PERDÃO DE PENA
PRESCRIÇÃO DA PENA
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário

I - O perdão de pena é um ato que tem a ver com a carência de pena e só deve verdadeiramente ter por efeito impedir a verificação das consequências jurídicas do crime.
II - Assim, sob pena de contradição intrínseca, um perdão de pena não se pode constituir em gravame na contagem de um prazo prescricional da mesma pena.
III - Não pode levar-se à conta de suspensão do prazo prescricional o tempo, superior a três anos, que mediou entre a momento em que o tribunal ordenou a notificação do condenando nos termos e para os efeitos do art. 5.º da Lei 29/99, de 12/5 e a prolação de nova ordem de notificação, não na pessoa do defensor, mas do próprio condenado.

Texto Integral

Processo 959/86.9TBSTS-A.P1
Relator: Melo Lima

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

1. No Processo Comum 959/86.9TBSRS-A, a correr termos pelo 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso, foi proferida a seguinte decisão:
«Da prescrição
O arguido B… foi condenado nos presentes autos por acórdão proferido em 27.1.1988, além do mais, pela prática em Maio, Novembro e Dezembro de 1985 de um crime continuado de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo art.24° do Decreto n°13004, de 12.1.1927, na pena de 4 anos de prisão, tendo sido declarado perdoado 1 ano dessa pena de prisão, nos termos do artigo 13°, n° 1, alínea b), da Lei n° 16/86, de 11 de Junho.
Posteriormente, por decisão de 8.7.1991 (cfr. fis. 107), foi igualmente perdoado 1 ano da referida pena de prisão, nos termos do artigo 14°, n° 1, alínea b), da Lei n° 23/91, de 4 de Julho.
E, por decisão de 18.5.1994 (cfr. fis. 127), foi ainda perdoado 1 ano de prisão, nos termos do artigo 8°, n° 1, alínea d), da Lei n° 15/94, de 11 de Maio, ficando, por força de todos os perdões até aí concedidos, a referida pena reduzida a 1 ano de prisão.
Entretanto, em 4.3.1997, o arguido foi notificado do acórdão proferido nos autos que, assim e na ausência de recurso, transitou em julgado - cfr. fls.165.
Finalmente, pela decisão de 9.6.1999 (cfr. fls. 193), foi declarado perdoado mais um ano de prisão, nos termos do artigo 1°, n° 1, da Lei n° 29/99, de 12 de Maio, sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4° e 5°, do mencionado diploma e declarada extinta a totalidade da pena.
Operada a condição resolutiva nos termos do art.5° da Lei n° 29/99 foi por despacho de 24.11.2005, revogado o perdão concedido ao arguido pela decisão de fis. 193 e, em consequência, determinado o cumprimento da pena de 1 (um) prisão.
Deste despacho foi o arguido notificado em 4.4.2006 que, assim e na ausência de recurso, transitou em julgado - cfr. fls.331.
Decidindo.
O prazo de prescrição da pena em causa é de 10 anos, quer à luz do Código Penal de 1982 (art.121°, n°1, al.c), quer à luz do Código Penal de 1995, na sua redacção original ou actual, após 2007 (art.122°, n°1, al.c).
O prazo de prescrição começa a correr no dia em que transitar em julgado a decisão que aplicou a pena - cfr. art.121°, n°3, do CP’82 e 122°, n°2 do CP’95 e 2007.
A prescrição da pena suspende-se, durante o tempo em que por força da lei, a execução não possa começar ou continuar a ter lugar e volta a correr a partir do dia em que cessa a causa da suspensão — cfr. art.123°, n°1, al.a) e n°2, do CP’82 e 125°, n°1, al.a) e 2 do CP’95 e 2007.
No caso dos autos, o acórdão que condenou o arguido, no que para o caso interessa, em 4 anos de prisão, transitou em julgado em Março de 1997.
Acontece que em 9.6.1999 foi declarado perdoado o remanescente ano de prisão, nos termos do artigo 1o, no i, da Lei n° 29/99, de 12 de Maio, sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4° e 5°, do mencionado diploma e declarada extinta a totalidade da pena.
A partir de então deixou de ser possível executar a aludida pena de prisão, suspendendo-se, assim, o respectivo prazo de prescrição até ao trânsito em julgado do despacho de 24.11.2005 - de que o arguido foi notificado em 4.4.2006 - que revogou o perdão concedido ao arguido e, em consequência, determinou o cumprimento da pena de 1 ano prisão.
Assim e ressalvando-se o tempo de suspensão da prescrição da pena não decorreu ainda o prazo de prescrição da pena aplicada ao arguido nos presentes autos.
Por conseguinte, indefere-se o requerido.»
2. Inconformado, interpôs recurso desta decisão o arguido B… rematando a respectiva Motivação com as seguintes Conclusões:
2.1 Salvo o devido respeito por diferente opinião a responsabilidade criminal do Recorrente encontra-se extinta por prescrição face ao decurso do prazo prescricional fixado em relação à pena que lhe foi aplicada nos autos à margem melhor identificados.
2.2 De facto, em 27.01.1988 foi proferida sentença que condenou o Recorrente na pena de quatro anos e seis meses de prisão.
2.3 O prazo de prescrição de tal pena é de dez anos.
2.4 Até à presente data decorreram mais de vinte e quatro anos.
2.5 Porém não foi aquele o entendimento manifestado pelo douto despacho proferido pelo Tribunal a quo relativamente ao requerimento apresentado pelo Recorrente, no qual pedia que fosse declarada extinta a pena em causa com o aludido fundamento.
2.6 A meritíssima Juíza a quo considerou, em suma, que o prazo de prescrição da pena esteve suspenso entre 09.06.1999 e 04.04.2006.
2.7 O Recorrente não pode aceitar tal entendimento, pelas razões seguintes.
2.8 Por decisão de 9.6.1999 (cfr fls 193), foi declarado perdoado mais um ano de prisão, nos termos do artigo n° 1, da Lei n 29/99, de 12 de Maio, sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4º e do mesmo diploma e declarada extinta a totalidade da pena.
2.9 Ora, uma vez que o Recorrente não pagou qualquer indemnização, verificou-se a condição resolutiva, tendo sido revogado o perdão que lhe havia sido concedido, ao abrigo da identificada Lei de Amnistia.
2.10 Contudo entre a concessão do perdão, em 09.06.1999, e a revogação deste, em 24-11-2005, decorreu um exageradíssimo período de tempo, de mais de seis anos. por motivo não imputável ao Recorrente, cuja morada no estrangeiro era conhecida nos autos desde, pelo menos, o ano de 1996 (cfr. fls. 160 e 162).
2.11 Ora sob pena de violação de várias normas e princípios constitucionais, entre as quais avulta a do n°5 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa ‘Para defesa dos direito liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos” - nosso o sublinhado), o Recorreria não pode ser prejudicado pelo facto de o procedimento que conduziu à revogação do perdão ter demorado tão desproporcionado período de tempo por causa de burocracias várias e de tardias promoções (de que á paradigma a verificada a fls 229 dos autos).
2.12 O período de suspensão da contagem do tempo de prescrição da pena considerado pela meritíssima Juíza a quo (de mais de sete anos de duração’ de 09-06-1999 a 04-04-2006) é manifestamente desproporcionado relativamente aos noventa dias previstos na Lei n. 29/99 de 12-05, para satisfação da indemnização, o que, não tendo sucedido, deverão retroagir a 09-06-1999 (como sucede no âmbito do direito civil, em matéria análoga - artigo 276º do C. Civil.
2.13 Sendo a amnistia uma medida de clemência que se consubstancia na extinção da responsabilidade criminal, no caso sub judice a prevalecer o entendimento da meritíssima Juíza a quo, a Lei n° 29/99, de 12 de Maio teria produzido, na prática, o inverso da sua vocação, agravando a situação do Recorrente, obviando a que transcorresse o prazo de prescrição da pena.
2.14 O que agravaria o desrespeito pelo princípio da proporcionalidade consagrado na nossa Lei Fundamental (artigo 18°, n °s 2 e 3 da C. R P.) já que, a urna pena a que correspondia um prazo de prescrição de 10 anos, ao fim de mais de 24 anos, manter-se-ia o Recorrente sujeito à parte restante da mesma, por causa de uma medida (amnistia) que, perversamente acabaria por produzir o efeito contrário ao desejado pelo seu espírito.
2.15 E disso ninguém aproveitaria: nem a sociedade para quem é destituído de sentido o cumprimento de uma pena distanciada mais de 24 anos do ilícito criminal praticado, nem o arguido ora Recorrente - que se ressocializou por si próprio e é um cidadão exemplar, de extensa prol (seis filhos), trabalhador, respeitado e respeitador, pautando a sua conduta no país que o acolheu há já muitos anos pelas normas advindas da consciência axiológico-normativa da referida comunidade.
2.16 O despacho recorrido, além de outras violou as normas do n° 3 do artigo126º do C.Penal; do artigo 5.° da Lei n 29/99, de 10-05; do n 9 do artigo 113º do C. P. Penal; do nº 5 do artigo 20º da Constituição e o princípio da proporcionalidade, aflorado, além do mais nos nºs 2 e 3 da nossa Lei Fundamental.
2.17 TERMOS EM QUE, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, POR VIA DISSO, SUBSTITUÍDO O DESPACHO RECORRIDO POR OUTRO, DE SENTIDO INVERSO, QUE. RECONHECENDO O DECURSO DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PENA DECLARE EXTINTA A RESPONSABILIDADE DO ARGUIDO-RECORRENTE B….
3. Respondeu o MºPº na instância recorrido dizendo, em síntese, que o despacho proferido deve ser mantido nos seus precisos termos uma vez que carece de qualquer razão o recorrente.
4. O Exmo. Juiz depois de admitir o recurso sustentou a decisão proferida nos seguintes termos: «Analisados os fundamentos do recurso, afigura-se-nos que a decisão recorrida não enferma de qualquer vício que importe reparar.»
5. Neste Tribunal da Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto Parecer nos termos do qual concluiu no sentido da improcedência do recurso, com a seguinte argumentação:
«Apreciando, analisada a decisão recorrida de não considerar extinto por prescrição o remanescente (um ano) da pena cominada nos presentes autos (quatro anos de prisão) ao Recorrente, em face do processado esclarecedoramente ali historiado e as disposições legais aplicáveis, afigura-se-nos evidente que o Recorrente não tem razão.
Se não, vejamos:
Conforme inequivocamente se refere no despacho recorrido, o acórdão condenatório, embora proferido em 27 de Janeiro de 1988, só transitou em julgado após a sua notificação ao Arguido/Recorrente em 04 de Março de 1997, numa fase processual em que a inicial pena de quatro anos de prisão pela prática de crimes de emissão de cheques sem provisão (de quantias avultadas que nunca foram pagas, importa dizê-lo), havia já sido reduzida ao remanescente de um ano por aplicação sucessiva de perdões.
Esse remanescente de um ano foi, por decisão de 09 de Junho de 1999, também declarado perdoado ao abrigo do disposto no art. 1° n° 1 da Lei n°29/99 de 10/05, sob as condições resolutivas previstas nos arts. 4° e 5° da mesma lei.
E, embora o despacho recorrido o não refira, tal decisão foi seguramente notificada ao Arguido, tanto mais que expressamente a refere como início do período de suspensão do prazo de prescrição da pena.
Em 24 de Novembro de 2005, constatada a circunstância de o Arguido não ter satisfeito a condição de ressarcimento dos lesados, que onerava a medida de demência em causa, foi esta revogada, tendo-se imposto o cumprimento daquele remanescente de um ano da inicial pena de quatro anos de prisão.
Remanescente esse que o Recorrente tem assim para cumprir.
Da argumentação recursiva será de concluir que o Recorrente entende que o período de suspensão da prescrição da pena, no caso sub judice, se resume aos noventa dias em que vigorou a condição resolutiva do perdão concedido em 09 de Junho de 1999 pela Lei n° 29/99 de 10 de Maio e, não tendo satisfeito tal condição, não haverá fundamento para se considerar suspensa tal prescrição até 24 de Novembro de 2005
É efectivamente verdade que entre a decisão que aplicou o perdão (09/06/1999) e o despacho que revogou o mesmo perdão (24/11/2005) decorreram mais de seis anos, mas daí não pode retirar-se o efeito de inoperância da suspensão pretendido pelo Recorrente.
O regime legal da prescrição da pena cominada ao Recorrente contem-se nos arts. 122° nºs 1 al. c) e 2, 125° n°s 1 al. a) e 2 e 126° n° 3 do CP.
Como assim, à inicial pena de quatro anos de prisão corresponde o prazo de prescrição de dez anos contados a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória, no caso concreto, do 16° dia seguinte à notificação do Arguido operada em 04 de Março de 1997 [1]
Por força da aplicação do perdão concedido pela Lei n° 29/99 de 10/05, a contagem do tempo de prescrição da pena suspendeu-se. E manteve-se suspensa até à data do despacho que revogou tal perdão, em face do comprovado incumprimento da condição em causa.
Se é certo que a referida condição operava, por força da lei (cfr. art. n°s 1 e 2 da lei n° 29/99 de 10/05), nos noventa dias a contar da notificação para o efeito, não é menos certo que nos termos do n° 7 do mesmo preceito legal, o Juiz podia, a requerimento ou oficiosamente, prorrogar tal prazo, podendo assim concluir-se que, até à data da revogação do perdão, o Arguido, tendo pago, se assim o tivesse querido, as quantias em dívida aos lesados, concerteza não veria revogada a medida de demência dependente de tal pagamento e, consequentemente, o processo há muito estaria findo e arquivado.
E assim, em nosso entender, pode concluir-se que o Arguido teve, não noventa dias, mas mais de seis anos para satisfazer a condição de ressarcir os lesados e beneficiar do perdão do remanescente da pena que lhe restava para cumprir e não o fez.
Não nos parecendo legítimo, por isso, que venha agora invocar a incompreensão da sociedade decorrente do tardio cumprimento de uma pena por factos ocorridos há mais de vinte anos, na medida em que essa mesma sociedade em que diz estar plenamente inserido também engloba os ditos lesados que até hoje esperam o ressarcimento.
Seja como for, dúvidas não subsistem de que, nos termos das normas prescricionais invocadas, o prazo de prescrição da pena cominada nos autos ao Recorrente é de dez anos, começou a contar no 16° dia posterior a 04 do Março de 1997, data em que foi notificado do acórdão condenatório e suspendeu-se com a prolação do despacho de 09 de Junho de 1999, data do despacho que aplicou o perdão da Lei n° 29/99 de 10 de Maio, até 24 de Novembro de 2005, data do despacho que revogou o referido perdão, altura em que se voltou a correr (cfr. arts. 122° n°s 1 al. c) e 2 e 125° n°s 1 al. a) e 2 do CP).
Feitas as contas, temos, até ao presente, decorridos de tal prazo prescricional de dez anos, cerca de oito anos e quatro meses, pelo que forçoso será concluir não estar ainda a pena extinta por prescrição.
Como tal, somos de parecer que o recurso não deve proceder.»
6. Observada a notificação a que alude o artigo 417º/2 do CPP, colhidos os vistos e realizada a Conferência cumpre conhecer e decidir.

II FUNDAMENTAÇÃO

1. São factos processualmente adquiridos relevantes para o conhecimento da causa, decorrentes já da decisão sob recurso já da demais documentação constante dos autos:

1.1 Pela prática, em Maio, Novembro e Dezembro de 1985, de um crime de emissão de cheque sem cobertura, na forma continuada, o arguido B… foi condenado, por acórdão de 27 de Janeiro de 1988 (Querela 959/86.9TBSTS), na pena de 4 anos e seis meses de prisão [2], bem assim, «na indemnização de 1.260.000$00 a favor de C…, 180.000$00 a favor de D… e 50.000$00 a favor de E…».
1.2 Logo então, foi declarado perdoado um ano de prisão daquela pena de 4 anos e seis meses, nos termos do artº 13º nº1 al. b) da Lei 16/86 de 11/6.
1.3 Por decisão de 10 de Julho de 1991 [Fls.25] foi declarado perdoado mais um ano de prisão, agora nos termos do artº 14º/1 al.b) da Lei 23/91 de 4/7.
1.4 Em 18 de Maio de 1994, foi proferida decisão judicial nos seguintes termos:
«Atento o doutamente exposto na promoção constante de fls. 126 e no artº 120º nº3 do Código Penal, declaro extinto, por prescrição, o procedimento criminal contra o R. B…, pela prática dos crimes continuados de emissão de cheque sem provisão por que foi condenado em b) e c) de fls. 78 e vº (relativos aos apensos nºs 19/86 e 2221/86 dos Tribunais Judiciais de Ovar e S. João da Madeira) e por isso, dou sem efeito na parte respetiva aquela douta decisão condenatória.
Nos termos do artº 8º nº2 al. d) da Lei 15/94 de 11/5, declaro perdoado 1 ano da assim subsistente pena de 4 anos de prisão em que o R. foi condenado em a) de fls.78 – que, por força de tal perdão como dos decretados a fls. 78v e 107, nos termos das Lei nºs 16/86 de 11/06 e 23/91 de 4/7, ficará reduzida apenas a 1 ano de prisão»
1.5 Por ofícios datados de 28 de Junho de 1996 e de 5 de Julho de 1996, o Consulado Geral de Portugal em Genebra informa o Tribunal que o B…, inscrito naquele Posto Consular sob o nº ….., tem o seu endereço em “RUE … -…. GENEVE”, endereço esse que “já data de Outubro de 92” [Fls.28 e 30]
1.6 A partir daquela informação, o arguido B… foi notificado, em 4 de Março de 1997, da decisão condenatória referida em 1.1, bem assim das decisões referidas em 1.2, 1.3 e 1.4, sem que, relativamente a qualquer delas haja interposto qualquer recurso. [Fls.31 a 33]
1.7 Por decisão de 9 de Junho de 1999, nos termos do artº 1º/1 da Lei 29/99 de 12/5, foi declarado perdoado um ano de prisão – dizer, o ano sobejante da pena (sobejante) de 4 anos de prisão – sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4º e 5º [3] daquele mesmo diploma legal – consignando-se na decisão proferida: «Notifique, advertindo, expressamente, este réu para o regime previsto nas condições supra-aludidas»
1.8 Em Promoção de 18 de Setembro de 2002, o Mº Pº promoveu a notificação dos ofendidos para “virem aos autos dizer se o R. efectuou o pagamento das indemnizações arbitradas no período e termos referidos no artº 5º da Lei 29/99 de 12/5” (Sic) (Fls.36)
1.9 No deferimento daquela promoção, foram notificados, respetivamente, C…, D… e E… [Fls.37,38 e 39]
1.10 Em nova Promoção, de 30 de Setembro de 2002, deu conta de que, não obstante o despacho referido em 1.7, ter sido notificado ao Defensor do R., “não o foi pessoalmente a este”. Uma vez que o Artigo 5º da Lei 29/99 referia a notificação ao condenado, promoveu, então, “com referência à morada de fls. 160 (dizer, supra 1.5) se expeça carta rogatória para notificação pessoal do arguido” [Fls.40]
1.11 Sobre esta promoção incidiu o deferimento judicial proferido por despacho de 3 de Outubro de 2002 [Fls.40v]
1.12 De acordo com o despacho judicial proferido a 24 de Novembro de 2005 “o arguido foi notificado pessoalmente em 10 de Janeiro de 2005 para, no prazo de 90 dias proceder ao pagamento da indemnização fixada nos autos”, “tendo o demandante civil informado a fls. 304 nada ter recebido por conta da indemnização fixada” [Fls.41]
1.13 Aí se decidiu: «…nos termos do artigo 5º da Lei 29/99 de 12/5, revogo o perdão concedido ao arguido pela decisão de fs. 193 e, em consequência, determino o cumprimento da pena de 1 ano de prisão. Notifique. A antecedente decisão será notificada ao arguido através de contacto pessoal a efectuar por meio da cometente carta rogatória” [Fls. 41v]
1.14 Desta decisão foi o arguido notificado em 4 de Abril de 2006. [Fls.43]

2. Questão a conhecer (delimitação objetiva do recurso):

A questão sob debate prende-se com o sentido e a medida da interferência do perdão conferido pela Lei 29/99 de 12/5 na contagem do prazo da prescrição da pena cominada ao Recorrente: Suspende? Na eventualidade afirmativa, em que medida?

3. Conhecendo
3.1 Em termos muito breves recapitulemos a situação fáctica sob apreço:
● O Recorrente, pela prática, em Maio, Novembro e Dezembro de 1985, de um crime de emissão de cheque sem cobertura, na forma continuada, foi condenado, por acórdão de 27 de Janeiro de 1988, na pena de 4 anos e seis meses de prisão, bem assim, na indemnização de 1.260.000$00 a favor de C…, 180.000$00 a favor de D… e 50.000$00 a favor de E….
● Esta decisão apenas seria notificada ao Recorrente em 4 de Março de 1997 e só com o decurso do prazo para recurso sem que este tivesse sido exercido, transitou em julgado o que sempre equivalerá a dizer, que, com referência à presente data, vão decorridos, praticamente, mais de 26 anos sobre a data do último facto que fundamentou a condenação pelo crime continuado, mais de 24 anos sobre a prolação da decisão condenatória e mais de 15 anos sobre o trânsito em julgado da decisão condenatória.

3.2 Não estando em causa, como não estão, nem o prazo da prescrição – dez anos [4] -, nem o termo a quo do início da contagem do prazo prescricional - trânsito em julgado da decisão condenatória [5]-, a questão que subsiste e se deixa identifica tem a ver com a interferência do perdão conferido pela Lei 29/99 enquanto causa suspensiva na contagem do prazo da prescrição da pena.
Deixa-se referido que, por decisão de 9 de Junho de 1999, nos termos do artº 1º/1 da Lei 29/99 de 12/5, foi declarado perdoado um ano de prisão – dizer, o ano sobejante da pena (sobejante) de 4 anos de prisão – sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4º e 5º daquele mesmo diploma.
Entendeu-se na decisão recorrida que a partir daquela declaração de perdão deixou de ser possível executar a aludida pena de prisão, suspendendo-se, assim, o respectivo prazo de prescrição.
Mais se entendeu, ali, que este tempo de suspensão devia contar-se desde tal prolação até ao trânsito em julgado do despacho de 24.11.2005 - de que o arguido foi notificado em 4.4.2006 – revogatório do perdão concedido, uma vez comprovado o inadimplemento da condição resolutiva.
Este entendimento mereceu o acolhimento do Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação.

Será de subscrever?
Entende-se que não, por diferentes ordens de razões.

3.3 Tomem-se em consideração, desde logo, a axiologia e a ratio essendi subjacentes aos institutos do perdão quanto da prescrição.
Nos termos do artigo 128º/3 da lei penal substantiva, «o perdão genérico extingue a pena, no todo ou em parte»
Na linguagem de Figueiredo Dias, o exercício do direito de graça constitui um ato de soberania estadual que “criando um obstáculo à efectivação da punição”, pode qualificar-se como “a contraface do ius puniendi estadual”, ou dizer um ato que tem a ver com a carência de pena: “como ato de perdão, ele só deve verdadeiramente ter por efeito impedir a verificação das consequências jurídicas do crime (que representam a atualização, in casu, do ius puniendi)” [6]
Este princípio reitor da carência de pena não deixa der determinante com referência ao instituto da prescrição:
«É óbvio que o mero decurso do tempo sobre a prática de um facto não constitui motivo para que tudo se passe como se ele não houvesse ocorrido; considera-se, porém, que uma tal circunstância é, sob certas condições, razão bastante para que o direito penal se abstenha de intervir ou de efetivar a sua reação. Por um lado, a censura comunitária traduzida no juízo de culpa esbate-se, se não chega mesmo a desaparecer. Por outro lado, e com maior importância, as exigências da prevenção especial, porventura muito fortes logo a seguir ao cometimento do facto, tornam-se progressivamente sem sentido e podem mesmo falhar completamente os seus objetivos: quem fosse sentenciado por um facto há muito tempo cometido e mesmo porventura esquecido, ou quem sofresse a execução de uma reação criminal há muito tempo já ditada, correria o sério risco de ser sujeito a uma sanção que não cumpriria já quaisquer finalidades de socialização ou de segurança. Finalmente, e sobretudo, o instituto da prescrição justifica-se do ponto de vista da prevenção geral positiva: o decurso de um largo período sobre a prática de um crime ou sobre o decretamento de uma sanção não executada faz com que não possa falar-se de uma estabilização contrafáctica das expetativas comunitárias, já apaziguadas ou definitivamente frustradas” [7]

Mantem-se a este propósito o entendimento deixado expresso no Acórdão deste Tribunal da Relação de 07.09.2011, em caso aliás bastante similar ao ora ajuizado:
«A prescrição funda-se em que “o decurso do tempo tornou a execução da pena sem sentido e, por aí, o facto deixou de merecer punição”. [8][9]
Sem sentido ou dizer: vencido o prazo legal da prescrição relativamente a uma pena, a execução desta já não permitirá alcançar as finalidades da pena, antes resulta inútil, desnecessário e injusto executá-la.
Assim, desde logo, na consideração do princípio da personalidade da pena: vencido que se mostre um decurso prolongado do tempo, já não poderá dizer-se, nem biológica nem sociologicamente, que a pessoa condenada seja a mesma, que o mesmo é dizer conquanto condenado seja ainda o mesmo, a pena a executar incidirá já sobre outra pessoa.
Dizer ainda e de novo, com o decurso de um lapso de tempo prolongado, a pena já não é nem útil, nem necessária, nem justa. Nem útil nem necessária por não poder cumprir já os fins de retribuição, de prevenção geral e especial e de ressocialização do delinquente. Injusta porquanto ao pretender-se executar uma pena uma vez decorrido um prolongado lapso de tempo, a execução parecerá mais um acto de vingança tardia do que um verdadeiro acto de justiça. [10]
Em fundamento da axiologia que vem de ser exposta, dir-se-á que a prescrição encontrará suporte na Lei Fundamental por via da vinculação ao direito à segurança jurídica, a um processo sem dilação excessiva e a uma pena com o fim primordial da reinserção social.
Outrossim, por ser a prescrição uma renúncia ao ius puniendi por parte do Estado e um instituto de cariz penal substantivo, pode ser-lhe aplicável o princípio in dubio pro reo na sua versão relativa ao âmbito interpretativo da lei penal: favolabilia sunt amplianda, odiosa sunt restringenda [11]” [12]

Dizer, então.
Desde logo, numa perspetiva global e à luz dos sobrecitados princípios custará compreender a exigibilidade ainda do cumprimento do sobejante ano de prisão de uma pena cominada há mais de 24 anos, por acórdão transitado em julgado há mais de 15 anos e por factos praticados há mais de 26 ano.
Legitimo será perguntar: biológica e sociologicamente a pessoa condenada será ainda a mesma? O eventual cumprimento de uma tal pena, num tal circunstancialismo de tempo, cumpriria, ainda, quaisquer finalidades de socialização ou de segurança ou, de todo o modo, serviria à satisfação da estabilização contrafáctica das expetativas comunitárias?

À sobreposse.
Em face da identidade de valores e interesses subjacentes aos institutos em causa – perdão / prescrição – torna-se difícil compreender que um possa tornar-se em fonte de perversão do outro.
Como compreender que constituindo o perdão uma perda de sentido e/ou de razão de ser da pena para o legislador, ele mesmo se venha a constituir já em fonte de agravação relativamente ao prazo prescricional, quando, como se deixa referido, este tem subjacente aquele mesmo sentido e/ou razão de ser?
É compreensível que, sem contradição intrínseca, um perdão de pena se possa constituir em gravame na contagem de um prazo prescricional da mesma pena?
Na conformidade do que vem de ser exposto não repugna considerar que a admitir uma tal asserção seria admitir uma verdadeira perversão do sentido do instituto da prescrição da pena.
3.4 Admitamos, porém, a conformidade legal na interpretação da lei penal substantiva nos termos da qual, se verificará, in casu, a condição de suspensão da prescrição ínsita na alínea a) do nº1 do artigo 123º do CP 82, condição subsistente nos termos do artº 125º/1 al.a) do CP de 95 e 2007.

Suspensão, porém, desde quando e até quando?
A lei do perdão estabelece que “o perdão é concedido sob condição resolutiva de reparação ao lesado ou, nos casos de crime de emissão de cheque sem provisão, ao portador do cheque”.
Com o dizer-se, condição resolutiva entende-se, salvaguardado o devido respeito p.m.o., que o perdão concedido produzirá os seus efeitos desde a entrada em vigor da lei – dizer, extinção da pena, in casu, um ano de prisão – mas deixará de os produzir, sendo destruídos retroactivamente, se o evento condicionante não for observado.
Assumem, aqui, particular significado os termos da condição resolutiva fixada pelo legislador: (i) O perdão é concedido sob condição resolutiva de reparação ao lesado ou, nos casos de crime de emissão de cheque sem provisão, ao portador do cheque; (ii) A condição referida no número anterior deve ser satisfeita nos 90 dias imediatos à notificação que para o efeito será feita ao condenado.
Aqui chegados, não podemos de deixar de considerar os princípios de cariz constitucional que subjazem ao processo penal, nomeadamente os princípios do “prazo razoável” e do “processo equitativo” [Artigo 20º/4 CRP)
No que a este concerne, dever-se-á ter presente que “Todo o processo - desde o momento de impulso da ação até o momento da execução – deve estar informado pelo princípio da equitatividade, através da exigência do processo equitativo”. “O due process positivado na Constituição Portuguesa deve entender-se num sentido amplo, não só como um processo justo na sua conformação legislativa (…..) mas também como um processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais”. “O significado básico da exigência de um processo equitativo é o da conformação do processo de forma materialmente adequada a uma tutela judicial efetiva”.
Já na densificação deste princípio do processo equitativo, a doutrina e a jurisprudência têm apelado a outros princípios como sejam, ex.g., o direito a prazos razoáveis de acção ou de recurso, o direito à decisão em tempo razoável, o direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas. [13]

Pois bem.
Na decisão sob apreciação ponderou-se:
«Pela decisão de 9.6.1999 (cfr. fls. 193), foi declarado perdoado mais um ano de prisão, nos termos do artigo 1°, n° 1, da Lei n° 29/99, de 12 de Maio, sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4° e 5°, do mencionado diploma e declarada extinta a totalidade da pena.
Operada a condição resolutiva nos termos do art.5° da Lei n° 29/99 foi por despacho de 24.11.2005, revogado o perdão concedido ao arguido pela decisão de fis. 193 e, em consequência, determinado o cumprimento da pena de 1 (um) prisão»
Noutro passo:
«Acontece que em 9.6.1999 foi declarado perdoado o remanescente ano de prisão, nos termos do artigo 1o, no i, da Lei n° 29/99, de 12 de Maio, sob a condição resolutiva prevista nos artigos 4° e 5°, do mencionado diploma e declarada extinta a totalidade da pena.
A partir de então deixou de ser possível executar a aludida pena de prisão, suspendendo-se, assim, o respectivo prazo de prescrição até ao trânsito em julgado do despacho de 24.11.2005 - de que o arguido foi notificado em 4.4.2006 - que revogou o perdão concedido ao arguido e, em consequência, determinou o cumprimento da pena de 1 ano prisão.
Assim e ressalvando-se o tempo de suspensão da prescrição da pena não decorreu ainda o prazo de prescrição da pena aplicada ao arguido nos presentes autos.»

Dizer: o tribunal recorrido levou à conta da suspensão do prazo prescricional o tempo ocorrido entre a prolação do despacho que aplicou o perdão e a prolação do despacho que julgou não cumprida a condição resolutiva.
Todavia, com o devido respeito e olhadas (desde logo) as circunstâncias do caso concreto, não se pode concordar com uma tal tomada de posição.
Assim, na consideração de uma clara e óbvia violação do prazo razoável, adequado, côngruo no cumprimento por parte do tribunal da notificação imposta ex vi legis.
Dizer: como levar à conta de suspensão do prazo prescricional o tempo superior a três anos que mediou entre o tribunal ordenar a notificação do condenado nos termos e para os efeitos do artigo 5º da Lei 29/99 de 12/5 e a prolação de nova ordem de notificação, não na pessoa do defensor, mas do próprio condenado?! [Supra II, 1.7 a 1.10]
Admiti-lo, consubstanciaria clara violação do princípio do processo devido na justa medida em que faria repercutir negativamente no recorrente – ad infinitum ?! - a inépcia do próprio tribunal !!

3.5 Cumpre concluir.

No seu douto Parecer, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto refere, a final:
«Feitas as contas, temos, até ao presente, decorridos de tal prazo prescricional de dez anos, cerca de oito anos e quatro meses, pelo que forçoso será concluir não estar ainda a pena extinta por prescrição.»
Não pondo em causa tais contas não pode, todavia, deixar-se de lhes introduzir, pelo que acaba de ser referido – seja apenas os três anos de excesso na notificação, por ato cuja responsabilidade cabe ao tribunal e não ao recorrente e que, por isso, por ele não pode ser prejudicado – a exérese, na dita suspensão da contagem do prazo prescricional da pena, de pelo menos os três referidos anos que o tribunal levou em ordenar a notificação.

Destarte, em necessidade de outras considerações, imperiosa se torna a conclusão da prescrição da pena.

III DECISÃO

São termos em que, na procedência do recurso, se revoga a decisão recorrida, julgando-se extinta, pela prescrição, a pena sobejante de um ano de prisão, resultante da pena originária de quatro anos e seis meses de prisão em que o Recorrente B… havia sido condenado por acórdão de 27 de Janeiro de 1988.

Sem custas

Porto, 23 de Maio de 2012
Joaquim Maria Melo de Sousa Lima
Francisco Marcolino de Jesus
________________
[1] Cfr. art. 411º nº1 do CPP na redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei n°48/2007 de 29/08.
[2] Na decisão sob recurso, refere-se a condenação “na pena de 4 anos de prisão”. Certo, porém, que na certidão junta a fls. 20 e ss, consta a condenação na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão [Fls.24v]
[3] «Artigo 5.o 1 — Sempre que o condenado o tenha sido também em indemnização o perdão é concedido sob condição resolutiva de reparação ao lesado ou, nos casos de crime de emissão de cheque sem provisão, ao portador do cheque.
2 — A condição referida no número anterior deve ser satisfeita nos 90 dias imediatos à notificação que para o efeito será feita ao condenado
[4] Como corretamente afirmado na decisão sob recurso: O prazo de prescrição da pena em causa é de 10 anos, quer à luz do Código Penal de 1982 (art.121°, n°1, al.c), quer à luz do Código Penal de 1995, na sua redacção original ou actual, após 2007 (art.122°, n°1, al.c).
[5] Acolhe-se, sem objeção, a data indicada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto: «16° dia posterior a 04 do Março de 1997»
[6] DIREITO PENAL PORTUGUÊSAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO CRIME, 2ªReimpressão, Coimbra Editora, §§1110 e 1121
[7] FIGUEIREDO DIAS, ob. cit. §1125 [Sublinhados do Relator]
[8] FIGUEIREDO DIAS ob. cit. §1130
[9] “Há crecido la hierba sobre el asuntoCLAUS ROXIN, Derecho Penal, Parte General Tomo I, Civitas, 1997, § 23, 55
[10] No sentido exposto: BUTRAGUEÑO, IGNACIO SERRANOCÓDIGO PENAL DE 1995 (Comentários y Jurisprudencia), Granada 1999, Editorial COMARES, S.L., Artigo 133, págs. 917-918
[11] Vide: CÓDIGO PENAL COMENTADO Y COM JURISPRUDENCIALUIS RODRIGUEZ RAMOS (Director), AMPARO MATINEZ GUERRA (Coordinadora) – 3ª Edición – grupo Wolters Kluwer, págs. 488-489
[12] Publicitado in www.dgsi.pt
[13] J.J.GMES CANOTILHO * VITAL MOREIRA, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA, ARTIGOS 1º A 107º, Vol. I, 4ªEd. Revista, Coimbra Editora, Artigo 20º XI.