RECURSO PENAL
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
NULIDADE DE SENTENÇA
CONHECIMENTO OFICIOSO
CORREIO DE DROGA
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PERDA DE BENS A FAVOR DO ESTADO
Sumário


I - Está imposto ao juiz o dever de, na decisão, indagar da pertinência ou inconveniência da aplicação do regime para jovens, previsto pelo DL 401/82, de 23-09 e de fundamentar a sua opção, ainda que o julgue inaplicável, razão pela qual o tribunal a quo estava obrigado a pronunciar-se sobre se era de aplicar, ou não, ao arguido G, o regime da atenuação especial da pena, previsto no art. 4.º do citado diploma legal, o que não fez, deixando, por isso, de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, por ser de conhecimento oficioso. Por isso, o acórdão impugnado enferma, nesta parte, da nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, al c), do CPP, nulidade que pode ser conhecida oficiosamente em recurso, nos termos do n.º 2 deste mesmo artigo e do art. 425.º, n.º 4, também do CPP.
II - Nos termos do art. 379.º, n.º 2, do CPP é um dever do tribunal de recurso o suprimento das nulidades da sentença recorrida, razão pela qual sobre o tribunal de recurso impende a obrigação de suprir as nulidades de que padeça a sentença recorrida. Deste modo, com excepção dos casos em que isso não for possível, designadamente por insuficiência de matéria factual, o tribunal de recurso, se o acolher, substitui a decisão por aquela que considere ser a legal. Dispondo os autos de todos os elementos necessários à decisão da eventual aplicação do regime penal especial para jovens, a nulidade cometida pelo tribunal recorrido pode e deve ser suprida por este STJ.
III - Atenta a gravidade do crime (tráfico de estupefacientes – correio de droga), com as consequentes elevadas necessidades de prevenção geral, e as necessidades de prevenção especial (abandono escolar precoce, recusa em assumir responsabilidade, designadamente através do exercício de uma actividade profissional, estilo de vida ocioso e desregrado com consumo de estupefacientes), é legítimo concluir pelo afastamento da aplicação a arguido do regime da atenuação especial da pena de prisão, previsto no art. 4.º, do DL 401/82, de 23-09.
IV - Tendo em conta a intensidade do dolo (directo), bem como a ilicitude, a culpa (analisada sob o ponto de vista da vontade), as condições pessoais do arguido e as exigências de prevenção especial e geral, enunciadas em III., sendo certo que o arguido G é ainda um jovem, confessou os factos e não tem antecedentes criminais, afigura-se-nos excessiva a pena aplicada de 5 anos e 6 meses de prisão, considerando-se adequada a pena de 4 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, do DL 15/93.
V - Os correios de droga são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes, motivo pelo qual vem sendo enfaticamente salientado pelo STJ que, nos casos de crimes de tráfico de estupefacientes, as razões de prevenção geral só excepcionalmente se satisfazem com uma pena de substituição. Da ponderação dos factos provados, quanto às condições pessoais do arguido G, não se vê que o arguido aparente qualquer interiorização dos valores ofendidos e vontade de alterar o seu comportamento desviante. Pelo que, e independentemente do maior ou menor relevo das circunstâncias que depõem a seu favor (designadamente a sua idade à data da prática dos factos, a confissão e a ausência de antecedentes criminais), julgamos não ser possível um juízo de prognose favorável em relação ao comportamento futuro do arguido, como exige o art. 50.º, do CP, razão pela qual não se suspende a pena aplicada.
VI - No que diz respeito ao arguido F, o facto de estar em causa um produto estupefaciente classificado como “droga não dura” e da sua quantidade não ser relevante (total de 67 embalagens em forma de bolota, contendo cannabis com o peso bruto de 571,200 g.), o facto de a condenação anterior do arguido pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado reportar-se a factos ocorridos em Maio de 2001, bem como o facto de o arguido dispor de condições favoráveis à sua reintegração familiar e profissional, julgamos ser de reduzir a pena de 7 anos aplicada ao arguido, afigurando-se-nos adequada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.
VII – Estando provado que foram apreendidos ao recorrente e declarados perdidos a favor do Estado os dois telemóveis que o mesmo tinha na sua posse aquando da sua detenção, ocorrida em Elvas e quando regressava de Marrocos da sua actividade de correio de droga, tudo indicando, pois, que os mesmos se destinavam a servir à prática da actividade de tráfico, conclui-se que a decisão recorrida, nesta parte, deve manter-se inalterada.

Texto Integral


 
RECURSO PENAL[1]



                                          
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I – RELATÓRIO

1. No processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, nº 10/15.3GMLSB, da Comarca de Portalegre, Instância Central- Secção Cível e Criminal-J1, foi proferido acórdão, em 24.05.2016,  que decidiu:

«A) Absolver os arguidos como coautores materiais dum crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artºs 21º, nº 1, e 24º, als. b), e c), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, por referência à tabela I-C a este anexa, e convolando os crimes imputados na acusação:

B) Condenar o arguido AA como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do Dec. – Lei nº 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão;

C) Condenar o arguido BB como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do Dec. – Lei nº 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;

D) Condenar o arguido CC como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1, do Dec. – Lei nº 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;

E) Condenar os arguidos no pagamento solidário das custas do processo, fixando-se a Taxa de Justiça em 2 UC (art. 344º, nº 2, do Código de Processo Penal e arts. 1º e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais, por referência à Tabela III anexa a este mesmo diploma);

F) Declarar perdido a favor do Estado todo o estupefaciente apreendido nos autos, determinando-se a sua destruição, nomeadamente das respetivas amostras-cofre (arts. 35º nº 2 e 62º nº 6 do Dec. - Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro). D.N.;

G) Declarar perdidos a favor do Estado, os seguintes bens/valores: a) quantias monetárias apreendidas e depositadas à ordem dos autos; b) telemóveis; c) Veículo automóvel com matrícula ...-FB e respetivos documentos;

H) Determinar a entrega ao arguido BB da máquina fotográfica de marca Casio, e ao arguido CC, da máquina fotográfica de marca Canon observando-se, para tanto, o procedimento e a cominação a que se reportam os nºs 3, e 4, do art. 186º, do Código de Processo Penal;

I) No caso do ADN dos arguidos ainda não constar na base de dados de perfis de ADN, determinar que, após trânsito, fossem recolhidas amostras do seu ADN e que os perfis resultantes das amostras fossem inseridos na base de dados de perfis de ADN para efeitos de identificação civil e criminal, devendo a recolha ser solicitada ao Instituto de Medicina Legal (arts. 5º, nº 1, 6º, nº 2, 8º, nº 2, 18º, nº 3, da Lei nº 5/2008, de 12 de Fevereiro)».

2. Inconformados, os arguidos BB e AAs interpuseram recurso deste acórdão.

2.1. Foram as seguintes as conclusões do recurso interposto pelo arguido BB:

«A – O Recorrente é jovem e primário, tendo 20 anos de idade à data da prática do crime;

B – O Recorrente confessou o crime, mostrou-se arrependido e colaborou com o tribunal de forma ativa na descoberta da verdade material;

C – O Recorrente tem bom ambiente familiar, estando a família nuclear disponível para o acolher e o apoiar;

D – O Recorrente encontra-se com o firme propósito de prosseguir com a sua vida de forma autónoma e independente, sem comportamentos ilícitos;

E – Existem sérias e fortes razões para acreditar que a atenuação da pena, nos termos do DL 401/82, de 23 de Setembro, resultaria em vantagens para o Recorrente.

F – Sendo certo que o Tribunal a quo não tomou em consideração a aplicação e os pressupostos do regime especial para jovens delinquentes ao aqui Recorrente.»

Termos em que requer seja revogado o acórdão recorrido, no que tange à não aplicação ao recorrente da aplicação do regime especial para jovens delinquentes, e a sua substituição por acórdão que considere ao recorrente a aplicação do regime especial para jovens delinquentes.

2.2. Foram as seguintes as conclusões do recurso interposto pelo arguido AA:

«1ª. De acordo com os relatórios do instituto de reinserção social para a determinação de sanções a reintegração do arguido será certamente bem sucedida uma vez que se mostra manifestamente arrependido pelos actos cometidos;

2ª. O seu agregado familiar é constituído pela sua a mulher, a filha comum, de 5 anos, e as duas enteadas com 18 e 12 anos de idade, é estável e casal mantém um relacionamento afectivo e de apoio mútuo, o que certamente ajudará a sua reintegração social quando a esta houver lugar;

3ª. Assim como o desenvolvimento da sua actividade profissional;

4ª. O arguido confessou integralmente e sem reservas o crime de que vinha acusado, colaborando de forma consciente e voluntária para a descoberta da verdade material e consequente aplicação da Justiça.

5ª. O grau de ilicitude e do dolo deverá ter em conta, com vista a uma especial atenuação, que o arguido não passava de um mero “correio de droga”, a droga transportada ser considerada “leve” e a quantidade da mesma não se poder considerar elevada, como o não seria a retribuição patrimonial que o recorrente retiraria desta atividade de transporte.

6ª. Pelo que a pena concreta deverá ser atenuada, tendo em conta os critérios de determinação da medida da pena estabelecidos nos arts. 40º e 71º do Código Penal.

7ª.As necessidades de prevenção geral e especial das penas, ficariam acauteladas com a fixação de uma pena perto dos limites mínimos;

8ª.A não ter sido alterada (diminuída) a decisão recorrida, a manutenção da mesma é revelador de uma perspectiva desfasada e desproporcional da reacção penal, o que acarreta uma perda da eficácia dissuadora do Direito, sendo que, fará cumprir as exigências de prevenção geral e de prevenção especial;

9ª.Assim, a manutenção da decisão proferida no âmbito do presente acórdão recorrido, viola o preceito do Art.º 71, alínea d) do Código Penal.

10ª.Deverá ser restituído ao arguido o seu telemóvel pessoal, que não foi instrumento da actividade de tráfico e contém registos fotográficos da filha menor do recorrente, cujas imagens, pelo seu conteúdo e carga emocional pretende preservar.

11ª. Bem como os documentos pessoais, em nada relacionados com a actividade de tráfico, que se encontram apreendidos juntamente com o veículo automóvel»

Nestes termos, deve o acórdão recorrido ser revogado e substituído por  outro que  aplique ao arguido uma pena de prisão perto dos seus limites mínimos  e que declare a restituição ao recorrente dos bens acima descritos.

 

3. Em resposta conjunta aos recursos dos arguidos BB e AA, apresentou o Ministério Público na 1ª instância as seguintes conclusões:

«A decisão do Tribunal “a quo” no que concerne ao arguido/recorrente AA, não violou qualquer norma legal e foi correctamente aplicada face à prova existente.

Revelando cuidadosa fundamentação, quer quanto à matéria de facto quer no que concerne à matéria de direito.

Expressando uma acertada subsunção dos factos à lei.

E optando por pena que se julga justa e adequada face aos critérios consignados nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal.

Louvando-nos, pois, no bem fundado do douto acórdão recorrido somos de parecer que o recurso dele interposto pelo arguido/recorrente AA não merece provimento.

Já no que tange ao arguido/recorrente BB partilhamos do seu desacordo pelo facto de o Tribunal “a quo” não se ter pronunciado sobre a aplicação do regime especial para jovens adultos previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, de 2 de Setembro.

Com efeito, o arguido/recorrente BB tinha, à data dos factos, 20 anos de idade, não tendo, pois ainda atingido os 21 anos de idade, pelo que o Tribunal “a quo” deveria ter-se pronunciado sobre o estatuído no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 2 de Setembro (eventual atenuação da pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal).»

*

4. Neste Supremo Tribunal, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu proficiente parecer de que se transcreve o trecho seguinte:

«1 – O Tribunal Coletivo da Instância Central, Secção Cível e Criminal-J1, da Comarca de Portalegre, condenou, por Acórdão de 24.05.2016, os arguidos AA, BB e CC, nos seguintes termos:

→ “B) Condenar o arguido AA como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21°, n° 1, do Dec-Lei n° 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão;

→ C) Condenar o arguido BB como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21°,  n° 1, do Dec-Lei n° 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;

→ D) Condenar o arguido CC como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21°, n° 1, do Dec-Lei n° 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão (…).”.

2 – Inconformados com a decisão recorreram os arguidos BB e AA, per saltum, para este Venerando Tribunal discutindo exclusivamente questões de direito.

2.1. O tribunal competente para decidir a presente causa é o STJ (arts. 434º e 432º, nºs 1, al. c) e 2 do CPP).

Os recursos foram interpostos em tempo e com legitimidade, admitidos com o efeito e modo de subida devidos (cfr. fls. 668, 689 e segs, 692 e segs. e 707).

O MP respondeu, com legitimidade e tempestivamente (fls. 713 e segs.).

3 - Consabidamente, são as conclusões de recurso que delimitam o seu âmbito.

3.1.1. O arguido BB levou às conclusões da sua motivação de recurso as seguintes questões de direito:

À data da prática do crime pelo qual veio a ser condenado tinha 20 anos de idade e era primário. Confessou o crime, mostrou-se arrependido e colaborou com o tribunal na descoberta da verdade material (concls. A e B).

Tem bom ambiente familiar, estando a família disponível para o acolher e apoiar, sendo que o arguido tem o firme propósito de prosseguir a sua vida sem comportamentos ilícitos (concls. C e D).

Existem sinais e fortes razões para acreditar que a atenuação da pena, nos termos do Dec-Lei 401/82, de 23.09, resultaria em vantagens para o Recorrente, porém o tribunal recorrido não tomou em consideração a aplicação e os pressupostos do regime especial para jovens delinquentes (concls. E e F).

  Pede a revogação do Acórdão recorrido, a ser substituído por outro que considera ao Recorrente a aplicação do regime especial para jovens delinquentes.

3.1.2. O MP, na sua resposta, acompanha a posição do recorrente, confessando não se ter apercebido oportunamente de tal omissão por banda do Tribunal a quo.

3.2. O arguido AA concluiu a sua motivação de recurso com as seguintes questões:

  - De acordo com os relatórios do Instituto de Reinserção Social, a reintegração do arguido será certamente bem sucedida, o seu agregado familiar é estável com um ambiente afetivo positivo e de apoio mútuo, com desenvolvimento da sua atividade profissional (concls. 1ª a 3ª).

  - O arguido confessou integralmente e sem reserva os factos, colaborando de forma consciente e voluntária para a descoberta da verdade material (concl. 4ª).

  - O arguido era um mero “correio de droga”, droga que deve ser considerada leve, não podendo ser considerada elevada a quantia que tinha em seu poder aquando da sua detenção, pelo que, deveria ter-lhe sido aplicada uma pena especialmente atenuada, considerando o grau de ilicitude e do dolo com que atuou (concls. 5ª a 6ª).

  - As necessidades de prevenção geral e especial das penas ficariam acauteladas com a fixação de uma pena perto dos limites mínimos (concls. 7ª e 9ª).

  Deverão ser-lhe restituídos o seu telemóvel pessoal e os documentos pessoais, em nada relacionados com a atividade de tráfico (concl. 11ª).

3.2.1. O MP na sua resposta, bem fundamentada, pugna pela manutenção do julgado, quer quanto à medida concreta da pena aplicada, quer quanto ao perdimento dos telemóveis apreendidos, considerados pela decisão recorrida como instrumento essencial na atividade de tráfico, sendo que o apreendido ao ora recorrente foi utilizado por ele, precisamente para contatar um dos traficantes em Marrocos.

A decisão recorrida determinou a restituição das máquinas fotográficas apreendidas.

Quanto aos restantes elementos/documentos apreendidos, “por consubstanciarem meios de prova, determina-se a sua permanência nos autos”, decisão que tem a concordância do MP.

4 – Como resulta da leitura e confronto das respetivas motivações e conclusões de recurso de cada um dos arguidos, são pessoais e autónomos os pedidos, pelo que o Acórdão recorrido pode e deve ter soluções diversas para cada um dos recorrentes, sem que se mostre inevitável a anulação de toda a decisão.

Com efeito, diferente deverá ser a solução a tomar relativamente a cada um dos recorrentes.

4.1. No que tange ao recorrente BB, de 20 anos à data dos factos criminosos por si praticados, o Acórdão recorrido é nulo, por omissão de pronúncia, devendo ser determinado a reelaboração da sentença que terá, necessariamente, de ponderar a aplicação (ou não) do regime penal especial para jovens delinquentes, vertido no Dec-Lei nº 401/82, de 23.09, no caso concreto, ao jovem arguido recorrente Gonçalo Inácio.

É Jurisprudência pacífica deste Venerando Tribunal que a eventual aplicação do regime especial para jovens adultos é de conhecimento oficioso, não constituindo a consideração da sua aplicação uma mera faculdade do juiz, mas antes um poder vinculado que o juiz tem de usar sempre que se verifique os respetivos pressupostos e devendo justificar e fundamentar a opção – de aplicação ou não aplicação – (Cfr., por todos, Ac. do STJ, de 17.04.2013, pº. 237/11.7JASTB.S1).

Ao tribunal incumbe o poder-dever de averiguar se estão ou não verificados os pressupostos de facto de que depende a aplicação do Dec-Lei nº 401/82” – Ac. supra identificado, citando os Acs. do STJ de 15.04.2010, pº. 1423/08.2JDLSB.L1.S1-3ª e de 30.05.2012, pº. 21/100.5GATVR.E1.S1-3ª. Revisitando, de novo, do Ac. do STJ, de 17.04.2013, pº. 237/11.7JASTB.S1 dele se transcreve:

“(…) Posteriormente a 1 de Janeiro de 1999, com a entrada em vigor da reforma operada pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto, com a introdução da alínea c) do nº 1 do artigo 379º, do CPP, deixou de haver dúvidas quanto à cognição oficiosa da nulidade emergente de omissão de pronúncia, considerando-se a partir de então que a não consideração da aplicabilidade do regime constitui nulidade por omissão de pronúncia sobre questão de conhecimento oficioso, sendo de conhecimento oficioso nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea c) e nº 2 do CPP. Caso se entenda estar em causa violação do dever de fundamentação, a falta de fundamentação constituirá violação da injunção constante do artigo 374º, nº 2, do CPP, sendo então a nulidade a prevista na alínea a) do nº 1 do citado preceito (…)”.

Nesta parte, e relativamente ao arguido recorrente BB é nula a decisão recorrida, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379º, nº 1, al. c) e 374º, nº 2, ambos do CPP.»

4.2. No que concerne ao recurso interposto pelo arguido AA não merece o mesmo provimento.

Acompanho, na íntegra, a resposta do MP no Tribunal a quo, que com a devida vénia dou aqui por reproduzida.

Não obstante condenação anterior pelo crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 9 anos, que cumpriu, com termo em 2011, não lhe foi a mesma bastante para o afastar da senda do crime, do mesmo tipo de crime que praticou, logo em Setembro de 2015.

As necessidades de prevenção geral e especial mostram-se particularmente exigentes, relativamente a um agente que já cumpriu pena longa de prisão pelo mesmo tipo de crime e que, em prisão preventiva, dá mostras de não acatamento das regras e disciplina vigentes no estabelecimento prisional.

Foi objeto de dois processos disciplinares, por consumo de estupefaciente e por posse de telemóvel (cfr. motivação de facto da decisão recorrida, fls. 642).

Não obstante os bons projetos de vida que afirma ter, certo é que no seu percurso de vida não demonstra assumir comportamentos que permitam elaborar um juízo de prognose favorável à sua reinserção social, credor da aplicação de uma pena de prisão mais “branda”.

O Acórdão recorrido fundamenta suficientemente a aplicação ao arguido Francisco da pena de 7 anos de prisão, que deve manter-se.

Pelo exposto emite-se Parecer no sentido:

→ da nulidade parcial do Acórdão recorrido, por omissão de pronúncia, relativamente ao arguido BB, por não se ter pronunciado sobre a aplicação (ou não) do Regime Penal para Jovens Adultos, vertido no Dec-Lei nº 401/82. De 23 de Setembro.

→ Não provimento do recurso interposto pelo arguido AA. »             

5. Notificados, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, os arguidos  nada vieram dizer

6. Colhidos os vistos em simultâneo e não tendo sido requerida a audiência de discussão e julgamento, o processo foi presente à conferência para decisão, cumprindo apreciar e decidir.

***

II. FUNDAMENTAÇÃO

A. Fundamentação de facto.

A 1ª  instância deu como provada e não provada a seguinte matéria de facto:

1. Factos  provados :

«1-No dia 26 de setembro de 2015, os arguidos AA, BB e CC, na sequência de contato previamente estabelecido com um indivíduo que conhecem como DD, com a alcunha “o Piolho”, também residente na área geográfica de Pontinha, deslocaram-se de Portugal para Marrocos, no veículo automóvel de marca Opel, modelo Astra, com matrícula ...-FB, pertencente a AA, com o intuito de ingerirem e transportarem nos respetivos aparelhos digestivos, canabis (resina), acondicionada em embalagens com forma de bolota, que entregariam ao dito DD depois do regresso a Portugal, recebendo cada um deles, por tal transporte, uma remuneração, à razão de € 1.00, por cada grama de produto estupefaciente.

2- Ao arguido AA, foi entregue, pelo dito indivíduo, o montante de € 600,00, para despesas relacionadas com o combustível e alimentação de todos os arguidos, bem como um telemóvel, de cor branca, com os contatos do indivíduo que os deveria receber em Marrocos.

3- Chegados a este país utilizaram o dito telemóvel para contatar um indivíduo, cuja identidade desconhecem, e que os transportou para uma casa no interior da qual foi posteriormente entregue, a cada um dos arguidos, um saco contendo as embalagens com o formato de bolotas que deveriam respetivamente engolir, o que fizeram.

4- No dia 30 de setembro de 2015, pelas 02h30m, os arguidos circulavam pela A6, Caia, em Elvas, sentido Espanha-Portugal, fazendo-se transportar no sobredito veículo automóvel de marca, detendo no interior dos respetivos organismos:

a. O arguido AA:  

i. 65 embalagens em forma de bolotas, contendo produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 562,500 gramas, grau de pureza de 30,7%, e  suficiente para 3191 doses individuais;

ii. 1 embalagem em forma de bolota, contendo produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 8,7 gramas, grau de pureza de 26,8%, suficiente para 42 doses diárias individuais, e que foi expelida no Hospital Prisional de Caxias, em 02 de Outubro de 2015, pelas 21h45m;

b. O arguido BB: um total de 116 embalagens em forma de bolota, contendo um produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 1009,400 gramas, grau de pureza de 30,9%, suficiente para 5720 doses individuais;

c. O arguido CC: um total de 112 embalagens em forma de bolota, contendo um produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 841,200 gramas, grau de pureza de 29,4%, suficiente para 4539 doses individuais.

5- Naquelas exatas circunstâncias:

a. o arguido CC detinha na sua posse uma máquina fotográfica de marca Canon, modelo Powershot SD 780IS, um telemóvel da marca MEO, modelo BL-C008B, duas notas do BCE, com o valor facial de € 20,00, e duas notas do BCE com o valor facial de € 5,00;

b. o arguido BB detinha na sua posse uma máquina fotográfica de marca Casio, modelo Exilim EX-Z35 e um telemóvel marca Samsung, modelo GT-E1050;

c. O arguido AA detinha na sua posse uma nota do BCE, com o valor facial de € 10,00, um telemóvel da marca Samsung, modelo Galaxy S4, de cor preto, IMEI 35584606230615101 e respetiva capa, um telemóvel da marca Samsung, modelo GTE 1200, cor branca, IMEI 359076056908590, e dois envelopes almofadados e um selo de correio espanhol, no valor de 0,90€.

6- O arguido CC requereu a emissão de passaporte para poder efetuar a referida deslocação a Marrocos, o qual foi emitido em 16 de Setembro de 2015, com o nº N876211, tendo os respetivos custos de emissão sido suportados pelo dito indivíduo chamado DD.

7- Também para o efeito de se deslocarem a Marrocos e propositadamente para realizarem o transporte de produto estupefaciente nos termos atrás descritos, os arguidos AA e BB, decidiram, ainda em Portugal, solicitar a emissão de novos passaportes, designadamente:

a. Em 14 de Setembro de 2015, foi emitido o passaporte nº 872714, em nome do arguido AA, existindo um histórico de 4 passaportes anteriormente emitidos, um dos quais foi anteriormente declarado extraviado pelo arguido e outro, declarado inutilizado;

b. Em 25 de Setembro de 2015, foi emitido o passaporte nº N897909, em nome do arguido BB, existindo um histórico de 2 passaportes anteriormente emitidos, ambos declarados extraviados pelo arguido.

8- Para realização de transporte de produto estupefaciente nos exatos moldes atrás descritos, o arguido BB deslocou-se a Marrocos nos meses de fevereiro, maio, e no início do mês de setembro, todos do ano de 2015.

9- O arguido BB era consumidor de cocaína - para além doutros produtos estupefacientes – e mantinha uma dívida relacionada com a aquisição de estupefacientes para com o dito DD. Do valor correspondente à quantidade de produto estupefaciente que transportava no interior do organismo, parte dele era destinado à liquidação da referida dívida e para além de produto estupefaciente, o referido DD entregava-lhe, ainda, quantias monetárias variáveis e não concretamente determinadas.  

10- Antes do regresso a Portugal, em Espanha, e com vista à não deteção pelas autoridades policiais, os arguidos expediram os respetivos passaportes por correio, para Portugal, para morada não concretamente determinada.

11- Os arguidos AA, BB e CC previram e quiseram receber, deter e transportar nos termos atrás descritos, canabis (resina), conhecendo os princípios ativos desta substância, bem como as suas características químicas e psicotrópicas, sabendo que tal atividade lhes estava legalmente vedada, e, não obstante, quiseram atuar da forma supra descrita, com o propósito de auferirem vantagem económica.

12- Os arguidos agiram de forma livre, deliberada e consciente.

Mais se provou que:

13- O arguido AA, natural de ..., é o mais velho de três irmãos. Desenvolveu-se num agregado familiar normativo, onde existiam regras e limites, com reconhecimento da autoridade parental. O progenitor é engenheiro mecânico e a progenitora funcionária pública. Os pais do arguido divorciaram-se, tinha este 10 anos de idade, período em que AA veio para Portugal residir com os avós maternos, tendo a progenitora vindo um ano mais tarde. O progenitor passou a residir em Angola, onde permaneceu até aos 27 anos do arguido.

14- AA iniciou a escolaridade em idade adequada tendo frequentado com 18 anos, o 11º ano, que não concluiu, abandonando a escola por vontade própria.

15- Iniciou o consumo de estupefacientes com 14 anos de idade, consumo que se foi intensificando ao longo do tempo, passando a consumir drogas pesadas a que juntou o consumo de bebidas alcoólicas. Sujeitou-se a vários tratamentos, com internamento em clinica, seguidos de várias recaídas.

16- Aos 18 anos autonomizou-se, passando a residir sozinho, no Alentejo Litoral. Trabalhou num bar, onde permaneceu durante cerca de dois anos, ingressando de seguida no serviço militar obrigatório. A sua atração por motores levou-o a frequentar e concluir com sucesso uma formação profissional - “Serralheiro de Tubos”, na ..., passando a exercer atividade nesta área, naquela instituição, que abandonou por motivos de saúde, cerca de dois anos mais tarde. Posteriormente passou a trabalhar como repositor nas grandes superfícies, com contratos de 6 meses e paralelamente, sempre que lhe era possível, trabalhava em bares. Estes trabalhos foram desenvolvidos de forma esporádica, com pouco investimento por parte do arguido.

17- Durante este percurso AA manteve uma situação económica estável.

18- Constituiu família com 30 anos, tendo deste relacionamento uma filha, atualmente com 19 anos, que se encontra autónoma.

19- Contraiu matrimónio aos 42 anos, cujo relacionamento marital lhe terá dado alguma estabilidade. Desde relacionamento tem mais uma filha.

20- O arguido, apesar de manter o tratamento ao seu problema aditivo no CRI, não conseguiu ultrapassar o consumo de estupefacientes e os hábitos etílicos.

21- À data da detenção, o arguido AA residia com a mulher, a filha comum, de 5 anos, e as duas enteadas com 18 e 12 anos de idade, em casa arrendada, com condições de habitabilidade e pela qual pagam € 350,00 mensais. O arguido encontrava-se a desenvolver atividade laboral na área de limpezas de veículos, empresa que herdou do progenitor, trabalhando em parceria com um familiar, que fornecia os produtos de limpeza. Não auferia rendimento certo, variando entre € 1.000,00 a € 1.500,00 mensais. A mulher trabalha na área da segurança, atividade que desenvolve no consolado de Angola, auferindo cerca de € 1.100,00/mês.

22- A situação económica apresentava algumas fragilidades, uma vez que o arguido tinha cada vez menos clientes e a mulher encontra-se a pagar um crédito efetuado pela sua filha mais velha (de quem foi fiadora), no valor de € 200,00 mensais.

23- O casal mantém um relacionamento afetivo e de apoio mútuo. E embora a mulher se encontre dececionada com toda a situação, mantém o seu apoio, com esperança que o arguido, com o avançar da idade, venha a mudar de atitude, revelando alguma ansiedade pela atual situação jurídico-penal daquele.

24- AA apresenta fracas competências sociais e laborais, com alguma incoerência face ao que pensa e ao que faz, o que interfere no seu processo de mudança. A ocupação do arguido, em tempos livres, não incluía atividades organizadas, não conseguindo o mesmo fazer uma boa utilização do tempo.

25- No decurso da prisão preventiva, o arguido revela dificuldades no cumprimento das normas institucionais. Foi objeto de dois processos disciplinares, por consumo de estupefacientes e por posse de telemóvel, medidas que cumpriu em sela disciplinar.

26- AA pretende fazer exame – destinado a maiores de 23 anos – para ingressar na universidade.

27- BB é o mais novo de quatro irmãos consanguíneos. Quando nasceu, o progenitor encontrava-se detido em Espanha e a progenitora, toxicodependente, entregou-o, com dois meses, aos cuidados de uma tia materna para ir ter com o companheiro, onde permaneceu durante vários meses. O arguido continuou aos cuidados da tia que fez questão de assegurar a sua educação, mesmo após o regresso da progenitora, uma vez que aquela continuava a consumir estupefacientes. Assim, BB foi educado pelos tios maternos, que se assumiram como as figuras parentais de referência.

28- A situação socioeconómica era frágil.

29- O arguido teve uma boa infância e adolescência, pautada por um ambiente familiar normativo onde imperavam as regras e os limites, que respeitava. A sua socialização foi, assim, efetuada num ambiente estruturador até aos 16 anos de idade. O tio é talhante e a tia empregada doméstica.

30- O seu percurso escolar caraterizou-se por reduzido interesse pelas atividades letivas e fracas competências, não tendo concluído o 6º ano, que frequentou já com 15 anos de idade, depois de várias retenções por absentismo.

31- Aos 16 anos de idade, iniciou atividade laboral, na área da construção civil, que manteve durante cerca de um ano. Entretanto a progenitora residia com um tio, na mesma área de residência, tendo sido incluída no programa da metadona e BB que começava a desejar ‘outra liberdade’, foi residir com a progenitora, que não lhe impunha regras nem limites.

32- Iniciou o consumo de haxixe em idade precoce, passando por volta dos 18 anos a consumir cocaína, em período coincidente com a morte da progenitora. Entrou, então, numa escalada ‘destrutiva’, invertendo os sonos, passando a viver ‘na noite’ e, trabalhando apenas quando necessitava de dinheiro para satisfazer os seus consumos.

33- A sua experiência laboral é pouco expressiva e restringe-se à área da construção civil e da restauração, trajeto que se pautou pela irregularidade e inconsistência, não possuindo competências profissionais significativas.

34- À data da detenção BB encontrava-se maioritariamente inativo. Residia com um tio materno, em casa arrendada, situada em bairro social, pela qual pagam € 2,00 mensais e que dispõe de condições de habitabilidade. As despesas domésticas eram suportadas por ambos.

35- O tio, pintor na área da construção civil, trabalha de forma esporádica, pelo que os rendimentos são escassos. BB mantinha um estilo de vida socialmente desvinculado, sem rotinas organizadas, sem participação em atividades estruturadas e sem contacto regular com estruturas socializadoras como as entidades laborais ou as estruturas locais.

36- Apresenta reduzidas competências pessoais, sociais e laborais, revelando fraca resistência à frustração, centrando as suas prioridades no imediato.

37- Embora os tios que educaram BB, bem como os primos, se encontrem desapontados com a sua situação jurídico-penal, mantêm-se apoiantes, aos vários níveis, revelando alguma ansiedade, mostrando-se determinados em voltar a receber o arguido.

38- No Estabelecimento Prisional tem a decorrer um processo disciplinar, por posse de telemóvel. Recebe visitas dos tios e dos primos.

39- CC é o mais velho de dois irmãos germanos. Tem  ainda dois irmãos uterinos mais velhos, sendo oriundo de um agregado familiar de condição socioeconómica difícil.

40- Da sua infância e adolescência retém episódios de violência verbal por parte do progenitor, com frequência alcoolizado, e das dificuldades económicas. A sua socialização foi, assim, efetuada num ambiente pouco estruturador e permissivo.

41- O seu percurso escolar caraterizou-se por reduzido interesse pelas atividades letivas e fracas competências, tendo concluído o 4º ano, aos 17 anos de idade, após várias retenções, revelando limitações ao nível da aprendizagem. É também com 17 anos, que influenciado pelo grupo de pares, iniciou o consumo de bebidas alcoólicas e haxixe.

42- Com 21 anos de idade e através das redes sociais conheceu uma rapariga, com quem posteriormente passou a residir na cidade da Guarda, localidade de origem da mesma e onde foi acolhido pelos progenitores da jovem, tendo aí permanecido cerca de um ano.

43- A sua experiência laboral restringe-se a trabalho como ajudante de pedreiro e atividades sazonais no setor da agricultura, algumas das quais desenvolvidas em França e de forma mais regular, auferindo, então, cerca de € 750,00. Não obstante, o seu trajeto profissional tem sido pautado pela irregularidade e inconsistência, não possuindo competências profissionais significativas.

44- À data da detenção, CC encontrava-se desempregado. Tinha regressado de França em finais de Julho e não conseguiu integrar a campanha agrícola seguinte.

45- Residia com os progenitores em casa arrendada, situada em bairro social, pela qual pagam € 4,00 mensais. O progenitor, pedreiro de profissão encontra-se desempregado e a progenitora é reformada por invalidez, auferindo cerca de € 200,00 mensais. O irmão mais novo encontra-se atualmente a trabalhar, contribuindo para as despesas diárias. A situação económica é precária.

46- CC mantinha um estilo de vida socialmente desvinculado, sem rotinas organizadas, sem participação em atividades estruturadas e sem contacto regular com estruturas socializadoras como as entidades laborais ou as estruturas locais.

47- Apresenta reduzidas competências pessoais e sociais, com acentuadas dificuldades ao nível do relacionamento interpessoal, da comunicação eficaz e do estabelecimento de relações empáticas.

48- Em contexto económico mantém o apoio dos progenitores, apesar da situação deficitária em que vivem.

49- No Estabelecimento Prisional mantém uma postura adequada às normas institucionais. Não recebeu visitas até hoje, aparentemente devido às dificuldades económicas do agregado.

50- A presente situação de reclusão produziu algum impacto junto dos familiares mais próximos, que se mantêm apoiantes, porém com ausência de censura. No meio sócio residencial, não existem constrangimentos ou fatores impeditivos ao seu regresso, uma vez que o agregado se havia mudado pouco antes de o arguido ser detido.

51- O arguido AA tem inscritas no seu certificado de registo criminal, as seguintes condenações:

- No âmbito do Processo Comum Coletivo que correu termos sob o nº 30/01.5GALNH, do extinto Tribunal Judicial da Comarca da Lourinhã, por acórdão proferido em 14 de abril de 2005, transitado em julgado em 2 de maio de 2005, o arguido foi condenado por um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21º, nº 1 e 24º, als. b), e c), do DL 15/93 de 22 de janeiro, praticado em 8 de agosto de 2001, na pena de 9 anos de prisão; e por um crime de detenção ou tráfico de armas proibidas, p. e p. pelo art. 275º, nºs 1, e 3, do Código Penal, praticado em 8 de agosto de 2002, na pena de 10 meses de prisão. Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de 9 anos e 4 meses de prisão, já extinta por cumprimento (com efeitos a partir de 7 de março de 2011).  

52- O arguido BB não tem antecedentes criminais.

53- O arguido CC tem inscritas no seu certificado de registo criminal, as seguintes condenações:

- No âmbito do Processo Comum Singular que correu termos sob o nº 515/09.5PVLSB, do extinto 5º Juízo Criminal – 3ª Secção do Tribunal Judicial de Lisboa, por sentença proferida em 19 de abril de 2010, transitada em julgado em 19 de maio de 2010, o arguido foi condenado por um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1, do Código Penal, praticado em 27 de maio de 2009, na pena de 1 ano de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período de tempo, mostrando-se já extinta.

*

2. Factos não provados:

«Não se lograram provar quaisquer outros factos com interesse para a decisão da causa, designadamente, que:

A) Em data não concretamente apurada, mas pelo menos desde 01 de janeiro de 2015, os arguidos AA e BB decidiram dedicar-se à comercialização de produtos estupefacientes e deslocar-se de Portugal a Marrocos, propositadamente para adquirir cannabis e seguidamente revender tal produto estupefaciente em Portugal, a qualquer indivíduo que os procurasse para esse efeito na região da Grande Lisboa, designadamente na Pontinha, mediante a cobrança de um preço superior ao despendido na respetiva aquisição, como forma de obterem os proventos de que necessitavam para se proporcionarem melhores condições de vida.

B) Em execução desse propósito, os arguidos AA e BB contataram indivíduos desconhecidos, com as alcunhas de Incha, Catu ou Alish, cujos elementos de identificação não foram concretamente apurados, em Marrocos, para adquirir esses estupefacientes, designadamente haxixe, em grandes quantidades.

C) E, em execução de tal desígnio, o arguido BB, no ano de 2015, em datas não concretamente apuradas, deslocou-se a Marrocos um total de 3 vezes distintas, propositadamente para adquirir cannabis e seguidamente revender tal produto estupefaciente em Portugal, a qualquer indivíduo que o procurasse para esse efeito na região da Grande Lisboa, mediante a cobrança de um preço superior ao despendido na respetiva aquisição, como forma de obter os proventos de que necessitava para se proporcionar melhores condições de vida.

D) Também em execução de tal desígnio, o arguido AA, no ano de 2015, em datas não concretamente apuradas, mas entre Julho e Maio, deslocou-se a Marrocos um total de 2 vezes distintas, propositadamente para adquirir e transportar cannabis e seguidamente revender tal produto estupefaciente em Portugal, a qualquer indivíduo que os procurasse para esse efeito na região da Grande Lisboa, mediante a cobrança de um preço superior ao despendido na respetiva aquisição, como forma de obter os proventos de que necessitava para se proporcionar melhores condições de vida.

E) Em data não concretamente apurada, mas seguramente entre 01 e 25 de setembro de 2015, os arguidos AA, BB e CC decidiram, de comum acordo e em conjugação de esforços e intentos, dedicar-se à comercialização de produtos estupefacientes e deslocar-se de Portugal a Marrocos, propositadamente para adquirir cannabis e seguidamente revender tal produto estupefaciente em Portugal, a qualquer indivíduo que os procurasse para esse efeito na região da Grande Lisboa, designadamente na Pontinha, mediante a cobrança de um preço superior ao despendido na respetiva aquisição, como forma de obterem os proventos de que necessitavam para se proporcionarem melhores condições de vida e lucros avultados.

F) Em execução desse propósito, os arguidos AA, BB e CC contataram indivíduos desconhecidos, com as alcunhas de Incha, Catu ou Alish, cujos elementos de identificação não foram concretamente apurados, em Rife, Marrocos, para adquirir esses estupefacientes, designadamente haxixe, em grandes quantidades.

G) Os arguidos adquiriram em Marrocos, por montante não concretamente apurado e a indivíduos não concretamente identificados, um total de 294 bolotas de cannabis (resina).

H) O produto apreendido aos arguidos no dia 30 de setembro de 2015, era da sua propriedade e destinava-se a ser posteriormente pelos mesmos vendido a um número elevado e indeterminado de consumidores que os procurassem para esse efeito, na região da Grande Lisboa, designadamente na Pontinha, vendendo as embalagens individuais por um preço superior àquele que pagaram pela cannabis, assim obtendo o respetivo lucro.

I) Os arguidos AA, BB e CC previram e quiseram vender, ceder ou disponibilizar a elevado número de pessoas canabis, em execução do plano previamente delineado, procurando obter avultados lucros, com o propósito de auferir avultada vantagem económica, o que representaram.»

***

B. Fundamentação de direito

Constitui jurisprudência assente que, de harmonia com o disposto no n.º 1 do art. 412.º do Código de Processo Penal e sem prejuízo para a apreciação das questões de oficioso conhecimento, o objecto do recurso define-se e delimita-se  pelo teor das conclusões que o recorrente extrai da correspondente motivação.

Assim, a esta luz, as questões a decidir são as seguintes:

A. Quanto ao recurso do arguido, BB:

I. Aplicação do regime especial de jovens adultos, aprovado pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro.

II. Medida da pena

***

B. Quanto ao recurso do arguido, AA:

I. Medida da pena.

II. Se há lugar à restituição do telemóvel e dos documentos pessoais.

***

8. Apreciando o recurso interposto pelo arguido BB, sustenta o mesmo haver lugar à atenuação especial da pena, por efeito da aplicação do regime penal especial para jovens, na sequência do que ( apesar de não o dizer expressamente, mas resultar claro das suas conclusões) pretende a aplicação de uma pena em medida inferior à de 5 anos e 6 meses que lhe foi aplicada.

8.1. Antes, porém, de entrarmos na apreciação do objecto do recurso, cumpre decidir a:

Questão prévia suscitada pela Exmª Srª Procuradora-Geral Adjunta, a qual decorre da circunstância de o tribunal recorrido, pese embora a idade do arguido  à data dos factos – 20 anos - não ter equacionado a possibilidade de aplicação do regime penal especial de jovens adultos, aprovado pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro, omissão consubstanciadora de nulidade.

Vejamos.

O Tribunal Coletivo da Instância Central, Secção Cível e Criminal-J1, da Comarca de Portalegre, por Acórdão de 24.05.2016,  condenou o arguido, BB, como autor material dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21°,  n° 1, do Dec-Lei n° 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa a este diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Deste  acórdão, verifica-se que o arguido BB nasceu  no dia  ... de 1994 e que os factos integradores do referido crime  ocorreram  nos dias 26 e 30 de Setembro de 2015, pelo que aquando da prática do referido crime, este arguido tinha  20 anos de idade.  

O Código Penal, ao determinar, no seu art. 9º,  que «Aos maiores de 16  e menores de 21 são aplicáveis normas fixadas em legislação especial», ditou a criação de um regime penal próprio para os jovens adultos, que foi instituído pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro.

Trata-se, como se refere no ponto 4 do respectivo preâmbulo, de «instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção».

Isto porque o crescente  fenómeno social  da delinquência de jovens adultos e de jovens na fase de transição para a idade adulta, tornou o legislador  muito consciente de que a aplicação de soluções diferenciadas aos jovens, embora penalmente imputáveis, como que numa transição entre o direito dos menores e o dos adultos, poderia representar a diferença entre a educação para o direito e o início de uma vida de delinquência.

E ainda porque, face ao caráter, na maior parte  dos casos, efémero e  transitório da delinquência juvenil[2], à comprovada natureza criminógenea da prisão e aos  seus efeitos dessocializantes e estigmatizantes, o legislador quis evitar, tanto quanto possível, a aplicação de penas de prisão aos jovens adultos, impondo a atenuação especial sempre que se verifiquem as condições prognósticas previstas no artigo 4º do referido diploma legal.

Assim, neste quadro de opção fundamental de política criminal, estabelece o artº 4° do referido DL 401/82, de 23.09, que «Se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artº 73° e 74° do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado».

Em torno desta norma, que, no dizer do Acórdão do STJ, de 13.07.2005 ( proc. 2122/05-3ª Sec. ), « configura um fundamento autónomo de atenuação especial da pena directamente fundado na idade do agente  e no juízo de prognose favorável quanto  ao desempenho da personalidade, não remetendo para os pressupostos da atenuação especial do artigo 72º do Código Penal», a jurisprudência deste Supremo Tribunal[3]  alcançou a unanimidade quanto aos seguintes aspectos:

- A aplicação do regime do artigo 4º do DL 401/82, de 23.09, não opera automaticamente em função da idade do agente, devendo, antes, ser averiguada casuisticamente  ( Acórdão do STJ, de 01.03.1990, BMJ, nº395º, pág. 210) e havendo necessidade de fazer um prognóstico favorável acerca do carácter evolutivo e da capacidade de ressocialização ( Acórdão do STJ, de 12.06.1997,  proc. 209/97-3ª Sec, BMJ nº 468, pág. 116).

-  O tribunal não é livre de atenuar, ou não, especialmente a pena de prisão, quando o indivíduo julgado e condenado em pena de prisão tenha idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, na medida em que  o que está consagrado no citado artigo 4º é um poder/dever ou um poder vinculado,  que o juiz tem de usar  sempre que se verifiquem  os respectivos pressupostos, sendo a aplicação, em tais circunstâncias, obrigatória e oficiosa ( Acórdão do STJ, de 28.11.2002,   proc. 3110/01, www.dgsi.pt).

- No juízo de prognose positiva  imposto pelo regime do citado artigo deve considerar-se tanto a globalidade da actuação do jovem, como a sua situação pessoal e social, o que implica o conhecimento da sua personalidade, das suas condições pessoais, da sua conduta anterior e posterior ao crime ( cfr., entre muitos outros, os Acórdãos do STJ de 12.01.2000, proc. 829/99-3ª Sec, CJSTJ 2000, tomo I, pág. 163; de 14.02.2002, proc. 4438/01-5ª Sec. , CJSTJ, 2002, tomo I, pág. 213; de 11.06.2003, proc. 1657/03-3ª Sec., www.dgsi.pt; de 29.04.04, proc. 1679/04-5ªSec., CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 177).

- É obrigatório o dever de fundamentação relativamente à não aplicação do regime  de atenuação especial previsto no artigo 4º do DL 401/82, de 23.09 ( Cfr., entre muitos outros, o Acórdão do STJ de 28.10.1998, proc. 887/98-3ª Sec, BMJ nº 480, pág. 83).

Temos, assim, como certo  estar imposto ao juiz  o dever de, na decisão, indagar da pertinência ou inconveniência da aplicação  do regime para jovens, previsto pelo Decreto Lei nº 401/82 de 23 de Setembro e de fundamentar a sua opção, ainda que o julgue inaplicável, razão pela qual o tribunal a quo estava obrigado a pronunciar-se sobre se era de aplicar, ou não, ao arguido ..., o regime da atenuação especial da pena previsto no artigo 4º do referido DL 401/82.

A verdade é que, no caso presente,  o tribunal  colectivo não ponderou, no acórdão recorrido, essa possibilidade,  deixando, por isso, de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, por ser de conhecimento oficioso.

Conclui-se, assim,  que o acórdão impugnado enferma, nesta parte, da nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, alínea c), do C.P. Penal, nulidade  que pode ser conhecida oficiosamente  em recurso, nos termos do nº 2 deste mesmo artigo e do art. 425º, nº4, também do CPP.

É que este nº 2, aditado ao citado art. 379º pela revisão introduzida pela Lei nº 59/98, de 25.08, para além de consagrar na lei o entendimento jurisprudencial expresso no Acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ, nº 1/94[4] (de que as nulidades da sentença enumeradas no nº1 desse artigo não têm de ser arguidas necessariamente nos termos estabelecidos na al. a) do nº3 do art. 120º do CPP, podendo sê-lo em motivação de recurso para o tribunal superior),  com a expressão «ou conhecidas em recurso», veio impor, a partir de então, o conhecimento de tais nulidades pelo tribunal ad quem, independentemente de arguição[5].

Deste modo, seguindo-se este entendimento pacífico do S.T.J, impõe-se, nos termos do  nº2 do citado artigo 379º, declarar nulo, nesta parte, o acórdão recorrido, por omissão de pronúncia sobre a questão da possibilidade de aplicação do regime da atenuação especial da pena previsto no artigo 4º do referido DL 401/82 ao arguido ... .

*

Mais controversa  é  a questão de  saber  se esta nulidade pode ser suprida por este tribunal de revista, em substituição do tribunal recorrido.

A este respeito, vinha o STJ  a entender, de forma maioritária[6], que, tratando-se de omissão de pronúncia, o tribunal de revista não podia substituir-se ao tribunal recorrido e suprir a nulidade, devendo, por isso, mandar baixar o processo a fim de se fazer a reforma da decisão anulada, pelos mesmos juízes quando possível, nos termos do disposto no art. 731º, n2º do CPP, pois de outra forma subtrair-se-ia o único grau de recurso ao dispor do arguido, violando-se a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição ( art. 32º da CRP).   

Julgamos, porém, tal como escreve o Conselheiro Oliveira Mendes, na anotação 4 ao artigo 379º do CPP[7], que « por efeito da alteração introduzida ao texto do nº2 pela lei nº 20/2013, de 21 de Fevereiro, passou a constituir um dever do tribunal de recurso o suprimento das nulidades da sentença recorrida ( é o que decorre da actual letra da lei «as nulidades da sentença devem  ser arguidas ou conhecidas em recurso, devendo o tribunal supri-las…») , razão pela qual sobre o tribunal de recurso impende a obrigação de suprir as nulidades de que padeça a sentença recorrida, a menos, obviamente, que a nulidade só seja susceptível de suprimento pelo tribunal recorrido».
Na verdade, basta comparar a redação atual do nº2 do citado  art. 379º dada pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro, com  a redação originária dada  ao mesmo número pela Lei nº 59/98, de 25 de agosto, para facilmente se constatar que, enquanto esta  refere «sendo lícito ao tribunal supri-las», a atual redação refere « devendo o tribunal supri-las» (sublinhado nosso), o que, atento até o disposto no art. 9º, nº3 do C. Civil[8], significa que o legislador de 2013,  não só teve a intenção clara de afastar a natureza não vinculada do poder/dever contido na redacção primitiva do referido nº2, como quis tornar esse poder/dever vinculado, impondo, deste modo, ao  tribunal de recurso a obrigação de suprir tais nulidades, com exceção dos casos em que as  mesmas só sejam passíveis de ser supridas pelo tribunal recorrido.   
De realçar ser esta a solução  mais adequada ao nosso sistema processual penal  de recurso que, como é consabido, segue, essencialmente, o modelo de substituição ( e não de cassação), embora com limitações.
Deste modo, com exceção  dos casos em que isso não for possível, designadamente por insuficiência de matéria factual, o tribunal de recurso, se o acolher, substitui a decisão por aquela que considere ser a legal.
Daí que, na mesma linha de posicionamento do  Acórdão do STJ de 04.06.2014 ( relatado pelo Conselheiro Oliveira Mendes no Proc nº 262/13.3PVLSB.L1.S1-3ª Sec.), se entenda que, dispondo os autos de todos os elementos necessários à decisão da eventual aplicação do regime penal especial para jovens,  a nulidade cometida pelo tribunal recorrido  pode e deve ser suprida por este Supremo Tribunal.
Assim, suprindo a denunciada nulidade e  tendo em conta que o arguido Gonçalo Inácio está, objectivamente, em condições de beneficiar do regime em causa, visto ter  20 anos de idade à data da prática dos factos e o crime, por cuja prática foi condenado,  admitir apenas a aplicação da pena de prisão,  impõe-se, desde logo, tal como determina o artigo 4º do referido DL 401/82, averiguar se há razões « sérias para crer que da atenuação especial da pena resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado», devendo, na formulação deste juízo de prognose favorável à sua reinserção, atender-se às circunstâncias do crime, aos traços essenciais da personalidade em formação do jovem condenado, à sua conduta anterior e posterior ao crime, às suas condições de vida e à sua situação familiar, educacional  e profissional, com vista a avaliar se o mesmo é, ou não, sensível à aceitação dos valores tutelados pelo direito penal.
E, por outro lado, indagar se, com a atenuação especial da pena, ficam, ou não,  satisfeitas  as exigências de prevenção geral da criminalidade, pois é esse o sentido que emerge, desde logo, da circunstância da “defesa de bens jurídicos” constituir, em si mesma, o desiderato de todo o sistema repressivo penal, globalmente considerado e é esse o sentido que se retira do nº 7 do preâmbulo do DL nº 401/82, de 23 de Setembro ao estabelecer que «As medidas propostas não afastam a aplicação - como última ratio – da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade e esse será o caso de a pena aplicada[9] ser a de prisão superior a 2 anos».
Daqui decorre, por um lado, que será sempre dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva que deverá formular-se o juízo de prognose favorável à reintegração social do jovem condenado. Trata-se, no dizer do  Acórdão do STJ, de 12.02.2004[10],  de erigir, como última barreira, a defesa da ordem jurídica, que, em caso algum, pode ser ultrapassada.
E, por outro lado,  que, em caso de  conflito concreto entre exigências de prevenção geral e o  formulado juízo de prognose favorável e de absoluta incompatibilidade entre eles, as exigências (mínimas) de prevenção geral, funcionam como limite à consideração das especiais vantagens que da atenuação especial da pena pudessem eventualmente resultar  para a reintegração social do jovem condenado.
Assente que o juízo sobre as sérias vantagens para a reinserção social do jovem condenado  tem de se fundar em factos concretos que apontem  nesse sentido e no da satisfação das exigências da prevenção geral, impõe-se, ante os factos  dados como provados, ponderar:
- o facto do arguido ter apenas 20 anos de idade, à data da prática dos factos, não ter antecedentes criminais e ter confessado os factos.
- a sua atuação como “correio” de droga, transportando de Marrocos para Portugal, no interior do seu aparelho digestivo, 116 embalagens em forma de bolota, contendo um produto cuja substância ativa era cannabis (resina) com o peso bruto de 1009,400 gramas, grau de pureza de 30,9%, suficiente para 5720 doses individuais, que, em Portugal, entregaria a um indivíduo chamado DD, a troco de uma remuneração, à razão de € 1,00, por cada grama de produto estupefaciente;
- o facto de ser consumidor de cocaína - para além doutros produtos estupefacientes – e manter uma dívida relacionada com a aquisição de estupefacientes para com o dito DD, sendo que, parte do valor correspondente à remuneração da quantidade de produto estupefaciente que transportava no interior do organismo era destinado à liquidação da referida dívida e que, para além de produto estupefaciente, o referido DD entregava-lhe, ainda, quantias monetárias variáveis e não concretamente determinadas;
- para o efeito de se deslocar a Marrocos e propositadamente para realizar o transporte de produto estupefacientes, o arguido, decidiu, ainda em Portugal, solicitar a emissão de novos passaporte;
- em 25 de Setembro de 2015, foi emitido o passaporte nº N897909, em nome do arguido Gonçalo Inácio, existindo um histórico de 2 passaportes anteriormente emitidos, ambos declarados extraviados pelo arguido; antes do regresso a Portugal, em Espanha, e com vista à não deteção pelas autoridades policiais, o arguido expediu o respectivo passaporte  por correio, para Portugal, para morada não concretamente determinada;
- para realização de transporte de produto estupefaciente nos exatos moldes descritos, o arguido deslocou-se a Marrocos nos meses de fevereiro, maio e no início do mês de Setembro, todos do ano de 2015.
E, na perspectiva da formação da  sua personalidade, das suas condições de vida e da sua sensibilidade, ou não, para a  aceitação dos valores tutelados pelo direito penal, importa ainda ter presente que:
- o arguido  foi, até aos 16 anos,  educado pelos tios maternos, que se assumiram como as figuras parentais de referência e lhe proporcionaram um ambiente familiar estruturador e  normativo onde imperavam as regras e os limites, que respeitava, o seu percurso escolar caracterizou-se por reduzido interesse pelas actividades letivas e fracas competências, não tendo concluído o 6º ano, que frequentou já com 15 anos de idade, depois de várias retenções por absentismo;
- aos 16 anos de idade, iniciou actividade laboral, na área da construção civil, que manteve durante cerca de um ano; por começar a desejar “outra liberdade”, foi residir com a progenitora que, na altura estava incluída num programa de metadona, e que não lhe impunha regras nem limites;
- iniciou o consumo de haxixe em idade precoce, passando por volta dos 18 anos a consumir cocaína, em período coincidente com a morte da progenitora. Entrou, então, numa escalada ‘destrutiva’, invertendo os sonos, passando a viver ‘na noite’ e, trabalhando apenas quando necessitava de dinheiro para satisfazer os seus consumos;
- a sua experiência laboral é pouco expressiva e restringe-se à área da construção civil e da restauração, trajeto que se pautou pela irregularidade e inconsistência, não possuindo competências profissionais significativas; à data da detenção BB encontrava-se maioritariamente inactivo;
- residia com um tio materno, em casa arrendada, situada em bairro social, pela qual pagam € 2,00 mensais e que dispõe de condições de habitabilidade;
- as despesas domésticas eram suportadas por ambos;
- o tio, pintor na área da construção civil, trabalha de forma esporádica, pelo que os rendimentos são escassos;
- o BB mantinha um estilo de vida socialmente desvinculado, sem rotinas organizadas, sem participação em atividades estruturadas e sem contacto regular com estruturas socializadoras como as entidades laborais ou as estruturas locais;
- apresenta reduzidas competências pessoais, sociais e laborais, revelando fraca resistência à frustração, centrando as suas prioridades no imediato.
Perante este quadro factual  e porque, no caso  vertente estamos perante, a prática pelo arguido de um crime de tráfico de estupefacientes previsto pelo art. 21º do DL nº 15/93, diremos que, para além da  gravidade intrínseca deste crime,  punido com pena de 4 a 12 anos de prisão,  a actividade do arguido como “correio” de droga é particularmente grave, não só porque  foi planeada e programada, visando a importação de Marrocos para Portugal de relevante quantidade de produto estupefaciente, mas, sobretudo, porque o arguido  demonstrou ter uma personalidade reveladora de grande desvio de valores,  aberta à pratica de acto que todos sabem ser objecto de grande censura social e legal e já com considerável determinação e disponibilidade para  correr riscos (designadamente fazendo perigar a sua  própria vida com a ingestão destas embalagens), com vista a obter os ganhos e vantagens que procurava, o que associado ao abandono escolar precoce, à recusa em assumir responsabilidades, designadamente através do exercício de uma actividade profissional,  à adoção de um estilo de vida ocioso e desregrado e ao consumo de estupefacientes, apontam no sentido de uma acrescida necessidade de prevenção especial, não se afigurando, por isso, existirem sérias razões para acreditar que da atenuação especial da pena resultem vantagens para a reinserção social do arguido.
Acrescem as fortíssimas exigências de prevenção geral, conhecidos  que são os enormes malefícios do tráfico de droga, para a saúde pública, em geral, e  para a saúde  e liberdade individual dos consumidores, em particular,  afectando a respectiva coesão familiar e social pelo efeito disfuncional e criminógeno que, subsequentemente, desencadeia. A reforçar estas exigências, está ainda o facto de,  no que respeita ao haxixe,  o  tráfico e  toxicodependência, ser, no nosso país, ainda preocupante e de Portugal continuar a ser considerado como uma porta de entrada para o tráfico na Europa.
Por tudo isto, atenta a gravidade do crime e as necessidades de prevenção geral e especial,  afigura-se-nos legítimo concluir  pelo afastamento da aplicação  ao arguido do regime da atenuação especial da pena de prisão previsto no artigo 4º, do DL nº 401/82, de 23 de Setembro.

*

8.2. Medida da pena.

Sindicando,  agora,  a medida concreta da pena aplicada ao arguido, importa começar  por fazer um enquadramento geral da tarefa  a realizar pelo juiz na determinação da pena, no pressuposto irrenunciável, de matriz constitucional,  de que as restrições aos direitos, liberdades e garantias  devem « limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos» ( art. 18º, nº2 da CRP).
Nesta linha, preceitua  o artigo 40º, nº1 do Código Penal, que «a aplicação de penas (…) visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade», estabelecendo o seu n.º2 que « Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».
Com este preceito inovador, introduzido  no Código Penal, pela revisão operada pelo DL nº 48/95, de 15 de março, a pena deixou de ter, como finalidade primária, a retribuição “qua tale” da culpa, passando a servir uma finalidade de prevenção especial ou de socialização, ou ainda, segundo os termos legais, de «reintegração do agente na sociedade» (art. 40.º n.º 1 do CP), enquanto   “a defesa de bens jurídicos”, entendida como prevenção geral, na sua vertente positiva ou de integração, passou a assumir o papel de finalidade mais importante da pena.
À culpa, como expressão da  responsabilidade individual do agente pelo facto e como realidade da consciência social e moral, fundada na existência de liberdade de decisão do ser humano e na vinculação da pessoa a valores juridicamente protegidos e, consequentemente, enquanto fundamento ético da pena, foi dado o papel de limite inultrapassável da medida da pena[11]
Nas palavras de Figueiredo Dias ( in, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas Do Crime”, Editorial de Notícias, págs. 227 e segs), à culpa, na medida em que traduz a vertente pessoal do crime, a marca, documentada no facto, da singular personalidade do agente (com a sua autonomia volitiva e a sua radical liberdade de fazer opções e de escolher determinados caminhos) pede-se que imponha um limite às exigências de prevenção.
Neste sentido é que se diz que a medida da tutela dos bens jurídicos, como finalidade primeira da aplicação da pena, é referenciada por um ponto óptimo, consentido pela culpa, e por um ponto mínimo que ainda seja suportável pela necessidade comunitária de afirmar a validade da norma ou a valência dos bens jurídicos violados com a prática do crime. Entre esses limites devem satisfazer-se, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização».
É neste sentido  que se diz, no artigo 71º, nº1 do C. Penal, que «A determinação da medida da pena « é  feita em  função da culpa do agente e das exigências de prevenção».
E é também neste mesmo sentido que se vem orientando a jurisprudência deste Supremo Tribunal[12], conforme se vê do Acórdão de  04.06.2014 ( Proc. 262/13.3PVLSB.L1.S1-3ª Secção), em que o Conselheiro Oliveira Mendes afirma que « a defesa da ordem  jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, e o máximo, que a culpa do agente consente; entre estes limites, satisfazem-se quando possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização.
Daqui decorre que o juiz pode impor qualquer pena que se situe dentro do limite máximo da culpa, isto é, que não ultrapasse a medida da culpa, elegendo em cada caso aquela pena que se lhe afigure mais conveniente, tendo em vista os fins das penas com apelo primordial à tutela necessária dos bens jurídico-penais do caso concreto, tutela dos bens jurídicos não, obviamente, num sentido retrospectivo, face a um facto já verificado, mas com significado prospectivo, correctamente traduzido pela necessidade de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada; neste sentido sendo uma razoável forma de expressão afirmar-se como finalidade primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime, finalidade que, deste modo, por inteiro se cobre com a ideia de prevenção geral positiva ou de prevenção geral de integração, dando-se assim conteúdo ao exacto princípio da necessidade da pena a que o artigo 18º, n.º 2 da Constituição da República, consagra».
Na determinação concreta da pena, o tribunal atende ainda aos factores indicados no n.º 2 do art. 71.º do CP e (visto que tal enumeração não é exaustiva) a outros que sejam relevantes do ponto de vista da prevenção e da culpa, mas que não façam parte do tipo legal de crime, sob pena de infracção do princípio da proibição da dupla valoração.

*

O acórdão recorrido aplicou ao arguido a pena de  5 anos e 6 meses de prisão, numa moldura que, como já se deixou dito, situa-se entre 4 e 12 anos de prisão.
Como também já se deixou consignado,  o arguido, BB, tinha 20 anos, à data dos factos.
Mas se é certo ter este tribunal entendido que, apesar desta idade, a gravidade dos factos por ele praticados conjugada com  as exigências  de prevenção especial e geral, impedia a aplicação da atenuação especial da pena de prisão prevista no artigo 4º do DL nº401/82, a verdade é que não podemos deixar de ponderar a idade do arguido à data dos factos  como factor atenuativo geral da sua responsabilidade, nem se vê razão para o tribunal recorrido não o ter feito.
De ponderar que, contrariamente ao que o arguido afirma nas suas  conclusões  de recurso, a confissão dos factos só assume relevo relativamente aos factos  supra descritos sob o nº8, não assumindo, quanto aos demais factos dados como provados, porquanto o arguido foi detido em flagrante delito e, como se afirmou no acórdão recorrido « os elementos objetivos de prova  sustentavam, sem necessidade de declarações,  recebimento, detenção e transporte ilícito de substâncias estupefacientes». Também contrariamente ao afirmado pelo arguido, não se provou o  seu alegado arrependimento nem  que o mesmo tenha o propósito de prosseguir com a sua vida de forma autónoma e independente, sem comportamentos ilícitos.
De ponderar  ainda  a intensidade do dolo (direto) bem como tudo o que, a propósito da ilicitude, da culpa (analisada sob o ponto de vista da vontade), das condições pessoais do arguido  e da exigências de prevenção especial e geral se  deixou dito a propósito do afastamento da aplicação ao arguido do regime penal especial para jovens.
Todavia, contrapondo tudo isto, à da idade do arguido, à confissão dos factos e à ausência de antecedentes criminais, afigura-se-nos excessiva a pena aplicada de 5 anos e 6 meses de prisão, considerando-se, antes, que a pena a aplicar  deve situar-se  próximo do limite mínimo estabelecido no art. 21º do DL nº 15/93.
Daí julgarmos adequado  à culpa do arguido e às faladas exigências de prevenção, aplicar-lhe a pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

*

Aqui chegados,  importa ainda  analisar a questão de saber  se o arguido deve, ou não, beneficiar do regime de suspensão de execução da pena, nos termos do  artigo 50º do Cód. Penal, posto que, em conformidade com o mesmo,  a pena de prisão em medida não superior a 5 anos não pode deixar de ser suspensa na sua execução sempre que o tribunal conclua que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
A  pena de prisão suspensa, sujeita ou não a certas condições ou obrigações, é a reação penal por excelência que exprime um juízo de desvalor ético-social e que não só antevê, como propicia ao condenado, a sua reintegração na sociedade, que é um dos vectores dos fins das penas.
Mas, apesar  de não constar do citado artigo 50º, nº1  qualquer referência expressa  às necessidades de reprovação[13], a verdade é que  a prevenção geral constitui  um importantíssimo factor de decisão de suspensão, ou não, da execução da pena de prisão, na medida em que, tal como já se deixou dito  e decorre  do disposto no art. 40º, nº1 do C. Penal, a proteção dos bens jurídicos violados,  entendida como prevenção geral, na sua vertente positiva ou de integração, é o primeiro dos vectores dos fins das penas,  de modo que, responsabilizando suficientemente os agentes do  crime, se possa esperar que os mesmos não venham a adoptar novas condutas desviantes.
Como refere Figueiredo Dias[14], as penas substitutivas da pena de prisão não devem ser aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias.

Será, pois, nesta dupla perspetiva da prevenção geral positiva ou de integração e da prevenção especial positiva ou de socialização,  que deverá incidir o juízo de prognose favorável à suspensão da correspondente pena de prisão, impondo-se as exigências de prevenção geral de integração como limite às exigências de prevenção especial, para que não sejam defraudadas as expectativas comunitárias relativamente à tutela dos bens jurídicos.

Nesta linha de pensamento, a jurisprudência tem vindo a acentuar, como refere o Acórdão do STJ, de 15.11.2007 ( Proc. 3761/07- 5ª Secção), que “para que  possa ser suspensa a pena de prisão é necessária a formulação de um juízo de prognose social favorável que permita esperar que essa pena de substituição reintegre o agente na sociedade, mas também proteja os bens jurídicos, os fins visados pelas penas», o que vale por dizer,  nas palavras  do já citado  Acórdão do STJ, de 04.06.2014, que  « a suspensão da execução da pena de prisão tem de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Se as não realizar, a suspensão  não deve ser decretada». 

Ora, sendo os «correios de droga», uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes, concorrendo, de modo directo, para a sua disseminação, às  elevadas as exigências de prevenção geral, impostas pela defesa da saúde  do consumidor, da saúde pública, em geral, e da liberdade individual daquele, acrescem as ditadas pela necessidade  de combate ao tráfico internacional, cada vez mais interiorizada na consciência da generalidade das pessoas, pelo que os tribunais, ao administrarem a justiça, no  cumprimento  do dever de assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, postulado no artigo 202º, nº2 da CRP, não podem ficar indiferentes a estas realidades, a bem da saúde pública, da segurança e das  próprias instituições do Estado de direito.

Daí que venha  sendo enfaticamente salientado por este Supremo Tribunal, que, nos crimes de tráfico de estupefacientes as razões de prevenção geral só excepcionalmente se satisfazem com uma pena de substituição[15].

No caso do arguido BB, estamos perante uma pessoa que, com total indiferença para os malefícios que do produto adviriam para a vida e saúde dos futuros consumidores, para as respectivas famílias e sociedade em geral,  aceitou ser «correio de droga», não se importando sequer de ingerir o produto estupefaciente  e de, com isso fazer perigar a própria vida, para daquela forma tornar mais difícil a deteção e apreensão do produto estupefaciente.

Acresce que da ponderação dos demais factos dados como provados, quanto  às suas condições pessoais,  também não se vê  que o arguido  aparente qualquer interiorização dos valores ofendidos e vontade de alterar o seu comportamento desviante, por forma a criar  uma fundada confiança na sua actual capacidade para, no futuro, resistir a pulsões criminógenas, o que tudo conjugado, não abona em favor da sua personalidade.

Por tudo isto e,  independentemente do maior ou menor relevo das circunstâncias  que depõem a seu favor ( designadamente a sua idade à data da praticados factos, a confissão e a ausência de antecedentes criminais, já acima equacionadas  no contexto do afastamento da atenuação especial da pena de prisão e da  determinação concreta da pena), julgamos não ser possível um juízo de prognose favorável em relação  ao comportamento futuro do arguido, como exige o art. 50º do CP, razão pela qual não  se suspende a execução da pena aplicada.
Procede, pois, parcialmente o recurso o recurso interposto pelo arguido.

***

9. Apreciando, agora, o recurso interposto pelo arguido AA.

9.1. Medida da pena.

O acórdão recorrido condenou este arguido, pela prática  do crime de tráfico de estupefacientes,  p. e p. pelo artigo 21º do Dl nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 7 anos de prisão, com base nos seguintes factos que deu  como provados:

 

«1-No dia 26 de setembro de 2015, os arguidos AA, BB e CC, na sequência de contato previamente estabelecido com um indivíduo que conhecem como DD, com a alcunha “o Piolho”, também residente na área geográfica de Pontinha, deslocaram-se de Portugal para Marrocos, no veículo automóvel de marca Opel, modelo Astra, com matrícula ...-FB, pertencente a AA, com o intuito de ingerirem e transportarem nos respetivos aparelhos digestivos, canabis (resina), acondicionada em embalagens com forma de bolota, que entregariam ao dito DD depois do regresso a Portugal, recebendo cada um deles, por tal transporte, uma remuneração, à razão de € 1.00, por cada grama de produto estupefaciente.

2- Ao arguido AA, foi entregue, pelo dito indivíduo, o montante de € 600,00, para despesas relacionadas com o combustível e alimentação de todos os arguidos, bem como um telemóvel, de cor branca, com os contatos do indivíduo que os deveria receber em Marrocos.

3- Chegados a este país utilizaram o dito telemóvel para contatar um indivíduo, cuja identidade desconhecem, e que os transportou para uma casa no interior da qual foi posteriormente entregue, a cada um dos arguidos, um saco contendo as embalagens com o formato de bolotas que deveriam respetivamente engolir, o que fizeram.

4- No dia 30 de setembro de 2015, pelas 02h30m, os arguidos circulavam pela A6, Caia, em Elvas, sentido Espanha-Portugal, fazendo-se transportar no sobredito veículo automóvel de marca, detendo no interior dos respetivos organismos:

a. O arguido AA:  

i. 65 embalagens em forma de bolotas, contendo produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 562,500 gramas, grau de pureza de 30,7%, e  suficiente para 3191 doses individuais;

ii. 1 embalagem em forma de bolota, contendo produto cuja substância ativa era cannabis (resina), com o peso bruto de 8,7 gramas, grau de pureza de 26,8%, suficiente para 42 doses diárias individuais, e que foi expelida no Hospital Prisional de Caxias, em 02 de Outubro de 2015, pelas 21h45m;

[…]

5- Naquelas exatas circunstâncias:

[…]

c. O arguido AA detinha na sua posse uma nota do BCE, com o valor facial de € 10,00, um telemóvel da marca Samsung, modelo Galaxy S4, de cor preto, IMEI 35584606230615101 e respetiva capa, um telemóvel da marca Samsung, modelo GTE 1200, cor branca, IMEI 359076056908590, e dois envelopes almofadados e um selo de correio espanhol, no valor de 0,90€.

[…]

7- Também para o efeito de se deslocarem a Marrocos e propositadamente para realizarem o transporte de produto estupefaciente nos termos atrás descritos, os arguidos AA e BB, decidiram, ainda em Portugal, solicitar a emissão de novos passaportes, designadamente:

a. Em 14 de Setembro de 2015, foi emitido o passaporte nº ..., em nome do arguido AA, existindo um histórico de 4 passaportes anteriormente emitidos, um dos quais foi anteriormente declarado extraviado pelo arguido e outro, declarado inutilizado;

[…]

10- Antes do regresso a Portugal, em Espanha, e com vista à não deteção pelas autoridades policiais, os arguidos expediram os respetivos passaportes por correio, para Portugal, para morada não concretamente determinada.

11- Os arguidos AA, BB e CC previram e quiseram receber, deter e transportar nos termos atrás descritos, canabis (resina), conhecendo os princípios ativos desta substância, bem como as suas características químicas e psicotrópicas, sabendo que tal atividade lhes estava legalmente vedada, e, não obstante, quiseram atuar da forma supra descrita, com o propósito de auferirem vantagem económica.

12- Os arguidos agiram de forma livre, deliberada e consciente.

Mais se provou que:

13- O arguido AA, natural de Moçambique, é o mais velho de três irmãos. Desenvolveu-se num agregado familiar normativo, onde existiam regras e limites, com reconhecimento da autoridade parental. O progenitor é engenheiro mecânico e a progenitora funcionária pública. Os pais do arguido divorciaram-se, tinha este 10 anos de idade, período em que AA veio para Portugal residir com os avós maternos, tendo a progenitora vindo um ano mais tarde. O progenitor passou a residir em Angola, onde permaneceu até aos 27 anos do arguido.

14- AA iniciou a escolaridade em idade adequada tendo frequentado com 18 anos, o 11º ano, que não concluiu, abandonando a escola por vontade própria.

15- Iniciou o consumo de estupefacientes com 14 anos de idade, consumo que se foi intensificando ao longo do tempo, passando a consumir drogas pesadas a que juntou o consumo de bebidas alcoólicas. Sujeitou-se a vários tratamentos, com internamento em clinica, seguidos de várias recaídas.

16- Aos 18 anos autonomizou-se, passando a residir sozinho, no Alentejo Litoral. Trabalhou num bar, onde permaneceu durante cerca de dois anos, ingressando de seguida no serviço militar obrigatório. A sua atração por motores levou-o a frequentar e concluir com sucesso uma formação profissional - “Serralheiro de Tubos”, na ..., passando a exercer atividade nesta área, naquela instituição, que abandonou por motivos de saúde, cerca de dois anos mais tarde. Posteriormente passou a trabalhar como repositor nas grandes superfícies, com contratos de 6 meses e paralelamente, sempre que lhe era possível, trabalhava em bares. Estes trabalhos foram desenvolvidos de forma esporádica, com pouco investimento por parte do arguido.

17- Durante este percurso AA manteve uma situação económica estável.

18- Constituiu família com 30 anos, tendo deste relacionamento uma filha, atualmente com 19 anos, que se encontra autónoma.

19- Contraiu matrimónio aos 42 anos, cujo relacionamento marital lhe terá dado alguma estabilidade. Desde relacionamento tem mais uma filha.

20- O arguido, apesar de manter o tratamento ao seu problema aditivo no CRI, não conseguiu ultrapassar o consumo de estupefacientes e os hábitos etílicos.

21- À data da detenção, o arguido AA residia com a mulher, a filha comum, de 5 anos, e as duas enteadas com 18 e 12 anos de idade, em casa arrendada, com condições de habitabilidade e pela qual pagam € 350,00 mensais. O arguido encontrava-se a desenvolver atividade laboral na área de limpezas de veículos, empresa que herdou do progenitor, trabalhando em parceria com um familiar, que fornecia os produtos de limpeza. Não auferia rendimento certo, variando entre € 1.000,00 a € 1.500,00 mensais. A mulher trabalha na área da segurança, atividade que desenvolve no consolado de Angola, auferindo cerca de € 1.100,00/mês.

22- A situação económica apresentava algumas fragilidades, uma vez que o arguido tinha cada vez menos clientes e a mulher encontra-se a pagar um crédito efetuado pela sua filha mais velha (de quem foi fiadora), no valor de € 200,00 mensais.

23- O casal mantém um relacionamento afetivo e de apoio mútuo. E embora a mulher se encontre dececionada com toda a situação, mantém o seu apoio, com esperança que o arguido, com o avançar da idade, venha a mudar de atitude, revelando alguma ansiedade pela atual situação jurídico-penal daquele.

24- AA apresenta fracas competências sociais e laborais, com alguma incoerência face ao que pensa e ao que faz, o que interfere no seu processo de mudança. A ocupação do arguido, em tempos livres, não incluía atividades organizadas, não conseguindo o mesmo fazer uma boa utilização do tempo.

25- No decurso da prisão preventiva, o arguido revela dificuldades no cumprimento das normas institucionais. Foi objeto de dois processos disciplinares, por consumo de estupefacientes e por posse de telemóvel, medidas que cumpriu em sela disciplinar.

26- AA pretende fazer exame – destinado a maiores de 23 anos – para ingressar na universidade.

[…]

51- O arguido AA tem inscritas no seu certificado de registo criminal, as seguintes condenações:

- No âmbito do Processo Comum Coletivo que correu termos sob o nº 30/01.5GALNH, do extinto Tribunal Judicial da Comarca da Lourinhã, por acórdão proferido em 14 de abril de 2005, transitado em julgado em 2 de maio de 2005, o arguido foi condenado por um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21º, nº 1 e 24º, als. b), e c), do DL 15/93 de 22 de janeiro, praticado em 8 de agosto de 2001, na pena de 9 anos de prisão; e por um crime de detenção ou tráfico de armas proibidas, p. e p. pelo art. 275º, nºs 1, e 3, do Código Penal, praticado em 8 de agosto de 2002, na pena de 10 meses de prisão. Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de 9 anos e 4 meses de prisão, já extinta por cumprimento (com efeitos a partir de 7 de março de 2011)».

E, na fundamentação da medida da pena de 7 anos de prisão aplicada a este arguido, o acórdão recorrido  atentou nas seguintes circunstâncias:

« - A ilicitude dos factos, que no caso é elevada, ponderado, desde logo, o desvalor da ação, que se afere pelo fim da ação criminosa (obtenção de remuneração), mas também, a qualidade (droga que não é classificada como “dura”) e quantidades de droga efetivamente transportadas por cada um dos arguidos, nomeadamente, as doses de consumo individual que podiam gerar e as consequências daí decorrentes, nomeadamente, a afetação da saúde física e moral dos consumidores, e das respetivas famílias, conhecidos que são os males associados à toxicodependência. Por último, não pode ser esquecida a circunstância dos denominados “correios” de droga assumirem um particular relevo na rede de tráfico, na medida em que é o seu desempenho que permite a introdução no mercado de quantidades consideráveis de droga, que possibilitam o consumo dum leque alargado de pessoas, como se verificaria seguramente no caso dos autos, caso a operação de transporte não tivesse sido detetada, para além dos lucros relevantes que resultam desta particular atividade para os “donos do negócio”;

     - Os arguidos agiram com dolo intenso (dolo direto): conheciam as características do produto que transportavam, a ilicitude das suas condutas e agiram com o único intuito de auferirem retribuição económica;

     - As necessidades de prevenção geral são elevadas, atenta a danosidade social inerente a este tipo de atividade e a consequente necessidade de desencorajar a prática destes comportamentos: o tráfico de droga é causa de grande perturbação social, tanto no domínio da saúde, dado o perigo que representa sobretudo para as camadas mais jovens da população (a iniciação aditiva é feita habitualmente com este tipo de drogas consideradas mais “leves” a acessíveis a jovens em início da adolescência), como no domínio da família – é fonte de fraturas familiares – ou noutros, designadamente, ao nível da criminalidade adjacente, pelo que a prevenção geral deve ser especialmente acautelada na determinação da pena como garantia da utilidade das normas e da confiança da comunidade.

     - No que diz respeito ao comportamento dos arguidos anterior aos factos, realça-se o comportamento do arguido AA, que em maio de 2005 foi condenado na pena de 9 anos de prisão, por crime de tráfico, e também por crime de detenção de arma proibida (10 meses), revelando agora, através destes novos factos, que não interiorizou a censura inerente a este tipo de criminalidade (tráfico).

     […]

     - A condição e modo de vida dos arguidos apurada em audiência, realçando-se a respetiva fragilidade económica e financeira, as fracas competências pessoais e profissionais, a ausência dum modo de vida devidamente estruturado, não obstante o apoio familiar de que gozam em geral, e finalmente, a problemática aditiva de cada um dos arguidos e o risco daqui decorrente ao nível da reincidência neste tipo de condutas;

- O comportamento posterior aos factos: os arguidos prestaram declarações confessórias, colaborando na realização da justiça, ainda que sem especial relevo no apuramento dos factos, porquanto os elementos objetivos de prova sustentavam, sem necessidade de declarações, o recebimento, detenção e transporte ilícito de substâncias estupefacientes.

[…].»

Entende, porém,  o recorrente que, tendo em conta os critérios de determinação da medida da pena estabelecidos nos artigos 40º e 71º do C. Penal e considerando que a droga transportada é considerada “leve” e  em quantidade  não elevada, confessou integralmente e sem reservas os factos, mostra-se arrependido pelos actos cometidos e dispõe de condições favoráveis à sua reintegração familiar e profissional, a  pena concreta deve ser atenuada, pretendendo  vê-la  reduzida a um quantum próximo do seu limite mínimo ( 4 anos de prisão).

A este respeito  importa, desde logo salientar que, contrariamente ao alegado pelo recorrente  a sua confissão  não foi total e sem reservas, tendo sido apenas  parcial ( cf. Motivação da decisão de facto de fls. 650 e 651), nem  se provou que o mesmo tivesse demonstrado arrependimento, sendo certo que a  declaração de arrependimento feita em sede de alegações de recurso não equivale ao verdadeiro arrependimento, que é a constatação pelo tribunal de que o arguido interiorizou os maus efeitos do crime, que se inadequa à sua personalidade, convencendo da acidentalidade do acto.

Posto isto e chamando  à colação  tudo o que já se deixou dito sobre a natureza do crime de tráfico de estupefacientes,  p. e p. pelo artigo 21º do Dl nº 15/93, de 22 de janeiro e  sobre os critérios legais de determinação da medida concreta da estabelecidos no art 71º do Código Penal, urge, então,  indagar da adequação da pena de 7 anos de prisão  aplicada ao arguido à luz do princípio da proporcionalidade  que, em matéria de punição,  significa que a pena deve ser fixada na justa medida, ou seja, não se poderá situar nem aquém nem além do que importa para obtenção do resultado devido.

Quanto a esta matéria diremos, desde logo, que  a  fundamentação da medida da pena feita no acórdão recorrido merece, no essencial, a nossa adesão.
Todavia, sopesando melhor nesta sede, o facto de estar em causa um produto estupefaciente classificado como “droga não dura” e da sua  quantidade não ser relevante  ( total de 67 embalagens em forma de bolota, contendo cannabis com o peso bruto de 571,200 gramas), o facto da condenação do arguido, em 2 de maio de 2005, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21º, nº1 e 24, als. b) e c) do DL nº 15/93, de 22 de janeiro, reportar-se a factos ocorridos  em maio de 2001( e, portanto, há  mais de 15 anos) bem como o facto do arguido  dispor de condições favoráveis à sua reintegração familiar e profissional ( cfr. factos dados como provados sob os nºs 21, 23 e 26), somos levados a admitir que, neste contexto, as exigências de prevenção especial  e positiva ou de socialização são de molde a comprimir a pena concreta até ao mínimo necessário para satisfazer as necessidades de prevenção geral.
Daí que, na ponderação  destas e das demais circunstâncias ocorrentes mencionadas no acórdão recorrido, à luz do falado princípio da proporcionalidade, julgamos ser de reduzir a pena de 7 anos aplicada ao arguido, afigurando-se-nos adequada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

Procede, pois, parcialmente o recurso o recurso interposto pelo arguido.

*

9.2. Requer ainda o arguido  que lhe seja restituído o seu telemóvel pessoal, que não foi instrumento de atividade de tráfico e contém registos fotográficos da filha menor do recorrente, cujas imagens, pelo seu conteúdo e carga emocional pretende preservar, bem como os documentos pessoais, em nada relacionados com a actividade de tráfico, que se encontram apreendidos juntamente com o veículo automóvel.

O Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, diploma que define o regime aplicável ao tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, dispõe, no seu artigo 35º,  nº1 que «são declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de uma infracção prevista no presente diploma ou que por esta tiverem sido produzidos».
No caso dos autos, está provado que foram apreendidos ao recorrente  e declarados perdidos a favor do Estado os dois telemóveis que o mesmo tinha na sua posse aquando da sua detenção, ocorrida, em Elvas e quando o mesmo regressava de Marrocos, o que tudo indica que os mesmos destinavam-se a servir a prática da atividade de tráfico, pelo que conclui-se que a decisão recorrida, nesta parte, deve permanecer inalterada.
Relativamente aos documentos pessoais, entende-se não haver, por ora, lugar à pretendida restituição uma vez que o recorrente nem sequer os identifica.

Improcede, pois, nesta parte, o recurso interposto.

***
 
III. Decisão

Termos em que acordam na 3ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça em:

1. Conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido, BB, na parte respeitante à medida concreta da pena, determinando o cumprimento de uma pena de prisão efetiva de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido nos termos do art. 21.º, n.º 1, do Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

2. Conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido AA, na parte respeitante à medida concreta da pena, determinando o cumprimento de uma pena de prisão efetiva de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido nos termos do art. 21.º, n.º 1, do Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

3. Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA na parte em que requereu a revogação da perda a  favor do Estado do telemóvel “pessoal” e a restituição dos documentos “pessoais”.

4. No mais, confirmar a decisão recorrida.

Por os recursos terem obtido provimento parcial não são devidas custas, de harmonia com o disposto no art. 513.º, n.º 1 do CPP.

Supremo Tribunal de Justiça, 19 de outubro de 2016

(Texto elaborado e revisto pela relatora – artigo 94.º, n.º 2, do CPP).

Lisboa, 19 de Outubro de 2016

Rosa Tching (Relatora)
Oliveira Mendes

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[1] Relato nº4
[2] Como referem Norman A. Sprinthall; W. Andews Cllins, “Psicologia do Adolescente, uma abordagem desenvolvimentista”, 1994, pág. 501, “(...) cerca de 80% dos adolescentes, uma vez por outra, participam em actos levemente anti-sociais (...) aproximadamente 15% dos adolescentes tomam parte repetidamente em graves actos anti-sociais, mas só um terço destes entra na criminalidade séria, semelhante a que se pode encontrar em certos adultos.”

[3] Tal como se dá conta no Acórdão do STJ, de 17.04.2013, Proc. 237/11.7JASTB.S1-3ª Sec., relatado pelo Conselheiro Raul Borges, publicado em www.dgsi.pt e para o qual se remete por conter apreciação exaustiva sobre esta temática, com indicação de inúmera jurisprudência.
[4] Publicado no DR, I Série-A, de 11.02.1994
[5]Neste sentido, vide Acórdãos do STJ, de 22.03.2001, Proc. nº 353/01-5ª Sec., de 18.10.01, Proc. nº 3066/01-5ª Sec., de 06.02.2002, Proc. nº 4106/01-3ª Sec., de 14.05.2003, Proc. nº 518/03- 3ª Sec.,  de 21.06.2007, proc. 07P20595ª Sec., de 21.01.2009, Proc. 111/09 e de 27.10.2010, Proc. 70/07.0JBLSB.L1.S1-3ª Sec.   

[6] Neste sentido, entre outros, os Acórdãos, de 11.01.2006, Proc. 2249/05-3ª Sec., de 28.02.2007, Proc. 3382/06-3ª Sec. e de 21.01.2016, Proc. 2/14.0GAAMT.S1.  
[7] In, “Código de Processo Penal, Comentado, Almedina, Coimbra 2016, 2ª edição revista, págs. 1133 e 1134.
[8] Onde se determina que na fixação do sentido  e alcance da lei, o intérprete  presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
[9] Devendo ter-se como certo,  conforme refere o Acórdão do STJ, de 12.02.2004, in, CJ/STJ, ano XII, tomo I, pág. 203, que se terá querido dizer “pena aplicável”.
[10] In, CJ/STJ, ano XII, tomo I, pág. 203.
[11] Cfr. Claus Roxin, Culpabilidad Y Prevención En Derecho Penal (tradução de Muñoz Conde – 1981), págs 96-98.
 
[12] Entre muitos outros, cfr. Acórdãos do STJ,  de 06.01.2011, in, CJ/STJ, ano XIX, tomo I, 2011, pág.171;de15.12.2011(Proc.706/10.6PHLSB.S1-5ªSecção);de 03.07.2014 (Proc.1081/11.7PAMGR.C.S1-3ª Secção) e de 27.05.2015 (Proc. 445/12.3PBEVR.E1.S1-3ª Secção).
[13] Contrariamente ao que acontecia na versão originária do Código Penal (art. 48º, nº2), em que exigia-se também que a censura do facto e a ameaça da pena satisfizessem também as necessidades de reprovação, o que, no dizer de Figueiredo Dias, in, “Direito Penal Português . As Consequências Jurídicas do Crime”,  págs, 227 e segs,  implicava ponderar factos que relevassem da prevenção geral, embora «sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico».
[14] In, obra citada, pág. 333.
[15] Cfr. Entre muitos outros o Acórdão do STJ, de 11.10.2012, in, CJ/STJ, ano XX, tomo III, 2012, pág. 189.