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INJUNÇÃO
OBRIGAÇÕES EMERGENTES DE TRANSAÇÕES COMERCIAIS
FORMA DE PROCESSO
Sumário
I- Destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transacções comerciais pode nele ser exigido o cumprimento de obrigações de valor superior a € 15.000. II- Se estiver em causa um valor superior à alçada da Relação, a dedução de oposição determina a remessa dos autos para o Tribunal competente, onde será distribuído como acção declarativa, na forma de comum.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
Em 8-11-2010 B…… GMBH apresentou requerimento de injunção, solicitando a notificação de C….., S.A., no sentido de lhe ser paga a quantia de € 110.316,78.
A requerida contestou. E, em reconvenção, pede a condenação da requerente no pagamento da quantia de € 230.073,16, acrescida de montante a liquidar e execução de sentença e de juros de mora.
A requerente replicou.
Seguiu-se decisão que concluiu pela verificação de erro na forma de processo. E, considerando que, do requerimento de injunção, nada pode ser aproveitado – “não existe sequer petição inicial”, escreve-se naquela decisão – decidiu-se: “Em face de todo o exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 199º, 202°, 206°, nº2, 493º, n°2 e 494°, alínea b), todos do Código Civil e 3° n°1, do Regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor não superior a € 15.000,00, julgo verificada a nulidade do erro na forma de processo e, em consequência absolvo a Requerida da instância”.
Inconformada, a requerente interpôs recurso.
Conclui:
- foi apresentado um requerimento de Injunção no dia 08 de Novembro de 2010, no valor de 110.316.78 euros (cento e dez mil trezentos e dezasseis euros e setenta e oito cêntimos);
- no dia 02 de Dezembro de 2010, foi apresentada oposição à injunção pela Recorrida, tendo-se verificado a convolação do requerimento injuntivo em acção declarativa sob a forma de processo ordinário;
- de acordo com o artigo 7.° do Anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 107/2005, de 1 de Julho, “Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais, abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro”;
- acresce que, o artigo 7.°, número 1 do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro dispõe que “O atraso de pagamento em transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida;
- resulta, assim, do estabelecido nos referidos dispositivos legais, que a Recorrente pode recorrer ao procedimento de injunção e que tal direito poderá ser exercido, independentemente do valor em causa, para exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transacções comerciais;
- de facto, por transacção comercial deverá entender-se, nos termos do artigo 3.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, “( …) qualquer transacção entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração”;
- tal corresponde precisamente ao caso ora em apreço, em que a Recorrente, para exigir o pagamento da quantia devida pela Recorrida como contrapartida pelas mercadorias fornecidas, recorreu ao procedimento de injunção;
- além do mais, o artigo 7.°, número 2 do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro estabelece que “para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum”;
- sucede que, a decisão proferida fundamentou-se na alegada inexistência de petição inicial, o que obstava a que o processo se aproximasse tanto quanto possível da forma estabelecida legalmente;
- no entanto, dispõe o artigo 199.°, número 1 do Código de Processo Civil que “o erro na forma do processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei”;
- mais, resulta da aplicação do princípio da adequação formal, explanado no artigo 265.º A do Código de Processo Civil, que “quando a tramitação processual prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz, oficiosamente, ouvidas as partes, determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações”;
- assim, é evidente que a decisão do Tribunal a quo encontra-se em violação do disposto nos artigos 199.º e 265.º A do Código de Processo Civil, uma vez que declarou a nulidade do processo e consequente absolvição da recorrida da instância, quando deveria ter, à luz dos referidos dispositivos legais, determinado a prática dos actos necessários à adequação dos presentes autos à forma de processo ordinário;
- de resto, tem sido este o entendimento da melhor jurisprudência, como é o caso do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, referente ao processo n.º 0834643 (in www.dgsi.pt), no qual foi declarado que “cremos que aquilo com que o legislador se preocupou foi, sim, que, sendo o tribunal que já tinha a injunção o competente para tramitar a acção declarativa ordinária, devia ficar com ela, limitando-se a determinar as diligências necessárias para que essa forma do processo fosse efectivamente seguida, assim se assegurando os legitimas interesses e garantias processuais das partes”;
- resulta, pois, de tudo o acima exposto que a decisão recorrida viola manifestamente o disposto no artigo 7.° do Anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 107/2005, de 1 de Julho, e no artigo 7.°, número 1 do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, ao não reconhecer o direito da ora Recorrente a recorrer ao requerimento de injunção para exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de transacção comercial, independentemente do valor da divida;
- sendo, ainda, evidente que a decisão do Tribunal a quo viola o disposto nos artigos 199.º e 265.º A do Código de Processo Civil, ao declarar a nulidade do processo e consequente absolvição da recorrida da instância, quando deveria ter determinado a prática dos actos necessários à adequação dos presentes autos à forma de processo ordinário.
Não foram apresentadas contra-alegações
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Os factos a considerar já resultam do relatório.
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São questões a decidir:
- verificação de erro na forma de processo;
- consequências, em caso afirmativo.
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Adiantámos que assiste razão à recorrente.
Vejamos.
Pelo at.1º do DL nº269/98 de 1 de Setembro – após as alterações introduzidas pelo DL nº107/2005 de 1 de Setembro e pelo DL nº303/2007 de 24 de Agosto - foi aprovado “o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15000, publicado em anexo, que faz parte integrante do presente diploma”.
Consistem tais procedimentos na acção declarativa e na injunção, cujo regime consta daquele anexo.
Neste caso, está em causa o regime da injunção, previsto no art.7º e ss. do referido anexo.
Assim, dispõe o art.7º do anexo ao DL nº269/98 de 1 de Setembro, na redacção resultante da alteração introduzida pelo DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro: “Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.° do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º32/2003, de 17 de Fevereiro”.
Havendo oposição regem, em princípio, os art.s 15º e ss.. Donde resulta que, havendo oposição, os autos são apresentados à distribuição – art.16º; seguindo-se a tramitação prevista para a acção declarativa cujo regime consta dos art.s 1º a 5º - art.17º, ambos do referido anexo.
Mas tratando-se de obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro, dispõe o art. 7º deste diploma legal que: “o atraso de pagamento em transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida” – nº1; e “para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o Tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum” – nº2.
Ou seja, destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações a que se refere o art.1º do DL nº269/98 de 1 de Setembro – obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior a € 15.000 – havendo oposição, o processo é apresentado a distribuição, seguindo-se tramitação prevista na acção declarativa especial prevista no anexo àquele diploma legal.
Destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro, desde logo, não existe limite de valor. Pelo que pode, no respectivo requerimento injuntivo, ser exigido o cumprimento de obrigações de valor superior a € 15.000.
Além disso, se estiver em causa um valor superior ao da alçada da Relação, havendo oposição, a tramitação seguinte já não é a que se deixou referida – como acção declarativa especial. Antes, o processo é remetido ao tribunal competente, onde será distribuído com acção declarativa, na forma comum.
Resta dizer que, por transacção comercial deve entender-se “…qualquer transacção entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração” – art.3º, al. a), do DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro.
Ora, no caso em apreço, estão, inequivocamente, em causa transacções comerciais: fornecimentos, pela requerente à requerida, de papel para impressão de jornal. Solicitando a requerente o pagamento da quantia de € 110.316,78 (104.556,97 de capital e 5.683,31 de juros).
Podia, assim, a requerente, e não obstante o montante peticionado ultrapassar o valor de € 15.000, recorrer ao processo de injunção – art.7º, nº1, do DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro. Processo que, sendo o respectivo valor superior ao da alçada da Relação, que é de € 30.000 – art.24º da Lei nº3/99 de 13 de Janeiro – deveria ter sido distribuído, no tribunal competente, como acção declarativa, na forma de processo comum.
Mas, se é assim, não se pode concluir por erro na forma de processo: antes, a recorrente seguiu precisamente o processo indicado na lei. Por isso mesmo os autos prosseguem, hoje, como acção declarativa, na forma de processo comum ordinário.
E não existindo erro na forma de processo, não há que recorrer ao disposto no art.199º do CPC.
Por isso, e desde logo, não há que proceder à anulação de quaisquer actos: todos os actos praticados foram-no de acordo com a lei.
E não há, por outro lado, que praticar quaisquer actos, de forma a que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida na lei.
O processo já segue a tramitação prevista na lei: foi acima referida. Importa, apenas, segui-la. O que, aliás, foi cumprido, já que, consoante se deixou dito, os autos prosseguem, hoje, como acção declarativa, na forma de processo comum.
A questão que se pode colocar é outra: consiste em saber se, estando-se, agora, em face de uma acção declarativa, na forma de processo comum, o requerimento de injunção reveste os requisitos da petição inicial, constantes do art.467º do CPC.
Só que, e caso se conclua que não, a requerente não pode ser penalizada por isso. Na verdade, ao apresentar o requerimento de injunção, apenas tinha de respeitar os requisitos exigidos pelo art.10º do anexo ao DL nº269/98 de 1 de Setembro, e não os exigidos pelo art.467º do CPC.
Pelo que, e caso se conclua pela necessidade de aperfeiçoamento dos articulados - neste caso, do requerimento inicial, convertido em petição inicial – apenas haverá que fazer uso do disposto no art.508º do CPC.
E se, de qualquer modo, o tribunal concluir que a tramitação prevista na lei - e acima referida – não se adequa às especificidades da causa – o que não nos perece ser o caso - então pode determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações – art.265º-A do CPC.
Pelo que o recurso merece provimento.
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Acorda-se, em face do exposto, e julgando a apelação procedente, em revogar a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir os seus termos como acção declarativa, sob a forma de processo comum ordinário.
Custas pela parte vencida a final.
Porto, 28-05-2012
Abílio Sá Gonçalves Costa
António Augusto de carvalho
Anabela Figueiredo Luna de Carvalho