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INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
INSOLVÊNCIA
FUNDO DE GARANTIA SOCIAL
Sumário
I - A declaração de insolvência da entidade patronal não implica a inutilidade superveniente da lide da ação de impugnação de despedimento coletivo ilícito, cujo julgamento ainda não tenha sido efetuado, impondo-se a continuação da sua tramitação, até que se alcance a data do trânsito em julgado da respetiva decisão. II - Se se vier a verificar que o montante da indemnização de antiguidade e das retribuições vencidas e vincendas até à data do trânsito em julgado da decisão, ultrapassa o montante dos créditos verificados no processo de insolvência, a tais títulos, pode o A. tentar receber a diferença através do Fundo de Garantia Salarial. III - Se após a liquidação efetuada no processo de insolvência, existir um saldo a exceder o necessário para o pagamento integral das dívidas da massa, o mesmo deve ser entregue à insolvente, pelo que o A. (munido de um título executivo) pode obter o pagamento do seu crédito, tal como o poderá fazer se o insolvente lograr obter bens após o encerramento do processo.
Texto Integral
Reg. N.º 899
Proc. N.º 351/09.9TTSTS.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B… deduziu em 2009-07-13 contra C…, Ld.ª a presente ação declarativa, com processo especial, emergente de despedimento coletivo, pedindo que se:
1 – Declare a ilicitude do despedimento da A. por falta de pagamento da compensação pecuniária devida e por improcedência dos motivos justificativos invocados para o despedimento e
2 – Condene a R. a pagar à A.:
a) Uma indemnização de antiguidade no valor de € 5.4007,00;
b) A quantia de € 1.976,90, relativa a férias e respetivo subsídio vencidos em 2009-01-01 e férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao trabalho prestado em 2009;
c) Juros vencidos no montante de € 80,97 e ainda os juros vincendos até integral pagamento e
d) Os salários vincendos até à data da sentença final.
Alegou a A. que foi abrangida por um despedimento coletivo, envolvendo 15 trabalhadores, em 2009-03-31, conforme carta recebida em 2009-04-01, mas datada de 2009-02-03, sem observância de qualquer legal formalismo a não ser, para além desta carta, um outra, datada de 2009-01-09, em que a R. declarou ser sua intenção proceder ao referido despedimento coletivo. Mais alegou que tal despedimento é ilícito porque a R. não pôs à disposição da A., como referia na decisão de despedimento, a compensação pecuniária prevista no Art.º 401.º do CT2003, nem lhe pagou qualquer outra quantia, bem como não demonstrou nenhum dos fundamentos do mesmo despedimento coletivo.
Contestou a R., alegando que cumpriu todas as formalidades legais do despedimento coletivo, indicando que não existia na empresa comissão de trabalhadores, nem foi constituída comissão ad hoc, e embora reconhecendo que à A. é devida a quantia de € 1.976,90, relativa a férias e respetivo subsídio, vencidos em 2009-01-01 e férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao trabalho prestado em 2009, bem como a compensação legal pelo despedimento coletivo, declarou que não procedeu ao respetivo pagamento por falta de meios financeiros.
A A. respondeu à contestação.
A R. foi declarada insolvente por sentença de 2011-06-06 – cfr. fls. 117.
A A. veio requerer o prosseguimento da presente acção declarativa, apesar da declaração de insolvência da R., com fundamento em que a ilicitude do despedimento terá que ser decretada judicialmente, o que será relevante, a seu ver, para efeitos de concurso ao Fundo de Garantia Salarial.
O Administrador da Insolvência da R. informou que a A. reclamou e foi-lhe reconhecido, no processo de insolvência, o crédito no montante de € 8.852,65 – cfr. fls. 128.
O Tribunal a quo julgou extinta a instância nestes autos de impugnação de despedimento coletivo, por inutilidade superveniente da lide, sendo a respetiva decisão do seguinte teor:
“De acordo com a informação que consta dos autos, a aqui ré foi declarada insolvente, por sentença já transitada em julgado, tendo entretanto sido ordenado o prosseguimento normal dos autos com vista à liquidação do ativo.
Ora, de acordo com o atual regime de insolvência, previsto no CIRE, nos casos em que é decretada a insolvência e os autos prosseguem para liquidação de todo o património da insolvente, qualquer crédito, mesmo que privilegiado tem de ser reclamado no próprio processo de insolvência, por virtude do princípio da universalidade do processo falimentar.
A ser assim, e na sequência do raciocínio supra expendido, o processo de insolvência da aqui R. passou a ser o único e o processo próprio para fazer valer qualquer direito patrimonial contra si, determinando o nº 3 do art.128º do C.I.R.E. que a verificação de créditos aí efetuada tem por objeto todos os créditos, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência se nele quiser obter pagamento.
Por conseguinte, não vislumbramos qualquer utilidade no prosseguimento da presente acção, até porque também um eventual pedido de créditos não satisfeitos pela insolvente ao Fundo de Garantia Salarial tem como pressuposto a respetiva reclamação no processo de insolvência (sendo que nesse processo foi reconhecido à autora o crédito por aquela reclamado no valor de 8.852,65 euros).
Como tal, e a ser assim, ao abrigo do disposto no 287º al. e) do C.P.Civil, julga-se extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide.”
Inconformada com o assim decidido, veio a A. interpôr recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão impugnada, tendo formulado a final as seguintes conclusões:
A - O TRIBUNAL A QUO CONSIDEROU EXTINTA A INSTÂNCIA POR INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE DADO A RÉ TER SIDO DECLARADA INSOLVENTE;
B - A DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA NESTE CASO NÃO ACARRETA QUALQUER INUTILIDADE Á LIDE;
C - É QUE O PEDIDO PRINCIPAL DESTES AUTOS É A DECLARAÇÃO DA ILICITUDE DO DESPEDIMENTO PROMOVIDO PELA RÉ;
D - NOS AUTOS DE INSOLVÊNCIA NO APENSO DE RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS, APENAS E SÓ SE PODEM RECLAMAR CRÉDITOS;
E - ALÉM DISSO, NOS PRESENTES AUTOS, A SER DECLARADA A ILlCITUDE DO DESPEDIMENTO DA APELANTE, ESTA VERÁ AINDA SER-LHE RECONHECIDO O DIREITO ÀS PRESTAÇÕES PECUNIÁRIAS VINCENDAS;
F - ACRESCE QUE, A ÚNICA FORMA DA APELANTE PODER RECEBER O SEU CRÉDITO É ATRAVÉS DO FUNDO DE GARANTIA SALARIAL;
G - SENDO POIS NECESSÁRIO QUE SEJA PROFERIDA UMA SENTENÇA PELO TRIBUNAL DO TRABALHO, POR FORMA A SER DETERMINADA A DATA DO VENCIMENTO DO CRÉDITO INDEMNIZATÓRIO;
H - PELAS RAZÕES EXPOSTAS CONSTATA-SE NÃO TER OCORRIDO QUALQUER INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA PRESENTE LIDE;
I - AO DECIDIR COMO DECIDIU, SALVO O DEVIDO RESPEITO, O TRIBUNAL A QUO FEZ UMA ERRADA INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 88 E 128 N° 3 do CIRE.
TERMOS EM QUE E COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXaS DEVERÁ SER CONSIDERADO NÃO OCORRER A INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE,ORDENANDO-SE O PROSSEGUIMENTO DOS AUTOS.
O Exm.º Senhor Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.
A A. tomou posição quanto ao teor de tal parecer.
Recebido o recurso, elaborado o projecto de acórdão e entregues as respectivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[1], foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
Estão provadosos factos constantes do relatório que antecede.
Fundamentação.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[2], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo diploma referido na nota(1), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, a únicaquestão a decidir nesta apelação consiste em saber se, decretada a insolvência da entidade empregadora, se verifica a inutilidade superveniente da lide da ação de impugnação de despedimento coletivo ilícito, cujo julgamento ainda não tenha sido efetuado.
Vejamos.
Dispõe o CIRE, o seguinte:
Artigo 85.º Efeitos sobre as ações pendentes
1 — Declarada a insolvência, todas as ações em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, e todas as ações de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo.
2 — O juiz requisita ao tribunal ou entidade competente a remessa, para efeitos de apensação aos autos da insolvência, de todos os processos nos quais se tenha efetuado qualquer ato de apreensão ou detenção de bens compreendidos na massa insolvente.
3 — O administrador da insolvência substitui o insolvente em todas as ações referidas nos números anteriores, independentemente da apensação ao processo de insolvência e do acordo da parte contrária.
Por sua vez, dispunha o Cód. dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência[3], de ora em diante designado apenas por CPEREF, o seguinte:
Artigo 154.º Apensação de ações e outros efeitos
1 — Declarada a falência, todas as ações em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa falida, intentadas contra o falido, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, são apensadas ao processo de falência, desde que a apensação seja requerida pelo liquidatário judicial, com fundamento na conveniência para a liquidação.
2 — O disposto no número anterior não é aplicável às ações sobre o estado e a capacidade das pessoas.
3 — A declaração de falência obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer ação executiva contra o falido; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.
Por último, dispunha anteriormente o Cód. Proc. Civil, de ora em diante designado apenas por CPC, o seguinte:
Artigo 1198.º Efeitos da falência sobre as causas em que o falido seja parte
1 — Declarada a falência, todas as causas em que se debatam interesses relativos à massa são apensadas ao processo de falência, salvo se estiverem pendentes de recurso interposto da sentença final, porque neste caso a apensação só se faz depois do trânsito em julgado.
2 — Exceptuam-se do disposto neste artigo as causas em que o falido seja autor, as ações a que se refere o artigo 73.º, as acções sobre o estado de pessoas e aquelas em que, além do falido, haja outros réus.
3 — A declaração de falência obsta a que se instaure ou prossiga execução contra o falido; mas se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.
As normas acabadas de transcrever regulam o regime das ações que se encontram pendentes contra o devedor quando é declarada a situação de falência ou de insolvência[4]. Porém, ultrapassada esta identidade no que respeita à hipótese, logo verificamos que muitas diferenças existem no que às estatuições concerne. Na verdade, se no CPC a apensação das ações pendentes ao processo de falência era automática, no CPEREF e no CIRE a apensação só ocorre se for requerida pelo liquidatário judicial ou pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para a liquidação.
Na vigência do CPC considerava-se que em matéria de falência vigorava o princípio da universalidade de procedimento ou da plenitude da instância falimentar, a significar que todos os direitos que tivessem o falido como sujeito passivo tinham de ser apreciados e decididos no mesmo processo, com vista a satisfazer todos os credores, de forma igual, seja pela totalidade dos créditos, seja em rateio. No entanto, se o falido fosse demandado juntamente com outros RR. ou executados e como o processo de falência só podia ter o falido no lado passivo, extraía-se certidão do processo relativamente à responsabilidade do falido e reclamava-se o crédito correspondente no processo de falência, sendo declara extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, naqueloutro processo e relativamente à parte respeitante ao falido, pois para este tais autos deixaram de ser o meio próprio de atuar o direito, dada a competência universal adquirida pelo Tribunal da falência[5].
Porém, relativamente às ações autónomas deduzidas apenas contra o falido e pendentes aquando da declaração de falência, decretada esta, eram elas apensadas automaticamente ao processo de falência, valendo o ato como reclamação de créditos, pelo que as ações apensadas mantinham o seu interesse, isto é, não se verificava em relação a elas a inutilidade superveniente da lide, pois elas eram integradas na – única – lide falimentar.
Tal regime justificava-se porque o processo de falência era tido como uma execução universal contra o falido, pretendendo-se satisfazer, com um único processo, a totalidade dos créditos de todos os credores[6].
No entanto, no âmbito da vigência do CPEREF, o legislador passou a acentuar os valores da manutenção da empresa em funcionamento, mesmo com sacrifício dos interesses dos credores dentro de determinados condicionalismos, sempre que tal fosse possível. Porém, sendo irremediável a declaração de falência, havia que satisfazer os interesses dos credores, mas a apensação das acções pendentes deixou de ser automática, para funcionar apenas a requerimento do liquidatário judicial, com fundamento na conveniência para a liquidação.
Já no domínio da vigência do CIRE, embora o legislador tenha voltado ao sistema da execução universal do insolvente, como se tem entendido[7], manteve o sistema de apensação das ações pendentes, portanto, a requerimento do administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo[8].
Ora, sendo requerida – e ordenada – a apensação ao processo de insolvência, está bom de ver que não se coloca a questão da sua inutilidade superveniente da lide, tal como ocorria no CPC, pois o processo autónomo é integrado no processo de insolvência, perdendo a sua autonomia, mas mantendo a sua utilidade.
A questão coloca-se, no entanto, na hipótese de não ocorrer a apensação da ação autónoma ao processo de insolvência.
Olhando a evolução legislativa acima sinteticamente referida, cremos poder afirmar que o princípio da universalidade ou da plenitude da instância, se não foi arredado nos dois diplomas mais recentes, encontra-se pelo menos esbatido. Em realidade, declarada a insolvência os créditos devem ser reclamados no respectivo processo, não através da apensação das ações pendentes, mas através de requerimento, em que se conclua por um pedido líquido e juntando os documentos pelos quais se prove o direito invocado. Tal procedimento deve ser observado mesmo que o crédito em causa já tenha sido objecto de decisão transitada em julgado, como estabelece o Art.º 128.º do CIRE. No entanto, pode haver créditos reconhecidos no processo de insolvência e que não tenham sido reclamados, pois o administrador da insolvência está adstrito à obrigação de relacionar todos os créditos, mesmo que não reclamados, desde que tal resulte dos elementos da contabilidade do devedor ou de qualquer outra fonte, como dispõe o Art.º 129.º, n.º 1 do CIRE. Acresce que também podem ser verificados créditos que apenas sejam reclamados depois de terminado o prazo das reclamações, respeitado que se mostre o condicionalismo constante do Art.º 146.º do mesmo diploma.
Ora, a partir do momento em que as reclamações de créditos são apresentadas através de requerimento e não através das ações – então – pendentes, o Tribunal da insolvência vai verificar créditos, depois de eventualmente impugnados, tendendo a sua atividade a desembocar na satisfação de todos os direitos de todos os credores, mas não irá propriamente julgar cada uma das ações em que os pedidos respetivos foram ou seriam formulados, como acontecia ou poderia acontecer no regime do CPC.
Tal significa que, decretada a insolvência, as ações autónomas pendentes em que o insolvente seja demandado podem não ser inúteis, isto é, a sua tramitação ulterior pode até ser necessária.
Na verdade, não sendo ordenada a apensação respetiva, se a ação não estiver julgada ou se os pedidos não estiverem liquidados, pode haver interesse no prosseguimento da sua tramitação, com vista a definir o direito, tanto mais que nunca se sabe antecipadamente se os créditos reclamados na insolvência vão ou não ser impugnados e, na hipótese afirmativa, qual a respetiva sorte em sede de verificação. In casu, estando em causa uma ação de impugnação de despedimento coletivo, alegadamente ilícito, que ainda não foi julgada, em que a A. pede a indemnização de antiguidade, que na hipótese de procedência implica que os montantes da referida indemnização e os salários de tramitação sejam calculados até à data em que a decisão, sentença ou acórdão, se torne definitiva, cremos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que não se poderá afirmar de ânimo leve que a respetiva tramitação se tornou inútil[9].
Pelo contrário, pensamos que se trata de hipótese em que a ação de impugnação de despedimento coletivo deverá prosseguir seus trâmites, pois importará, para além do mais, determinar a data do trânsito em julgado da respetiva decisão, quer no que respeita às retribuições vencidas, atento o disposto no Art.º 437.º, n.º 1 do CT2003, versão originária[10], quer quanto ao pedido da indemnização de antiguidade, de acordo com o disposto no Art.º 439.º, n.º 2 do mesmo diploma e versão[11], pois pensamos que nestes casos a decisão de verificação e de graduação de créditos proferida no processo de insolvência não pode substituir a decisão – transitada em julgado, pois é necessário atender à data do trânsito em julgado – da ação de impugnação do despedimento coletivo.
Até aqui seguimos de muito perto o Acórdão desta Relação de 2007-10-29, que tratou idêntica questão, em hipótese próxima[12]. In casu, tendo a R. sido declararada insolvente, impõe-se a continuação da tramitação da presente ação de impugnação de despedimento coletivo, até que se alcance a data do trânsito em julgado da sua decisão final[13].
Na verdade, se se vier a verificar que o montante das retribuições vincendas ultrapassa o montante do crédito verificado no processo de insolvência, a tal título, pode a A. tentar receber a diferença através do Fundo de Garantia Salarial.
É que, “…Além do mais, e atendendo ao artigo 184º do CIRE, a dispor que se, após a liquidação, existir um saldo a exceder o necessário para o pagamento integral das dívidas da massa, o mesmo deve ser entregue ao devedor, sempre o demandante (munido de um título executivo) pode obter o pagamento do seu crédito, tal como o poderá fazer se o devedor lograr obter bens após o encerramento do processo. …”.[14]
Ora, assim não tendo entendido o Tribunal a quo, deve a respetiva decisão ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da normal tramitação dos presentes autos, assim procedendo o recurso.
Decisão.
Termos em que se acorda em, concedendo provimento à apelação, revogar a decisão impugnada que deve ser substituída por outra que ordene o prosseguimento da normal tramitação dos presentes autos.
Custas pela parte vencida a final.
Porto, 2012-07-11
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
António José da Ascensão Ramos
________________
[1] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[3] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril.
[4] Repare-se que desde o CIRE passou a referir-se insolvência e insolvente, em vez de falência e falido.
[5] Parece que se trata da única situação em que se verificava a inutilidade superveniente da lide, a determinar a extinção da instância.
[6] Cfr. Pedro de Sousa Macedo, in Manual de Direito das Falências, volume III, 1968, págs. 110 e segs. e Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência Anotado, 2.ª edição, 1997, págs. 383 e 384 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1992-03-19, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 415, págs. 521 a 524.
[7] Cfr. Luís Carvalho Fernandes, in Efeitos da declaração de Insolvência no Contrato de Trabalho segundo o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, 2004, N.ºs 1, 2 e 3, págs. 5 e segs.
[8] Repare-se também que, ao nível substantivo, a declaração de falência ou de insolvência nenhuma influência tem – ou pode ter – sobre os contratos de trabalho, como resulta do disposto nas seguintes normas: Artigo 56º da LCCT
regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro] Falência ou insolvência da entidade empregadora
1 — A declaração judicial de falência ou insolvência da entidade empregadora não faz cessar os contratos de trabalho, devendo o administrador da massa falida continuar a satisfazer integralmente as obrigações que dos referidos contratos resultem para os trabalhadores enquanto o estabelecimento não for definitivamente encerrado.
2 — Pode, todavia, o administrador, antes do encerramento definitivo do estabelecimento, fazer cessar os contratos de trabalho dos trabalhadores cuja colaboração não seja indispensável à manutenção do funcionamento da empresa, com observância do estabelecido nos 16.º a 25.º, ex vi do disposto no Art.º 172.º do CPEREF e Artigo 391º do CT2003 Insolvência e recuperação de empresa
1 — A declaração judicial de insolvência do empregador não faz cessar os contratos de trabalho, devendo o administrador da insolvência continuar a satisfazer integralmente as obrigações que dos referidos contratos resultem para os trabalhadores enquanto o estabelecimento não for definitivamente encerrado.
2 — Pode, todavia, o administrador da insolvência, antes do encerramento definitivo do estabelecimento, fazer cessar os contratos de trabalho dos trabalhadores cuja colaboração não seja indispensável à manutenção do funcionamento da empresa.
3 — Com exceção das microempresas, a cessação do contrato de trabalho decorrente do encerramento previsto no nº 1 ou realizada nos termos do nº 2 deve ser antecedida de procedimento previsto nos artigos 419º e seguintes, com as necessárias adaptações.
4 — O disposto no número anterior aplica-se em caso de processo de insolvência que possa determinar o encerramento do estabelecimento,
norma que se entende aplicável, apesar de o CIRE ser adrede lacunoso, como se tem entendido.
Cfr. genericamente sobre a matéria, Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, volume I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, págs. 934 e segs., Maria do Rosário Palma Ramalho, in Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 2006, págs. 783 e segs. e Aspectos Laborais da Insolvência. Notas Breves sobre as Implicações laborais do regime do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, Questões Laborais, Ano XII-2005, n.º 26, págs. 145 e segs.
Cfr. também Luís de Menezes Leitão, in As repercussões da Insolvência no Contrato de Trabalho, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, 2006, N.ºs 3 e 4, págs. 273 e segs., António Nunes de Carvalho, in Reflexos laborais do Código dos Processos especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, 1995, N.ºs 1-2-3, págs. 55 e segs. e N.º 4, págs. 319 e segs., Luís Carvalho Fernandes, in Repercussões da Falência na Cessação do Contrato de Trabalho, ESTUDOS DO INSTITUTO DE DIREITO DO TRABALHO, VOLUME I, 2001, págs. 411 e segs. e Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Juris, 2008, págs. 353 a 355.
[9] Cfr., embora em sentido diverso, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2006-10-18, Processo:6544/2006-4, in www.dgsi.pt.
[10] Que dispõe:
Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do nº 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal [sublinhado nosso].
[11] Que estabelece:
Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial [sublinhado nosso].
[12] In www.dgsi.pt, Processo 0714018.
[13] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Juris, 2008, págs. 768 e segs.
[14] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2012-03-15, Processo 501/10.2TVLSB.S1, in www.dgsi.pt, subscrito pelos Srs. Conselheiros Sebastião Póvoas (Relator), Moreira Alves e Alves Velho.
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S U M Á R I O
I - A declaração de insolvência da entidade patronal não implica a inutilidade superveniente da lide da ação de impugnação de despedimento coletivo ilícito, cujo julgamento ainda não tenha sido efetuado, impondo-se a continuação da sua tramitação, até que se alcance a data do trânsito em julgado da respetiva decisão.
II - Se se vier a verificar que o montante da indemnização de antiguidade e das retribuições vencidas e vincendas até à data do trânsito em julgado da decisão, ultrapassa o montante dos créditos verificados no processo de insolvência, a tais títulos, pode o A. tentar receber a diferença através do Fundo de Garantia Salarial.
III - Se após a liquidação efetuada no processo de insolvência, existir um saldo a exceder o necessário para o pagamento integral das dívidas da massa, o mesmo deve ser entregue à insolvente, pelo que o A. (munido de um título executivo) pode obter o pagamento do seu crédito, tal como o poderá fazer se o insolvente lograr obter bens após o encerramento do processo.