REGISTO PREDIAL
PROVA DOCUMENTAL
CERTIDÃO
CERTIDÃO PERMANENTE
ÓNUS DA PROVA
DOCUMENTO AUTÊNTICO
PRINCÍPIO INQUISITÓRIO
DEVER DE COOPERAÇÃO PARA A DESCOBERTA DA VERDADE
EXPECTATIVA JURÍDICA
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
JUNÇÃO DE DOCUMENTO
BAIXA DO PROCESSO AO TRIBUNAL RECORRIDO
Sumário


I - O art. 368.º do CC dispõe que as reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos ou das coisas que representam se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão.

II - O DL n.º 116/2008, de 04-07 – aprovando medidas de simplificação, desmaterialização e desformalização de actos e processos na área do registo predial e actos notariais conexos –, criou condições para a promoção de actos de registo predial pela internet, bem como a existência de uma certidão permanente, disponível em sítio da internet.

III - Com a alteração introduzida pelo DL n.º 116/2008, o art. 110.º, n.º 1, do CRgP passou a dispor que o registo se prova por meio de certidões e que as mesmas podem ser disponibilizadas em suporte electrónico.

IV - Tendo o autor junto documento da Conservatória não autenticado – com vista à prova de factos que só por certidão poderiam ser provados – deveria o Tribunal ter determinado, nos termos do art. 265.º, n.º 3, do CPC, as diligências necessárias ao apuramento da verdade e justa composição do litígio, convidando a parte a apresentar a respectiva certidão.

V - Ao ter-se admitido o documento não autenticado, com fundamento no interesse do mesmo para a apreciação do mérito, sem que se tivesse convidado o autor a juntar a respectiva certidão, criou-se no mesmo a expectativa de que o mesmo documento seria, pelo menos, apreciado.

VI - Não tendo essa apreciação sido feita pelas instâncias – com o fundamento de que o registo só se prova por certidão – operou-se uma violação da confiança que as partes devem depositar no tribunal e uma nítida violação do art. 6.º da CEDH e do art. 20.º, n.º 4, da CRP.

Texto Integral



Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça:



A) Relatório:


Pela 13ª vara cível do Tribunal Judicial da comarca de Lisboa corre processo comum, na forma ordinária, em que é A o Condomínio do Prédio sito na Rua ............., n°.., ........., em Lisboa, representado por AA
, S.A., identificados nos autos, e R BB, U.C.R.L., também identificada nos autos, pedindo aquele que a R. seja condenada: a reparar e corrigir os defeitos detectados nas partes comuns do empreendimento "Q..........." enumerados. subsidiariamente, caso a R. não proceda voluntária e adequadamente à eliminação dos defeitos existentes nas partes comuns do imóvel, deverá pagar ao A. as quantias que este vier a despender com essa eliminação, a executar por terceiro.
Alega para tanto que a R. no seu exercício de construção e promoção imobiliária construiu, executando por si ou sob a sua responsabilidade, e vendeu,
as fracções que constituem actualmente o empreendimento da Q................,
que enferma de inúmeros defeitos, denunciados por carta de 19 de Maio de 2005.
A Ré não efectuou qualquer reparação, mantendo-se os vícios dos quais se destaca múltiplas fissurações na laje da cobertura da garagem, e nas fachadas laterais, bem como várias deficiências a nível da exaustão de ar e fumos.
Citada, a R. veio contestar, invocando que a administração do condomínio carece de legitimidade para a presente acção, mas também a caducidade do direito invocado pelo A, impugnando ainda o factualismo aduzido.
O A. veio responder.
Foi proferido despacho que convidou o A. a apresentar nova petição suprindo as deficiência apontadas.
O A. apresentou nova petição.
A R. reproduziu e completou a sua contestação.
No despacho saneador considerou-se que o A., condomínio do prédio urbano, representado pela administradora do mesmo, a qual se encontra devidamente autorizada pela assembleia de condóminos, era parte legítima para os presentes autos, e julgou procedente a excepção peremptória de caducidade, absolvendo a R. do pedido.
Inconformada veio o A. interpor recurso de apelação, sendo proferido acórdão desta Relação de 18.09.2007, que na procedência do recurso anulou a decisão recorrida, ordenando o prosseguimento dos autos.
Foi deferido o pedido de intervenção acessória provocada de CC, SA.
Citada, veio a Interveniente contestar, invocando a excepção da caducidade e impugnando o factualismo alegado.
Realizado julgamento foi proferida sentença que julgou improcedente a acção.
Inconformado, veio o A. interpor recurso, sendo proferido acórdão desta Relação de 29.10.2010, que anulando a sentença proferida, ordenou a ampliação da base instrutória.
Efectuada a ampliação, e realizado julgamento, foi proferida sentença, que julgou a acção improcedente, absolvendo a R. do pedido.
Novamente inconformado, veio o A. interpor recurso tendo o Tribunal da Relação tendo sido julgada improcedente a apelação e confirmada a sentença recorrida.

Desta decisão interpôs o A recurso para o STJ alegando, em conclusão, o seguinte:
A) O presente recurso vem interposto do douto acórdão, proferido no âmbito dos presentes autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 18.09.2012, que decidiu no sentido da confirmação da sentença sob recurso porquanto entende que a arguida nulidade da sentença não se verificava, concluindo pela insuficiência probatória de cópias não certificadas de descrições / inscrições prediais, na medida em que, a prova do registo de aquisição apenas pode ser efectuada através de certidão;
B) Ora, a informação sobre o conteúdo dos actos de registo é susceptível de exteriorizar-se de diferentes maneiras (em suporte físico (papel), seja em formato electrónico (ficheiro PDF), e a cópia não certificada de actos de registo constitui ela mesma um documento, sendo que o seu valor probatório, não pode ser outro que não o que no art. 368º do C. Civil prevê para as reproduções mecânicas: não sendo impugnada a sua exactidão, a cópia (em papel ou em formato electrónico) fará prova plena do original;
C) Nessa medida, a mera fotocópia cuja exactidão não foi impugnada pela parte contra quem é apresentada (artigo 368º do Código Civil), não impedia o juiz de aceitar tal meio de prova, o que se verificou - Admite-se o rol apresentado pela A., bem como os documentos por ela juntos, por os mesmos se poderem revestir de interesse para a decisão da causa - pois tal se insere no âmbito da livre apreciação, o que aliás se verificou nos autos.
D) Atento o disposto no artigo 368º, do Código Civil, face à ausência de impugnação dos documentos juntos pelo Recorrente e ao douto despacho que admitiu os mesmos documentos, nem a decisão da 1ª instância nem a do Tribunal da Relação que a confirma pode manter-se.
E) Na verdade, predominando no nosso sistema jurídico o princípio da livre apreciação das provas, tal permite ao juiz a libertação das regras severas da prova legal, o que significa, no caso presente e atendendo ao disposto no art. 368º., do C. Civil, que as simples reproduções das descrições e inscrições prediais fazem prova plena do seu conteúdo.
F) Ora, face à confissão vertida nos autos, corroborada pelos documentos juntos, seria de justiça dar como provado o aditado quesito 25º., também por aplicação do princípio da aquisição processual consagrado no artigo 515º do Código de Processo Civil que postula que "os materiais (afirmações e provas) aduzidos por uma das partes ficam adquiridos para o processo e são atendíveis mesmo que sejam favoráveis à parte contrária";
G) Pelo que, entende o Recorrente, existe suficiente fundamento para a revogação do acórdão recorrido, uma vez que se verifica violação manifesta, entre outras disposições, da norma contida no art. 368º., do Código Civil.
Em face do alegado e das presentes conclusões, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão objecto do mesmo e, em consequência, dando-se cumprimento ao Direito, e far-se-á a costumada JUSTIÇA

Contra-alegou CC SA, interveniente acessória, dizendo que deve ser negada a revista confirmando-se o acórdão recorrido.

Tudo visto,
Cumpre decidir:


B) Os Factos:

Pelas instâncias foram considerados provados os seguintes factos:


1 - A ré é uma cooperativa de 2o grau, denominada "BB, U.C.R.L.", constituindo uma União de Cooperativas [al. A. da matéria assente];
2 - O artigo 2o, n°1, dos Estatutos da ré tem a seguinte redacção:
"A União de Cooperativas desenvolverá a sua actividade principal no ramo da Habitação e Construção, podendo desenvolver outras actividades complementares de interesse para os Cooperadores das Cooperativas-Membros da União, de acordo com o objectivo definido no Artigo Quinto" [al. B. da matéria assente];
3 - O artigo 5o dos Estatutos da ré tem a seguinte redacção:
"Objecto social"
A União tem como objecto a promoção e execução de Empreendimentos Habitacionais, nomeadamente a compra, venda e hipoteca de terrenos, edifícios e fogos destinados aos membros das Cooperativas, a gestão, reparação, manutenção ou remodelação de fogos construídos, o espaço envolvente e todas as infra-estruturas e ainda a prestação de serviços, podendo também promover outras iniciativas de interesse para os Cooperadores nos domínios social, cultural, material e de qualidade de vida" [alínea C. da matéria assente];
4 - Encontra-se descrito na 5a Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n°00000000 - Freguesia de Benfica, o prédio urbano, sito na ........., em Benfica, composto de sete edifícios designados por A, B, C, D, E, F e G, constituído por cave ou piso menos um, destinado a parqueamento e arrecadações, piso zero, ou rés do chão, destinado a habitação e comércio, sete andares com lados direito, frente e esquerdo, destinados a habitação [alínea D) da matéria assente];
5 - Pela Ap. 22 de 2001/07/04, foi inscrito naquela Conservatória, provisório por dúvidas, o registo da propriedade horizontal sobre o prédio identificado em D) [necessariamente por lapso indicada na matéria assente como A)], o qual passou a ser composto pelas fracções A) a EZ), sendo "partes comuns do dito prédio, setenta e seis lugares de estacionamento sob a laje de cobertura da cave, o espaço sobrante do logradouro, zona de lazer para adultos e crianças, um espaço comercial no Edifício "E", que é a sala de condomínio" [alínea E) da matéria assente];
6 - Pela Ap. 3 de 2001/08/14, foi convertida em definitiva a inscrição identificada em E) [ai. F. da matéria assente];
7 - Em 05.01.2005 a ré enviou aos Condóminos do prédio identificado em D), a carta cuja cópia se encontra a fls. 89 da qual consta, além do mais, o seguinte:
"Assunto: Empreendimento "Q................" - Caldeiras Murais/Sistema de aquecimento de Aguas e Ambiente.
(...)
Como é do vosso conhecimento a NOVA IMAGEM U.C.R.L. entidade promotora do empreen­dimento denominado "Q................" 131 fogos, iniciou a entrega das habitações/escrituras em Setembro 2001, para habitação própria e permanente.
Tem esta União de cooperativas colaborado na resolução de pequenas anomalias, quer atra­vés da empresa construtora CC ou directamente com os seus meios.
Assim, temos sido confrontados com a utilização das caldeiras murais de aquecimento de águas e ambiente com as seguintes situações:
- Disparos/cortes sistemáticos do funcionamento normal da caldeira
- Selagem e quebra de fornecimento de gás, por segurança por parte dos técnicos da G.D.P.
Sempre que são requisitados pelos moradores, os técnicos daDD S.A. (S.......), imputam as culpas à construção e deficiências nas condutas de extracção que são do tipo "féria" homologadas pelo LNEC.
A NOVA IMAGEM solicitou uma vistoria dos técnicos da DD ao Empreendimento (cópia de carta - anexo 1), da qual resultou um relatório (cópia - anexo 2).
Devemos sublinhar que a legislação actual obriga a abertura para o exterior (entrada de ar), o que não se verificava na data da construção do empreendimento.
Um dos locais possíveis e de fácil execução para esta ventilação será na tampa da caixa de estores.
Também recomendamos a manutenção preventiva das caldeiras que deverá ser de iniciativa individual de cada condomínio junto de empresa credenciada para o efeito, (ex. s.......)" [alínea G) da matéria assente];
8 - Em 19 de Maio de 2005 a Administração do Condomínio autor enviou à ré, que a rece­beu, a carta que se encontra a fls. 46, da qual consta, além do mais, o seguinte:
"Assunto: Defeitos de Construção
Na qualidade de Administradora do Condomínio, em referência, por este meio, informar V. Exas quais os defeitos e/ou vícios de construção detectados, até à presente data, nas partes comuns do empreendimento em referência, ou que de qualquer forma possam afectar a segurança das mesmas, com vista à sua urgente reparação.
Para tal, juntamos, em anexo, uma lista de defeitos/vícios, da qual faz parte um quadro de identificação de patologias, devidamente individualizadas, com referência à sua localização e tipologia, e ainda a referência a algumas patologias recorrentes, ou seja, comuns e extensivas a diversos espaços/situações de acabamento, o que denota uma deficiente execução de obra ou pormenorização.
Como V. Exas poderão verificar, estes defeitos, detectados até à presente data, obrigam a uma intervenção e reparação urgentes.
Por óbvio, essa intervenção e consequente reparação, é da responsabilidade de Va. Exas, pelo que, aguardamos num prazo máximo de 15 dias que nos informem quais os procedimentos que irão adoptar para a regularização de todos os defeitos, indicando o prazo estimado para a sua concretização" [alínea H) da matéria assente];
9 - No dia 04.01.1999, entre a ré e a interveniente "CC S.A", foi realizado o acordo escrito cuja cópia se encontra de fls. 172 a 180, denominado "contrato para execução de empreitada de construção de 131 fogos na q................ - Lisboa" [alínea I) da matéria assente];
10 - A cláusula primeira do acordo referido em I), tem a seguinte redacção:
" (Objecto da Empreitada)
A CC, S.A., obriga-se à realização de todos os trabalhos em regime de Forfait, em quantidades, condições gerais e técnicas constantes do Projecto, e proposta final da empreitada de 131 fogos na q................ - Lisboa" [alínea J) da matéria assente];
11 - O n°1 da cláusula décima terceira do acordo referido em I), tem a seguinte redacção:
“ (Responsabilidade)
A SEGUNDA OUTORGANTE é responsável perante a PRIMEIRA OUTORGANTE, ou terceiros nos termos gerais de direito e designadamente por factos imputáveis ao comportamento dos seus empregados ou colaboradores, à deficiente execução dos trabalhos, ou à má qualidade dos materiais e utensílios utilizados" [ai. K. da matéria assente];
12 - Nas caldeiras murais das cozinhas de cada uma das fracções do prédio identificado em D), destinadas ao aquecimento de águas sanitárias e de água em circuito fechado para posterior aquecimento ambiente, foi utilizado o sistema de ventilação natural [alínea L) da matéria assente];
13 - Tais caldeiras são equipamentos de queima atmosférica de gás natural, sendo a captação do ar comburente feita directamente no local da instalação [alínea M) da matéria assente];
14 - (...) e a evacuação dos produtos de combustão feita através de uma conduta que se encontra ligada a uma chaminé colectiva de evacuação para o exterior [alínea N) da matéria assente];
15 - Na cozinha de cada uma das fracções foi instalado um equipamento de cocção com funcionamento a gás (fogão) [alínea O) da matéria assente];
16 - Após o envio da carta referida em H) e até à data da instauração da presente acção, o Condomínio autor não comunicou à ré a existência de quaisquer outros defeitos no prédio identificado em D) [alínea P) da matéria assente];
17- Em cerca de 30 fracções (cerca de 23% da totalidade), sobre o fogão, foi instalado um ventilador mecânico de exaustão de ar [resposta ao art° da base instrutória];
18 - A utilização conjunta dos sistemas de ventilação referidos no art° Io [da base instrutória] provoca uma sobrepressão na saída de ar da chaminé da conduta principal, que por sua vez provoca a inibição da evacuação natural dos gases da caldeira [resposta ao art° 3o da base instrutória];
19 - Não existem condutas separadas para a evacuação dos produtos de combustão das caldeiras murais e dos exautores [resposta ao art° 4o da base instrutória];
20 - O funcionamento simultâneo da caldeira, do exaustor ligado na velocidade máxima, de todos os bicos do fogão, com as portas e janelas da cozinha fechadas, provoca concentrações excessivas de monóxido de carbono nas cozinhas das fracções do prédio identificado em D) em que foram colocados exaustores [resposta conjunta aos art°s 5o, 15° e 16° da base instrutória];
21- Concentrações excessivas de monóxido de carbono podem causar a morte [resposta ao art° 6o da base instrutória];
22- O Condomínio do prédio identificado em D) apresentou reclamação junto da ré relativa ao sistema de ventilação das cozinhas das fracções daquele prédio, em data anterior a 25.11.2004 [resposta ao art° 7° da base instrutória];
23- Na sequência dessa reclamação a R. fez entradas de ar nas cozinhas das fracções cujos donos o pretenderam [resposta conjunta aos art°s 8o e 9o da base instrutória];
24 - As condutas verticais instaladas nas cozinhas das fracções permitem a saída de ar e fumos por termossifão, do tipo "féria-seric" [resposta ao art.10° da base instrutória];
25 - Nas cozinhas das fracções foram instalados armários basculantes "apanha-fumos", isolados com chapa inox [resposta ao art° 11oda base instrutória];
26 - E no topo de tais armários existem furos com cerca de 125 mm de diâmetro para saída de ar viciado ou fumos [resposta ao art° 12° da base instrutória];
27 - A colocação de exaustores não estava prevista no projecto de construção do prédio [resposta ao art° 13° da base instrutória];
28 - Tais equipamentos opcionais foram instalados em cerca de 30 fracções a pedido dos respectivos donos [resposta ao art° 14° da base instrutória];
29 - (...) do que a ré informou os donos das fracções onde os exaustores foram montados [resposta ao art° 17° da base instrutória; reportado ao que consta da resposta conjunta aos art°s 5°, 15° e 16° da base instrutória, supra ponto 20];
30 - As empenas laterais do prédio identificado em D) apresentam fissuração no revestimento exterior (reboco) [resposta ao art° 20° da base instrutória];
31- (...) essas fissuras existem em maior número na empena voltada a poente [resposta ao art° 21° da base instrutória];
32 - As juntas de dilatação existentes entre os edifícios na fachada voltada para a R. ..... apresentam aberturas normais ao longo de toda a altura dos edifícios [resposta ao art° 24° da base instrutória];
33 - A construção dos edifícios que constituem todo o empreendimento foi executada pela "CC, SA" [resposta ao art° 27° da base instrutória];
34 - Uma das formas de resolver a insuficiente insuflação de ar nas cozinhas e a concentração de monóxido de carbono, consiste em criar ramais separados para a evacuação dos produtos de combustão das caldeiras murais e dos exaustores [resposta ao art° 28° da base instrutória];
35 - Mesmo que tal operação fosse tecnicamente possível ela obrigaria a modificar todas as cozinhas do edifício [resposta ao art° 30° da base instrutória];
36 - O custo de tal operação ascenderia a valores superiores a centenas de milhares de euros [resposta ao art° 31° da base instrutória].


C) O Direito:


O thema decidendum no presente recurso está limitado à questão de saber se houve ou não violação do art.368º do Código Civil (CC) e se o Tribunal deveria ou não ter mandado juntar cópia certificada do documento registral junto por extracção mecanográfica do original.
O A apresentou a fls.584 um requerimento para prova do quesito 25º (quesito resultante da ampliação ordenada pelo Tribunal da Relação em acórdão anterior ao agora posto em crise. Tal quesito tinha o seguinte teor “os sócios das cooperativas que integram a R e que a esta adquiriram as fracções, nalguns casos procederam posteriormente à revenda a terceiros?”.
O Tribunal da Relação tinha visto interesse na ampliação da matéria de facto dada a construção jurídica operada em 1ª instância no sentido de não se verificar a existência de um contrato de compra e venda pelo qual se pudesse operar a subsunção à secção de venda de coisas defeituosas (arts.913º e segs. do CC) mas uma relação entre a cooperativa e os cooperadores a qual afastaria a aplicação dos normativos indicados.
O A requereu a junção aos autos de cópia não certificada emitida pela Conservatória do Registo Predial de Lisboa em 15 de Outubro de 2010 da descrição e inscrição em vigor das fracções P, V, BO, ED e EV do prédio descrito sob o nº 00000000 da freguesia de Benfica, prédio objecto dos presentes autos, todas elas já objecto de revenda pelos cooperadores a terceiros em data anterior à propositura da presente acção.
Sobre tal requerimento foi proferido o despacho de fls.622 com o seguinte teor “Admite-se o rol apresentado pela A, bem como os documentos por ela juntos, por os mesmos se poderem revestir de interesse para a decisão da causa”.
O Tribunal da 1ª instância deu como não provado o quesito 25 com fundamento (entre outros) de ser insuficiente a força probatória do documento junto uma vez que o art.110ºnº1 do Código do Registo Predial (CRP) dispor que o registo se prova por meio de certidões (sejam elas físicas ou em suporte electrónico). Este entendimento acabou por ser sufragado pelo acórdão da Relação agora sob recurso.
Invoca o recorrente \o art.368º do CC dizendo que quaisquer reproduções mecânicas de factos fazem prova plena desses factos.
Dispõe o art.368º do CC dispõe que as reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos ou das coisas que representam se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão.
Este artigo viu restringido o âmbito da sua aplicação, nos tempos de hoje, na medida em que se passou do império da escrita para o mundo do audiovisual e onde o virtual e o trabalho “online” é a regra.
Assim, houve necessidade de regulamentar a actividade probatória decorrente dos meios informáticos. O Decreto-Lei nº116/2008 de 4 de Julho, aprovando medidas de simplificação, desmaterialização e desformalização de actos e processos na área do registo predial e de actos notariais conexos, criou condições legais para a promoção de actos de registo predial pela “internet” bem como a existência de uma certidão permanente de registo predial disponível em sítio na “internet”, que configura o desenvolvimento da certidão “online”.
O art.368º do CC sempre teria de ser conjugado com o disposto no art.110º nº1 do CRP, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº6/2006 de 27 de Fevereiro, o qual preconizava que a prova do registo se podia fazer por meio de certidão e fotocópias
Com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei nº116/2008 citado, o art.110ºnº1 do CRP passou a rezar: “ o registo prova-se por meio de certidões”. Essas certidões, diz o nº3 do mesmo artigo, “podem ser disponibilizadas em suporte electrónico. A forma como estão definidas tais certidões encontra-se, hoje, consagrada no art.1º da Portaria nº1513/2008 de 23 de Dezembro
Daqui se retira que tratando-se de direito sujeito a registo predial a prova de qualquer documento registral faz-se de acordo com o art.110ºnº1 do CRP por certidão, podendo sê-lo por certidão permanente disponível online.
Não tendo o A apresentado certidão dos factos registrais que se propunha provar ( nos termos do disposto nos arts.110º a 112º do CRP e 1º e 2º da Portaria nº1513/2008), mas tendo junto documento da Conservatória não autenticado, sempre podia o Tribunal determinar, nos termos do art.265ºnº3 do Código do Processo Civil (CPC), oficiosamente, as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio ou, pelo menos, deveria ter convidado a parte a apresentar a respectiva certidão.
Não o tendo feito, e não tendo dado corpo ao princípio do inquisitório, sempre se impunha a observação do princípio da cooperação inserto no art.266º do CPC já que são linhas essenciais da reforma do processo civil operada em 1995-1996 a sujeição do processo a um princípio de cooperação entre as partes e o Tribunal, a acentuação da inquisitoriedade do Tribunal e a prevalência da decisão relativa ao mérito sobre a decisão formal. E, em obediência a tais princípios impunha-se que, tendo o A alegado a venda de fracções a terceiros e que, para prova de tal asserção tenha junto documento da Conservatória, o Tribunal o convidasse a apresentar a respectiva certidão.
O Tribunal da 1ª instância ao admitir a junção aos autos de cópia do documento da Conservatória respectiva, por algum interesse merecer o documento na apreciação do mérito, criou no A a expectativa de que o documento, pelo menos, seria apreciado. Não tendo essa apreciação sido feita pelas instâncias com fundamento de que o registo só se prova por certidão operou-se uma violação da confiança que as partes devem depositar no Tribunal e uma nítida violação do art.6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e 20ºnº4 da Constituição da República Portuguesa, na medida em que, nesta parte, não se procedeu a um julgamento equitativo.
A irregularidade da situação verificada influi, como influiu no exame ou decisão da causa.
Nos termos do art.722ºnº2 do CPC o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova, para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova. Está vedado ao STJ exercer qualquer censura à matéria de facto apurada pelas instâncias a não ser que tendo havido ofensa de uma disposição expressa de lei que fixa a força de determinado meio de prova sempre lhe cabe corrigir o vício de uma tal violação.
O Tribunal da Relação entendeu e bem que a prova do quesito 25 se faz por meio de certidão, dada a exigência de prova vinculada, nos termos do art.371ºnº1 do CC. Então sempre o Tribunal da Relação deveria ter diligenciado, junto do A, pela sua junção de forma a corroborar o documento já por este apresentado.
A não reapreciação da matéria de facto, relativamente ao quesito 25, após convite formulado ao A para apresentação de certidão, constitui mau uso dos poderes da Relação a que se refere o art.712º do CPC.
Assim, deve o processo voltar à 2ª instância para que se proceda ao convide do A a juntar aos autos certidão da Conservatória respectiva e, uma vez junta se decida de facto e de direito.


Nesta conformidade, por todo o exposto, acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça, em conceder revista, anulando a decisão proferida e determinando a volta do processo ao Tribunal da Relação para os fins expostos em sede de fundamentação.
Custas a final.

Lisboa, 30 de Maio de 2013

Orlando Afonso (Relator)
Távora Victor
Sérgio Poças