do domínio do facto), inicialmente assumida por Bruns, Weber, Horn e Welzel, posteriormente defendida por Roxin (domínio finalístico do acto), conforme nos dá conta Figueiredo Dias, a que Eduardo Correia já se referia no seu Direito Criminal, II, 248, citando aquele insigne catedrático de Munique – Täterschaft u. Tatherrschaft (1993), e que é dominante actualmente na doutrina alemã.

[12] - Cf. os acórdãos deste Supremo Tribunal de 02.04.11 e de 02.10.24, proferidos nos Processo n.ºs 485/02 e 3211/02.

[13] - Cf. Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, II, 283.

[14] - Tratado de Derecho Penal – Parte General (4ª edição), 898 e ss.

[15] - Neste sentido os acórdãos deste Supremo Tribunal de 04.10.06 e 06.10.18 e 07.01.04, proferidos nos Recursos n.ºs 1875/04 e 2812/06 e 2675/06, respectivamente.
Assim se abrangem situações como a já referida do motorista que conduz os assaltantes ao banco e por eles espera, bem como a daquele que fica no exterior, vigiando o movimento circundante, aguardando que aquele que se introduziu em espaço fechado se apodere do que lá se encontra.

[16] - Como refere Wessels, Direito Penal, Parte Geral (1976), 121 e 129, o co-autor é co-titular da resolução comum para o facto e da realização comunitária do tipo, de forma que as contribuições individuais completam-se em um todo unitário e o resultado total deve ser imputado a todos os participantes. Neste preciso sentido, entre outros, os acórdãos deste Supremo Tribunal de 07.01.14 e 09.04.15, proferidos nos Processos n.ºs 2675/06 e 0583/09.
[17] - É do seguinte teor o n.º 3 do artigo 206º do Código Penal:
«Se a restituição ou a reparação forem parciais, a pena pode ser especialmente atenuada».
[18] - É do seguinte teor o n.º 2 do artigo 206º do Código Penal:
«Quando a coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for restituída, ou tiver lugar a reparação integral do prejuízo causado, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da audiência de julgamento em 1ª instância, a pena é especialmente atenuada».

[19] - É do seguinte teor o n.º 1 do artigo 72º do Código Penal:
«O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
[20] - Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 306/307.

[21] - Em sentido coincidente o acórdão deste Supremo Tribunal de 07.10.31, proferido no Recurso n.º 3484/07, segundo o qual a idade não é de per se uma séria razão para aplicar a atenuação especial integrante do regime especial para jovens, sendo apenas juridicamente relevante como pressuposto formal de aplicação desse regime, uma vez que, o mesmo regime, tem como pressuposto material, a existência de “sérias razões” que levem o julgador a concluir que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do condenado, as quais devem resultar de factos que tornem viável tal conclusão.

[22] - Regime que, de acordo com o próprio preâmbulo do DL 401/82, não deverá ser aplicado quando, em concreto, se mostre necessário defender a comunidade e prevenir a criminalidade.
Com efeito, ali se mostra consignado:
«As medidas propostas não afastam a aplicação – com última ratio – da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade, e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a dois anos»
Assim, razões atinentes às necessidades de reprovação e de prevenção do crime poderão precludir a aplicação daquele regime, designadamente quando a ele se opuserem considerações de prevenção geral sob a forma de exigência mínima e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico – cf. entre outros, os acórdãos deste Supremo Tribunal de 06.05.25 e de 07.07.11, proferidos nos Recursos n.ºs 1171/06 e 2047/07.
[23] - A pena da culpa, ou seja, a pena adequada à culpabilidade do agente, deve corresponder à sanção que o agente do crime merece, isto é, deve corresponder à gravidade do crime. Só assim se consegue a finalidade político-social de restabelecimento da paz jurídica perturbada pelo crime e o fortalecimento da consciência jurídica da comunidade – Cf. Claus Roxin, Culpabilidad Y Prevención En Derecho Penal (tradução de Muñoz Conde – 1981), 96/98.
[24] - Vide Figueiredo Dias, Temas Básicos da Doutrina Penal – 3º Tema – Fundamento Sentido e Finalidade da Pena Criminal (2001), 104/111. Na esteira desta doutrina, entre muitos outros, o acórdão deste Supremo Tribunal de 04.10.21, na CJ (STJ), XII, III, 192.
[25] - Relativamente à moldura penal deste crime e do crime de furto simples omitimos a pena de multa aplicável em alternativa, visto que no caso vertente é manifesta a desadequação da sua cominação, atenta a gravidade dos comportamentos protagonizados por ambos os arguidos.
[26] - Acta da 28ª Sessão realizada em 14 de Abril de 1964 – dever-se-á ter em conta que de acordo com a redacção do corpo do artigo 91º do Projecto a pena unitária tinha como limite superior a soma das que correspondem a cada crime, sem que, porém, pudesse ultrapassar o seu máximo legal.
Por sua vez, o seu § 1º era do seguinte teor: «Na determinação concreta da pena serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do delinquente» –, redacção esta que corresponde ipsis verbis à actual redacção da segunda parte do n.º 1 do artigo 77º, do Código Penal.
[27] - O texto do corpo do artigo 86º era o seguinte: «Na apreciação da medida da culpa do agente pelo facto e pela sua personalidade, o tribunal atenderá àquelas circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, militam a favor ou contra o delinquente e, nomeadamente: …».

[28] - Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 290/292.
[29] - Lições, II (1989), 161 – no mesmo sentido acórdão deste Supremo Tribunal de 97.03.05 BMJ, 465, 276.

[30] - Direito Penal Português, III, 168.

[31] - Código Penal Anotado, 268 – no mesmo sentido o acórdãos deste Supremo Tribunal de 99.03.17, BMJ, 485,121 e de 00.02.10 CJ (STJ), I, 206.

[32] - Cúmulo, 138.

[33] - Da unidade à pluralidade dos crimes no Direito Penal Português, 1346 e ss.
[34] - Comentário do Código Penal (2ª edição), 283.
[35] - Personalidade referenciada aos factos, ou seja, reflectida nos factos, visto que estes, como resultado do agir e actuar do delinquente, espelham a sua forma de pensar e o seu modo de ser, o seu temperamento, carácter e singularidade, isto é, a sua personalidade.

[36] - Consignado se deixa que afastamos a possibilidade da dupla ou múltipla valoração, tanto mais que, como já se deixou dito, aquando da discussão do Projecto do Código Penal, foi rejeitada proposta apresentada pelo Conselheiro Osório no sentido de aditar ao texto do § 1º do artigo 91º (actual artigo 77º), expressão conducente a permitir a utilização dos critérios gerais de determinação da medida das penas na determinação da pena conjunta.