ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
SUB-ROGAÇÃO LEGAL
DIREITO DE REGRESSO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
SEGURADORA
PAGAMENTO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Sumário


I - Tratando-se de sub-rogação legal, o direito transmitido confere ao solvens (novo credor) o mesmo amplexo de poderes e deveres jurídicos que se encontrava na esfera do credor originário. No caso do direito de regresso, por se tratar de um direito que nasce de uma situação extintiva do direito (de crédito) inicial, o accipiens da nova relação creditícia estabelece com o obrigado à nova prestação creditória um novo vínculo e uma obrigação de prestar nos termos em que o direito surgido se configura.
II - A figura jurídica que se ajusta ao direito de uma seguradora que haja procedido ao pagamento da indemnização a um trabalhador que haja sofrido um acidente de trabalho e que seja simultaneamente qualificado como de viação e a que esteja obrigada a reparar, pelo mesmo facto jurídico tendo como base a responsabilidade civil extracontratual, seria a sub-rogação legal externa e imprópria, como sucede no caso dos autos.
III - Ainda que tendo por base uma diversa fonte geradora da obrigação de indemnizar – por acidente de trabalho e por acidente de viação –, as obrigações para as duas seguradoras nascem e precipitam-se, uma vez cumprida ou prestada a indemnização, de uma forma que se pode qualificar de solidária e externa: ambas as seguradoras estão obrigadas a satisfazer uma dívida contratual ao mesmo credor (o lesado), pelo que uma vez um deles desonerado, radica-se nele o direito de se substituir ao outro na quota parte do crédito (que ambos estavam obrigados a satisfazer) que satisfez.
IV - Para efeitos de extinção da obrigação de indemnização a cargo dos responsáveis indirectos, referida em III e adveniente de uma relação contratual, aplica-se o prazo prescricional previsto no art. 498.º, n.º 2, do CC.

Texto Integral



PROCESSO nº 850/09.2TVLSB.L1.S1    
Recorrente: “SEGURO AA, S.A.”
Recorrido: “SEGURO BB, S.A.”

I. RELATÓRIO.
SEGURO AA, S.A.”, instaurou acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra “SEGURO BB, S.A.”, e CC e DD e EE, pedindo a condenação: «a.) a seguradora (...) condenada a pagar à A. SEGURO AA, o valor total que esta pagou aos RR. CC, DD e EE, e que até 10/07/2008 ascendia a euro 158.046,43, acrescido de juros de mora desde a data da respectiva citação, e até efectivo e integral pagamento; b.) a "SEGURO AA" (...) desonerada da obrigação de pagamento determinada por douta sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho de … no processo especial de acidentes de trabalho nº 141/2002, relativamente às pensões vincendas a pagar aos RR., CC, DD e EE».
Para a pretensão jurisdicional que impetra, alinha, em síntese apertada,  a sequente factualidade:

- No dia 30/02/2002, cerca das 10,30 horas, ocorreu um acidente de viação no nó de saída da RN 175/ A84 para a RD 937, em direcção a ..., atento o sentido de marcha ... - ..., na localidade de ... - ..., em França.

- Foi interveniente nesse sinistro o veículo pesado de mercadorias com semi-reboque marca "Renault T", modelo EURO 2/470 -18T, matricula XXX740CF, propriedade de "FF, S.A.”, conduzido por GG, e no qual era passageiro HH; 

3º A posse e direcção efectiva do XXX740CF pertenciam a "FF, S.A.”;

- O condutor, GG, e o passageiro, HH, encontravam-se vinculados à "II, Lda.”, através de contratos individuais de trabalho, no âmbito dos quais lhes havia sido conferida a categoria profissional de motorista de pesados, e exerciam as inerentes funções.

- No desempenho das funções profissionais desenvolvidas ao serviço da "II, Lda.”, e em plena execução das funções laborais que lhe haviam sido cometidas pela empregadora "II, Lda.”, que prosseguiam em nome, no interesse e sob as ordens da mesma, ingressaram na RN 175/A84 no sentido ... - ..., atento esse sentido de marcha;

- à direita apresenta-se uma via rodoviária que assegura o nó de ligação à RD 973, em direcção a ..., na qual, por volta das 10,25 horas, o XXX 740 C se incorporou, ainda com o GG, ao volante, e o HH, como passageiro.

- Este acesso comporta um único sentido de trânsito, de acordo com o qual descreve uma curva acentuada à direita, e apresenta uma ligeira inclinação ascendente.

- O piso é em betuminoso flexível, e a via encontra-se ladeada por separadores laterais de protecção, que a separam de uma ravina com cerca de 10 metros de profundidade.

- Era de dia, chovia intensamente e o pavimento encontrava-se muito molhado e escorregadio.

- A velocidade máxima permitida no identificado nó de ligação da RN 175/A84 à RD 973 era de 50 km/h.

- O local encontrava-se dotado da sinalização rodoviária que se passa a enunciar:

a) sinal vertical de limitação de velocidade a 50 km/h (Tipo B 14);

b) sinal vertical de aproximação de curva perigosa à direita (Tipo A1aa)

- Nestas circunstâncias de lugar e tempo, o XXX 740 C seguia a velocidade não inferior a 80 km/h.

- O seu condutor seguia desconcentrado e desatento da condução estradal, configuração, e demais obstáculos na via.

- Não empregava todo o cuidado e prudência exigíveis na condução, e que são especialmente acrescidos num pesado de mercadorias carregado.

- a sua habilitação legal na condução de pesados datava de 06/07/2001, e a experiência ao volante de um pesado da dimensão do sinistrado, e com a carga que este transportava, era ainda mais recente,

- Quando se encontrava sobre a curva do nó de ligação, o GG perdeu o controlo da direcção do XXX740C.

- tendo o veículo entrado em despiste, embatendo contra os separadores laterais de protecção e arrancando-os ao longo de uma extensão de cerca de 60 (sessenta) metros.

- Após o que os transpôs, sendo projectado para fora da via rodoviária, sobre a ravina.

- Até a cabine do veículo chocar contra uma árvore, e aí se imobilizar, ejectando o condutor e passageiro para o exterior, através do pára-brisas.

- A produção do acidente ficou, pois, a dever-se, exclusivamente, à imprudência, imperícia e culpa do condutor do XXX740C que violou o limite de velocidade máxima absoluta permitida de 50 km/hora e a obrigação de adequar a velocidade às demais condições limitadoras de circulação, como a chuva, a visibilidade, o traçado da via, a tipologia e peso do veículo, e a sua própria inexperiência.

- Como consequência directa e imediata do sinistro, o HH sofreu lesões corporais que lhe causaram a morte.

- Os RR. CC, DD e EE são, respectivamente, a viúva e filhos menores deste, e seus únicos e universais herdeiros.

- A responsabilidade emergente de acidentes de trabalho ocorridos com o HH ao serviço da "II, Lda.”, nas condições supra identificadas, encontra-se validamente transferida para a A. "SEGURO AA", através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 0000000001582.

- A responsabilidade pelos danos causados pelo XXX740C, e emergentes da respectiva circulação rodoviária, encontrava-se transferida para a seguradora R, através do contrato de seguro titulado pela apólice nº E-1 000/00001000/227

- No âmbito das coberturas de danos laborais e rodoviários de cada uma das sobreditas apólices, o sinistro foi participado:

a) pela "II, Lda.” à A. "SEGURO AA";

b) pela "FF, S.A.”, à seguradora R;

- Para reparação dos danos emergentes do acidente aqui descrito, e que foi causa directa e imediata da morte do HH, a A. "SEGURO AA" pagou aos RR CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-as suas, as quantias que se passam a discriminar:

a) despesas de funeral- € 2.784,00;

b) subsídio por morte - € 4.176,00;

c) despesas médicas - € 59,00;

d) despesas judiciais - € 4.952,80.

- para reparação dos danos emergentes do sinistro dos presentes autos, correu termos pelo Tribunal de Trabalho de … o processo especial de acidentes de trabalho nº 141/2002, no em 19/05/2004 foi proferida a douta sentença, devidamente transitada em julgado, que condenou a A. "SEGURO AA" a pagar, com inicio em 21/02/2002:

a) à R. CC, DD e EE a pensão anual e vitalícia, no montante de € 2.057,24 até perfazer a idade de 65 (sessenta e cinco) anos, e no montante de € 2.742,99, a partir daquela idade;

b) aos RR. DD e EE a pensão anual de € 2.742,99 até perfazerem 18. 22 ou 25 anos enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino secundário, curso equiparado ou o ensino superior;

- Em cumprimento desta decisão, a A. "SEGURO AA":

a) pagou aos RR. CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-as suas as pensões vencidas até 10/07/2008 no valor de € 30.963,51;

b) constituiu provisão matemática para o pagamento das pensões com vencimento entre essa data e 10/07/2008, no valor de € 66.242,56.

- Para indemnização dos danos emergentes do sinistro dos presentes autos, e que foi causa directa e imediata da morte do HH, a R. Seguradora pagou aos RR. CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-a sua a quantia de € 115.111,12.
Foi citada a sociedade “JJ, S.A.”, que seria, segundo a Demandante, representante em Portugal da 1ª Ré, que contestou invocando a sua ilegitimidade passiva, a incompetência territorial dos tribunais portugueses e quanto ao tema da prescrição – que ora inteeressa – alegou que:

- A ré SEGURO BB foi citada para contestar a presente acção em 06.02.2012.

- A autora indica no artigo 40º da petição que pagou aos 2º réus quantias referentes a despesa de funeral, subsídio por morte, despesas médicas, despesas judiciais, não referindo contudo em que data(s) terão ocorrido esses pagamentos.

- Refere ainda no artigo 42º da sua petição o pagamento aos 2º réus do valor de pensões vencidas até 10/07/2008.

- Confessa também a autora que foi condenada no processo especial de acidente de trabalho em sentença proferida em 19/05/2004 e transitada em julgado.

- A autora baseia a sua reclamação nos artigos 483º e 592º do Código Civil e paralelamente invoca o direito de regresso.

- O exercício do eventual direito de regresso da autora já se encontra prescrito, porquanto já decorreu o prazo previsto no art. 498º, nº 2 - três anos - após o cumprimento pela A. dos montantes indemnizatórios aos 2ºs réus.

- Não é invocável o benefício do prazo previsto no nº 3 do art. 498º, porquanto este dispositivo tem aplicação restrita à eventual indemnização a favor dos lesados e não às relações entre responsáveis por tal indemnização.
Após discussão e julgamento da causa, veio a ser proferida sentença que julgou a acção «totalmente não provada e improcedente, absolvendo a R. do pedido contra si formulado».
Interposta apelação, o tribunal de 2ª instância veio a ser decidido (sic). “(…) ainda que com fundamentação parcialmente distinta, julgamos a apelação da Autora totalmente improcedente e, em consequência, confirmamos a sentença impugnada.”

Interposto recurso – cfr. fls. – veio a ser admitido como revista excepcional – cfr. fls. 811 a 817 – com a fundamentação que a seguir queda impressa (sic): ““A recorrente fundamenta a sua alegação da existência de oposição de julgados, alegando, em suma:

No que diz respeito ao prazo prescricional aplicável in casu - questão referida em a) - ambas as decisões sustentaram que não seria de aplicar o prazo de prescrição alargado decorrente da aplicação do art. 498º, nº 3 do Cód. Civil, mas tão só o prazo de 3 anos nos termos do disposto no art. 498º, nº 2 do Cód. Civil.

O entendimento plasmado pelas duas instâncias espelha-se, sumariamente, no seguinte trecho constante do Douto Acórdão ora posto em crise: “(...) A seguradora na acção de regresso não exerce um direito igual ao do lesado que indemnizou, não propõe contra o réu uma acção de indemnização por danos, antes se limita a exigir o reembolso do que pagou e o alongamento do prazo de prescrição compreende-se quando esteja em causa o direito do lesado, mas não o direito de regresso da seguradora (...)

A patentear que estamos perante realidades distintas, temos que são completamente diversos os termos iniciais: enquanto no nº 1 do art. 498º - que se refere ao ressarcimento dos danos no âmbito da responsabilidade extracontratual - esse momento temporal é o correspondente à data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, no nº 2 - que se refere exclusivamente ao direito de regresso - releva o tempo do cumprimento.

Não se materializa, assim, do desenho circunstancial constante dos autos, motivo justificativo da aplicação do prazo prescricional de 5 anos. Aplica-se, antes, ao caso em apreço, o disposto no nº 2 daquele artigo que determina que "prescreve igualmente no prazo de 3 anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis".

E, salvo o devido respeito por diversa opinião, a tese nele expendida a propósito da aplicação do prazo de prescrição de 3 anos ao caso subjudice, por inaplicabilidade do disposto no art. 498º, nº 3, do Cód. Civil, encontra-se em manifesta contradição com o entendimento constante do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 15/01/2015, proferido no Processo nº 143/13.0TBVLN.G1, onde se lê: "Atendendo a que o pagamento peticionado pela recorrente corresponde à indemnização por esta já satisfeita ao lesado, de tal decorre que os poderes que a este assistia no sentido de serem ressarcidos da indemnização respeitante aos danos pelo mesmo sofrido será transferido para a Seguradora autora, pelo que, beneficiando aquele lesado do alargamento do prazo prescricional indicado no nº 3 do artigo 498º do Código Civil, por força da aludida transmissão, a autora também de tal beneficia - Ac. do STJ de 11/1/11, disponível na internet em www.dgsi.pt e também Ac. do ST J de 9/3/10, disponível no mesmo sítio. "

É patente que, perante duas situações fácticas muito semelhantes, foram proferidas suas decisões contraditórias quanto à aplicabilidade do art. 498º, nº 3 do Cód. Civil, aos casos em que a Seguradora peticiona da sua congénere, civilmente responsável pelo acidente, o reembolso do montante que liquidou ao lesado em cumprimento das obrigações para si emergentes do contrato de seguro de acidentes de trabalho.

Estriba-se ainda o presente recurso de revista na manifesta contradição entre teses seguidas na nossa Douta Jurisprudência a propósito da questão supra referida em b), ou seja, nas situações em que não estão discriminadas as quantias indemnizatórias relativas a danos patrimoniais e não patrimoniais, compete à Seguradora responsável pelo acidente de viação que se pretende desonerar, o ónus da prova de que o dano laboral se encontra integralmente ressarcido através do pagamento da indemnização acordada ao lesado, prova essa que não se basta com a demonstração genérica de que a indemnização foi a titulo de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais.

Com efeito, quanto a esta problemática, entendeu-se mo douto acórdão recorrido o seguinte: "(...) Esta menção fáctica, com esta dimensão abrangente, foi acolhida no art. 19º dos factos provados, de forma integral, nos seguintes termos: «19. O pagamento aos herdeiros da vítima mortal efectuado pela Ré SEGURO BB foi a título de indemnização por todos os danos, quer danos morais, quer danos patrimoniais ".

Ficou, pois, feita a demonstração que se reclama não existir.

Neste contexto, teve razão o Tribunal "a quo" ao referir que «Esta) leia-se, a Ré) satisfez integral e prontamente a indemnização global a que os lesados tinham direito e por nada mais é responsável. Cabia à Seguradora de acidentes de trabalho ter averiguado se os lesados não teriam já recebido a indemnização devida e ter excepcionado essa circunstância na acção de acidentes de trabalho. "

Acresce que a tese expendida no douto acórdão recorrido a propósito desta questão encontra-se em manifesta contradição com o entendimento constante do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02/06/2011, proferido no âmbito do Processo nº 175/10.0TVLSB.L1-6, onde se pode ler: Aqui chegados, podemos afirmar que, tendo o apelante provado o pagamento efectuado ao sinistrado, em cumprimento, aliás, de sentença judicial que a condenou a pagar o montante que reclama na acção, cabia à apelada demonstrar que já tinha ressarcido esse dano laboral no âmbito da transacção efectuada na acção penal onde fora deduzido pedido cível pelo sinistrado por se tratar de facto extintivo do direito da apelante (art. 342º, nº 2 CC)

A falta de discriminação dos danos ressarcidos no âmbito da transacção resolve-se contra a apelada. Não tendo sido demonstrado que foi ressarcido o dano laboral no âmbito da referida transacção, procede a apelação. (...)

Sempre com o devido respeito por entendimento diverso, parece-nos por demais notória a contradição existente entre a tese vertida no douto acórdão recorrido e a tese explanada no douto acórdão-fundamento, nesta concreta questão jurídica.

D. Para que exista oposição de julgados é necessário que as duas decisões em confronto versem a mesma situação, que esta releve para a decisão da causa e que a contradição seja expressa e não implícita.

No caso temos que a questão versada é a mesma em ambas as hipóteses: a aplicação do prazo do prazo prescricional dos nº 2 ou do nº 3 do art. 498º do C. Civil; a necessidade de alegar e demonstrar o ressarcimento do dano laboral. Dúvidas não existem de que ambas são essenciais para a apreciação do litígio.

Quanto à contradição temos que, também em qualquer dos casos ela é expressa e directa:

No primeiro referindo-se na decisões em confronto:

Não se materializa, assim, do desenho circunstancial constante dos autos, motivo justificativo da aplicação do prazo prescricional de 5 anos. (quando a autora é a seguradora que exerce o seu direito de regresso.

E: “os poderes que a este assistia no sentido de serem ressarcidos da indemnização respeitante aos danos pelo mesmo sofrido será transferido para a Seguradora autora, pelo que, beneficiando aquele lesado do alargamento do prazo prescricional indicado no nº 3 do artigo 498º do Código Civil, por força da aludida transmissão, a autora também de tal beneficia.

E no segundo referindo-se nas respectivas decisões: Esta menção fáctica, com esta dimensão abrangente, foi acolhida «19. O pagamento aos herdeiros da vítima mortal efectuado pela Ré SEGURO BB foi a título de indemnização por todos os danos, quer danos morais, quer danos patrimoniais ".

Ficou, pois, feita a demonstração que se reclama não existir.

E ... A falta de discriminação dos danos ressarcidos no âmbito da transacção resolve-se contra a apelada. Não tendo sido demonstrado que foi ressarcido o dano laboral no âmbito da referida transacção, procede a apelação. (…)

Com o que se verifica o pressuposto invocado. Deve, por isso, ser aceite o recurso.

Pelo exposto, acordam em admitir a revista excepcional.”

Para o tema que interessará resolver, face à admissibilidade da revista excepcional, extracta-se o quadro conclusivo que a seguir queda transcrito (na parte interessante).
I.a.) – Quadro Conclusivo.

“DO OBJECTO DO RECURSO:

(…) 19. Sendo que o âmbito do presente recurso se cinge à apreciação de duas questões:

a. Aplicação do alargamento do prazo prescricional previsto no art. 498º, n.º 3 do Cód. Civil, nas situações previstas no art. 498º, nº 2, por via da sub-rogação legal do direito do sinistrado de que a seguradora se encontra investida ao reclamar os créditos pagos em sede de acidente de trabalho à seguradora responsável pelo acidente de viação

b. Nas situações em que não estão discriminadas as quantias indemnizatórias relativas a danos patrimoniais e não patrimoniais, compete à Seguradora responsável pelo acidente de viação que se pretende desonerar, o ónus da prova de que o dano laboral se encontra integralmente ressarcido através do pagamento da indemnização acordada ao lesado, prova essa que não se basta com a demonstração genérica de que a indemnização foi a título de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais.

I. DA RESPONSABILIDADE INFORTUNISTICO-LABORAL VS RESPONSABILIDADE CIVIL: FALTA DA PROVA DO RESSARCIMENTO DO DANO LABORAL PELA SEGURADORA R. E SUAS CONSEQUENCIAS:

20. Andou mal o Meritíssimo Tribunal "a quo" ao considerar que a Seguradora Recorrida logrou provar, de forma cabal, que de entre a indemnização paga aos lesados, se encontrava integralmente ressarcido o dano laboral e que, por esse motivo, inexiste qualquer direito de crédito no qual a aqui A. se possa sub-rogar.

21. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, temos que na apreciação desta questão, olvidou o Venerando Tribunal da Relação o carácter imperativo das normas jurídicas aplicáveis em sede de responsabilidade infortunístico-laboral e a natureza irrenunciável das indemnizações advenientes de acidentes infortunístico-laborais.

22. Com efeito, dúvidas não subsistem de que na génese dos presentes autos está a responsabilidade civil extracontratual pela ocorrência de acidente de viação que foi simultaneamente acidente de trabalho.

23. E que o concreto dano que está na base do direito de sub-rogação da recorrente é o dano laboral.

24. Sendo certo que teremos sempre que ter igualmente em mente que a responsabilidade infortunístico laboral não é destinada a ressarcir todos os danos sofridos pelo sinistrado ou in casu dos seus beneficiários legais, abrangendo unicamente os danos patrimoniais concretamente especificados na LAT.

25. Ao contrário, já os danos que se pretendem ver ressarcidos através do instituto da responsabilidade civil extracontratual são de âmbito muito mais alargado.

26. Constitui também entendimento pacífico na nossa jurisprudência que o dano laboral e o dano emergente da responsabilidade civil extracontratual são complementares, mas nunca cumuláveis.

27. Isto porque sendo o dano, na sua génese, apenas um, diversa solução levaria a um duplo ressarcimento do mesmo dano.

28. Quid iuris, então, nas situações em que, como nos presentes autos, vem a Seguradora Apelante sub-rogar-se nos direitos dos lesados/beneficiários por força dos valores que comprovadamente lhes pagou no estrito cumprimento das obrigações que sobre si impendem enquanto responsável laboral e em que comprovadamente houve já um ressarcimento aos lesados da Seguradora enquanto responsável civil?

29.O que se verifica no caso em apreço é que, efectivamente, e no que tange ao pagamento efectuado pela recorrida é que, apenas se provou que: "O acidente de viação ocorreu a 20/02/2002 e a ré SEGURO BB pagou aos herdeiros beneficiários da vítima mortal a quantia de 155.111,12 euros conforme recibo com data de 12/07/2002"

"O pagamento aos herdeiros da vítima mortal efectuado pela ré SEGURO BB foi a título de indemnização por todos os danos, quer danos morais, quer danos patrimoniais.

30.Ou seja, não ficou demonstrado que nesse pagamento estaria incluído o dano laboral, qual o seu concreto montante, dano esse que constitui, ao fim e ao cabo, a génese do pedido de reembolso formulado nos presentes autos pela aqui apelante.

31.E tendo sempre em consideração que o direito dos lesados, neste segmento de dano laboral e tal como se apontou supra, é absolutamente irrenunciável, inalienável e impenhorável, jamais a aqui recorrida se poderia desonerar da sua obrigação ressarcitória sem demonstrar de forma cabal que a indemnização que comprovadamente pagou incluiu a totalidade dos danos laborais que inequivocamente assistem aos lesados, primitivos credores, discriminando-os.

32.Salvo o devido respeito por diverso entendimento, andou mal o Meritíssimo Tribunal "a quo” ao não atender ao teor imperativo e irrenunciável dos direitos aqui em causa.

33.Exigia-se, pois, e na sequência do citado Acórdão, cuja tese corroboramos, que para que a recorrida ficasse desonerada do pagamento dos valores peticionados nos autos, tivesse alegado e provado, de entre o montante indemnizatório que prestou aos lesados, qual o concreto valor que correspondia à indemnização do dano laboral.

34.Tal prova não se pode bastar com a alegação genérica de que foram ressarcidos "todos os danos patrimoniais e não patrimoniais".

35.Dado que, constituindo o pagamento um facto extintivo das obrigações, ao abrigo do disposto no art. 342º, n.º 2 do Cód. Civil, impunha-se à recorrida a sua demonstração, o que não sucedeu.

36.Ao decidir diferentemente, o douto acórdão recorrido incorreu, pois e manifesta violação do disposto nos arts. 34º e 35º da LAT e 342º do Cód. Civil, entre outros.

DA PRESCRICÃO: Aplicação do prazo alargado decorrente do dispositivo no Art. 498º, n.º 3 do Cód. Civil.

37.O direito de regresso/sub-rogação de que a Seguradora recorrente é titular funda-se também em responsabilidade civil extracontratual por facto considerado crime - homicídio por negligência ­cujo prazo prescricional do procedimento criminal é de 5 anos (Cfr. art. 118º, n.º 1 al. c) e 137º do Cód. Penal)

38.Por outro lado, recorde-se, o art. 498º, n.º 1 do Cód. Civil determina que o direito de indemnização prescreve no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.

(E o n.º 2 do mesmo preceito estipula que prescreve igualmente no prazo de 3 anos a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.

39.Contudo, o art. 498º, n.º 3 do Cód. Civil vem ainda estabelecer que se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.

40.Temos que, da conjugação dos preceitos legais acabados de elencar, e salvo o devido respeito por diverso entendimento, o prazo prescricional aplicável nos presentes autos é de 5 anos (prazo prescricional legalmente aplicável ao crime de homicídio por negligência).

41.Com efeito, o direito de regresso invocado pela Seguradora recorrente beneficia, portanto, do alargamento do prazo de prescrição alargado contemplado no art. 498º, n.º 3 do Cód. Civil.

42.Corroborando este entendimento, e a título de mero exemplo, veja-se a decisão recentemente proferida pelo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no Acórdão de 07/07/2010, disponível on line em www.dgs.pt, e que nos permitimos citar no corpo das presentes alegações

43.Ainda neste sentido veja-se igualmente o entendimento consignado no Douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17/09/2009, proferido no âmbito do Processo n.º 2270/04.6TBVLG.P12, disponível na íntegra em www.dgsi.pt, e igualmente o teor do Douto Acórdão do tribunal da Relação de Guimarães, de 15/01/2015, proferido no âmbito do Processo nº 143/13.0TBVLN.G1 e que constitui o acórdão-fundamento invocado para a presente revista excepcional.

44.No caso dos presentes autos impõe-se, pois, aplicar o prazo de prescrição decorrente do disposto no art. 498º, nº 3 do Cód. Civil.

(Pelo que, e sempre com o máximo respeito, a douta decisão ora posta em crise, ao consignar diverso entendimento, incorreu em flagrante violação, entre o demais, do disposto nos arts. 498.º, n.º 2 e 3 do Cód. Civil.

46.O que se deixa alegado, para todos os devidos efeitos legais, nomeadamente para revogação, nesta parte, da douta sentença recorrida.”

Revidou a fundamentação a demandada, “SEGURO BB, S.A.” rematando-a com a síntese conclusiva sequente.

1. Em ambas as questões suscitadas, não existe contradições entre acórdão recorrido e acórdão fundamentos, pois assentam em conceitos técnico-jurídicos distintos - direito de regresso versus sub-rogação.

2. Só por inconformidades estratégicas. a recorrente veio desistir da instância contra os beneficiários do sinistrado, quando já sabia que tinham sido integralmente compensados pela recorrida.

3. Pretende a recorrida através deste meio processual, indirectamente provocar alteração dos efeitos da matéria dada como provada no pleno exercício do ónus de prova da recorrida.

4. Assim, não se verificam os requisitos exigíveis no art. 672º, nº 1 da al. c) do C.P. Civil.”
I.b.) – Questões a abordar na revista.
As questões, tal como foram escrutinadas no aresto que admitiu a revista excepcional, foram condensadas pela recorrente, em: “a. alargamento do prazo prescricional previsto no art. 498º, n.º 3 do Cód. Civil, nas situações previstas no art. 498º, nº 2, por via da sub-rogação legal do direito do sinistrado de que a seguradora se encontra investida ao reclamar os créditos pagos em sede de acidente de trabalho à seguradora responsável pelo acidente de viação”.
II. – FUNDAMENTAÇÃO.
II.a.) – DE FACTO.
Vem adquirida para a solução (de direito) do caso, a factualidade que a seguir queda extractada. 
“1. Em Fevereiro de 2002, cerca das 10,30 horas, ocorreu um acidente de viação no nó de saída da RN 175/A84 para a RD 937, em direção a ..., atento o sentido de marcha ... - ..., na localidade de ... - ..., em FRANÇA (A).
2. Foi interveniente nesse sinistro o veículo pesado de mercadorias com semirreboque marca "RENAULT", modelo EURO 2/470 - 18 T, matrícula XXX 740 CF, propriedade de "FF, S.A.", conduzido por GG, e no qual era passageiro HH (B).
3. Quando se encontrava sobre a curva do nó de ligação, o GG perdeu o controlo da direção do XXX 740 C (C).
4. E, por via disso, o veículo entrou em despiste, embatendo contra os separadores laterais de proteção e arrancando-os ao longo de uma extensão de cerca de 60 (sessenta) metros (D).
5. Após o que os transpôs, sendo projetado para fora da via rodoviária, sobre a ravina (E).
6. Até a cabine do veículo chocar contra uma árvore, e aí se imobilizar, ejetando o condutor e passageiro para o exterior, através do para-brisas (F).
7. Os RR. CC, DD e EE são, respetivamente, a viúva e filhos de HH, e seus únicos e universais herdeiros (G).
8. A responsabilidade pelos danos causados pelo XXX 740 C, e emergentes da respetiva circulação rodoviária, encontrava-se transferida para a seguradora R., através do contrato de seguro titulado pela apólice nº E-0000/00001000/227 (H).
9. Concomitantemente, e igualmente para indemnização dos danos emergentes do sinistro dos presentes autos, e que foi causa direta e imediata da morte do HH, a R. Seguradora pagou aos RR. CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-a sua a quantia de EURO 155.111,12 (I).
10. A responsabilidade emergente de acidentes de trabalho ocorridos com o HH ao serviço da "II, LDA", encontra-se transferida para a A. "SEGURO AA", através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 0000000001582 (J).
11. Para reparação dos danos emergentes do sinistro dos presentes autos, correu termos pelo Tribunal de Trabalho de … o processo especial de acidentes de trabalho nº 141/2002, em 19/05/2004, foi proferida a sentença, devidamente transitada em julgado, que condenou a A. "SEGURO AA" a pagar, com início em 21/02/2002: aos RR. CC, DD e EE a pensão anual e vitalícia, no montante de EURO 2.057,24 até perfazer a idade de 65 (sessenta e cinco) anos, e no montante de EURO 2.742,99, a partir daquela idade; aos RR. DD e EE a pensão anual de EURO 2.742,99 até perfazerem 18, 22 ou 25 anos enquanto frequentarem, respetivamente, o ensino secundário, curso equiparado ou o ensino superior (K).
12. O acidente de viação ocorreu em Fevereiro de 2002 e a ré SEGURO BB pagou aos herdeiros beneficiários da vítima mortal a quantia de 155.111,12 mil euros conforme recibo com data de 12/07/2002 (L).
13. Quer o GG, quer o HH encontravam-se vinculados à "II, LDA", através de contratos individuais de trabalho, no âmbito dos quais lhes havia sido conferida a categoria profissional de motorista de pesados, e exerciam as inerentes funções (3º).
14. Como consequência direta e imediata do sinistro, o HH sofreu lesões corporais que lhe causaram a morte (21).
15. No âmbito das coberturas de danos laborais e rodoviários de cada uma das sobreditas apólices, o sinistro foi participado: pela "II, LDA" à A. "SEGURO AA"; pela "FF, S.A.", à seguradora R. (22).
16. Para reparação dos danos emergentes do acidente aqui descrito, a A. "SEGURO AA" pagou aos RR. CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-as suas, as quantias que se passam a discriminar: despesas de funeral - EURO 2.784,00; subsídio por morte - EURO 4.176,00; despesas médicas - EURO 59,00; despesas judiciais - EURO 4.952,80 (23).
17. Em cumprimento da decisão, a A. "SEGURO AA" pagou aos RR. CC, DD e EE, que dela receberam e embolsaram, fazendo-as suas as pensões vencidas até 10/07/2008 no valor de EURO 30.963,51; constituiu provisão matemática para o pagamento das pensões, no valor de EURO 66.242,56 (24).
18. No cumprimento da sentença proferida no âmbito da ação emergente de acidente de trabalho, e para além dos valores melhor discriminados na petição inicial, a A. liquidou aos beneficiários, a partir de 10/07/2008, e a título de pensões, os montantes que se passam a discriminar:
A) A BENEFICIÁRIA DD MÊS REFERENTE VALORES PAGOS
De agosto de 2008 a Dezembro de 2008 Euro 587,68 De Janeiro de 2009 a Dezembro de 2009 Euro 1.389,92 De Janeiro de 2010 a Dezembro de 2010 Euro 1.411,32 De Janeiro de 2011 a Dezembro de 2011 Euro 1.391,38 De Janeiro de 2012 a Abril de 2012 Euro 391,84 TOTAL Euro 5.172,22
B) AO BENEFICIÁRIO EE MÊS REFERENTE VALORES PAGOS
De agosto de 2008 a Dezembro de 2008 Euro 587,76; De Janeiro de 2009 a Dezembro de 2009 Euro 1.389,92; De Janeiro de 2010 a Dezembro de 2010 Euro 1.411,32; De Janeiro de 2011 a Dezembro de 2011 Euro 1.412,73;De Janeiro de 2012 a Abril de 2012 Euro 391,84
TOTAL Euro 5.193,57
C) À BENEFICIÁRIA CC
MÊS REFERENTE VALORES PAGOS
De agosto de 2008 a Dezembro de 2008 Euro 881,70; De Janeiro de 2009 a Dezembro de 2009 Euro 2.085,02; De Janeiro de 2010 a Dezembro de 2010 Euro 2.117,10; De Janeiro de 2011 a Dezembro de 2011 Euro 2.087,20; De Janeiro de 2012 a Abril de 2012 Euro 587,80:
TOTAL Euro 7.758,82 (25)
19. O pagamento aos herdeiros da vítima mortal efetuado pela ré SEGURO BB foi a título de indemnização por todos os danos, quer danos morais quer danos patrimoniais (26).
II.b.) – DE DIREITO.
II.b.1. – Sub-rogação/direito de regresso.
Prévia à questão do prazo prescricional que há-de ser aplicado ao caso em tela de juízo, importará delinear/recortar jurídico-conceptualmente a(s) figura(s) fundante(s) em que a recorrente escora o pedido de reembolso e que subjaz à substituição operada na relação obrigacional traduzida no cumprimento da obrigação, ou parte dela, por parte de um terceiro perante o credor.
A solução normativa postulada no artigo 589ºdo Código Civil (Sub-rogação) estatui que: “o credor que recebe a prestação de terceiro pode sub-rogá-lo nos seus direitos, desde que o faça expressamente até ao momento do cumprimento da obrigação.” 
A sub-rogação pode, assim, definir-se, segundo um critério puramente descritivo, com a substituição do credor, na titularidade de uma obrigação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários para cumprimento.” [[1]
Já o direito de regresso [[2]] – que segundo Antunes Varela algumas legislações configuram como compatíveis ou sobrepostas – tem uma raiz distinta e decorre de situações que não atinam com a substituição do devedor por terceiro mas de uma situação que surge ex novo, v. g. no caso de pagamento por um condevedor solidário.
Expressando de forma lapidar a dissemelhança jurídico-funcional das figuras em análise, refere o preclaro Mestre que: “A sub-rogação, sendo uma transmissão das obrigações, coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito (conquanto limitado pelos termos do cumprimento) que pertencia ao credor primitivo. O direito de regresso é um direito nascido ex novo na titularidade daquele que extinguiu (no todo ou em parte) a relação creditória anterior ou daquele á custa de quem a relação foi considerada extinta.
A sub-rogação envolve um benefício concedido (umas vezes, por uma ou outra das partes; outras pela lei) a quem, sendo terceiro, cumpre, por ter interesse na satisfação do direito do credor. O direito de regresso, no caso de solidariedade passiva, é uma espécie de direito de reintegração (ou de direito à restituição) concedido por lei a quem, sendo devedor perante o accipiens da prestação, cumpre, todavia, para além do que lhe competia no plano das relações internas.” [[3]/[4]]           
Enquanto que no caso da sub-rogação (legal) o crédito de que o accipiens da prestação é titular se transmite na íntegra para a titularidade do solvens, mantendo a totalidade da sua etiologia, características e funcionalidades, v. g. garantias constituídas etc. [[5]], no caso do direito de regresso, porque o direito inicial se extingue – nascendo ex novo um direito de crédito na titularidade do solvens [[6]] – o direito (de crédito) que exsurge adquire uma nova configuração e cria uma relação obrigacional nova entre o autor do cumprimento e aquele que mercê do cumprimento efectuado fica colocado na posição de obrigado. O direito transmitido confere ao solvens (novo credor) o mesmo amplexo de poderes e deveres jurídicos que se encontrava na esfera do credor originário, enquanto que no caso dos direito de regresso, por se tratar de um direito que nasce de uma situação extintiva do direito (de crédito) inicial, o accipiens da nova relação creditícia estabelece com o obrigado à nova prestação creditória um novo vínculo e uma obrigação de prestar nos termos em que o direito surgido se configura. O titular do direito de regresso encontra-se, tal como aqueles contra quem pretenda exigir o cumprimento da obrigação (creditória) que, entretanto, haja satisfeito, numa posição devedor (solidário e passivo), pelo que quando exerce o direito de regresso a sua pretensão jurisdicional traduz-se na alegação de uma relação obrigacional (interna) donde decorreria um dever de prestação, solidariamente assumido, [[7]] e que por os co-obrigados terem deixado de cumprir a parte [[8]] que lhes era imputada no crédito comum aceite, o autor do pagamento da divida adquire o direito de ser reintegrado ou restituído da parte que, pela natureza da obrigação constituída perante o credor, o seu património ficou despojado e diminuído.  
Se assim nos casos de solidariedade passiva, chamemos-lhe perfeita ou própria, já nos casos em que a solidariedade se baseia na impropriedade ou imperfeição nas respectivas relações internas a questão assume contornos específicos.
Dando palavra ao doutrinado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de Julho de 2015, (acórdão de uniformização de jurisprudência nº 11/2015, publicado no Diário da República nº 183/2015, Série I, de 18 de Setembro de 2015, quanto ao direito de regresso, nos casos em que a seguradora pede ao lesante – responsável pelos danos ocasionados na esfera do lesado pela prática de uma conduta ilícita e culposa – a indemnização que houvera pago em substituição, decorrente da vinculação contratual a que estava obrigada, “Como é sabido, no âmbito institucional do Direito das Obrigações a figura do direito de regresso, prevista no art. 524º do CC, situa-se no campo das obrigações solidárias, visando – no plano das relações internas entre os vários obrigados - reequilibrar as relações patrimoniais entre eles, afectadas pelo facto de o condevedor a quem foi exigida a prestação ter pago montante superior à sua quota na relação obrigacional comum; e tal direito de regresso traduz-se, como é sabido (ao contrário do que ocorre na mera novação subjectiva que é típica da figura da sub-rogação), na atribuição de um direito novo ao condevedor que, não podendo opor ao credor o benefício da divisão, teve de realizar a prestação por inteiro – direito esse constituído sequencialmente à extinção da primitiva relação obrigacional solidária, como decorrência da integral satisfação do interesse do credor.
Por outro lado – a admitir-se que é possível construir juridicamente uma vinculação solidária entre o segurado/lesante e a seguradora que assume prioritariamente o ressarcimento dos lesados – é manifesto que nos situamos no plano da solidariedade imprópria ou imperfeita, caracterizada pela existência de um escalonamento de responsabilidades, sendo – nos casos que ora nos ocupam, decorrentes do disposto no art. 19º - um dos vinculados (o autor do facto que fundamenta o direito de regresso da seguradora) o responsável principal e definitivo pelo ressarcimento dos danos causados; na verdade, o exercício da acção de regresso possibilita ao responsável provisório (a seguradora que, assumindo a função social do seguro, adiantou a satisfação das indemnizações devidas aos lesados) o reembolso das quantias que pagou, fazendo-as repercutir definitivamente no património do causador do acidente e autor dos comportamentos que, pela sua especial gravidade e censurabilidade, – implicando clara ultrapassagem do perímetro de riscos protegidos pelo seguro– ditam, na óptica do legislador, a preclusão da garantia de cobertura resultante da existência do seguro.
De realçar, porém, que na situação dos autos – situada na confluência da responsabilidade extracontratual do lesante em acidente de viação e da cobertura pela seguradora do risco de constituição no património do segurado da obrigação de indemnizar terceiros (cfr. art. 145º da LCS), implicando a consequente assunção contratual pela seguradora de responsabilidade civil da obrigação de suportar prioritariamente as indemnizações devidas pelo beneficiário do seguro aos terceiros lesados – o regime de solidariedade passiva que, pelos princípios gerais, se poderia supor existente entre o lesante a respectiva seguradora (sujeita, como é típico dos seguros obrigatórios, à acção directa do lesado) está obnubilada pelas regras especiais que há muito regulam a legitimidade passiva no campo das acções emergentes de acidentes sujeitos ao regime do seguro obrigatório automóvel.
Na verdade, tais regras especiais impõem que – existindo seguro válido e eficaz e estando em causa valores compreendidos no capital do seguro obrigatório – a acção seja proposta apenas contra a seguradora: ora, com este regime adjectivo quebra-se uma nota fundamental do conceito de solidariedade, qual seja a possibilidade de o credor exigir a totalidade da prestação a qualquer dos condevedores (tendo, porém, neste caso e por força do disposto no art. 29º, nº1, do DL 522/85, o lesado de deduzir a pretensão indemnizatória só contra a seguradora).
No entanto, a latente responsabilização do lesante pelas consequências do acto ilícito por ele pessoalmente praticado ressurge claramente em duas situações, ambas previstas na lei: 
- quando a seguradora demandada opta por fazer intervir na lide o seu segurado , trazendo-o, ela própria, por sua iniciativa e no seu interesse, para a demanda (nº2 do art. 29º) – não cabendo definir no presente processo quais as consequências, no caso de procedência da acção, de tal intervenção provocada do segurado, já que tal matéria extravasa manifestamente o âmbito do conflito jurisprudencial a dirimir; 
- e – precisamente no caso que nos ocupa – quando a seguradora que, em primeira linha, teve de satisfazer a indemnização devida ao lesado, exerce, nos termos da lei, contra o sujeito que beneficiou, perante o lesado, da cobertura do seguro, o direito de regresso que lhe é conferido, repercutindo definitivamente no responsável pelo acidente o sacrifício patrimonial decorrente do (prioritário) ressarcimento da vítima; ou seja, o responsável directo pelo acidente – que não podia, face às regras processuais especiais do seguro obrigatório, ser demandado pelo lesado – acaba (precisamente como sujeito passivo do referido direito de regresso da seguradora) por ter de assumir pessoalmente, por esta via e agora no plano das relações internas com a seguradora, o sacrifício patrimonial definitivo, decorrente do justo ressarcimento do lesado.   
Note-se que esta fundamental arquitectura das acções de responsabilidade civil fundadas no seguro obrigatório tem levado alguma doutrina a pôr em causa a própria existência de uma vinculação solidária entre lesante/segurado e a respectiva seguradora, acentuando a assunção garantística pela seguradora da obrigação de indemnizar resultante do seguro obrigatório - e procurando alcançar outra fundamentação substancial para o direito de regresso que nos ocupa, situada já fora do regime das obrigações solidárias: tal via jurídica alternativa implica a construção dogmática de uma inovatória figura de direito ao reembolso, diferenciada do típico direito de regresso entre condevedores solidários, (e que integraria, quer o direito de regresso da seguradora, quer a sub-rogação outorgada ao FGA), atribuído por causa e em função da verificação das circunstâncias, tipicamente previstas, que tornam, na óptica do legislador, absolutamente inaceitável a assunção definitiva do risco pelas entidades que, cumprindo a função social do seguro obrigatório, ressarciram os lesados (cfr. José Carlos Brandão Proença, Natureza e prazo da prescrição do “direito de regresso” no diploma do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, Comentário ao Ac. do STJ de 18/10/2012, in Cadernos de Direito Privado, 41, pag. 36 e segs.)
Trata-se, porém, de questão – de contornos essencialmente dogmático-jurídicos – a que não é necessário dar resposta cabal no presente recurso, já que o objecto deste se prende, não propriamente com o regime e conteúdo do referido direito de regresso ou reembolso, mas com a definição dos respectivos pressupostos legais, decorrentes precisamente da fattispecie contida no citado art. 19º: na verdade, qualquer que seja a configuração dogmático-normativa que se atribua ao direito de regresso ou de reembolso da seguradora, coloca-se exactamente nos mesmos termos o problema da interpretação das normas que condicionam a possibilidade de exercício da acção de regresso, definindo os respectivos pressupostos factuais.
Saliente-se ainda que esta figura do direito de regresso da seguradora - exercitável eventualmente contra o próprio segurado/condutor do veículo – é típica das situações de seguro obrigatório, resultando precisamente da circunstância de as finalidades de socialização do risco e de protecção dos lesados terem levado o legislador a prever um apertado regime de tipicidade das excepções oponíveis aos lesados ( art. 14º do DL 522/85) - delas excluindo, nomeadamente, factores ou circunstâncias de agravamento do risco que, no âmbito do seguro facultativo, funcionariam de pleno como causas de exclusão da responsabilidade da seguradora, desvinculando-a em absoluto do pagamento de quaisquer indemnizações decorrentes do sinistro.
A atribuição à seguradora do direito de regresso sobre quem, em primeira linha, beneficiou da cobertura do seguro obrigatório surge, pois, no plano funcional e teleológico, como forma de compensação da seguradora pela impossibilidade de – no campo do seguro obrigatório – invocar e fazer valer, de modo amplo, cláusulas de exclusão livremente convencionadas – repercutindo os valores pecuniários que teve de satisfazer para protecção primacial dos lesados no património dos causadores do acidente a quem seja também imputável algum dos factos tipificados no art. 19º (e que, deste modo, se não forem insolventes, acabarão por ter de suportar definitivamente o sacrifício patrimonial decorrente do pagamento das indemnizações às vítimas).” [[9]]
O legislador do direito infortunístico vincou de forma irretocável a relação de reembolso que deve ocorrer quando a entidade empregadora ou a seguradora hajam satisfeito a indemnização em substituição do(s) lesante(s) e naturalmente, no caso em que essa indemnização não seja da totalidade da indemnização a que o lesado/acidentado tenha direito, na parte (ou quota parte) respectiva.
Preceitua o nº 4 da lei 100/97, de 13 de Setembro, que: “A entidade empregadora ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente tem o direito de regresso contra os responsáveis referidos no nº 1, se o sinistrado não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.
Em nosso juízo, a figura jurídica que se ajusta ao direito de uma seguradora que haja procedido ao pagamento da indemnização a um trabalhador que haja sofrido um acidente de trabalho e que seja simultaneamente qualificado como de viação e a que esteja obrigada a reparar, pelo mesmo facto jurídico tendo como base a responsabilidade civil extracontratual, seria a sub-rogação legal externa e imprópria. As duas seguradores, tratando-se de um facto jurídico donde emergem dois tipos de obrigações de indemnização – uma por responsabilidade por acidentes de trabalho e outra por responsabilidade civil extracontratual – estão contratualmente obrigadas a satisfazer as respectivas obrigações de indemnização. Só que as obrigações que exsurdem do mesmo facto – infortunistico e ilicito [gerador da responsabilidade aquiliana] – geram um dever simultãneo de satisfazer a obrigação de indemnização (por acidente de trabalho e por acidente de viação) enformando uma relação paralela e sucessiva que se entrecruza num mesmo feixe orbrigacional, qual seja o de reparar as consequências (simbióticas) que emergem do mesmo facto jurídico e donde decorrem os dois tipos de obrigações contratuais. As obrigações para os dois obrigados a indemnizar – ainda que tendo por base uma divertida fonte geradora da obrigação – nascem e precipitam-se, uma vez cumprida ou prestada a indemnização – de uma forma que poderemos qualificar de solidária e externa. Ambas as seguradoras estão obrigadas a satisfazer uma divida contratual ao mesmo credor (o lesado) pelo que uma vez uma deles desonerado radica-se nele o direito de se substituir ao outro na quota parte do crédito (que ambos estvam obrigados a satisfazer, relembra-se) que satisfez.
Em nosso juízo ocorre neeste caso uma solidaridade passiva exterma e imprópria o que faria nascer um direito à sub-rogação e a um direito de regresso.       
Seja, porém, como for, e como decorre da lição do Professor Brandão Proença, a obrigação de indemnização advém de uma relação contratual pelo que deve ter, para efeitos de extinção do dever de indemnizar,  aplicação o disposto no nº 2 do artigo 498º do Código Civil.
II.b.2. – Prazo de Prescrição.
O artigo 498º, 1 do Código Civil estatui que: “1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso”; razoando o nº 2 do mesmo preceito que: “Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis”, e o nº 3 que: “Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável" 
O acórdão recorrido justificou a opção pela aplicação do nº 2 do artigo 498º do Código Civil, pela forma que a seguir extractada (sic): “A Companhia de Seguros Autora veio exercer direito de regresso que alegadamente lhe assistiria, o que fez ao abrigo do disposto no art. 31º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, que instituiu o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, encadeado normativo que vigorava à data da instauração da acção. Tal preceito, revogado em 2009, tinha o seguinte conteúdo: Artigo 31º (Acidente originado por outro trabalhador ou terceiros): 1- Quando o acidente for causado por outros trabalhadores ou terceiros, o direito à reparação não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos da lei geral.
2- Se o sinistrado em acidente receber de outros trabalhadores ou de terceiros indemnização superior à devida pela entidade empregadora ou seguradora, esta considera-se desonerada da respectiva obrigação e tem direito a ser reembolsada pelo sinistrado das quantias que tiver pago ou despendido.
3- Se a indemnização arbitrada ao sinistrado ou aos seus representantes for de montante inferior ao dos benefícios conferidos em consequência do acidente ou da doença, a desoneração da responsabilidade será limitada àquele montante.
4- A entidade empregadora ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente tem o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.° 1, se o sinistrado não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.
5 - A entidade empregadora e a seguradora também são titulares do direito de intervir como parte principal no processo em que o sinistrado exigir aos responsáveis a indemnização pelo acidente a que se refere este artigo.
Deste artigo, e do já lançado acima quanto à causa de pedir, brota que estamos perante o exercício de um direito assente num quadro contratual e emergente de uma atribuição normativa. Não nos situamos, seguramente, no contexto das relações lesado-lesante, no domínio da responsabilidade civil delitual - vd., neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07.05.2014, proferido no processo nº 8304/11.0T2SNT-AL1.S1 (Relator: Juiz Conselheiro Granja da Fonseca), in http://www.dqsi.pt., no qual bem se recordou que: «A seguradora, na acção de regresso, não exerce um direito igual ao do «lesado que indemnizou, não propõe contra o réu uma acção de indemnização por danos, antes se limita a exigir o reembolso do que pagou» e «o alongamento do prazo de prescrição» «compreende-se quando esteja em causa o direito do lesado, mas não o direito de regresso da seguradora».
Face às finalidades que se vislumbram no seio do nº 3 do art. 498º do Código Civil - que estatui que «Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável» - tem que se concluir ter plena adequação o referido por Rodrigues Bastos, Jacinto Fernandes, in Notas ao Código Civil, vol. II, Lisboa, 1988, pág. 298, ao afirmar que, através de tal preceito, se quis «sujeitar à mesma sorte a pretensão reparatória do dano privado e a pretensão punitiva do Estado, de modo a evitar que o autor de um crime, declarado responsável e penalmente condenado, fique isento da obrigação de indemnizar a vitima do crime, em consequência de uma mais breve prescrição civil.» Ora, na situação sob análise, encontramo-nos, flagrantemente, à margem desta busca de paralelismo assente na noção das potenciais maiores dificuldades e delongas da investigação criminal e da importância da protecção da vítima. Antes toda a problemática se localiza ao nível do exercício de um direito de emanação legal assente no cumprimento de um sinalagma contratual ainda que tendo como elemento despoletador um acidente de viação, simultaneamente de trabalho, imputável a terceiro.
Nesta linha, e com idêntico acerto quanto à definição da motivação da norma, preocupações de justiça e simetria subjacentes bem como focagem nos direitos dos titulares de direito a indemnização por danos produzidos em virtude de acidente de viação, o referido aresto jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça recorda que: «Corroborando este entendimento, é relevante o argumento que nos é oferecido pelo princípio de adesão estabelecido no artigo 71º do Código de Processo Penal. Tendo em conta tal princípio, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos no artigo 72º do mesmo diploma. Assim, não faria sentido que o titular do direito à indemnização civil (a exercer no processo criminal) pudesse ser atingido pela prescrição estando ainda a decorrer o prazo de prescrição do procedimento criminal que, em certo número de casos (vide artigo 118º do Código Penal) é mais longo que o fixado no nº1 do artigo 498º do Código Civil».
A patentear que estamos perante realidades distintas, temos que são completamente diversos os termos iniciais: enquanto no nº 1 do art. 498º - que se refere ao ressarcimento dos danos no âmbito da responsabilidade extracontratual - esse momento temporal é o correspondente à «data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, no nº 2 - que se refere exclusivamente ao direito de regresso - releva o tempo do cumprimento.
Não se materializa, assim, no desenho circunstancial constante dos autos, motivo justificativo da aplicação do prazo prescricional de 5 anos. Aplica-se, antes, ao caso em apreço, o disposto no nº 2 daquele artigo que determina que «Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis».
É, consequentemente, negativa a resposta à questão sob avaliação (…)”
A questão da aplicação dos apartados normativos (nº 2 e 3 do artigo 498º do Código Civil) mereceu análise no comentário elaborado pelo Professor Brandão Proença, na anotação supra citada, nos seguintes termos:  “A questão aqui versada tem certos contornos antigos (maxime, os do relacionamento entre o prazo do direito de sub-rogação previsto no art. 7º da Lei nº 1942 e o prazo de dois anos outorgado pelo nº 9 do art. 56º do CE, de 1954, ao dispor que "o direito de pedir a indemnização civil por acidente de trânsito caduca no prazo de dois anos, a partir da data em que o lesado teve conhecimento do dano e da pessoa do responsável..."), tendo certa doutrina e jurisprudência defendido a aplicação desse prazo sob o argumento de que o sub-rogado não deixa de exercer um direito de indemnização conexo com o acidente de viação, isto é, dentro dos "limites e condições em que podia exercê-lo o lesado em cujos direitos se sub-rogou". ALARCÃO DA SILVA, com melhores argumentos, tinha, no entanto, sustentado, em 1961, que o citado preceito do Código da Estrada só pretendera regular as relações entre a vítima e aqueles que eram considerados responsáveis. Apesar de submeter o direito da entidade patronal “aos prazos normais da prescrição", o jurista não deixou de admitir aquela primeira solução, contando os dois anos desde o momento do pagamento. O próprio VAZ SERRA, partindo da consideração jurisprudencial de que o citado nº 9 do art. 56º era igualmente aplicável à responsabilidade subjetiva, não deixou de sustentar a "extensão" desse prazo de dois anos não só à hipótese prevista no art. 7º da L nº 1942 mas também ao "crédito de regresso". Tendo dúvidas, como sabemos, na teorização dogmática da sub-rogação a ponto de ver nela uma pretensão indemnizatória de "conteúdo idêntico" ao do crédito satisfeito, VAZ SERRA, para obviar às dificuldades da prescrição (que, em rigor, continuaria a correr contra o sub­rogado), não deixou de "especificar" este aspeto, ao entender, e bem, que o prazo só deveria começar a contar-se desde o pagamento efetuado pelos sub-rogados.

Lendo o atual art. 498º, não podemos deixar de concluir que parte da sua redação foi o corolário do debate acabado de referir, e isto no duplo aspeto da consagração de um prazo comum para a satisfação dos diferentes direitos do lesado e do "pagador" da indemnização (em rigor, como já vimos, a norma do nº 2 só contempla diretamente o caso da solidariedade passiva) e na adoção de um dies a quo específico para o começo da contagem do prazo de prescrição no tocante à pretensão reintegradora.

Nas páginas dedicadas à justificação dos motivos do seu anteprojeto, VAZ SERRA mostrando maior preocupação com a questão indemnizatória conexa com o ilícito criminal, é muito sucinto no concernente ao direito de regresso ligado à pluralidade de "pessoas obrigadas a indemnizar”. Rejeitando, por razões probatórias, sujeitar aquele direito à prescrição ordinária, VAZ SERRA acaba, assim, por diluir a sua especificidade ("... ele não resulta do facto ilícito") ao fazê-lo comungar da "prescrição de curto prazo". Por outro lado, o jurista é muito esclarecedor quando, hipotizando a prática de um crime por um vigiado, afirma que o prazo da prescrição penal não pode ser aplicável pois os vigilantes "não respondem pelo crime, mas só pela indemnização". No articulado únic070 há uma significativa independência entre o nº 1 (prescrição da indemnização e do direito de regresso) e o nº 5, dedicado à prescrição de "facto...considerado criminoso pela lei ...”. É certo que na 1ª revisão ministerial (arts. 478º e 479º) desaparece, estranhamente, a referência ao direito de regresso, mas mantém-se todo o sentido da separação entre a "prescrição do direito de indemnização" e o "concurso de responsabilidades de diferente natureza".

Com as palavras e a sagesse de ANTUNES VARELA não temos dúvidas em afirmar que o art. 498º acabou por consagrar um "prazo-regra" (de três anos), dois "prazos excecionais" (parte final do nº 1 e nº3) e, para nós, um prazo específico (igualmente de três anos, embora contados desde o momento do "cumprimento"), com um determinado escopo reintegrador, diretamente aplicável aos devedores solidários, condicionado pelo crédito indemnizatório (relação lesado-responsável civil ou criminal) mas não identificado com ele. Crendo nós que o receio da inércia do titular no exercício de um direito não é nem foi determinante na fixação do concreto prazo prescricional, o que pode é haver hesitação na resposta à questão de saber se a coincidência do prazo de três anos do "direito de regresso" se ficou a dever às mesmas razões probatórias subjacentes à solução do nº 1 do preceito ou antes a uma necessidade de igualdade de tratamento do responsável, na sua dupla qualidade de lesante e devedor.

Estamos agora em condições de, voltando ao aresto sub annotatione, concluirmos, mais seguramente, pelo acerto da decisão do Supremo. Temos, no entanto, uma reserva a apontar à solução encontrada.

Como fomos referindo e o acórdão relatado por TAVARES DE PAIVA deixa transparecer, com diversas alusões aos argumentos da orientação jurisprudencial que parece consolidar-se, há razões ponderosas para circunscrevermos o espaço aplicativo do nº 3 do art. 498º, razões essas que se prendem com a natureza e o escopo do direito de regresso (próprio ou impróprio) e a própria racionalidade desse nº 3, não tendo sentido considerar, no caso em análise e noutros semelhantes, a seguradora beneficiária (no plano prescricional) do ilícito criminal cometido pelo seu segurado. Só este deve suportar "0 efeito sancionatório do alongamento da prescrição", não devendo a seguradora repercutir no seu direito (que não é o de fazer valer uma pretensão indemnizatória fundada, eventualmente, no art. 483º) esse mesmo efeito, tendo em conta que não houve, perante ela, qualquer ilícito criminal. A seguradora não é, em rigor, lesada imediata, só surgindo o seu "dano" com o pagamento ao verdadeiro lesado. Esta visão não deixa de ser coerente, não sendo posta em causa por contra-argumentos, de ordem sistemática ou racional, relevados pela orientação jurisprudencial contrária. Efetivamente, lendo com atenção os trabalhos preparatórios e acompanhando a evolução do processo legislativo que culminou na redação final do art. 498º, o legislador soube exprimir bem o seu pensamento, adotando conscientemente uma determinada conceção sistemática, "construindo" a norma não de forma avulsa ou ilógica (o nº 3 não é um preceito de "c/ôture" mas é uma norma específica com um determinado campo de aplicação) mas em função da racional idade dos princípios de que partiu. Já vimos que nos fundamentos da decisão há uma verdadeira pedra de toque consistente na diferenciação entre um "autónomo" direito de reembolso e o direito do lesado a ser ressarcido (com as condicionantes já assinaladas de demandar um mero pagador civil). Por outras palavras, o "direito de regresso" da seguradora e o respetivo prazo não se fundam, como se lê em certa jurisprudência, no possível ilícito extracontratual cometido pelo lesante/segurado/tomador. Nem uma pretensa visão solidarística da responsabilidade da seguradora e do segurado, que não dissocie o pagador do seu papel na "comunhão" (o que é patente no caso da relação comitente-comissário), depõe contra o que estamos a dizer, pois, como é sabido, as obrigações solidárias pautam-se por regimes diferentes em função da especificidade de cada vínculo e tem diferentes valências (relações externas e internas).

Nada tendo a opor substancialmente ao decidido no acórdão de 18/10/2012, cremos, no entanto, que o nº 2 do art. 498º não devia ter sido aplicado diretamente ao caso decidido pelo aresto, pela razão de não considerarmos o núcleo de situações descritas no art. 27º do DL nº 291/2007 como de verdadeiro direito de regresso. Devia, assim, o tribunal ter aplicado analogicamente aquele nº2, sabendo-se, por outro lado, que há uma remissão expressa para esse normativo no nº 6 do art. 54º do Dl nº 291/2007 e que, para não diferenciar, por ausência de "razões justificativas", o que é, verdadeiramente, semelhante, a defendida analogia deve igualmente valer para o direito de sub-rogação previsto no regime dos acidentes de trabalho referidos no art. 17º da Lei nº 98/2009 e no seguro de responsabilidade contra danos em coisas. 
Como se dá nota na anotação acabada de citar, a questão não tem merecido solução parelha na jurisprudência [[10]]  
Porém, a jurisprudência recenseada neste Supremo Tribunal de Justiça, vem-se apropinquando da solução que elege como prazo prescricional a vigorar entre os responsáveis indirectos, ou por via contratual, como sendo aquele que está prescrito no citado nº 2 do artigo 498º do Código Civil. 
Pela largueza da análise, e com a devida vénia, lançamos mão do expendido no douto acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de Março de 2010, relatado pelo Conselheiro Lopes do Rego.
“Como dá nota o acórdão recorrido, a questão jurídica em debate no presente recurso, - consubstanciada na aplicabilidade do regime, atinente ao início da prazo prescricional de 3 anos, expressamente previsto para o direito de regresso no nº 2 do art. 498º do CC, também às situações em que a pretensão do A. se funda na figura da subrogação – não é inédita na jurisprudência do Supremo, surgindo frequentemente colocada a propósito de situação equiparável à dos autos: a determinação do início do referido prazo prescricional nos casos m que o FGA, subrogado nos direitos do lesado a quem satisfez a indemnização, pretende obter, em via e regresso, o seu reembolso pelo lesante.
Ora, é possível detectar uma firme corrente jurisprudencial no sentido de que deve aplicar-se analogicamente o referido preceito legal, constante do nº2 do art. 498º, aos casos em que o direito ao reembolso, invocado pelo A., se funda na subrogação legal, e não na atribuição de um inovatório direito de regresso no plano das relações internas entre os vários devedores solidários, vinculados no confronto do credor. Como se afirma, por exemplo, no ac. de 17/12/02 (proferido no p. 02A3540):
“As dúvidas surgem, e prendem-se, com a questão de saber qual o momento em que inicia a contagem daquele prazo de 5 anos:
- data do acidente (13.9.91), como decidiu o acórdão recorrido; ou
- data em que o Fundo indemnizou o lesado (18.12.93), como defende o recorrente?
2.1. Para o primeiro termo da alternativa - data do acidente - apontam os elementos atrás recenseados acerca da natureza jurídica da sub-rogação e sua distinção do direito de regresso.
Na verdade, ao menos numa primeira aproximação poder-se-ia dizer que, sendo o crédito do sub-rogado o mesmo que pertencia ao antigo credor, e não um crédito novo, o devedor deveria poder opor ao sub-rogado os mesmos meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o credor primitivo.
Como assim, e no que especificamente respeita à prescrição, o prazo continuaria a correr contra o sub-rogado, como se do primitivo credor se tratasse (neste sentido, os acórdãos do STJ de 06.07.2000, CJSTJ, ano VIII, tomo II-148, e de 29.01.2002, Proc. nº 4176/01).
2.2. Propendemos para diferente entendimento, na linha dos já citados acórdãos de 13.04.200 e de 20.02.2001 (no mesmo sentido, veja-se ainda o acórdão do STJ de 23.05.2000, Proc. nº 438/00, e em sentido idêntico o acórdão, também do STJ, de 20.10.98, CJSTJ, ano VI, tomo 3-71).
Com efeito, pensamos que a resposta à questão tem de atender à substância e razão de ser das normas em confronto, privilegiando os interesses em jogo, sem se quedar por uma argumentação formalista e bastando-se com um raciocínio que se arrime apenas aos conceitos atrás precisados.
2.2.1. Como se sublinhou já, fulcro da sub-rogação e medida dos direitos do sub-rogado é o cumprimento.
Sendo a sub-rogação uma transmissão do crédito, fonte desta transmissão é, em todos os casos, o facto jurídico do cumprimento (Galvão Telles, "Obrigações", 3ª ed., p. 230).
Mas então, se a sub-rogação supõe o pagamento, não pode deixar de entender-se que antes dele não há ... sub-rogação.
Ou seja, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor (cfr. RLJ, ano 99º-360).
2.2.2. Não pode razoavelmente aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido).
É esta, precisamente, a situação aqui em causa.
Antes de satisfazer, por imperativo legal, a indemnização ao lesado, o A não é titular de qualquer direito de crédito que possa exercer em substituição do lesado - nomeadamente, não pode, antes de cumprir, interromper a prescrição mediante a propositura de acção contra o responsável civil (5).
Aliás, sublinhe-se, a solução que sustentamos encontra arrimo na própria letra da lei, na medida em que ela decorre, com alguma clareza, do nº 1 do citado artigo 25º do DL nº 522/85, ao estabelecer que o A fica sub-rogado ... "satisfeita a indemnização".
Ademais - uma vez a indemnização "satisfeita", e assim nascido o direito do A -, pode dizer-se que esse direito já só indirectamente tem como fundamento o acidente que determinou a indemnização, passando antes a basear-se no seu direito de ser reembolsado daquilo que pagou ao lesado (cfr. acórdão do STJ de 22.1.97, BMJ, nº 463-587).
2.3. De todo o exposto se conclui, fundadamente a nosso ver, que o prazo de prescrição do direito que a lei reconhece ao A se deve contar a partir do cumprimento, conforme prescreve o nº 2 do artigo 498º.
Certo que esta norma apenas dispõe, de forma directa e expressa, para o caso do direito de regresso entre os responsáveis, ao passo que, no caso do A, deparamos com um caso de sub-rogação.
Entendemos, porém, que, procedendo as razões justificativas da regulamentação estabelecida naquele nº 2, deve ela aplicar-se, por analogia, à situação em apreço.
No mesmo sentido, veja-se o ac. de 21/1/03, proferido na revista 4110-02 (in CJ/STJ I/03, pag.39) onde se considera: “3 - Com efeito, o direito de regresso assiste ao devedor solidário que houver satisfeito o direito do credor, além da parte que lhe competia no crédito comum, contra cada um dos condevedores pela quota respectiva - artigo 524º do Código Civil, diploma a que pertencerão os normativos que se indiquem sem menção da origem.
Por sua vez, a sub-rogação pode ser definida como a transmissão do crédito em favor daquele que, substituindo-se ao devedor, cumpre a obrigação a que este se encontrava adstrito - artigo 589º. Supõe sempre um pagamento feito por terceiro ao originário credor, ingressando esse terceiro na posição jurídica que o primitivo credor ocupava na relação obrigacional.
Ou seja, a sub-rogação é uma forma de transmissão do crédito, enquanto o direito de regresso constitui um crédito novo, que nem sequer tem o mesmo objecto do direito extinto (2).
Abordando a problemática da natureza jurídica da sub-rogação, escreve Antunes Varela: "A doutrina tradicional considera a sub-rogação como uma modalidade de transmissão do direito de crédito. Embora a sub-rogação assente no facto do cumprimento e este constitua a causa extintiva da obrigação por excelência, a circunstância de a satisfação do interesse do credor ser operada, não pelo devedor, mas por terceiro, ou com meios por este facultados, tem como efeito que o crédito, em lugar de se extinguir, transita de armas e bagagens para esse terceiro" (3).
Quer isto dizer que a sub-rogação envolve a transmissão de todas as garantias e outros acessórios do crédito (artigos 594º e 583º). E não é esse o regime que quadra a um direito ex novo, como o direito de regresso, nem à natureza própria da obrigação solidária, que está na base do direito de regresso.
Daí que o legislador, ao referir-se de forma diferente, por um lado, ao direito do "A" como sub-rogação (artigo 25º do diploma citado) e, por outro, ao direito de reembolso das Seguradoras, como direito de regresso (artigo 19º do mesmo diploma), o tenha feito intencionalmente, estando o fundamento da distinção de regimes na própria origem dos créditos.
Na verdade, a seguradora é, por força do contrato de seguro, directamente responsável perante a vítima até ao limite fixado na lei. Não tem, ao contrário do "A", função subsidiária.
4 - A sub-rogação do "A" nos direitos do lesado é a legal, operando-se a investidura do solvens na posição até então ocupada pelo credor ope legis (artigo 592º, nº 1).

Ora, de acordo com o nº 1 do artigo 593º, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam. Quer isto dizer que a sub-rogação coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito, se bem que limitado pelos termos do cumprimento, que pertencia ao credor primitivo.
Improcede, pois, a conclusão 1ª.
5 - Na busca da resposta para as restantes, configura-se como indispensável proceder à interpretação do artigo 498º do Código Civil, que assim dispõe: "1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.
2. Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.
3. Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável".
Formulam-se, a propósito, quatro breves observações.
- Estabelece-se neste normativo um prazo especial de prescrição do direito de indemnização (embora sem prejuízo do prazo ordinário - 20 anos).
- Prazo que é de três anos, nas hipóteses previstas nos dois primeiros números.
- Porém, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo - situação que não é a dos presentes autos -, é este o prazo aplicável (nº 3).
- Sublinhem-se, por fim, as diferentes estatuições (constantes dos nºs 1 e 2), no tocante ao início da contagem do prazo de prescrição

- a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete (nº 1);
- a contar do cumprimento (nº 2).
Retomar-se-á, oportunamente, a problemática relativa ao início da contagem do prazo de prescrição (5).
6 - Ora, sem prejuízo do prazo (de vinte anos) correspondente à prescrição ordinária (contado sobre a data do facto ilícito - artigos 498º, nº 1, in fine, e 309º), o direito à indemnização fundada na responsabilidade civil está sujeito a um prazo curto de prescrição (três anos) (6).
Assim, tendo o "A" ficado sub-rogado no crédito do lesado, nos termos acima expostos, para que ora se remete, a situação dos autos é, inevitavelmente, subsumida ao disposto no nº 1 do mesmo artigo 498º, nos termos do qual "o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso".
(…) 7.2. Propendemos, porém, para diferente entendimento, na linha dos já citados acórdãos de 13.04.200 e de 20.02.2001 (8). Com efeito, pensamos que a resposta à questão tem de atender à substância e razão de ser das normas em confronto, privilegiando os interesses em jogo, sem se quedar por uma argumentação formalista e bastando-se com um raciocínio que se arrime apenas aos conceitos atrás precisados.
7.2.1. Como resulta do acima exposto, fulcro da sub-rogação e medida dos direitos do sub-rogado é o cumprimento.
Sendo a sub-rogação uma transmissão do crédito, fonte desta transmissão é, em todos os casos, o facto jurídico do cumprimento (Galvão Telles, "Obrigações", 3ª ed., p. 230).
Mas então, se a sub-rogação supõe o pagamento, não pode deixar de entender--se que antes dele não há ... sub-rogação.
Ou seja, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor.
7.2.2. Não pode razoavelmente aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido).
É esta, precisamente, a situação aqui em causa.
Antes de satisfazer, por imperativo legal, a indemnização ao lesado, o "A" não é titular de qualquer direito de crédito que possa exercer em substituição do lesado - nomeadamente, não pode, antes de cumprir, interromper a prescrição mediante a propositura de acção contra o responsável civil.
Aliás, sublinhe-se, a solução que sustentamos encontra arrimo na própria letra da lei, na medida em que ela decorre, com alguma clareza, do nº 1 do citado artigo 25º do DL nº 522/85, ao estabelecer que o "A" fica sub-rogado ... "satisfeita a indemnização".
Ademais - uma vez a indemnização "satisfeita", e assim nascido o direito do "A" -, pode dizer-se que esse direito já só indirectamente tem como fundamento o acidente que determinou a indemnização, passando antes a basear-se no seu direito de ser reembolsado daquilo que pagou ao lesado (11).
7.3. De todo o exposto se conclui que o prazo de prescrição do direito que a lei reconhece ao "A" se deve contar a partir do cumprimento, conforme prescreve o nº 2 do artigo 498º.
Certo que esta norma apenas dispõe, de forma directa e expressa, para o caso do direito de regresso entre os responsáveis, ao passo que, no caso do "A", deparamos com um caso de sub-rogação.
Entendemos, porém, que, procedendo as razões justificativas da regulamentação estabelecida naquele nº 2, deve ela aplicar-se, por analogia, à situação em apreço.
No mesmo sentido da aplicabilidade, por analogia, do regime contido no nº 2 do art. 498º a situações em que o direito ao reembolso do demandante se funda na figura da subrogação, só se iniciando o prazo prescricional contra ele no momento em que ocorre o cumprimento da obrigação que gera a transmissão do crédito, podem citar-se ainda os acs do STJ de 22/2/04 (p. 04B404), de 17/11/05 (p.05B3061) e de 13/4/00 (p.00B200).
5.É a esta corrente jurisprudencial que inteiramente se adere.
Não se nega que – se nos movermos num plano estritamente lógico-jurídico, adoptando uma metodologia interpretativa que estaria mais próxima de uma «jurisprudência de conceitos» - poderia efectivamente ser-se levado a considerar que, assentando a subrogação legal na estrita ideia de transmissão do crédito (que não sofre qualquer alteração objectiva), o transmissário sucederia estritamente na posição jurídica do transmitente, devendo, consequentemente, suportar, nos precisos termos em que a este eram oponíveis, as excepções contra ele invocáveis .
Não pode, porém, olvidar-se que tal diferenciação radical de regimes entre a subrogação e o direito de regresso, assente na respectiva fisionomia dogmática ou conceitual, e não na ponderação dos interesses que lhe vão subjacentes, acaba por conduzir a um tratamento injustificadamente diferenciado de situações que, de um ponto de vista material, não merecem a aplicação de regimes radicalmente divergentes (podendo conduzir, em última análise, a uma verdadeira impossibilidade prática de obtenção pelo interessado do reembolso através da via da subrogação, bastando que tenha ocorrido uma dilação significativa – e não necessariamente imputável ao credor subrogado, podendo a demora radicar numa situação litigiosa quanto ao apuramento exacto dos danos causados pelo sinistro - entre os momentos do evento danoso e daquele em que se realizou o cumprimento que gera a subrogação).
E essa dualidade de tratamentos torna-se particularmente injustificável se tivermos presente que não tem havido no ordenamento jurídico uma separação, clara e estanque, entre o âmbito de aplicação das figuras da subrogação e do direito de regresso, não sendo poucos os casos em que se discute o enquadramento e qualificação jurídica do direito ao reembolso em certa situação específica, bem como aqueles em que tal fundamento tem oscilado ao longo do tempo e da sucessão de regimes legais (veja-se o Ac de5/11/09, por nós relatado no p. 3162/08.5TBLRA.C1.S1).
Por outro lado, movendo-nos no plano da responsabilidade extracontratual, estamos confrontados com um prazo prescricional de curta duração – 3 anos – drasticamente encurtado relativamente ao prazo da prescrição ordinária, podendo facilmente transmutar-se num prazo exíguo ou insuficiente para o exercício do direito que, por subrogação, advém e quem cumpriu a obrigação no confronto do lesado e se pretende reembolsar à custa do lesante e principal responsável, colocando-o numa situação de excessiva onerosidade: na verdade, e como é óbvio, se esse prazo curto se contar a partir da originária ocorrência do facto danoso, irrelevando de todo, para tal efeito, o momento em que ocorreu o acto de cumprimento que gera a subrogação, o demandante fica inelutavelmente sujeito ao decurso desse prazo prescricional curto contado de um momento em que está absolutamente privado da possibilidade de exercer o direito ao reembolso, pela via da subrogação - podendo facilmente tal prazo estar já inelutavelmente exaurido no momento em que o cumprimento teve lugar.” [[11]/[12]]
Perfilamos a linha jurisprudencial e doutrinal que escora a sua preferência pela interpretação “restritiva” do artigo 498º do Código Civil.
O artigo 498º do Código Civil prescreve três tipos de prazos de prescrição. Um (nº 1 do artigo citado – três [3] anos) endereçado ao responsável directo da obrigação de indemnizar por virtude um facto ilícito (danoso) de que é (presumivelmente) directamente responsável (por lhe ter sido directa, objectiva e subjectivamente imputado); e outro (nº 2 do citado preceito – três [3] anos) que é cominado aos responsáveis indirectos, ou seja aqueles que, por alor das obrigações contratualmente assumidas, estão vinculados ao cumprimento de solver uma obrigação indemnizatória, e que uma vez satisfeita podem, nas situações legalmente identificadas e assinaladas, reverter a seu favor as quantias que hajam despendido em prol de um dever a que só por força de um vínculo contratual deviam prover, mas que a lei desonera em funções de situações – qualificadas de ilícitas e não remíveis – dos responsáveis directos; e, finalmente, um terceiro (nº 3 do preceito assinalado – prazo indicado na lei penal para o ilícito típico donde decorra o facto (ilícito) gerador do pedido de indemnização) que, por se referir a uma responsabilidade criminal, vale dizer, pessoal, por ser subjectivamente vinculada (ainda que indicada na forma negligente), e impérvia, por vinculativa e adstrita a um (ou mais do que um) concreto(s) sujeito(s) (individuo(s) imputável(eis) e criminalmente responsável(eis)) se conecta com o(s) responsável(eis) directo (do facto lesivo) e que por isso inculca a possibilidade de um prazo conecto e parelho com a lei criminalmente aplicável.
Teleologicamente e no plano da compreensão e dimensão lógico-jurídica são distintas as situações concentradas no preceito em análise, embora o legislador tenha, na arrumação segmentar da norma, do nosso ponto de vista, feito uma inclusão sistémica que poderá arrastar a uma divertida interpretação.
Em nosso juízo, num plano de arrumação normativa, o nº 2 do artigo 498º do Código Civil caberia, em numeração, no nº 3 e este no nº 2. Deste modo, parece-nos, ter-se-ia permitido uma conexão directa e  imediata entre o prazo prescricional do responsável directo do nº 1 – caso em que o facto gerador da responsabilidade não constitui crime – e o propugnado nº 2 para os casos em que o facto (imputável ao responsável directo indicado no nº 1) fosse qualificado como ilícito criminal e sujeito a um prazo predefinido para o crime que estive em tela de juízo.
Retornando ao caso, e ainda tal como a norma se encontra alinhada, temos que o direito que decorre de uma relação contratual não pode, teleológica e juridicamente, assumir o mesmo tratamento que aquele que é conferido aquele que é responsável (directo e imediato) de um facto ilícito e gerador de responsabilidade. As situações configuram-se como distintas, desde logo no plano da contagem do prazos, no caso do responsável directo o inicio do prazo (de prescrição) inicia-se a partir do momento em que o lesado toma conhecimento do direito que lhe compete (“embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos”) enquanto que, no caso previsto no nº2 do citado preceito, o direito só pode ser accionado e exercitado a partir do momento em que se verifica o facto gerador do direito a pedir o reembolso do que haja despendido a mais ou do que haja despendido em substituição daquele a quem a lei não desonera da responsabilidade pessoal e directa, por razão da sua imputação subjectiva e objectiva a um quadro típico penalmente relevante. Isto é, nesta segunda situação o prazo radica numa relação contratual e é com o cumprimento da obrigação que nasce o direito (à sub-rogação ou de regresso).
O facto gerador do direito do sub-rogante ou do titular do direito de regresso não radica nos mesmos pressupostos em que se funda o direito a exigir o ressarcimento por danos advindos de um facto pessoal, imediato e directo. Aquele é um facto externo a este enlace intrínseco e directamente vinculado e que como tal não pode seguir as mesmas vicissitudes. A este facto (criminalmente ilícito) hão-de seguir-se as vicissitudes próprias e inerentes ao facto axial e desencadeador, vale dizer, aos prefixados ditames do planeamento jurídico estabelecido e deste eito os prazos prescricionais são aqueles que para o facto típico estiver estatuído na lei criminal. Já para as situações em que um terceiro (contratualmente responsável) se desobriga de uma obrigação que pactuara por convenção de vontade o prazo prescricional está fixado no nº 2 do artigo 498º do Código Civil, por ter sido esse o consagrado pelo legislador.
Não vinga, pela argumentação aduzida, a pretensão da recorrente e fundante do pedido de revista de poder ser extensível e aplicável às situações em que um responsável contratual obrigado à indemnização exerça o direito de regresso (ou sub-rogação) a extensão do prazo fixado no artigo 498º, nº 3 do Código Civil.
     
III. – DECISÃO.
Na desinência do argumentado, acordam os juízes que constituem este colectivo, na 1ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, em:
- Negar a revista;
- Condenar a recorrente nas custas.


Lisboa, 31 de Janeiro de 2017

Gabriel Catarino – Relator

                                              
Roque Nogueira

                                              
Alexandre Reis





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[1] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 324.   
[2] Estatui o artigo 524º do Código Civil. “O devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe compete tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a estes compete.” 
[3] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 334-335.
[4] Cfr. para melhor e mais aturado desenvolvimento teorético-analítico da figura do direito de regresso Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, págs. 749 a 758.  
[5] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 756 (artigos 594º e 583º do Código Civil)
[6] “(…) apesar de ser concebido no momento constitutivo da obrigação solidária, o direito de regresso só nasce no preciso momento em que o condevedor satisfaz o direito do credor para além da sua quota. É através deste acto que se determina o objecto do direito do solvens contra cada um dos condevedores, como é a partir desta data (e não da obrigação solidária: art. 521º,1) que principia a correr o prazo da prescrição contra ele; etc.” - Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 759.   
[7]A obrigação diz-se solidária, pelo seu lado passivo, quando o credor pode exigir a prestação integral de qualquer dos devedores e a prestação efectuada por um deles os libera a todos perante o credor comum.”- cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 719. 
[8]No plano das relações internas, ou seja, das relações entre os devedores, na solidariedade passiva, e das relações entre os credores, na solidariedade activa, cada um dos obrigados deve apenas uma quota ou parte da prestação, em geral proporcional ao seu número; e cada um dos credores tem apenas direito a uma quota ou parte do crédito comum.” - Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 4ª edição, Coimbra, pág. 721.     
[9] Pelo aporte doutrinário que concita para a temática conceptual das figuras/institutos do “direito de regresso” e sub-rogação, no caso da responsabilidade civil, achamos oportuno transcrever – na parte interessante – a anotação/comentário ao Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Outubro de 2012, relatado pelo Conselheiro Tavares de Paiva – “Natureza e Prazo de Prescrição do “direito de regresso” previsto no diploma do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel”, efectuada pelo Prof. José Carlos Brandão Proença, no citados Cadernos de Direito Privado.

“(…) Os sucessivos diplomas relativos a este seguro obrigatório têm igualmente consagrado, sob a designação corrente de "direito de regresso", o poder de a seguradora, em situações particulares e taxativas, exigir de certos responsáveis (não necessariamente tomadores do seguro) a restituição do montante indemnizatório pago ao(s) lesado(s). A inexistência, para a seguradora, de um genérico "direito de regresso" tem a ver com a garantia do pagamento da indemnização devida pelo responsável civil, pagamento este processado por via de uma ação direta movida pelo lesado contra a mesma seguradora, pressuposto que seja um quantitativo indemnizatório que não ultrapasse os limites previstos no art. 12º do diploma de 2007. A circunstância de a seguradora, desde logo no relacionamento interno com o seu segurado, não possuir o direito contemplado no art. 524º está em sintonia com a filosofia subjacente à contratação obrigatória e com a fisionomia jurídica do papel da seguradora. Na verdade, o risco da verificação de um acidente de viação e suas consequências danosas é assumido pela seguradora a troco de certa contra partida pecuniária, motivando-se a sua obrigação com razões principais de solvabilidade atinentes à condição patrimonial dos eventuais responsáveis civis (insuficiência económica, encargo excessivo) e com a necessidade de proteger os terceiros lesados. E embora a eventual intervenção processual do "tomador do seguro” mantenha ativo o centro de imputação da responsabilidade (naturalmente potenciado, na forma de litisconcórcio passivo, para os pedidos que ultrapassem o capital mínimo obrigatório) não é possível, ao que pensamos, defender-se uma vinculação solidária, tendo em conta que a indemnização, por força da conjugação lei-contrato, só pode ser prestada pela seguradora não responsável. Repare-se que a seguradora não co­causou o dano, nem existe, em relação a ela, um fundamento semelhante ao que, por ex., responsabiliza os comitentes ou os detentores. E mesmo que a seguradora utilize o mecanismo processual da intervenção provocada, esta intervenção não parte da existência daquela solidariedade, visando apenas os fins de reembolso (nos casos em que exista) assinalados no art. 330º do CPC. A "arquitetura" da ação direta, esse "direito de fonte paracontratual", segundo a expressão de MARGARIDA LIMA REG0, também não parece, na verdade, compatível com uma visão solidária (mesmo imperfeita) das obrigações da seguradora e do tomador do seguro, já que não deixa liberdade ao credor na formulação da sua pretensão (repete-se que o segurado não responde pela prestação integral), estando, igualmente, inviabilizada a aplicação do "regime externo" da solidariedade passiva (os "meios de defesa" da seguradora ou são legais ou tem a ver com a relação segurado-lesado). Sendo, em princípio, definitiva a libertação do responsável, este não tem que satisfazer ao pretenso devedor solidário qualquer "quota-parte". A seguradora, enquanto devedor singular, cumpre aquilo a que está obrigada (legal e contratualmente), sem direito, numa pretensa relação interna entre devedores, a qualquer reembolso de reintegração. Por outras palavras, a seguradora paga em vez, na medida e no lugar do responsável civil, num quadro de interesses valorado pelo legislador a favor dos lesados ou, como diz CARLOS ALBERTO BETTENCOURT DE FARIA, fruto de uma "hétero - regulamentação de interesses derivada directamente da lei". Fora das hipóteses descritas no art. 27º do DL nº 291/2007, e atendendo à secundarização do responsável civil, o pagamento pela seguradora do débito indemnizatório do tomador do seguro corresponde civilisticamente a uma espécie de prévia promessa de cumprimento ou assunção exoneratória de dívida, consolidando-se, no património da seguradora, o efeito da verificação do risco. Como afirma MARGARIDA LIMA REG0 "o dever de indemnizar que vincula o segurador é, na verdade, um dever primário de prestar" e "decalca-se sobre o dever (secundário) de indemnizar do segurado".

(…) Como já dissemos, este direito não se funda numa relação solidária (não existe uma Gleichstufigkeit, uma "mesmidade de degrau” ou "uma conexão interna entre as obrigações dos vários co-responsáveis"), apresentando-se a seguradora como mero garante provisório ou obrigado secundário de uma indemnização que responsabiliza (ou não liberta) os "garantidos" do art. 27º. A título parentético, há que dizer que teria mais sentido ter-se consagrado um direito de regresso do Fundo de Garantia, partindo-se daquilo que certa jurisprudência apelida de "solidariedade externa impura" e dogmaticamente é concebível como verdadeira solidariedade já que o Fundo e o responsável civil respondem pela dívida integral (em rigor, o Fundo é um devedor com outro ou outros devedores) e tem o mesmo interesse processual, pese a circunstância de só o primeiro gozar de reembolso.

(…) Assim como a seguradora, mesmo quando sobressai o contrato celebrado, não satisfaz a parte de outros condevedores solidários, nem procura com o reembolso evitar enriquecimentos alheios ou repartir quotas de responsabilidade, também o Fundo de Garantia, numa visão teleológica, assume um papel semelhante, não sendo um vulgar terceiro (a base legal que o funda torna-o uma espécie de obrigado público) pois satisfaz imperativamente uma obrigação alheia no interesse dos lesados, não havendo razões para o considerar "sucessor" no mesmo direito do lesados. O princípio comum do reembolso, integrado pela defesa de um direito específico, é nitidamente visível, quanto à questão, em causa no aresto aqui anotado, do prazo de prescrição e da sua forma de contagem. Efetivamente, e embora certa jurisprudência já defendesse a aplicação analógica do art. 498º,2 à sub-rogação legal (quer do Fundo de Garantia, quer da entidade patronal ou da sua seguradora), o nº 6 do art. 54º do DL nº 291/2007 veio definir expressamente que o prazo de prescrição do chamado "direito de sub-rogação" não é o do direito de indemnização do lesado mas é o previsto no nº 2 do art. 498º. Parece, pois, definitivamente afastada a tese que, "Iadeando" o prazo previsto no nº 2 do art. 498º, defendia a aplicação do prazo ordinário de prescrição, mesmo após o trânsito em julgado da decisão condenatória do Fundo de Garantia. Na verdade, qualquer intérprete coerente e razoável não pode defender uma solução (judicial) de benefício para o Fundo (quando está a exercer um direito qualitativamente semelhante ao das seguradoras), "vendo-o", por falsas razões terminológicas, exatamente na mesma posição do lesado, com o mesmo direito que foi reconhecido ao lesado (!) e, como tal, aparentemente sujeito à aplicação combinada dos arts. 309º e 311º,1 e do art. 56º,1 do CPC. (…)

A terminologia legal, longe do rigor dos conceitos ou da forma como, por ex., ANTUNES VARELA dogmatiza o direito de regresso e a sub-rogação, espelha uma "comunicação" das figuras, tal como transpareceu no pensamento de VAZ SERRA, nalgumas legislações, como a italiana e a alemã (o §426 do BGB acolhe a chamada "Legalzession" como outro "Regressinstrument", no regime dos acidentes laborais e nas próprias conceções dogmáticas sobre a sub-rogação, aproximando-a do direito de regresso, vendo nela não propriamente uma mera modificação subjetiva mas conferindo ao direito reintegrador ou, se se quiser, ao credor sub-rogatório (entre nós, o Fundo de Garantia e a entidade patronal/seguradora) um direito de natureza diversa, embora limitado no seu conteúdo pelo direito originário.
A análise feita neste número leva-nos a três conclusões: (i) o "direito de regresso" previsto no art. 27º do DL nº 291/2007 não é um verdadeiro direito de regresso, no sentido em que a nossa doutrina e legislação civilísticas o ligam, mesmo na perspetiva sistemática que resulta da "posição" dos arts. 497º e 498º, ao regime de vinculação solidária (nos casos daquele normativo a seguradora não responde como condevedor do causador do dano); (ii) o direito de sub-rogação legal do Fundo de Garantia Automóvel corresponde muito imperfeitamente aos quadros dogmáticos dominantes da figura (não existe uma intervenção interessada e voluntária, podendo, por outro lado, admitir-se uma solidariedade externa); (iii) o "direito de regresso" e o "direito de sub-rogação" mais não são do que, em circunstâncias diferentes, idênticos direitos de reembolso (ou de regresso lato sensu) das quantias pagas, ex vi legis, a título provisório e por obrigados (não responsáveis) secundários, direitos esses a "construir" substancialmente de forma semelhante61, com uma natureza que não é, nem deve ser a do direito do lesado ressarcido e com um conteúdo delimitado essencialmente pelo crédito satisfeito e, em rigor, a considerar extinto.”
[10] Cfr. Jurisprudência citada na nota 7 do estudo citado.
[11] Disponível em www.dgsi.pt (tal como os demais que venham a ser citados).
[12] No mesmo sentido vejam-se os acórdãos 18 de Outubro de 2012, relatado pelo Conselheiro Tavares de Paiva, e que foi objecto da anotação a que acima aludimos; de 17 de Dezembro de 2012, relatado pelo Conselheiro Fonseca Ramos; de 27 de Outubro de 2009, relatado pelo Conselheiro de que respiga o sequente tramo: ““Aqui chegados, teremos que definir se o prazo prescricional é o de três ou se poderá ser o de 5 anos, ex vi do disposto no artigo 498.º, n.º 3, dado o prazo prescricional correspondente ao ilícito penal a que se subsumem as ofensas corporais causadas.
A nossa jurisprudência divide-se quanto a tal problemática, havendo naturalmente quem defenda tal aplicação (cf., entre todos, os acórdãos deste Supremo Tribunal de 13.04.2000, processo n.º 00B200 e de 26.06.2007, processo n.º 03B644), ao passo que outros (cf., entre outras, as decisões deste Tribunal de 4.11.2008 e de 18.12.2003, já citados) pugnam pela tese oposta, considerando que o prazo de prescrição do direito de regresso é, somente, de 3 anos, não havendo fundamento legal para o seu alargamento, ao contrário do que acontece com o prazo de prescrição do n.º 1 do artigo 498.º do Código Civil.
Tomando posição, desde já, nesta polémica, entendemos que não se justifica o alargamento do prazo prescricional do número 2 do artigo 498.º do Código Civil, pois, na acção de regresso, através da qual se pretende reaver as quantias indemnizatórias pagas aos lesados, não está já em causa, em termos directos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo, que, em rigor, já estará definida mas antes um segundo momento, subsequente à definição, em concreto, da dita responsabilidade, não se vislumbrando necessidade ou motivo, quer em termos fácticos como jurídicos, para proceder a tal ampliação do prazo de 3 anos previsto para o direito de regresso.”