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DOCUMENTO PARTICULAR
LETRA E ASSINATURA
AUTORIA CONTESTADA
ÓNUS DA PROVA
Sumário
I - Os documentos particulares não provam, por si sós, a genuidade da sua proveniência. II - A letra e assinatura, ou a assinatura, só se consideram como verdadeiras, se forem expressa ou tacitamente reconhecidas pela parte contra quem o documento é exibido ou se legal ou judicialmente forem havidos como tais. III - Havendo impugnação, é ao apresentante do documento que incumbe provar a autoria contestada.
Texto Integral
Apelação nº 8277/06.1YYPRT-A.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que o B…, S.A., move a C…, S.A., D… e E…, veio esta última executada deduzir oposição, alegando que, nem a assinatura, nem a expressão a dar aval constante da livrança que constitui título executivo, de onde resultaria a sua obrigação ao pagamento da quantia exequenda, foram por si efectuadas, e que não tem qualquer relação de pagamento com a exequente que justifique a existência da mesma livrança.
Conclui pela procedência da oposição e improcedência da execução contra si instaurada.
A exequente alegou que foi a executada/oponente que assinou a livrança apresentada como título executivo e a expressão a dar o aval constante daquele.
Conclui pela improcedência da oposição.
Seleccionada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, procedeu-se a julgamento e, a final, foi proferida sentença, na qual a oposição foi julgada procedente.
Inconformada, a exequente recorreu para esta Relação, formulando as seguintes conclusões:
1.Salvo o devido respeito, o Banco Apelante entende que a douta decisão proferida consubstancia uma errónea interpretação da factualidade controvertida, encontrando-se deficientemente fundamentada, não sendo perceptíveis os fundamentos que motivaram em concreto a formação da convicção do julgador, de tal forma que se torna inexplicável o motivo pelo qual a decisão do tribunal “a quo” foi aquela de que hoje se recorre, e não outra, facto que, salvo melhor opinião, não deverá deixar de ser considerado tremendamente atentatório dos princípios da certeza e segurança jurídica.
2.No âmbito dos presentes autos havia já sido proferida sentença, a fls. dos autos, que havia julgado a oposição à execução totalmente improcedente, sentença essa que assentava expressamente na prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente, no depoimento da testemunha F….
3.A fls. 102 dos autos, o tribunal considerou que a testemunha F… “relatou, de forma explicativa, conhecedora e coerente” os procedimentos relativos ao uso de livranças, acrescentando mesmo, a fls. 103 dos autos, que a testemunha em causa “Depôs de forma a convencer o tribunal, realçando ainda que chegou a contactar com a oponente nas instalações da firma subscritor da livrança sem que a mesma jamais invocasse a situação da alegada falsidade da sua assinatura aposta no verso da livrança”.
4.Posteriormente, veio este Tribunal da Relação, no seguimento de recurso apresentado pela ora apelada, entender que a realização de exame pericial à assinatura constante da letra dada à execução seria um elemento de prova imprescindível. Por tal facto, revogou a decisão recorrida, ordenando a realização do dito exame. Igualmente determinou a anulação do processado a partir de fls. 78, e consequentemente, a repetição da produção de prova em audiência de julgamento, o que se fez.
5.A testemunha F… declarou expressamente que teve conhecimento directo dos factos relacionados com o contrato de financiamento a que dívida exequenda se reporta, a partir de 10.07.2002 – cfr. gravação da prova produzida em audiência de julgamento, 08m51s, onde se pode ouvir que:
F…: “Eu passo a intervir, aqui a nível de contrato, passo a intervir aqui na carta de 10 de Julho de 2002”;
6.A testemunha F… declarou expressamente que a executada tinha conhecimento da sua condição de avalista do financiamento concedido – cfr. gravação da prova produzida em audiência de julgamento, 19m43s, onde se pode ouvir que:
Mandatária do Banco Apelante: “Dessas conversas que teve com a D. E…, tem a sensação, portanto...teve as conversas directamente com ela...
F…: “Sim..Sim...”
Mandatária do Banco Apelante: “Tem a sensação que ela conhecia perfeitamente os termos do financiamento, as obrigações que decorriam dele...?” [...]
F…: “...ela esteve presente nessa reunião”
Mandatária do Banco Apelante: “Portanto sabia...”
F…: “Sabia que existia um financiamento e sabia das obrigações que tinha para com o Banco.”
Mandatária do Banco Apelante: “Das próprias..pessoais obrigações que tinha para com o
Banco?”
F…: “Sim, claro!”
Mandatária do Banco Apelante: “Isso é claro?”
F… “Claro.”
7.A testemunha F… declarou expressamente que a Executada já em momento anterior tinha sido confrontada com a livrança, na presença da testemunha, sem que houvesse, em momento algum, levantado qualquer dúvida acerca da veracidade da assinatura nela aposta – cfr. gravação da prova produzida em audiência de julgamento, 28m17ss, onde se pode ouvir que:
F…: “Eu quando falo com eles, estou a exigir a dívida e estamos com...”
Mandatara da Apelada “Mas estava a falar com eles na empresa, não é?”
F…: “...Estamos com documentos à frente, e portanto da livrança também lá estava a fotocópia, que a gente leva sempre contrato e fotocópia, e portanto de certeza que na altura foi perceptível que ela era avalista.”.
8.Todos estes factos se revestem da maior relevância, não restando, perante as declarações da testemunha em causa, dúvidas de que a referida livrança foi, de facto, assinada pela apelada.
9.A testemunha F… esclareceu ainda todo o procedimento escrupulosamente seguido pelos funcionários do Banco Apelado a respeito da verificação das assinaturas constantes de contratos e livranças, e que consistia, nomeadamente, em análise comparativa, efectuada por dois funcionários, entre tais assinaturas e as constantes da base de dados do Banco Apelante – cfr. gravação da prova produzida em audiência de julgamento, 13m35s.
10.Inexplicavelmente, a prova produzida em audiência de julgamento foi totalmente desconsiderada pelo Tribunal a quo, facto que o Banco Apelante considera ser absolutamente incompreensível.
11.O Banco Apelado não contesta o direito que legitimamente assiste ao tribunal de apreciar livremente a prova produzida, de acordo com o disposto no artigo 655.º do C.P.C., mas não só contesta, como não pode aceitar, a manifesta desconsideração de que foi alvo a prova produzida em audiência de julgamento.
12.Tanto mais quando é sabido que a exacta mesma prova serviu já anteriormente para sustentar uma decisão proferida pelo mesmo Tribunal, a respeito dos mesmos factos, em sentido totalmente oposto.
13.A resposta dada à matéria de facto a fls. dos autos deixa transparecer a ideia de que o relatório pericial realizado por ordem deste Tribunal da Relação foi determinante para que não se lograsse provar, com certeza absoluta, a autoria da assinatura constante da livrança dada à execução.
14.Mas a realidade é que tal facto, por si só, é insuficiente para determinar com certeza se tal decisão corresponde à verdade material, tanto mais que o referido relatório pericial não logrou obter uma resposta conclusiva.
15.Tendo unicamente resultado de tal perícia, a fls. 304 e 305 dos autos, que é “provável” que tais expressões não sejam da autoria da Apelada, sendo certo que na escala de expressões de conclusão constante de fls. 306 dos autos, não é perceptível qualquer critério que permita com efectividade distinguir entre as conclusões que mediam entre a designada “provável” e a designada “provável não”.
16.De forma que, até por esse facto, deveria o Tribunal “a quo” ter ponderado especialmente a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento.
17.Motivo pelo qual deve a douta sentença recorrida ser revogada, e substituída por outra que, apreciando correctamente a prova produzida em audiência, nomeadamente atendendo à ambiguidade do relatório pericial de fls. 300 e seguintes dos autos, julgue provados os factos 1.º, 2.º e 3.º constantes da base instrutória de fls.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, ser a sentença recorrida proferida se revogada e substituída por outra que considere provados os 1.º, 2.º e 3.º factos constante da base instrutória e, em consequência, julgue totalmente improcedente a oposição à execução.
A apelada apresentou contra-alegações, concluindo pela confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
A sentença recorrida considerou assentes os seguintes factos:
1.Foi apresentada à execução de que estes autos constituem um apenso o documento junto a fls. 18 e 18 verso dos mesmos, denominado livrança, contendo, além do mais, os seguintes dizeres: importância – € 159.099,61; local e data de emissão: Porto 02-07-10; vencimento: 2005/08/17; valor: Caução; Assinaturas dos subscritores: contém um carimbo com firma C…, o administrador, sob a qual se mostra aposta uma assinatura; No verso, contém apostas duas assinaturas a seguir às expressões ‘Dou o meu aval à firma subscritora’, sendo a segunda dessas com os dizeres “E…” e sob a qual se mostram manuscritos os dizeres “Nº B.I: ……. de 17/6/96 de Lisboa” (vd. doc. fls. 18 e 18 verso dos autos de execução, cujo teor, no mais, se dá aqui por reproduzido. – (al. A) dos factos assentes).
2.Por escrito datado de 11 de Dezembro de 1995, denominado “Crédito em Conta Corrente com Caução Curto Prazo”, que se mostra junto a fls. 37 e 38, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “damos o nosso acordo” (cfr. doc. de fls. 37 e 38 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. B) dos factos assentes).
3.Por escrito datado de 10 de Dezembro de 1996, denominado “Crédito em Conta Corrente com Caução Curto Prazo”, que se mostra junto a fls. 39, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “Dou o meu acordo” (cfr. doc. de fls. 39 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. C) dos factos assentes).
4.Por escrito datado de 25 de Março de 1997, denominado “Crédito em Conta Corrente com Caução Curto Prazo”, que se mostra junto a fls. 40, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “Dou o meu acordo” (cfr. doc. de fls. 40 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. D) dos factos assentes).
5.Por escrito datado de 6 de Novembro de 1997, denominado “Crédito em Conta Corrente com Caução Curto Prazo”, que se mostra junto a fls. 41 e 42, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “Dou o meu acordo” (cfr. doc. de fls. 41 e 42 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. E) dos factos assentes).
6.Por escrito datado de 10 de Janeiro de 2000, denominado “Quarto Aditamento à carta-contrato celebrado em 11.12.1995”, que se mostra junto a fls. 43 e 44, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “Dou o meu acordo” (cfr. doc. De fls. 43 e 44 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. F) dos factos assentes).
7.Por escrito datado de 10 de Julho de 2002, denominado “Aditamento à carta-contrato da Facilidade de Crédito em Conta Empréstimo”, que se mostra junto a fls. 45 e 46, consta aposta a assinatura da aqui executada/oponente a seguir à expressão “Dou o meu acordo e aceito as modificações do financiamento aos termos e condições estabelecidas neste aditamento” (cfr. doc. de fls. 45 e 46 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. G) dos factos assentes).
8.Por carta registada com aviso de recepção que foi recebida pela aqui executada/oponente datada de 19/11/2004, cuja cópia consta de fls. 48 e 51 dos autos, a exequente comunicou àquela, além do mais, que:
«Sendo V.Ex.cia garante no financiamento concedido à empresa C…, S.A., sob a forma “Crédito em Conta Corrente com Caução Curto Prazo”, formalizado através de Contrato datado de 11 de Dezembro de 1995, no montante de Escudos 60.000.000$00, actualmente em euros 144.639,00, serve a presente para lhe comunicar a denúncia da referida facilidade de crédito para o fim do prazo em curso, ou seja, dia 2004/12/31» (cfr. doc. de fls. 48 e 51 dos autos, cujo teor, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido). – (al. H) dos factos assentes).
São apenas as questões suscitadas pelos recorrentes e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1, do C. P. C.
As questões a decidir são as seguintes: impugnação da decisão relativa à matéria de facto, no que concerne aos números 1, 2 e 3 da base instrutória; se o direito aplicável está conforme aos factos que se consideraram ou vierem a considerar provados.
I. Encontrando-se gravada a prova produzida em julgamento, nos termos do disposto nos artigos 522º-B e 522º-C, do C. P. Civil, pode alterar-se a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, se para tanto tiver sido observado o condicionalismo imposto pelo artigo 685º-B, como o permite o disposto no artigo 712º, nº 1, alínea a), ambos do mesmo diploma.
Igualmente, nos termos do citado artigo 712º, nº 1, alínea b), do C. P. Civil, a decisão do tribunal da 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas.
O registo dos depoimentos prestados em audiência de julgamento tem como objectivo facilitar a reparação de um eventual erro de julgamento. Esta tarefa – apreciação da prova – está cometida, em primeira linha e como regra geral, à primeira instância e em execução do princípio da imediação, que a reforma processual trazida pelo Decreto Lei nº 329-A/95, de 12/12, veio reforçar quanto à prova testemunhal.
Os casos em que, pela via do recurso, se há-de reapreciar a prova produzida em primeira instância, terão de ser, concretamente, evidenciados pelo recorrente, destacando-os dos demais, indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda, nos termos do nº 2, do citado artigo 522º-C (artigo 685º-B, nº 2, do C. P. Civil).
A apelante, mencionando os concretos meios probatórios, constantes do processo, da gravação ou da transcrição nele realizada que, em seu entender, impõem decisão diversa da recorrida, preenche, no essencial, estes requisitos legalmente impostos, para que se possa apreciar o alegado erro na apreciação da matéria de facto.
Os pontos da matéria de facto que a recorrente considera incorrectamente julgados são os seguintes: “A assinatura que consta no verso do documento referido em A), com os dizeres: E…, foi feita pelo punho da aqui oponente?”; “A expressão que consta no verso do documento aludido em A) “Dou o meu aval à firma subscritora”, sob a qual se mostra aposta a assinatura referida em 1), foi efectuada pelo punho da aqui oponente?”; “A expressão que consta do verso do documento referido em A) “Nº B.I. ……. de 17/6/96 de Lisboa”, aposta sob a assinatura aludida em 1, foi feita pelo punho da aqui oponente?”.
Com base no depoimento da testemunha F…, ex-funcionário da exequente/apelante, pretende esta que os referidos factos sejam considerados provados.
A apelante, porém, não tem razão na apreciação que faz de tal depoimento, bem como da prova pericial de exame à assinatura da executada/oponente e também às expressões apostas no verso da livrança.
Da audição da respectiva gravação digital e até das transcrições parciais efectuadas pela apelante, o que resulta é que a matéria de facto retrata com fidelidade e exactidão aquelas provas produzidas.
Apesar do que a testemunha F… disse em audiência de julgamento e se encontra descrito nas transcrições efectuadas pela apelante, o certo é que aquela não presenciou a aposição da assinatura e expressões constantes da livrança, cuja autoria foi impugnada pela executada.
Como se refere na motivação da decisão sobre a matéria de facto, (…) «incidindo o seu depoimento sobre os procedimentos habituais do Banco, no âmbito da celebração dos contratos e reconhecimento das assinaturas, tendo o mesmo referido que a norma era serem efectuados na presença de um funcionário do Banco, com ulterior intervenção de um funcionário administrativo para conferência das assinaturas (por comparação com documentos identificativos do subscritor e ficha que constava dos registos do Banco e não presencial), referenciando como marca identificativa da realização de tal conferência das assinaturas a assinatura/rubrica a lápis (que consta da livrança, designadamente, no seu verso); no entanto, a testemunha nunca sequer afirmou que, no caso, houve efectivamente alguém do Banco a presenciar a assinatura (antes referindo que essa era a norma e que “não acredita que ninguém tenha assistido à assinatura do aditamento de 2002 e da livrança”), pelo que, do seu depoimento apenas resultou efectivamente confirmado que um funcionário administrativo do Banco – que não presenciou a aposição das assinaturas na livrança, dado que essa função, de acordo com o depoimento da testemunha, caberia aos funcionários do Banco da área comercial – conferiu as assinaturas apostas na livrança, face aos documentos de que dispunha para comparação de assinaturas, considerando-as conformes com as assinaturas constantes dos documentos, sendo que esse juízo de conformidade ou conferência de um funcionário do banco de uma assinatura nessas circunstâncias (até porque não se sabe quais os concretos documentos, designadamente, contendo a assinatura da executada usados para conferência) não merece maior relevância que a prova pericial realizada».
De todo modo, foi realizado exame pericial à assinatura da executada e às expressões apostas no verso da livrança, no qual se chegou às seguintes conclusões (fls. 300 a 306): 1.Considera-se como provável a verificação da hipótese de a escrita da assinatura contestada de E…, aposta no documento identificado em C1, não ser do seu punho. 2.Considera-se como provável a verificação da hipótese de a escrita das expressões contestadas “Dou o meu aval à firma subscritora” e “Nº BI ……. de 17/6/96 de Lisboa”, atribuída a E…, aposta no documento identificado em C1, não ser do seu punho.
Como se diz na mesma motivação da decisão sobre a matéria de facto, o resultado do exame pericial (…) “aponta em sentido inverso ao dos factos quesitados, ao concluir ser provável que, quer a assinatura do nome da executada constante do verso da livrança dada à execução, quer as expressões que se encontram antes e depois dessa assinatura, não são da autoria da executada/oponente, relatório esse que se encontra bem fundamentado e sustentado e que foi elaborado por peritos na matéria, com conhecimentos técnicos específicos».
Aliás, no Acórdão desta Relação, proferido a fls. 203 e seguintes, já se tinha reconhecido que, nestes casos, era essencial a realização de exame de reconhecimento da letra e assinatura atribuída à oponente e inserta na livrança dada à execução, anulando uma anterior decisão proferida no processo. Aí se refere, além do mais, que «o Laboratório de Polícia Cientifica nos exames de letra, com a ajuda de lupa e microscópio compara escritas suspeitas com escritas identificadas, atendendo a características gerais como as formas de ligação, se a letra é mais angular ou curva, se é maior ou menor, e a pormenores identificativos, que se assimilam desde que se aprender a escrever com “letra de primária”, o que conduzirá a resultados mais fiáveis que seguramente os adoptados pelo Tribunal recorrido».
Por conseguinte, não se pode deixar de concordar que o teor do relatório pericial criou a falta de certeza necessária para o tribunal poder afirmar que foi a executada que, pelo seu punho, assinou o verso da livrança dada à execução e nela apôs as expressões referidas na base instrutória, considerando, designadamente, a falta de produção de outros meios de prova capazes de afastarem tal incerteza, o que motivou as respostas negativas dadas aos factos vertidos na base instrutória”.
Portanto, tendo em conta os documentos juntos aos autos e a prova pericial realizada, confrontando estes elementos com a matéria de facto não provada, conclui-se que esta retrata com fidelidade e exactidão aquelas provas produzidas em audiência de julgamento.
A apelante, no fundo, pretendia que esta Relação fizesse uma nova valoração dos meios de prova, de forma a concluir que os factos que discrimina foram julgados erradamente e que, por consequência, eles deveriam ser alterados. Tal valoração foi feita e, como se referiu, a decisão sobre a matéria de facto retrata com fidelidade e exactidão as provas produzidas em audiência de julgamento.
No caso concreto, tendo em atenção a prova documental e pericial, a convicção desta Relação é a de que as dúvidas levantadas pela apelante não tinham fundamento, considerando-se, por isso, correcta a forma como o tribunal a quo decidiu a matéria de facto questionada, ou seja, não dando como provados os factos incluídos nos números 1, 2 e 3 da base instrutória.
II. Não havendo fundamento para alterar as respostas que foram dadas aos números 1, 2 e 3 da base instrutória, também inexiste razão para alterar a decisão de direito: quer porque o objecto do recurso, visando, essencialmente, a alteração da decisão de direito, na medida em que fosse alterada a matéria não provada, essa alteração não procedeu; quer porque, em face dos factos provados, a decisão de direito é a adequada e não merece qualquer censura.
A executada/oponente alegou como fundamento da oposição que não foi efectuada pelo seu punho a assinatura E…, aposta na livrança dada à execução. Nem foi escrito pelo seu punho o texto “Dou o meu aval à firma subscritora”, nem “Nº BI ……. de 17/6/96 de Lisboa”.
Nos termos do nº 1 do artigo 374º do C.C., a letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras.
Porém, se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade – nº 2 do citado artigo 374º do C.C.
Os documentos particulares não provam, por si sós, a genuidade da sua proveniência. A letra e assinatura, ou a assinatura, só se consideram como verdadeiras, se forem expressa ou tacitamente reconhecidas pela parte contra quem o documento é exibido ou se legal ou judicialmente forem havidos como tais. Havendo impugnação, é ao apresentante do documento que incumbe provar a autoria contestada.
Era, deste modo, à exequente B…, S.A., que cabia fazer a prova de que a assinatura e as expressões em causa apostas na livrança foram efectuadas/manuscritas pela executada/oponente, conforme estabelece a regra do nº 1 do artigo 342º do C.C.
Como resulta das respostas aos números 1, 2 e 3 da base instrutória, a exequente/apelante não conseguiu provar tal matéria e, por conseguinte, só poderia proceder a impugnação da assinatura e das expressões em causa como fundamento da oposição.
Improcedem, assim, as conclusões das alegações e o recurso da exequente.
Decisão:
Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta secção cível em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Sumário: I. Se a parte contra quem um documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que o apresentar a prova da sua veracidade.
Porto, 12.3.2012
António Augusto de Carvalho
Anabela Figueiredo Luna de Carvalho
Rui António Correia Moura