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RECURSO PENAL
PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
CONFIRMAÇÃO IN MELLIUS
Sumário
I - A admissibilidade de recurso para o STJ dos acórdãos ou dos seus segmentos decisórios que versem matéria cível passou, desde a alteração introduzida pelo DL 48/2007, de 29-08, a ser regulada, subsidiariamente, pelo regime jurídico do recurso de revista previsto no CPC e que estiver em vigor, à data da prolação da decisão recorrida, conforme vem sendo entendimento largamente maioritário da jurisprudência deste STJ. II - Mostrando-se confirmado, em sede de recurso, o acórdão da 1.ª instância quanto à condenação dos demandados civis no pagamento aos demandantes de uma indemnização de 20.000,00€, devida a cada um dos pais da vítima pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da mortes desta, confirmação em que ocorre unanimidade dos Senhores Juízes Desembargadores que apreciaram o recurso interposto, sendo idêntica, nesta parte, a fundamentação utilizada pelas duas instâncias, verifica-se dupla conforme, impeditiva do conhecimento do recurso (art. 671.º, n.º 3, do CPC). III - O mesmo vale dizer, relativamente à indemnização devida aos demandantes a título de perda do direito à vida, com a ressalva de que o acórdão do tribunal da relação, reduziu o montante desta indemnização de 150.000,00€ (fixado pelo acórdão coletivo do tribunal de 1.ª instância), para a quantia de 120.000,00€. A conformidade ou desconformidade das decisões das instâncias não podem ser aferidas pelo critério puramente formal da coincidência ou não coincidência do conteúdo decisório da sentença, pelo que, também nesta parte, se verifica a existência de dupla conforme, não sendo admissível o recurso.
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
I – RELATÓRIO
1. No processo nº 335/08.4GAPMS da Instância Central Criminal de ..., Comarca de ... foi proferido acórdão, em 11.09.2015, que decidiu:
«1- O Tribunal julga parcialmente procedente a pronúncia contra os arguidos AA e BB e, em consequência:
1- Condena o arguido BB, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de:
a) um crime de infracção de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços, previsto e punido pelo art. 277º, nº. 1, al. a) e n.º 2 do Código Penal, agravado pelo resultado em função do disposto no artigo 285º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução se suspende por igual período.
b) Condena o arguido nas custas, em 4 U. C. de taxa de justiça;
2- Absolve o arguido AA, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de infracção de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços, previsto e punido pelo art. 277º, nº. 1, al. a) e nº. 2, do Código Penal, agravado pelo resultado em função do disposto no artigo 285º do Código Penal.
3- O Tribunal julga parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por CC, DD e EE contra os arguidos AA e BB e FF, S. A. e, em consequência:
a) Condena o arguido BB, a FF, S. A. e a GG, S. A. solidariamente a pagar aos demandantes CC, DD e EE a quantia global de 190.000,00 € (cento e noventa mil euros)- sendo a FF apenas responsável pelo pagamento de 50.000,00 € e a GG apenas responsável pela parte que excede os 50.000,00 €- tudo acrescido de juros moratórios desde a notificação para contestarem o pedido;
b) Condena os demandados e os demandantes nas custas do pedido de indemnização civil, na proporção de proporção de 5/6 para os primeiros e 1/6 para os segundos, sem prejuízo do apoio judiciário concedido- art. 446.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, ex vi do art. 523.º do Código de Processo Penal.
c) Absolve o demandado AA e a HH, S. A. do pedido.
2. Inconformados com esta decisão, o arguido/ demandado civil, BB, a demandada civil FF, S. A. e a interveniente GG, S. A., interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra.
3. Em 13 de julho de 2016, foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Coimbra que decidiu:
« (…)
I - Julgar parcialmente procedente o recurso do arguido, da FF e da GG em matéria CÍVEL, decidindo-se:
- Condenar o arguido BB, a FF, S. A. e a GG, S. A. solidariamente a pagar aos demandantes CC, DD e EE a quantia global de 160.000,00 € (cento e sessenta mil euros) - sendo a FF apenas responsável pelo pagamento de 50.000,00 € e a GG apenas responsável pela parte que excede os 50.000,00 € - tudo acrescido de juros moratórios desde o trânsito em julgado desta decisão, nesta parte se revogando o acórdão recorrido;
- Julgar totalmente improcedente os recursos do arguido BB e da FF em matéria crime, pelo que no mais se mantem o acórdão recorrido.»
4. Inconformada, a interveniente GG, S. A., interpôs recurso deste acórdão, restrito à parte civil, para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as motivações com as seguintes conclusões:
« NOTA PRÉVIA
1ª A demandada GG não vê razões para se afastar no recurso agora para o S.T.J. das motivações que apresentou no antecedente recurso para o T.R.C. as quais mantêm a mesma atualidade e suficiência no plano da divergência que ainda subsiste no quantum indemnizatório e compensatório fixado pela Relação seja na indemnização pela lesão do direito à vida da vitima seja no que respeita aos danos morais próprios dos pais desta.
2ª Salvo o devido respeito, a demandada mantém a convicção de que quer a indemnização pelo dano morte quer a compensação por danos morais próprios em função da morte da vitima, subsistem quantificados por excesso.
LESÃO DO DIREITO À VIDA
3ª Os sumários dos Acórdãos desse S.T.J. e supra elencados cronologicamente desde Novembro /2010 até Junho de 2015 (Ac do STJ de 25/11/2010 – Revista 2102/06.0TBAMT.P1.S1; Ac. do STJ de 03/02/2011 – Revista 605/05.3TBVVD.G1.S1 - 7ª secção; Ac. do STJ de 31/05/2011 – Revista 1803/06.8TBVNG.G1.S1 – 6ª secção; Ac. do STJ de 12/07/2011 – Revista 322/07.0TBARC.P1.S1 – 2ª secção; Ac. do STJ de 27/09/2011 – Revista 425/04.2TBCTB.C1.S1 – 6 secção; Ac. do STJ de 31/01/2012 – Revista 875/05.TBILH.C1.S1 – 6ª secção; Ac. do STJ de 29/03/2012 – Revista 586/2002.L1.S1 – 6ª secção; Ac do STJ de 19/04/2012 – Revista 569/10.1TBVNG.P1.S1. – 2ª secção; Ac. do STJ de 31/05/2012 – Revista 14143/07.6TBVNG.P1.S1 – 7ª secção; Ac do STJ de 05/06/2012 – Revista 100/10.9YFLSB – 7ª secção; Ac do STJ de 30/10/2012 – Revista 830/08.5TBVCT.G1.S1 – 1ª secção; Ac. do STJ de 20/11/2012 – Revista 2/07.6TBMC.G1.S1 – 1ª secção; Ac do STJ de 23/04/2013 – Revista 4834/04.9TBVFR.P1.S1 – 1ª secção; Ac do STJ de 08/05/2013 – Revista 29894/05.3TBVRL.S1 – 1ª secção; Ac. do STJ de 22/05/2013 – Revista 17895/06.6TBAV.C1.S1 – 2ª secção; Ac do STJ de 30/05/2013 – Revista 1593/08.0TBFIG.C1.S1 – 2ª secção; Ac de 12/09/2013 – Revista 1/12.6TBTM.C1-S1 – 2ª secção; Ac. de 24/10/2013 – Revista 225/09.3TBVZL.S1 – 7ª secção; Ac do STJ de 29/10/2013 – Revista 62/10.2TBVZL.C1.S1 – 6ª secção; Ac do STJ de 28/11/2013 – Revista 313/05.5TBALQ.L1.S1 – 2ª secção; Ac. do STJ de 28/11/2013 – Revista 177/11.0TBPCR.S12 – 2ª secção; Ac do STJ de 18/12/2013 – Revista 1749/06.0TBSTS.P1.S1 – 2ª secção; Ac do STJ de 29/01/2014 – Revista 49/05.7TBPRL.E1.S1 – 1ª secção; Ac. do STJ de 13/05/2014 _ Revista 1279/11.8T2AVR.C1 – 1ª secção; Ac. do STJ de 19/02/2015 – Revista 1094/08.6TBSLV.E2.S1 – 7ª secção; Ac. do STJ de 21/04/2015 – Revista 184/2000 – C3.S1 – 6ª secção; Ac. do STJ de 07/05/2015 – revista 982/11.7TBSTR.E1.S1 – 2ª secção; Ac do STJ de 18/06/2015 – Revista 2567/09.9TBABF.E1.F1 – 7ª secção), e os mais recentes e tirados após Junho/2015 (Ac. do STJ de 04/06/2015 – Revista 7645/12.4TBMAI.P1.S1- 2ª secção; Ac. do STJ de 09/07/2015 – Revista 2985/05.1TBVRL.P1.S1 – 2ª secção ; Ac. do STJ de 10/12/2015 – Revista 896/10.8TBESP.G1 – 1ª secção, Ac. do STJ de 15/12/2015 – Revista 132/13.5TBMCN.S1 – 1ª secção), todos disponíveis in Sumários dos Acórdãos do STJ no sitio respetivo www.stj.pt fixam sistemática e invariavelmente para a indemnização pela lesão do direito à vida, valores que ficam aquém e em muito, da quantia indemnizatória de 120.000,00€ que subsistiu, nos presentes autos, no arbítrio do TRC.
4ª O valor de 120.000,00€ que vem fixado pelo Tribunal da Relação de Coimbra não respeita assim a equidade, muito menos se compagina com os valores fixados nos mais recentes arestos tirados nesse STJ, afastando-se assim dos princípios da igualdade, proporcionalidade, equidade, desprezando por isso as preocupações da justiça relativa, e o valor ajuizado regista afinal e ainda uma subida abrupta perante os julgados desse S.T.J. nesta precisa matéria.
5ª De acordo com os princípios da equidade, proporcionalidade, e salutares preocupações da justiça relativa e uniformidade de julgados, salvo sempre o devido respeito, a indemnização pela lesão do direito à vida da vitima, no caso concreto, não deve ultrapassar nunca a quantia de 70.000,00€.
DANOS MORAIS PRÓPRIOS DOS PAIS DA VITIMA
6ª O douto acórdão do TRC neste âmbito, manteve na íntegra a decisão provinda da 1ª instância, revalidando a quantia compensatória pelos danos morais próprios dos pais da vitima fixada em 20.000,00€ para cada um deles.
7ª Sendo indiscutível a dor, sentimento de perda e incomensurável desgosto inerentes ao trágico infortuno da perda de um filho, salvo o devido respeito por opinião contrária, o valor fixado peca por algum excesso, é certo que não muito, afigurando-se-nos que a quantia de 15.000,00€ atribuída a cada um dos pais da vitima é também mais consentânea, com os valores jurisprudenciais fixados para casos semelhantes.
LEGISLAÇÃO
8ª O douto acórdão do TRC fez incorrecta interpretação e aplicação do que vem disposto nos artigos 70º/1, 483º/1, 496º/1; 562; 563º, 566º e 567º todos do CC e a correta interpretação e aplicação destes normativos impõe decisão/ acórdão que revogue ou pelo menos modifique a decisão contida no acórdão do TRC nos termos expostos no âmbito do presente quadro conclusivo, baixando o valor indemnizatório atribuído pela lesão do direito à vida da vitima e a quantia compensatória pelos danos morais próprios dos pais desta, para os valores que vão preconizados pela recorrente e tudo sempre sob as legais consequências.
São termos em que deve o presente recurso vir a ser julgado procedente e provado e a decisão cível proferida no Acórdão do TRC revogada e modificada no âmbito da motivação e conclusões explanadas, procedendo-se à redução preconizada neste recurso, seja na indemnização emergente da lesão do direito à vida da vitima, seja na quantificação compensatória dos danos morais próprios atribuíveis aos pais desta.»
5. Igualmente inconformados com o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, vieram o arguido/ demandado civil, BB, a demandada civil FF, S. A, vieram nos termos do disposto no art. 634º do CPC, ex vi, art. 4º do CPP, aderir integralmente e sem reservas ao recurso interposto pela GG, S. A.
6. Os demandantes civis responderam, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
7. Colhidos os vistos em simultâneo e não tendo sido requerida a audiência de discussão e julgamento, o processo foi presente à conferência para decisão, cumprindo apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
Constitui jurisprudência assente que, de harmonia com o disposto no n.º 1 do art. 412.º do Código de Processo Penal e sem prejuízo para a apreciação das questões de oficioso conhecimento, o objeto do recurso define-se e delimita-se pelo teor das conclusões que o recorrente extrai da correspondente motivação.
Assim, a esta luz, a única questão a decidir traduz-se em saber se estão corretos os montantes fixados a título de indemnização pela perda do direito à vida e pelos danos não patrimoniais sofridos pelos pais da vítima.
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1. Antes, porém, de entramos na apreciação do objeto dos recursos, impõe-se conhecer da sua admissibilidade.
Para tanto, importa ter em conta a seguinte factualidade:
1º- No processo nº 335/08.4GAPMS da Instância Central Criminal de ..., Comarca de ... foi proferido acórdão, em 11.09.2015, que decidiu, julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por CC, DD e EE contra os arguidos AA e BB e FF, S. A. e, em consequência, condenar o arguido BB, a FF, S. A. e a GG, S. A. solidariamente a pagar aos demandantes CC, DD e EE a quantia global de 190.000,00 € ( 150.000,00 €, a título de indemnização pela perda do direito à vida, e 20.000,00 € devidos a cada um dos pais da vítima pelos danos não patrimoniais sofridos), sendo a FF apenas responsável pelo pagamento de 50.000,00 € e a GG apenas responsável pela parte que excede os 50.000,00 €, tudo acrescido de juros moratórios desde a notificação para contestarem o pedido.
2º- Na sequência do recurso que o arguido e demandado civil, BB, a demandada civil, FF, S. A. e a interveniente GG, S. A., interpuseram para o Tribunal da Relação de Coimbra, decidiu este tribunal, por acórdão proferido em 13 de julho de 2016, julgar parcialmente procedente o recurso do arguido, da FF e da GG em matéria CÍVEL, e consequentemente, condenar o arguido BB, a FF, S. A. e a GG, S. A. solidariamente a pagar aos demandantes CC, DD e EE a quantia global de 160.000,00 € ( tendo reduzido para 120.000,00 €, o valor da indemnização pela perda do direito à vida e mantido os 20.000,00 € devidos a cada um dos pais da vítima pelos danos não patrimoniais sofridos), sendo a FF apenas responsável pelo pagamento de 50.000,00 € e a GG apenas responsável pela parte que excede os 50.000,00 €, tudo acrescido de juros moratórios desde o trânsito em julgado desta decisão, nesta parte se revogando o acórdão recorrido.
3º- Deste acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, interpôs a GG, S. A. recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, ao qual aderiram, nos termos do disposto no art. 634º do CPC, ex vi, art. 4º do CPP, o arguido/demandado civil, BB e a demandada civil FF, S. A.
4º- Tais recursos foram admitidos por despacho da Senhora Juíza Desembargadora Relatora, datado de 14 de outubro de 2016.
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Posto que o acórdão impugnado, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, confirmou com fundamentação idêntica e sem voto de vencido, a decisão da primeira instância quanto à condenação dos recorrentes no pedido de indemnização civil formulados pelos demandantes, tendo apenas reduzido o montante da indemnização fixada pela perda do direito à vida ( que de € 150.000,00 passou para € 120.000,00), há que decidir sobre a admissibilidade do recurso deste acórdão, na parte respeitante a esta matéria civil, para o Supremo Tribunal da Justiça.
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No que diz respeito ao regime de admissibilidade de recurso para o STJ dos acórdãos ou dos seus segmentos decisórios que versem matéria cível, importa, desde logo, chamar a atenção para a profunda alteração introduzida, nesta matéria, pelo DL n.º 48/2007, de 29.08, com o aditamento do n.º 3 ao art. 400.º do CPP.
Trata-se de uma verdadeira mudança de paradigma, pois o legislador penal, ao estabelecer neste n.º 3, que “ mesmo que não seja admissível recurso quanto à matéria penal, pode ser interposto recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil”, quis, a bem da “igualdade” entre todos os recorrentes em matéria civil, dentro e fora do processo penal Neste sentido, Proposta de Lei 109/X., que a admissibilidade dos recursos para o STJ das decisões proferidas sobre os pedidos de indemnização cível enxertados em processo penal, deixasse de estar dependente da recorribilidade do segmento decisório relativo à matéria criminal, como até aí sucedia Neste sentido, Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 1/02, de 14.03, segundo o qual “no regime do Código de Processo Penal vigente - n.º 2 do artigo 400.º, na versão da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto - não cabe recurso ordinário da decisão final do Tribunal da Relação, relativa à indemnização civil, se for irrecorrível a correspondente decisão penal.”..
E se é certo não ter o legislador definido normas próprias de admissibilidade de recurso para a parte da sentença relativa ao pedido de indemnização civil, dúvidas não restam impor-se ao julgador, por força do estatuído pelo art. 4.º do CPP, socorrer-se do regime previsto para os processos de natureza exclusivamente civil.
Quer tudo isto dizer que a admissibilidade de recurso para o STJ dos acórdãos ou dos seus segmentos decisórios que versem matéria cível passou, desde então, a ser regulada, subsidiariamente, pelo regime jurídico do recurso de revista previsto no Código de Processo Civil e que estiver em vigor, à data da prolação da decisão recorrida, conforme vem sendo entendimento largamente maioritário da jurisprudência deste STJ Neste sentido, entre muitos outros, Acs. do STJ de 29.09.2010, Proc. n.º 343/05.7TAVFN.P1.S1; de 07.04.2011, Proc. n.º 4068/07.0TDPRT.G1.S1; de 22.06.2011, Proc. n.º 444/06.4TASEI.L1.S1; de 30.11.2011, Proc. n.º 401/06.0GTSTR.E1.S1; de 15.12.2011, Proc. n.º 53/04.2IDAVR.P1.S1; de 19.09.2012, Proc. n.º 13/09.7GTPNF.P2.S1; de 13.02.2013, Proc. n.º 707/10.4PCRGR.L1.S1; de 14.03.2013, Proc. n.º 610/04.7TAPVZ.P1.S1; de 12.06.2013, Proc. n.º 123/09.0GCTND.C1.S1; de 30.10.2013, Proc. n.º 150/06.0TACDR.P1.S1; de 06.03.2014, Proc. n.º 89/01.5IDLSB.L1.S1 e de 10.04.2014, Proc. n.º378/08.8JAFAR.E3.S1)..
Nestes autos, o acórdão do tribunal de 1.ª instância (da Instância Central Criminal de ---, Comarca de ---) foi proferido em 11 de setembro de 2015, o acórdão recorrido do Tribunal da Relação de Coimbra foi proferido em 13 de julho de 2016 e o despacho de admissão do recurso data de 14 de outubro de 2016.
Constata-se, assim, que o acórdão condenatório do tribunal coletivo de 1.ª instância e o acórdão recorrido do Tribunal da Relação de Coimbra, foram proferidos no âmbito do período de vigência do novo CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26.06, que entrou em vigor no dia 01 de Setembro do mesmo ano, sendo, por isso, aplicável, por força do citado artigo 4º do CPP, o regime dos recursos previsto no novo CPC., relativamente aos pressupostos de admissibilidade de recurso para o Supremo que tenha por objeto o pedido de indemnização civil, maxime o regime processual civil do nº3 do seu artº 671º.
Sob a epígrafe “Decisões que comportam revista”, estabelece o art. 671.º, n.º 3, do novo CPC, que: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que, confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.
Este regime de (in)admissibilidade de recurso, em caso de dupla conforme, tem aplicação a todos os processos cíveis instaurados após o dia 01 de Janeiro de 2008, desde que as decisões recorridas tenham sido proferidas após a data da entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, ocorrida no dia 01 de Setembro de 2013, conforme decorre, a contrario, da norma transitória vertida no art. 7.º deste diploma legal Neste sentido, António Santos Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra: Almedina, 2013, págs. 15 e 16.
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No caso vertente, mostra-se confirmado, em sede de recurso, o acórdão do tribunal coletivo de 1.ª instância quanto à condenação dos demandados civis e ora recorrentes no pagamento aos demandantes CC, DD e EE, de uma indemnização de €20.000,00, devida a cada um dos pais da vítima pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da morte desta, confirmação em que ocorre unanimidade dos Senhores Juízes Desembargadores que apreciaram o recurso interposto, sendo idêntica, nesta parte, a fundamentação utilizada pelas duas instâncias.
E o mesmo vale dizer, relativamente à indemnização devida aos demandantes a título de perda do direito à vida, com a ressalva de que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, reduziu o montante desta indemnização de €150.000,00 ( fixado pelo acórdão coletivo do tribunal de 1ª Instância), para a quantia de € 120.000,00.
Assim, no que concerne a este segmento, não restam dúvidas não existir uma total coincidência quantitativa entre o acórdão coletivo do tribunal de 1ª instância e acórdão do Tribunal da Relação, pelo que importa indagar se esta situação deve, ou não, ser qualificada como de “dupla conforme”.
No sentido afirmativo, ou seja, no sentido de equiparar à situação de dupla conforme aquela em que a Relação profere uma decisão, que embora não seja rigorosamente coincidente com a da 1ª instância, se revele mais favorável à parte que recorre, pronunciou-se Teixeira de Sousa In, “Dupla conforme: critério e âmbito da conformidade”, in Cadernos de Direito Privado, nº21,pág. 24., defendendo a tese de que « sempre que o apelante obtenha uma procedência parcial do recurso na Relação, isto é, sempre que a Relação pronuncie uma decisão que é mais favorável – tanto no aspecto quantitativo, como no aspecto qualitativo – para esse recorrente do que a decisão proferida pela instância, está-se perante duas decisões “conformes” que impedem que essa parte possa interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça».
Neste mesmo sentido, refere o Conselheiro Abrantes Geraldes, na sua decisão sumária de 30.10.12 Publicada in www.dgsi.pt. Cfr. ainda, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina 2013, pág. 287 e 288. , que « neste contexto, aquela primeira via recursória também deve considerar-se encerrada em casos, como o dos autos, em que a parte interessada acabou por sair beneficiada (ainda que em proporção inferior à pretendida) pelo acórdão da Relação.
Trata-se de solução que se funda no argumento “por maioria de razão” que mais não traduz do que o relevo dado ao elemento teleológico na interpretação normativa, levando a que, a par do texto legal, se atenda aos motivos que estiveram na génese de uma determinada solução. Confluindo, assim, para soluções coerentes e racionais, acabam por ser rejeitados por essa via resultados que não se inscrevem nos objectivos propostos pelo legislador.»
Nesta linha de pensamento, afirmou o Conselheiro Pereia da Silva Numa intervenção n colóquio, em 27.05.2010, “Recursos em Processo Civil: abordagem crítica à última Reforma”, disponível em http://www.stj.pt/nsrepo/cont/Coloquios/Discursos/Intervenção-colóquioVPPS%2027%2005.pdf. que a “conformidade” ou “desconformidade” das decisões das instâncias não podem ser aferidas pelo critério puramente formal da coincidência ou não coincidência do conteúdo decisório da sentença”.
Escreveu o Conselheiro Lopes do Rego No Acórdão do STJ, de 10.05.2012, relatado no processo 645/08.0TBALB.C1.S1 e publicado in wwwdgsi.pt. que o «conceito de dupla conformidade tem de ser interpretado, não em termos empíricos de coincidência puramente numérica ou matemática dos valores pecuniários das condenações constantes das decisões já proferidas pelas instâncias, mas com apelo a um elemento normativo, funcionalmente adequado à actual fisionomia dos recursos e do acesso ao STJ. E, nesta perspectiva, não faria o menor sentido admitir que a parte que viu a sua condenação ser atenuada pelo acórdão proferido pela Relação tivesse a possibilidade de aceder ao Supremo – quando seguramente a não teria se o acórdão proferido em 2ª instância tivesse mantido, nos seus precisos termos, o montante condenatório mais elevado, arbitrado na sentença proferida em 1ª instância. Constituiria, na verdade, seguramente solução normativa qualificável como arbitrária ou discricionária a que se traduzisse em conceder o direito ao recurso à parte beneficiada pela decisão da 2ª instância – quando era inquestionável que não poderia recorrer se a Relação, em vez de proferir decisão mais favorável para o recorrente, se tivesse limitado a manter, ipsis verbis, a condenação mais gravosa, decretada na sentença proferida na 1ª instância».
E é também neste sentido que se consolidou a jurisprudência deste Supremo Tribunal, conforme se pode ver, entre outros, dos Acórdãos do STJ de 12.07.2011 ( no âmbito de um recurso de revista interposto em processo civil); de 16-11-11 ( no âmbito de um recurso de revista interposto em processo do foro laboral); de 5-7-12 ( no âmbito de um recurso sobre pedido cível em sede de processo penal) ; e de 08.11.2006, de 27.01.2010 e de 06.01.2011 ( na área central do processo penal, em que se considerou vedado o recurso para o Supremo por parte do arguido quando a Relação atenua a pena aplicada na primeira instância).
Daí que, na esteira deste entendimento, por nós também sufragado, e porque não está em causa a aplicação do regime de revista excepcional do artº 672º do CPC, se considere que o recurso interposto pelos demandados civis, GG, S. A., BB e FF, S. A., para o Supremo Tribunal de Justiça não é admissível, atento o disposto no art. 671, nº3 do CPC, ex vi, art. 4º do CPP, sendo, por isso, de rejeitar.
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III. Decisão
Termos em que acordam na 3ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça em.
a) rejeitar os recurso interpostos pelos demandados civis, GG, S. A., BB e FF, S. A.
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b) Tributar os recorrentes em custas, com 5 (cinco) Unidades de Conta (UC’s) de taxa de justiça.
Supremo Tribunal de Justiça, 1 de fevereiro de 2017
(Texto elaborado e revisto pela relatora – artigo 94.º, n.º 2, do CPP).